sábado, 19 de abril de 2025

19/04/2025 - 12h00min
Martha Medeiros

“Eu poderia viver de entradas, por mim dispensaria os pratos principais”

Nem tinha terminado de digitar a frase e já havia percebido que era a metáfora da minha vida. Dispenso o prato de pedreiro, estou mais para um piquenique.

Gilmar Fraga / Agencia RBS

Tudo começou com uma troca de mensagens em um grupo de amigas no WhatsApp. Uma delas estava hospedando alguém de fora e queria levá-lo a um restaurante, mas como quase não saía, pediu uma indicação: levo onde? “Churrasco, claro”. 

Em segundos, foram sugeridas três opções de parrilla. Até que alguém recomendou um restaurante novo, “dizem que é sublime”, mas logo outra apresentou um senão: “já fui, tem entradas fabulosas, mas o menu de pratos principais não é lá essas coisas”.

Foi quando entrei na conversa: “Eu poderia viver de entradas, por mim dispensaria os pratos principais”. Nem tinha terminado de digitar a frase e já havia percebido que era a metáfora da minha vida.

Dali em diante, de restaurante passamos para o papo de botequim. Era meio da tarde, uma delas estava dando expediente em seu consultório, outra estava de férias em João Pessoa e várias, como eu, estavam diante da tela do computador, garantindo o salário no fim do mês, mas o mundo parou e cada uma encurvou-se sobre o seu celular a fim de palpitar sobre o assunto. É por isso que o Brasil não vai pra frente.

Pois bem, as entradas. Em churrascos, avanço no pão com alho e até flerto com o churrasqueiro se ele acertar o ponto do salsichão. Frequento uma cantina italiana só pela sua mesa de antepasto – me sirvo de um pouco de tudo, e tudo é tanto que, quando chega a hora de pedir a massa, acabo pedindo a conta. 

Em festa de casamento e aniversários, só me interessam os canapés. Uma pulsão pré-histórica de comer com as mãos. Tem até um nome chique pra isso: finger food. Ou: como ser fina sem usar o garfo e a faca.

O fato é que tudo é “principal” na minha vida (filhos, trabalho, viagens, amigos, amores, solitude), só que a sociedade não perdoa essa horizontalidade e nos induz a pensar que, se tudo é principal, nada é. Lamento, sociedade. Tudo me importa, tudo me é essencial, e, ao mesmo tempo, a tudo relativizo, pois somos efêmeros, provisórios. 

Um dia irei morrer de alguma coisa, então gargalho, danço, amo, me comovo, abraço a vida e a provo desse jeito, aos bocadinhos, com o que os meus dedos conseguem pegar. Dispenso o prato de pedreiro, estou mais para um piquenique, um bufê de frios e acordar leve na manhã seguinte (ok, delete a imagem do salsichão). 

O assunto aqui, na verdade, é estado de espírito e transcendência, essas coisas abstratas e pretensamente filosóficas que introduzi em um texto que finge estar falando de comida e que talvez faça o leitor se perguntar: mas o que foi que ela bebeu? Nada, deixe pra lá. Estou apenas divagando sobre a importância de facilitar a digestão neste mundo que tem me caído tão mal no estômago. 


19 de Abril de 2025
CARPINEJAR

Trancando o problema no quarto

Há pessoas que têm paciência para ler bula de remédio e evitar efeitos colaterais, que têm calma para acompanhar manual de instruções e montar objetos e aparelhos, mas não são capazes de fazer terapia para saber como elas mesmas funcionam.

Eu não abro mão da terapia semanal. É por onde vou me conhecendo. Não porque resolvo os problemas nela, como é comum acreditar, mas porque aprendo a conviver com os problemas e não mais sou alienado das minhas emoções.

Talvez essa seja a minha maior descoberta. Nem tudo eu preciso consertar de imediato. Nem tudo eu preciso decidir na hora. Nem tudo eu preciso solucionar no momento. Nem tudo eu preciso perdoar ou culpabilizar, adotando um lado.

Let it be. Deixe estar. Existem apreensões e angústias de que não conto com o total discernimento para tomar uma atitude. A sucessão dos dias vai me ajudar a compreender. A maturidade vai me ajudar a ser sábio. Caminhadas vão me ajudar a determinar de onde vem o incômodo, o porquê de me sentir tão magoado com o fato.

Eu coloco aquele sofrimento num quarto e fecho a porta. Desfruto do restante da casa, habitando os demais aposentos. Quando estou preparado, volto e reinauguro o espaço para organizar a bagunça.

Agora não. Agora eu afasto a mente de perto da adversidade. Não me mostrarei obcecado e fixado nela, com olhos para mais nada.

Por enquanto, eu me despeço da ansiedade que me levaria ao descontrole. Não mais amargo a preocupação de ter que esclarecer o ocorrido para continuar com a rotina. Não fico empacado. Não estaciono no rancor.

Não me vejo apto a ser justo, tão influenciado pela temperatura alta dos meus sentimentos. Nosso impulso inicial é nos defendermos, e nos defendemos atacando. Então, suspendo o choque até digeri-lo.

Passei a me proteger de mim. Se você brigou com um amigo, ou com a esposa, ou com o marido, ou com um familiar, não corte as relações. Espere. Apesar de aborrecido, siga o contato para o desabrochar do desconforto. O decorrer das interações fornecerá novos elementos para definir se foi uma exceção ou uma regra.

Não se obrigue a preservar a frequência de conversa. Apenas dispense o desgaste do enfrentamento prematuro, oferecendo tempo para o outro se dar conta.

Vá de parto natural, não de cesárea do ódio. A moderação previne arrependimentos futuros.

Pode ser que tenha sido um mal-entendido, um ruído de comunicação, um trauma de sua parte, um medo revisitado, uma limitação do afeto. Ou ainda que tenha completa razão para, no fim, distanciar-se, desligar-se e mudar de rumo.

Mas não julgue no ato. Tranque o cômodo. Por não estar diante de um caso de vida ou morte, por combater o extremismo fulminante, por esse mínimo detalhe, você já está se curando. Você não delegou a ninguém o domínio da sua existência.

Puxe para si a lição de Sartre: "Não importa o que fizeram de mim, o que importa é o que eu faço com o que fizeram de mim". 

CARPINEJAR

19 de Abril de 2025
COM A PALAVRA -S ofia Lungui

Com a Palavra - Nicolas Villain

Neurologista, professor e pesquisador na Universidade de Paris-Sorbonne

"Vai mudar completamente o panorama do diagnóstico do Alzheimer"

O neurologista francês Nicolas Villain é referência global em estudos sobre a doença de Alzheimer. Em fevereiro, ele esteve em Porto Alegre para participar do Neuroscience Next, encontro promovido pela Alzheimers Association na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Em entrevista a ZH, aborda as novas propostas de diagnóstico e tratamento da doença, impactos e perspectivas para os próximos anos..

Quais novas perspectivas suas pesquisas vêm agregando para o diagnóstico do Alzheimer?

A doença de Alzheimer causa degeneração do cérebro, causando a perda da memória. Progressivamente, perdem-se células cerebrais. E também ocorre a acumulação de moléculas anormais no cérebro, que são proteínas, especificamente proteínas TAU e beta-amiloide. Por meio das pesquisas, desenvolvemos formas de identificar essas proteínas com biomarcadores. Portanto, temos várias opções de diagnóstico. Podemos usar o que chamamos de PET scan, que funciona como um scanner do cérebro. Outra opção é fazer punção na lombar, que permite analisar o líquido cefalorraquidiano, que pode conter níveis alterados de proteínas beta-amiloide e TAU. Assim, quando se combinam testes cognitivos, exame clínico e estes biomarcadores, é possível estabelecer um diagnóstico.

E em relação ao tratamento, o que deve impactar nesse sentido nos próximos anos?

Há boas notícias. Há décadas, usamos pequenas moléculas que podem melhorar uma parte dos sintomas da doença, que têm nomes diferentes, como rivastigmina, memantina, donezepil, galantamina. Elas funcionam um pouco, mas não alteram o histórico natural da doença. Agora, temos novos medicamentos que são muito mais complexos, que são anticorpos. Concebemos anticorpos que combatem estas moléculas que se acumulam no cérebro, especificamente a proteína beta-amiloide. É feita uma infusão uma ou duas vezes por mês, e depois temos estes anticorpos que limpam estas moléculas anormais do cérebro. A questão é: será que também funciona nos sintomas? O paciente nem sempre responde a isso. Sob a perspectiva clínica, nem sempre funciona. Portanto, é um começo, mas não é capaz de parar a doença. É um primeiro passo e é muito promissor.

No Brasil, esse tipo de tratamento ainda não é comum. Quais efeitos a popularização da terapia antiamiloide deve trazer?

A imunoterapia antiamiloide vai mudar completamente o panorama do diagnóstico da doença de Alzheimer, porque vamos ter de rastrear muito mais pessoas. Teremos de utilizar biomarcadores sanguíneos para facilitar o rastreio e teremos, finalmente, algo a propor aos pacientes com Alzheimer. Por exemplo, na França, temos um grande subdiagnóstico. Muitas pessoas não são diagnosticadas porque os clínicos gerais costumam dizer "o que muda se eu diagnosticar a doença de Alzheimer?". Agora que temos potencialmente alguns anticorpos que podem limpar estas proteínas do cérebro, temos um novo desafio. Temos de pensar "ok, se eu diagnosticar, posso ter um tratamento". Não é para todo mundo, mas já é alguma coisa. Por isso, muitas pessoas vão querer ter um diagnóstico agora. Haverá uma necessidade de diagnóstico. Portanto, vamos ter que nos adaptar a muito mais diagnósticos. Vamos precisar de mais médicos. Vamos precisar de mais formação e mais acesso a instalações para garantir que estes diagnósticos aconteçam.

Uma de suas descobertas foram os chamados mecanismos de desconexão na doença de Alzheimer. O que é isso?

Essa questão está mais ligada ao campo de pesquisa na neurociência sobre Alzheimer, e menos ao meu trabalho clínico. O Alzheimer é uma doença complexa. Precisamos acrescentar um pouco de matemática para misturar todos os dados e evitar ruídos. Foi nisso que trabalhei no início da minha carreira, na mistura de técnicas de diagnóstico. Mostramos, por exemplo, que o Alzheimer não atinge todo o cérebro ao mesmo tempo, e nem na mesma intensidade, mas sim partes do cérebro. Queríamos entender por que isso acontece. 

Constatamos que isso se deve a um mecanismo de desconexão, porque as células cerebrais têm conexões importantes. Quando as células morrem no hipocampo, perde-se o sinal que está no exterior, que está enviando uma ligação importante para o lobo parietal. É a isso que chamamos desconexão. Essa é uma das coisas que produzi no campo de neuroimagem multimodal, misturando e mostrando que há, de fato, uma relação entre os dois, e que isso se deve à desconexão.

Recentemente, foi aprovado nos Estados Unidos o donanemab (ou Kisunla), medicamento que retarda a progressão do Alzheimer. Quais outros estão em desenvolvimento e seus impactos?

Tem o Kisunla e o Leqembi, que contém a substância ativa lecanemab. São duas drogas gêmeas, digamos, têm quase o mesmo efeito, de limpar as proteínas anormais do cérebro. A diferença entre eles é que, para o Leqembi, é necessária uma infusão duas vezes por mês. Já o Kisunla é somente uma vez ao mês. Por isso, é um pouco mais conveniente, mas eles funcionam da mesma forma e têm os mesmos efeitos colaterais. Na Europa, os medicamentos já foram aprovados, mas ainda estão em andamento etapas burocráticas da aprovação na França, por exemplo. Ainda estamos em meio a esse processo.

Quais são as expectativas da comunidade científica em relação a essa possível cura?

Alzheimer é uma doença complexa, não podemos dar falsas esperanças às pessoas. Será uma longa luta. Vai durar décadas, mas, passo a passo, vamos encontrar a cura. Já começamos com a terapia antiamiloide. Não é perfeita, tem efeitos colaterais. Não é para todo mundo, mas é um primeiro passo. Depois, vamos melhorar esses tratamentos, e depois vamos combiná-los. Combinaremos tratamentos, antiamiloides com outros alvos, como TAU, inflamação, etc. 

Teremos múltiplos tratamentos e, pouco a pouco, veremos o prognóstico melhorar lentamente e, talvez, um dia possamos dizer que estabilizaremos completamente a doença. É isso que espero para o resto da minha carreira. Depois de mim, em futuras gerações, provavelmente, teremos a luta pela recuperação das funções cognitivas afetadas pelo Alzheimer. Essa será outra luta, porque regenerar o cérebro que está se degenerando é muito difícil. Mas, primeiro, vamos impedir que aconteça essa degeneração. _



19 de Abril de 2025
GPS DA ECONOMIA - Anderson Aires

Governo Trump com embate "estilo Lula"

Um dia após Donald Trump ameaçar demitir o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Jerome Powell, o diretor do Conselho Econômico Nacional, Kevin Hassett, reforçou na sexta-feira que o republicano e sua equipe continuam considerando essa possibilidade.

O ataque parece um dos tantos blefes da segunda gestão do presidente dos EUA, mas mostra mais um flerte com o fim da independência de instituições americanas, além de certa semelhança com o terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Logo após a posse, em 2023, Lula e seu primeiro escalão fizeram ataques coordenados ao então presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto.

No centro da ofensiva, estava o discurso de que a ausência de corte do juro básico prejudicava a economia do país e deveria ser revista.

Agora, Trump parece fazer o mesmo quando chama Powell de lento no processo de corte de juro, mas com um agravante institucional quando ameaça o mesmo de demissão - algo que não pode fazer de maneira monocrática. O chefe do Executivo dos EUA não tem o poder de demitir diretamente o presidente do Fed.

Para tentar esse pleito, teria de iniciar processo não tão simples e atestar que o chefe do Fed cometeu falha grave. O ataque de Trump a Powell acende novo alerta sobre os riscos institucionais e econômicos provocados pelo republicano em meio ao vaivém dos tarifaços.

Caso a interferência se confirme, é mais um ingrediente na salada de incertezas na economia global. Quebrar a autonomia do banco central americano pode abrir precedentes perigosos.

Próximos capítulos

No Brasil, Campos Neto rebateu algumas falas de Lula, argumentando que a atuação do BC era técnica. Agora, resta saber como será a postura de Powell diante dessa tentativa de fritura.

Antes das declarações de Trump e equipe, o chefe do Fed citou a tendência de aumento da inflação no país diante da política tarifária agressiva, o que obviamente não agradou o presidente americano. _

Vale observar como as bolsas e os Treasuries vão reagir ao embate entre o governo Trump e o Fed nos próximos dias, após o feriado: se esse ruído tem potencial para novas quedas nos mercados depois do caos do tarifaço.

Queda nas vendas de imóveis no primeiro trimestre

A venda de imóveis caiu 4,19% em Porto Alegre no primeiro trimestre deste ano ante o mesmo período de 2024.

Foram vendidos 7.383 unidades residenciais e comerciais nos três primeiros meses deste ano - 323 imóveis a menos do que o registrado em igual intervalo de 2024. Os dados são do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis (Secovi-RS).

O presidente da entidade, Moacyr Schukster, afirma que a retração ocorre em um contexto onde as taxas aumentaram na esteira da Selic e a disponibilidade de funding se reduziu.

Com isso, o impacto nas vendas é iminente.

Apesar de queda nas unidades, o valor arrecadado com vendas atingiu R$ 84,7 milhões - alta de 4,97%.

Segundo Schukster, esse movimento pode confirmar que os imóveis de valor mais alto sofrem menos com a falta de financiamento, porque a média por transação aumentou. _

Mais pressão de dívidas

A Pesquisa de Endividamento e Inadimplência das Famílias (Peic-RS), da Fecomércio-RS, mostra que o percentual de lares inadimplentes caiu de 30%, em fevereiro, para 28,3% em março.

No entanto, a parcela da renda comprometida com dívidas subiu para 28,5% - maior valor desde fevereiro de 2020.

O presidente da Fecomércio-RS, Luiz Carlos Bohn, afirma que essa situação preocupa porque cria condições para mais pressão no orçamento das famílias e mais inadimplência. _

Demissões voluntárias

Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados mostram que 46,3% das demissões em janeiro ocorreram por iniciativa dos próprios trabalhadores no Rio Grande do Sul.

O especialista Italo Rickes cita tendência crescente de profissionais que decidem deixar seus empregos em busca de melhores condições e novas perspectivas de carreira.

Ele integra o Gestão de Impacto, programa que reunirá cerca de cem empresários em Gramado, entre os dias 27 e 30 de abril. 

GPS DA ECONOMIA

19 de Abril de 2025
POLÍTICA E PODER - Paulo Egídio

Correntes definem nomes para disputa no PT

A menos de três meses da eleição interna, as tendências do Partido dos Trabalhadores (PT) estão definindo os nomes que disputarão a presidência da agremiação no Rio Grande do Sul. A votação entre os filiados está marcada para o dia 6 de julho e ao menos cinco nomes estão cotados para concorrer.

Além da organização interna do partido, a escolha terá reflexo direto nas eleições de 2026, tanto na definição das candidaturas quanto na busca por coligações. Hoje, os nomes postos para a disputa majoritária são os do deputado federal Paulo Pimenta e o do presidente da Conab, Edegar Pretto. Uma vitória de ambos na disputa interna consolidaria esse quadro, enquanto uma derrota pode embaralhar as cartas.

Atual comandante do partido, a corrente Socialismo em Construção, de Pimenta, apostará no deputado estadual Valdeci Oliveira para manter o controle do partido. Para isso, terá o apoio do grupo de Pretto, que deixou recentemente a Articulação de Esquerda (AE). A composição ainda conta com as tendências Construindo um Novo Brasil (CNB) e Avante.

A Articulação, que compôs com o grupo de Pimenta no pleito anterior, desta vez lançou o jornalista Júlio Quadros, que foi duas vezes presidente do PT na década de 1990. A corrente prega que o partido deve ter condições de "polarizar política e ideologicamente a sociedade gaúcha".

Com quatro deputados estaduais, a Democracia Socialista (DS), que já foi o maior grupo do PT gaúcho, aposta em Sofia Cavedon para disputar a presidência. A deputada sustenta que o partido deve ter mais aproximação com movimentos sociais e uma atuação mais à esquerda.

Na Resistência Socialista, desponta o nome da deputada estadual Stela Farias, enquanto o Movimento PT lançará Thiago Braga, que afirma a necessidade de aproximação programática com o centro.

Segundo turno

Caso nenhum candidato alcance 50% dos votos, os filiados voltarão às urnas dia 21 de julho para decidir um segundo turno. Nessa hipótese, há conversas em andamento para a união entre AE, DS e a Resistência para rivalizar com Valdeci.

Além da eleição estadual, os filiados votarão, no mesmo dia, para as direções municipais e para o comando nacional do PT, em que se desenha um embate entre o ex-ministro Edinho Silva e o deputado Rui Falcão. _

Leite pede liberação imediata de verbas

O governador Eduardo Leite enviou ofício ao ministro da Casa Civil, Rui Costa, pedindo a liberação imediata de R$ 3 bilhões para os projetos de proteção contra cheias na Região Metropolitana.

Desse valor, R$ 2,5 bilhões são para intervenções na bacia do Arroio Feijó, em Alvorada e Porto Alegre, e R$ 531 milhões, para a contenção de cheias em Eldorado do Sul. Os recursos fazem parte dos R$ 6,5 bilhões disponíveis no fundo criado pela União depois da enchente de 2024 para intervenções nos sistemas de proteção.

No ofício, Leite indica que a liberação da verba é uma "etapa imprescindível" para o lançamento das licitações para a execução das obras. _

aliás

O governo Leite vinha sendo cobrado para aplicar os recursos depositados no fundo criado pela União, mas esperava as diretrizes para a aplicação das verbas. Elas foram publicadas na terça-feira, em resolução do Ministério da Casa Civil.

Perillo mantém esperanças

Apesar dos sinais da saída iminente de Eduardo Leite rumo ao PSD, o presidente nacional do PSDB, Marconi Perillo, nutre esperança de manter o governador no partido.

Perillo e Leite conversaram por telefone na quarta-feira. De acordo com o dirigente tucano, Leite reafirmou que só baterá o martelo sobre seu destino após a fusão do PSDB com o Podemos, no fim de abril.

- Tanto eu quanto a Renata Abreu, presidente do Podemos, garantimos todo o espaço, todas as condições para que ele possa ser candidato a presidente - disse Perillo.

A filiação de Leite ao PSD tende a ocorrer na primeira semana de maio, antes da viagem do governador a Nova York. _

Sumindo do mapa

Com a saída de Raquel Lyra (PE) e a provável partida de Eduardo Leite, o PSDB ficará com apenas um governador: Eduardo Riedel (MS).

E corre risco de ficar sem nenhum. Riedel já foi procurado pelo PSD e seu grupo político também tem convite para migrar ao PL. _

De chapéu de palha na procissão no Morro da Cruz

A despeito do público menor do que o esperado, o prefeito Sebastião Melo compareceu na sexta-feira na 66ª edição da

encenação da Paixão de Cristo no Morro da Cruz, na zona leste de Porto Alegre.

De chapéu de palha e camisa laranja, Melo acompanhou a cerimônia que reuniu artistas profissionais e moradores da comunidade.

- Porto Alegre é uma cidade de fé, cultura e tradição. A encenação da Paixão de Cristo emociona porque é feita por quem vive o bairro, sente a comunidade e acredita na força dessa celebração - afirmou.

O evento tem como um dos protagonistas o vereador de oposição Aldacir Oliboni (PT), que há mais de 40 anos participa da celebração e interpreta Jesus Cristo (leia reportagem na página 11). _

Um ano da enchente

Para marcar um ano da enchente, o governo do Estado prepara programação para apresentar novos anúncios e o balanço da reconstrução.

O roteiro inclui atos em municípios atingidos pela catástrofe e um balanço das ações do Plano Rio Grande, no Palácio Piratini. Secretarias estaduais também apresentarão suas entregas, enquanto o governador Eduardo Leite será escalado para conceder entrevistas.

Ainda será lançado um documentário produzido pela Secretaria de Comunicação com depoimentos de pessoas que atuaram na linha de frente. _

Postura de vereador irrita governo Melo

A postura do vereador Gilvani Dall Oglio (Republicanos), conhecido como Gringo, causa irritação na prefeitura de Porto Alegre. Gringo aparece com frequência em "ações fiscalizatórias" em órgãos como postos de saúde e estações do Dmae. O tom de denuncismo e o desgaste gerado pelas postagens irritam secretários e vereadores aliados do prefeito Sebastião Melo.

A última altercação com os colegas ocorreu semana passada, quando um assessor tentou gravar o discurso de Gringo em uma reunião fechada.

No centro administrativo, há quem defenda abertamente a retirada do vereador da base aliada e a demissão dos sete detentores de cargos comissionados indicados por ele. _

Divergência construtiva

Em nota, o vereador Gilvani Dall Oglio diz que "fiscalizar incomoda" e que "democracia se faz com escuta e divergência construtiva":

"Quando o projeto for bom para Porto Alegre, votarei a favor. Quando houver risco à saúde ou ao meio ambiente, estarei firme na cobrança". _

O Tribunal Superior Eleitoral marcou para terça-feira o julgamento do processo do ex-vereador Pablo Melo (MDB), que tenta validar sua candidatura de 2024. Se conseguir, Pablo assume mandato na Câmara de Porto Alegre.

POLÍTICA E PODER

A erosão do "soft power" americano

As viagens internacionais para os Estados Unidos diminuíram desde que Donald Trump voltou ao cargo, diz uma reportagem do The Washington Post. Especialistas do setor de turismo afirmam que os motivos são óbvios: detenções e deportações, que causaram medo de experiências ruins na fronteira.

Fronteiras, aliás, são coisas que me causam medo. Já confidenciei isso a amigos: como jornalista, elas determinam o sucesso ou o fracasso de uma cobertura jornalística. Já senti isso entre El Salvador e Honduras, entre Líbano e Síria, entre Jordânia e Israel. Sinto, agora, receio em relação aos EUA.

Tenho um amigo cujo visto de turista foi negado sem maiores explicações: o rapaz de quase 30 anos tem Ensino Superior, emprego, bom salário e residência fixa em Porto Alegre. Nunca pensou em ficar ilegal nos EUA, ao contrário, sonhava visitar Nova York, voltar e contar o que viu, mas teve o documento rejeitado na entrevista, em Porto Alegre, sem explicações.

Isso depois de pagar quase R$ 1 mil. Outra amiga, que mora e estuda em Nova York há mais de 10 anos, pediu renovação do visto, mas não sabe se receberá autorização. Os critérios não são claros.

Liderar pelo exemplo

Uma pena. Durante décadas, os EUA exerceram um tipo de poder que não precisava de tanques nem de mísseis: o poder da atração. Bastava um filme, uma música, um símbolo. Nas relações internacionais, chamamos de soft power, um conceito formulado por Joseph Nye, que se refere à capacidade de um Estado influenciar o comportamento de outros por meio da atração e da persuasão, e não pela coerção.

Esse poder simbólico está enraizado na legitimidade dos valores políticos, na cultura e na política externa percebida como legítima e moralmente orientada. As universidades, a cultura pop, a promessa da liberdade, a democracia emoldurada pela Constituição.

Os EUA eram a imagem do país que acolhia, liderava e inspirava. Mas essa moldura, quase consensual no passado, vem se liquefazendo com Trump. As decisões do presidente, suas palavras e sua postura empurram os EUA para o isolamento. O "America First" não é apenas slogan, mas realidade, para o bem e o mal.

Nas fronteiras, a política migratória se tornou vitrine do fechamento. No campo econômico, o uso das tarifas como arma vira roteiro para a confrontação não apenas para com quem foi escolhido adversário geopolítico do século 21, a China, mas também para aliados históricos, em Tóquio, Bruxelas, Berlim e Paris.

O resultado é triste: os EUA, antes vistos como farol democrático desde os Pais Fundadores, agora despertam desconfiança mundo afora.

Perder o soft power é perder a capacidade de liderar sem mandar, e influenciar sem pressionar. É perder algo que não se reconstrói com tanques nem com PIB. _

Penitência e perdão

Ajuris e OEA fecham acordo - "Ex-terrorista" na lista da Time

A Escola da Associação de Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris) firmou acordo de cooperação com a Organização dos Estados Americanos (OEA) para promover atividades acadêmicas e de pesquisa nas áreas do Direito e do Direito Internacional. A parceria foi formalizada em Washington, com a presença do presidente da entidade gaúcha, Cristiano Vilhalba Flores, e do secretário-geral da OEA, Luis Almagro.

O objetivo é aprimorar e qualificar a formação de juízes e demais integrantes do sistema de Justiça do Brasil e dos países membros da OEA. As atividades serão coordenadas pela Escola da Ajuris. Também participaram do evento a diretora da entidade, Clarissa Costa de Lima, e o vice-diretor, Daniel Neves Pereira. 

Na mesma lista que inclui o cantor Ed Sheeran, a atriz Demi Moore, a ativista Gisèle Pelicot, o empresário Elon Musk e a tenista Serena Williams, chama atenção a presença de um "ex-terrorista", se é que se pode dizer assim, entre as cem pessoas mais influentes do mundo em 2025, segundo ranking da revista Time.

Divulgada na semana que passou, a relação traz o nome do presidente interino da Síria, Ahmed al-Sharaa, na categoria de "Líderes". Al-Sharaa comandou o grupo, classificado por vários países como terrorista, Hay?at Tahrir al-Sham (HTS), e assumiu o país após a queda do regime de Bashar al-Assad em 2024. 

Fiéis ligados à irmandade Jesus Yacente, em Zamora, na Espanha, saíram às ruas da cidade para rememorar a Sexta-feira Santa.

O gorro pontudo, usado pelos penitentes espanhóis, surgiu em um dos momentos mais sinistros da história, na Inquisição, levada a cabo pela Igreja Católica, quando os condenados por blasfêmia e heresia eram obrigados a usar o "capirote" para identificação e constrangimento. _

Justiça climática em foco

Para marcar o primeiro ano do dilúvio de 2024, em maio, a Ajuris também promoverá o evento Justiça Climática em Foco: Lições da Enchente do RS e Caminhos para o Futuro. O evento ocorre em 29 de maio, das 9h30min às 18h no auditório do Espaço Multiuso do TJ-RS. Além de especialistas em sustentabilidade, participarão líderes comunitários, como Fabiane de Figueiredo Xavier, do Quilombo Areal da Baronesa, Luís Rogério Machado, do Quilombo dos Machado, e Beatriz Gonçalves, das comunidades das Ilhas Ribeirinhas. Inscrições no site da entidade. _

Isenções no IPTU de Porto Alegre

O valor da renúncia fiscal com as isenções do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) de Porto Alegre aumentou 53,1% após a criação de uma ferramenta digital pela equipe da Divisão de Receita Imobiliária da Secretaria da Fazenda. A medida beneficia, principalmente, moradores de habitações populares e imóveis incluídos na Regularização Fundiária Urbana, que têm direito à isenção.

A mudança operacional começou com a criação em 2024 de um sistema que permite aplicar as isenções de forma automatizada e em larga escala. Antes, o processo era manual e individualizado. Com a automatização, o número de isenções para imóveis populares saltou de cerca de 12 mil em 2024 para mais de 16 mil em 2025. 

RODRIGO LOPES 


18 de Abril de 2025
CARPINEJAR

O que estamos fazendo de nossa Páscoa?

As cestas de Páscoa de antigamente tinham um charme artesanal e afetivo que se perdeu no tempo.

Eram montadas nos lares, secretamente, com enfeites e doces caseiros: ovos pintados à mão, coelhinhos de tecido, biscoitos amanteigados em formato de cenoura, docinhos de leite condensado enrolados com embrulho colorido, pães de mel com cravo e canela, amendoins caramelizados, balas de coco, trufas, pudim no potinho e bolinhos confeitados.

Sentíamos o calor da mão de quem cozinhava, a guloseima fresquinha, recém-saída da panela, o carinho das vésperas e dos sonhos.

Os pais renunciavam à publicidade pelo mistério, com um suspense bem forjado e oculto no mundo adulto. Ajeitavam a surpresa em cestos de vime, forrados com guardanapos bordados ou papel crepom e celofane. Guarneciam as bandejas de modo igualitário, peça por peça, item por item, para não gerar ciúme entre os irmãos.

A prole vigiava o raiar do sol, a manhãzinha do Domingo de Páscoa com expectativa. O coelho entregaria o mimo em algum lugar incógnito da casa. Ela deveria procurar, rastrear o esconderijo, abrir as portas dos armários e as gavetas, espiar debaixo das camas e das mesas, revirar as almofadas do sofá, mexer nos entulhos da garagem, nos baldes do tanque da lavanderia.

O bando expedicionário cantava em uníssono, de preferência com saltos e pinotes: "Coelhinho da Páscoa, que trazes pra mim? Um ovo, dois ovos, três ovos assim...". Pegadas indicavam os caminhos para o arrebatamento, para o susto, para o sorriso trocando os dentes de leite.

Naquela época, há quatro décadas, dávamos mais atenção ao gesto do que ao conteúdo. Não existiam a atual disputa de marcas, a demanda por brindes e presentes, a obsessão por personagens conhecidas do universo infantil.

As cestas personalizadas e neutras desabilitavam a concorrência e a inveja. Prezávamos o sentido religioso da ressurreição de Cristo - hoje as crianças nem mais sabem se o momento se refere ao nascimento ou à morte de Jesus. Reverenciávamos a fertilidade e o início de uma nova vida, representados pelos ovos e pela figura do coelho.

A cobiça vem apagando as pequenas delícias da família. Uma caixa de bombons não emociona mais. Já estamos completamente indiferentes à data, exigindo o tamanho cada vez maior do produto.

Os pais gastam o que não têm, sofrem com as chantagens e birras, compensam a culpa e a sua ausência com o consumismo. O que estamos legando para nossas crianças?

A idolatria do brinquedo junto ao chocolate derrubou a compaixão. A embalagem subjugou o interior dos hábitos. Sobrou apenas a casca de um feriado, sem nenhuma profundidade metafísica.

Jogamos fora o movimento lúdico do faz de conta, as brincadeiras coletivas, o pacto com os antepassados, os rituais de geração a geração, as ideias criativas, a caça ao tesouro, o uso da imaginação.

O açúcar, antes, funcionava como um pretexto para entender e praticar outras doçuras. _

CARPINEJAR

18 de Abril de 2025
MARCO MATOS

Guerra contra a dengue

Gosto de escrever aqui sobre assuntos leves, crônicas, algo que meu olhar capta em algum instante da rotina. Hoje não vai dar.

Existe uma doença, bem séria, que muita gente negligencia, talvez por nunca ter passado por ela. Nunca se esqueça: a dengue mata. Eu tenho absoluta certeza de que se você já teve ou convive com alguém que também já passou por isso, você sabe do que eu estou falando.

Eu tive dengue em 2015, quando morava em Maringá, no norte do Paraná. Foi a sensação mais estranha e ruim que tive em toda a minha vida. Em sete dias, quase derreti de febre que insistia em ir e vir, cada vez pior. Minhas pernas não aguentavam o peso do meu corpo. Meus olhos ardiam. E foram muitos outros sintomas. Pensei até que não iria resistir. Tive muito medo.

A questão central aqui é que eu, que já enfrentei epidemias de dengue muito mais graves quando morei no Paraná, não vejo a mesma preocupação com a doença aqui no Rio Grande do Sul. Talvez porque o número de mortes aqui não seja tão alto quanto era lá, todos os anos.

Quando o verão se aproximava toda a região se mobilizava. Não tinha dia que não via pelas ruas alguma equipe dessas que combatem o mosquito seja com informação ou com fumacê (uma espécie de veneno que é lançado ao ar para matar os mosquitos). Aqui nem percebo as pessoas preocupadas em usar repelente!

Nessa quinta-feira noticiamos no Jornal do Almoço e em GZH que Porto Alegre iria decretar emergência em saúde por causa da dengue. Um hospital de campanha foi montado ao lado da UPA da Zona Norte.

Combater a dengue não é algo de agora. Faz anos, décadas que sabemos o que precisa ser feito. É simples: não dá para ter nada que possa acumular água, já que assim você cria o ambiente ideal para que o mosquito se prolifere. Para quem ainda não sabe, um mosquito da dengue precisa picar alguém com a doença e só então passa a transmitir dengue para outras pessoas.

Minha coluna de hoje é um pedido de atenção, um chamado de alerta. Teremos quatro dias mais tranquilos, dois feriados e um fim de semana. Tempo de sobra para olhar bem em volta de casa, fazer o que é preciso.

Parece até loucura ter que, em 2025, pedir para que as pessoas virem potinhos, coloquem areia em pneus, lavem bebedouros de animais, verifiquem os vasos de plantas. _

O conteúdo desta coluna reflete a opinião do autor

MARCO MATOS


18 de Abril de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

Quem são os credores dos EUA

A situação de caos criada por Donald Trump cria a expectativa de um freio à turbulência global. A concentração de riqueza nos Estados Unidos faz com que seu presidente tenha a sensação de ser dono do mundo, mas até o dono do mundo tem... credores.

Esse é o papel dos países que detêm títulos do Tesouro americano, os chamados Treasuries. Os diferentes tipos de papéis emitidos pelo governo compõem cerca de 90% da dívida pública americana, de US$ 36,7 trilhões, o equivalente a 122,7% do PIB.

Os países compram esses títulos para compor suas reservas internacionais, necessárias em um mundo em que o dólar determina negócios globais e os Treasuries são o porto seguro dos portos seguros. Durante a crise, até essa noção que parecia imutável foi chacoalhada.

Foi atribuída a um sinal de travamento na negociação desses títulos a gota d?água que fez Trump recuar, para além da pressão de Wall Street e dos amigos bilionários.

Chegou a haver especulação se o segundo maior detentor desses papéis, a China, teria provocado essa trava. Mas a discrição do gigante asiático e o orgulho da potência americana impediram, até agora, que isso fosse demonstrado.

O que ficou claro é que os credores dos EUA têm, afinal, algum poder, especialmente diante de quem só vê valor em cifrões. E, como todos estão desafiados pelo vaivém tributário, essa pode ser uma forma de chamar Trump à racionalidade.

Estoque de Treasuries maior do que o da China, só o Japão tem, com 42% a mais de títulos americanos do que o vizinho da Ásia. Os japoneses ganharam prioridade nas negociações comerciais.

O terceiro é um aliado histórico, o Reino Unido, que enfrenta tarifa de 10%. Não teme alíquota punitiva no final dos 90 dias de "pausa". O Brasil aparece em 15º lugar, com US$ 199,1 bilhões em Treasuries no final do primeiro trimestre - mais da metade das reservas internacionais, de US$ 336,2 bilhões no mesmo período. _

Governo Lula agora admite "estrangulamento" em 2027

Em meados de 2024, a Instituição Fiscal Independente (IFI) advertiu para o risco de "gravíssimo estrangulamento orçamentário" em 2027. Antes de prosseguir, é bom lembrar que a IFI é, como diz o nome, independente, ou seja, uma espécie de "xerife" das contas públicas cujo papel é avaliar dados sem opinar ou fazer juízo de valor. Acompanha, fiscaliza e emite alertas.

Nesta semana, durante a a apresentação de um já inquietante orçamento para 2026, o próprio governo Lula admitiu que o ano seguinte será "desafiador".

- Para 2027, R$ 122 bilhões (em despesas discricionárias) já é bastante comprometedor, por isso já citei como um número que comprometeria a execução de políticas públicas - disse o secretário de Orçamento Federal, Clayton Monte.

O problema é que, em despesas discricionárias - em tese, não obrigatórias -, é preciso prever desembolsos compulsórios, como R$ 56,5 bilhões em emendas parlamentares. Sobrariam R$ 65,7 bilhões, valor insuficiente para cumprir os pisos de gastos com saúde e educação.

Para entender, só depois de garantir as emendas e aplicações mínimas nos dois setores é possível destinar recursos a investimentos, por exemplo. Se a "sobra" não for suficiente nem para cumprir a regra, afeta o funcionamento do setor público da União. De que forma? Em tese, precisaria passar por um mecanismo semelhante ao "shutdown" nos Estados Unidos, em que serviços federais deixam de ser prestados.

Para evitar que isso ocorra, seria necessária um reforço orçamentário ou mudança no arcabouço fiscal aprovado no atual governo. Para lembrar, o regime fiscal anterior, de teto de gastos, desvinculava os pisos da saúde e da educação das receitas. Nenhuma das duas medidas teria aprovação fácil agora, mais ainda em 2026, ano eleitoral.

E Pestana faz novo alerta para o próximo ano:

- O quadro para 2026 é mais difícil, impondo um desafio maior em relação ao incremento das receitas, em um contexto de PIB e inflação em retração. E, ainda, sem incorporar os eventuais efeitos da atual guerra comercial no cenário global. _

Na Argentina, sem "mala" de dinheiro

A semana da Páscoa começou com mudança cambial na Argentina, país que brasileiros gostam de visitar em feriadões. A troca do "cepo" - restrições a operações com dólares - por um sistema de bandas flutuantes semelhante ao do Brasil de março de 1995 até janeiro de 1999 teve disparada do dólar, seguida de acomodação.

Na prática, há aproximação entre o dólar oficial e o "blue", o principal paralelo no país. Ontem, o oficial fechou cotado a 1.160 e o "blue", a 1.255 pesos argentinos. Então, turistas que andavam com dinheiro para evitar usar cartão podem dispensar a "mala".

O que não mudou, ao menos por enquanto, é a diferença de preços entre Brasil e Argentina. Como indicaram as levas de hermanos no litoral gaúcho, divididas entre as areias e as lojas, o lado de cá da fronteira segue mais barato do que o de lá.

A retirada de subsídios governamentais pelo governo Milei fez a inflação acumular alta de 55,9% em 12 meses. No Brasil, também é alta, mas está em 5,48% no acumulado em 12 meses. _

Casas a desabrigados quase prontas, falta adequar terreno

A poucos dias de o dilúvio de maio completar um ano, a coluna acompanha com ansiedade a construção das primeiras 50 casas definitivas que serão doadas a atingidos pela inundação em Muçum. No final do ano passado, a expectativa de entrega era até março, mas o mês terminou sem que as famílias pudessem ter um lar definitivo.

O Movimento União BR, que dedicou recursos milionários de doações a essa entrega, afirma que "o terreno escolhido apresenta desafios técnicos e exige intervenções adicionais de contenção e infraestrutura, especialmente após as chuvas que atingiram a região nos últimos meses".

O União BR destaca, ainda, que o trabalho é feito "em parceria com a prefeitura e o governo do Estado para viabilizar, o mais rápido possível, a entrega das casas no Jardim Cidade Alta 2".

A prefeitura de Muçum afirma que, "por se tratar de um terreno com desafios técnicos, foram feitos ajustes no projeto e na execução da obra, em parceria com o Movimento União BR e o governo do Estado".

Conforme a Secretaria de Habitação e Regularização Fundiária do Estado (Sehab), "o recebimento dos documentos técnicos finais, elaborados pela prefeitura de Muçum, deu-se em 31 de março de 2025". Só a partir de então, relata a secretaria, "providenciou os trâmites para aprovação do recurso do Funrigs", que deve decidir na próxima reunião do Comitê Gestor, no dia 29. _

GPS DA ECONOMIA

18 de Abril de 2025
POLÍTICA E PODER - Rosane de Oliveira

Lula erra em asilo à ex-primeira-dama do Peru

Como o presidente Lula vai explicar aos brasileiros a concessão de asilo diplomático à ex-primeira-dama peruana Nadine Heredia, condenada a 15 anos de prisão por lavagem de dinheiro? Mais: como explicar que Nadine e seu filho menor de idade tenham sido trazidos para o Brasil em um avião da FAB?

Certos atos de governantes não têm defesa, mesmo quando embalados no papel de seda da humanidade. A justificativa extraoficial de que Nadine já tinha pedido para residir no Brasil para fazer tratamento contra o câncer não cola. Nem brasileiros que estão vivendo no Exterior e precisam se tratar de uma doença grave têm o privilégio de voltar em aviões da FAB.

O máximo que o governo faz - e nisso acerta - é retirar brasileiro de zonas de conflito ou de desastres. Não se tem notícia de alguém trazido dos Estados Unidos, por exemplo, onde a medicina é caríssima, voltar em avião da FAB para se tratar de um câncer pelo SUS.

Argumento é o mesmo de Bolsonaro

Nadine e o marido, o ex-presidente Ollanta Humala, foram condenados sob acusação de receber dinheiro de origem ilícita da Venezuela e da Odebrecht para financiar as campanhas de 2006 e 2011. Humala e Nadine são acusados de receber US$ 3 milhões em contribuições ilegais da construtora que foi uma das protagonistas da Lava-Jato no Brasil.

Lula pode dizer que o casal peruano foi vítima de um julgamento injusto ou viciado. Se isso lhe soa familiar é porque esse argumento é o mesmo do ex-presidente Jair Bolsonaro, que ainda não foi julgado mas tenta desqualificar a acusação da Procuradoria-Geral da República com a tese de que é inocente.

Quando Bolsonaro passou dois dias refugiado na embaixada da Hungria em Brasília, o PT fez um escarcéu, alegando que ele pretendia fugir do Brasil com medo de ser preso.

E se Bolsonaro for condenado e se homiziar na embaixada dos Estados Unidos, da Argentina ou de qualquer país "amigo", dizendo-se perseguido político, como reagirá o governo brasileiro? _

Em queda de popularidade, Lula dá aos adversários um pacote pronto para ser criticado, não fundamenta a decisão e deixa o caminho livre para os acusados pela trama golpista saírem do país pela porta da frente de uma embaixada.

Propostas para a saúde não reduziram angústia dos prefeitos

Nem todos os prefeitos da Região Metropolitana saíram felizes da reunião com o governador Eduardo Leite sobre a saúde, quando ele anunciou recursos para o Assistir e propôs assumir a gestão da alta complexidade de Porto Alegre.

O presidente do Consórcio da Granpal e prefeito de Guaíba, Marcelo Maranata, cobrou mais medidas.

A chegada do inverno tende a aumentar muito a preocupação dos nossos prefeitos. A gente não vê o financiamento do Estado nem da União - lamentou.

O prefeito de Sapucaia do Sul, Volmir Rodrigues (PP), ameaçou reduzir o número de leitos já na próxima semana se não conseguir um acordo para resolver a sobrecarga. _

Prefeito de Viamão é condenado por expor intimidade de ex-companheira

O prefeito de Viamão, Rafael Bortoletti (PSDB), foi condenado a nove anos de prisão por divulgar uma gravação íntima da ex-companheira sem consentimento dela e tentar coagir testemunhas.

Segundo a decisão do juiz Igor Hamade, Bortoletti expôs áudios, da época em que os dois tiveram um relacionamento, em uma caixa de som durante reunião de políticos em um sítio.

Ele foi condenado a nove anos, um mês e 22 dias de reclusão em regime fechado e multa, mas poderá recorrer da decisão em liberdade.

Em nota, a defesa do prefeito informou que vai recorrer e que acredita que a Justiça irá reformar a decisão. _

Podemos e PSDB vão anunciar união

O casamento do PSDB com o Podemos está na fase do acerto de detalhes e será anunciado até o dia 30, mas os tucanos não migrarão em massa para o novo partido. Como os dois gostariam de manter os nomes de solteiros, a solução salomônica será uma terceira denominação. O mais provável é que venha se chamar Juntos, manter o número 20 (do Podemos) e adotar o tucano como símbolo.

De acordo com o presidente do Podemos no RS, Éverton Braz, a presidente nacional do partido, Renata Abreu, está tentando convencer os tucanos a aceitarem uma incorporação e não fusão. Pode parecer irrelevante, mas de acordo com Braz o problema é o estatuto do PSDB, considerado defasado em comparação com o do Podemos. Em caso de fusão, seria preciso escrever um novo estatuto.

Na interpretação de Renata Abreu, a fusão abriria caminho para que deputados dos dois partidos pudessem migrar para outra sigla sem risco de perder o mandato. Se a opção for pela incorporação, apenas os tucanos poderão alegar incompatibilidade para sair. _

Quem irá com Leite para o PSD

Principal líder do PSDB no Estado, o governador Eduardo Leite está acertado com o PSD. Com Leite devem migrar a ex-prefeita de Pelotas Paula Mascarenhas, o chefe da Casa Civil, Artur Lemos, o ex-prefeito de Santa Maria Jorge Pozzobom e o deputado estadual Professor Bonatto. A deputada estadual Nadine Anflor e os federais Lucas Redecker e Daniel Trzeciak tendem a optar pelo Republicanos. No novo partido deve permanecer o presidente do PSDB de Porto Alegre, Moisés Barboza. _

O ministro Augusto Nardes, do TCU, contesta a interpretação da coluna de que suas viagens ao Interior fazem parte de um projeto eleitoral. Ele alega que está visitando várias cidades como relator do processo do Programa Recupera Rio Grande, que cuida da área dos recursos repassados à Defesa Civil.

POLÍTICA E PODER

18 de Abril de 2025-
Rodrigo Lopes

Amigos... amigos...

Aos amigos, os favores. Aos inimigos, a lei. É o que diz o velho ditado, que o presidente Lula faz questão de tornar atual com a concessão de asilo político a Nadine Heredia, ex-primeira-dama do Peru, esposa de Ollanta Humala. Pior do que isso, só o fato de um jatinho da Força Aérea Brasileira (FAB) estar esperando Nadine no aeroporto de Lima tão logo fosse concluída a sessão judicial que culminou na condenação à prisão dela e de seu marido, o ex-presidente.

Concessões de asilo são atos políticos - e o direito, em geral, é revertido quando muda o governo de turno, ou a ideologia de quem está no poder. Há exceções, claro. Principalmente no Brasil, o país das exceções. Alfredo Stroessner, o ditador paraguaio, que governou seu país entre 1954 e 1989, viveu por 17 anos no Brasil, desde que José Sarney o protegeu após ser apeado do poder. O autocrata vizinho morreu em bom lar, em Brasília, em 2006. Ou seja, além de Sarney, Fernando Collor de Melo, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso e Lula garantiram que não fosse julgado em seu país pelas atrocidades aos direitos humanos que cometeu.

No caso de Nadine, o que desonra a nação é o fato do uso de um avião da FAB, pago pelo contribuinte, estar disponível para a ex-primeira-dama de forma tão rápida. Foi perspicaz o governo e o presidente, o comandante-em-chefe do país. É de surpreender a agilidade, sobretudo porque costumo ser um dos críticos diante da eventual lentidão das Forças Armadas para deslocamentos internos em tragédias como a que o RS viveu, em maio. _

Asilados e protegidos políticos

O asilo político à ex-primeira-dama do Peru Nadine Heredia, condenada pela Justiça de seu país por lavagem de dinheiro em casos ligados à empreiteira brasileira Odebrecht, não é um caso inédito no Brasil. O governo brasileiro já oferece proteção a figuras controversas da política internacional. Confira, ao lado, casos emblemáticos. _

Roger Pinto Molina

Opositor ferrenho de Evo Morales, denunciou corrupção e foi acusado de "sedição" pelo governo boliviano. Em 2012, pediu asilo na Embaixada do Brasil em La Paz, onde ficou 15 meses até ser retirado em um carro diplomático brasileiro. Morreu em um acidente aéreo em Goiás, em 2017.

Cesare Battisti

Ex-militante de extrema-esquerda italiana, ficou conhecido pelo envolvimento com grupos armados na Itália nos anos 1970. Em 1981, conseguiu asilo político na França, revogado anos depois. Passou pelo México e chegou ao Brasil em 2004. Em 2009, Lula concedeu asilo político, ignorando um pedido de extradição da Itália - que o acusava de terrorismo. Em 2019, Jair Bolsonaro autorizou sua extradição, sendo deportado para a Itália.

Abdalá Bucaram

Foi presidente do Equador deposto em 1997 por "incapacidade mental" declarada pelo Congresso de seu país. Vindo ao Brasil com parte de sua família, viveu asilado por vários anos.

Demais casos

Outros dois casos que chamam atenção: Ronald Biggs e Manuel Zelaya. Os dois não receberam asilo político formal, mas foram protegidos pelo governo brasileiro.

Biggs viveu no país por cerca de 30 anos. Participou do famoso assalto ao trem pagador, em Glasgow, em 1963. Foi preso, fugiu do Reino Unido e chegou ao Rio em 1970, onde viveu até 2001, quando voltou a seu país e foi detido. Faleceu em 2013.

Já Manuel Zelaya foi presidente de Honduras entre 2006 e 2009, foi deposto por um golpe militar. Zelaya retornou clandestinamente ao país em setembro do mesmo ano e refugiou-se na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa. Após meses de impasse, em 2010 foi viver na República Dominicana, retornando em 2011.

Um olhar sóbrio sobre a crise institucional no Brasil

No meio do furacão, nada como o olhar distanciado. A revista britânica The Economist conseguiu isso no artigo que ganhou repercussão ontem sobre os poderes excessivos do Supremo Tribunal Federal (STF).

E o primeiro sintoma da lucidez do texto é a capacidade de análise desapaixonada - que consegue, por certo, provocar a ira de quem se ilude em eleger, de um lado ou de outro, mocinhos e bandidos no atual cenário político brasileiro.

Decisões monocráticas

O texto provoca tanto bolsonaristas quanto alexandristas - e lulistas. A tônica do texto é focada no excesso de decisões monocráticas na Corte. Mas sobra, literalmente ou no subtexto, para todos - intra e extramuros do Supremo.

O diagnóstico é: a mais alta Corte enfrenta crescentes questionamentos na medida em que tenta administrar temas políticos. Para restaurar a imagem de imparcialidade, o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, acusado de golpe de Estado, deveria ocorrer no plenário do STF - e não pela Primeira Turma, composta pelo ex-advogado de Lula Cristiano Zanin e um ex-ministro Flávio Dino, além de Alexandre de Moraes.

Orientação liberal

A revista faz fortes críticas a Moraes, que está exercendo, segundo a Economist, "poderes surpreendentemente amplos, que têm como alvo predominantemente atores de direita".

É preciso ler o artigo com a consciência de que a Economist tem orientação liberal - e, até por isso, não personifica a culpa de um Brasil que parece andar para trás. A culpa não é só de um ou outro lado. Tampouco de um único poder da República, o que não isenta aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro de terem tentado golpe de Estado. _

STF na berlinda

Outro ponto do artigo da Economist é impactante: todos presidentes brasileiros desde 2003 foram acusados de violar a lei. Daí a importância do olhar externo.

No texto, sobram críticas a integrantes do STF. Além de Moraes, chamado de "juiz estrela", o decano da Corte, Gilmar Mendes, é alvo pelo Fórum Jurídico de Lisboa. Dias Toffoli é mencionado pelos despachos individuais. Luís Roberto Barroso, atual presidente da Corte, criticado pela declaração "derrotamos o bolsonarismo".

Esses fatores, diz a revista, comprometem a credibilidade do STF. E não ocorrem por acaso. Executivo e Legislativo caíram em descrédito, levando o Supremo a ampliar seu escopo em resposta a uma crise institucional. Quem se permitir aceitar críticas de fora e ler o texto compreenderá que a "anistia" resolverá o problema. A crise institucional em que nos encontramos é mais profunda. _

Casos de antissemitismo crescem 350%

Um relatório lançado nesta semana revela aumento de 350% nos casos de antissemitismo no Brasil, em 2024.

O documento foi lançado pela Confederação Israelita do Brasil (Conib), a Federação Israelita do Estado de São Paulo e o Departamento de Segurança Comunitária (DSC/FISESP).

Conforme o presidente da Conib, Claudio Lottenberg, o Brasil apresentou o maior aumento dos casos globais (961%) desde o início da guerra no Oriente Médio, deflagrada pelos atentados do grupo terrorista Hamas, em 7 de outubro de 2023.

No primeiro mês de conflito Israel-Hamas, houve aumento de 1.000% das denúncias, média de 12 denúncias diárias. O documento aponta um total de 1.788 casos, atingindo recorde histórico no Brasil, com aumento de 350% dos casos em 2024.

O ambiente digital é o principal vetor: 73% das denúncias ocorreram no ambiente online, com o X (ex-Twitter) liderando (48%) e o Instagram em segundo (37%). _

INFORME ESPECIAL

sábado, 12 de abril de 2025

11/04/2025 - 15h15min
Martha Medeiros

Cada pessoa tem seu próprio prazo de validade, e é um privilégio quando se consegue chegar tão longe sem depender dos outros

Nossas mães, que tão bem nos cuidaram na infância e adolescência, agora precisam segurar na nossa mão para atravessar essa rua assustadora chamada velhice

De fato, que oportunidade fabulosa de ficarmos mais próximos delas e retribuir o tanto que fizeram por nós.

Gilmar Fraga / Agencia RBS

Ao me visitar, uma amiga trouxe um vinho e o livro A Minha Mãe é a Minha Filha, de Valter Hugo Mãe. Uma edição minúscula, menos de 50 páginas, que trata sobre a relação do autor com sua progenitora. Minúscula no tamanho, claro, pois o assunto é da maior grandeza.

Minha amiga e eu estamos passando pela mesma situação: nossas mães, que tão bem nos cuidaram na infância e adolescência, agora precisam segurar na nossa mão para atravessar essa rua assustadora chamada velhice.

Valter Hugo Mãe é só doçura em seu texto e faz tudo parecer um piquenique no parque com a matriarca. De fato, que oportunidade fabulosa de ficarmos mais próximos delas e retribuir o tanto que fizeram por nós. Em tese, perfeito: os papéis se invertem, o ciclo se fecha e o amor vence no final. Na prática, porém, é um tsunami, que o digam as mulheres na faixa dos 50 e 60 que tinham outros planos. 

Geralmente, estão com os próprios filhos criados e com alguma estabilidade profissional. Seria o momento de se concederem uma aposentadoria por serviços prestados à família: hora de pensar em si mesmas, fazer um curso, visitar amigos que moram fora, dar uma circulada por aí antes de serem abatidas em pleno voo, afinal, também estão iniciando o processo de envelhecimento, só que ainda com pernas firmes e bom estoque de energia.

Quando essa liberdade precisa ser adiada, é um baque. Ninguém deseja, aos 60, já ter perdido os pais. Quem tem a sorte de ainda tê-los, sabe que eles, depois dos 80, correm riscos atrás de um volante, mal conseguem caminhar sozinhos e a ida ao mercado vira um passeio na selva. Não todos: muitos mantêm-se autônomos, mesmo em idade avançada. Cada pessoa tem seu próprio prazo de validade, e é um privilégio quando se consegue chegar tão longe sem depender dos outros. Mas não é a norma.

Tema bonito para uma prosa poética, mas mexe com emoções variadas. A culpa é a primeira a atacar. Queremos fazer mais por eles, mas temos nossa própria vida para cuidar. É justo privilegiar as demandas deles? O histórico da relação deve ser levado em conta? Se tivermos mágoas retroativas, devemos sublimá-las? Terceirizar os cuidados é bom? É ruim? Pra quem?

Dezenas de perguntas nos invadem. Terapeutas, acudam. Amor existe de sobra, mas com pitadas de impaciência, tempero que não é bem-vindo nesta receita. Por enquanto, um elemento tem facilitado a jornada dos Medeiros: o bom humor. Minha família nunca foi de fazer drama. Vamos rindo enquanto dá para rir, e assim todos se ajudam. Talvez esteja aí a beleza do caos: reconhecer que todos os envolvidos precisam de ajuda, e vivenciar a troca de papéis com a leveza necessária, sem ficar apostando em quem vai pirar primeiro. 


12 de Abril de 2025
CARPINEJAR

Alanpa!

Tenho quatro cadeiras no Beira-Rio há 15 anos. Confesso que já escondi as mensalidades da esposa. Solicitei ao clube que não mandasse mais os boletos pelo correio.

Como você paga tudo isso para um time? - ela me perguntou. Naquela época, eu me constrangi como uma ovelha cardada. Hoje, não mais. Hoje uivo com orgulho. Preciso proteger as minhas alegrias.

Por influência benéfica da terapia, assumi e aprendi a declarar: gasto e não nego. Sou fanático.

Frequentar o estádio é um dos meus maiores prazeres. O meu recreio. Onde descarrego as preocupações. Onde volto a ser um guri. Trata-se do principal evento da semana. Fico com aquele gostinho de Pastelina e guaraná na boca, após trabalhar como mula nos dias úteis. Um gostinho de esperança de infância. De explosão. De catarse.

Já conto com os meus vizinhos de bandeira e boné: o livreiro que fala sozinho e some no intervalo do segundo tempo; o adolescente que não para de berrar "chuta!"; o senhor que não cansa de exigir "senta". Compomos uma família colorada a cada batalha. São as pessoas de sempre compartilhando 90 minutos comigo, ao lado dos filhos e do melhor amigo Zé.

Investiria o dobro (não me escute, Alessandro Barcellos) para assistir ao espetáculo de Alan Patrick. Um 10 legítimo, em extinção. Camufla a bola nos pés - ela só aparece mais adiante, sob a forma de um lançamento primoroso ou de um chute imprevisível estufando as redes.

Um mago. Atua de fatiota e gravata-borboleta, um gentleman com a maciez da grama. Desliza, flutua. Eu canto Fly Me To The Moon, de Frank Sinatra, enquanto o vejo. Me leve para a lua. Me leve para o tri da Libertadores.

É tão bom que os adversários o respeitam e o temem. Ele transforma cobrança de pênalti em suspiro. A arquibancada respira com ele. Põe 40 mil torcedores a praticar pranayama, exercício da yoga. Redescobrimos o nosso diafragma. Redescobrimos o nosso coração. Todos puxamos o ar ao mesmo tempo, subindo o abdômen. Todos soltamos o ar ao mesmo tempo, descendo o abdômen num grito ensandecido de gol.

Na história, só Paulo César Carpegiani pode ombrear com ele em técnica e tática naquela posição. Os saudosos e sobreviventes concordarão comigo.

Seu repertório é inesgotável. Mobilia uma casa - janela, lençol, chaleira - em alguns minutos. Ele vem aumentando a minha concentração: não me distraio como antes, não pisco, não vou ao banheiro, não consumo nada dos ambulantes - à espera de um milagre ou de um lance surpreendente. Vem me devolvendo a comoção do instante ao vivo, inédito.

Não o quero na Seleção Brasileira, por ciúme, por gula, por inveja, por avareza. Não gostaria de desperdiçá-lo em nenhum jogo. Não gostaria de cedê-lo para mais ninguém. Ele desperta os piores sentimentos de possessividade. Inclusive porque a Seleção não o merece. Peço desculpas pela minha limitação. Deveria ser festejado mundialmente. Mas admito: meu mais terrível medo é perdê-lo.

Sofro por antecedência, projetando como o manteremos na próxima temporada. Ele não para de brilhar, de chamar atenção, de ser citado por comentaristas que estavam acostumados a exaltar exclusivamente o Sudeste. Chegou a fazer hat-trick em cima do Atlético Nacional da Colômbia. Precisava de três? Precisava esbanjar?

Em 13 de maio, Alanpa estará de aniversário. Completará 34 anos. Já estou pensando em comprar um presente. Até lá, muita terapia para explicar à minha esposa novos desembolsos com o futebol. Imagino o diálogo:

- Você nem o conhece! - Ah, conheço, sim. Ele vive me presenteando. Se sou um marido mais feliz hoje, agradeça a ele. O justo seria dividir as despesas. 

CARPINEJAR