
01
de abril de 2012 | N° 17026
MARTHA
MEDEIROS
O macacão
branco
Quem de nós pode vestir um modelo decotado na frente
e nas costas, colado ao corpo, sem antes passar por uma lipoescultura?
Sejamos honestas, colegas de trabalho: quem
de nós pode vestir um macacão branco decotado na frente e nas costas, colado ao
corpo, sem antes passar por uma lipoescultura, uma sessão de bronzeamento e
ficar duas semanas sem comer? Resposta no final dessa coluna.
Não teria adjetivos suficientes para
comentar o show que Maria Rita fez no Anfiteatro Pôr do sol , semana passada,
cantando músicas da sua mãe, Elis Regina. O espetáculo foi perfeito do início
ao fim, e São Pedro ainda deu uma canja, oferecendo um entardecer de cinema,
com direito a uma lasca de lua, céu estrelado e brisa suave. Se Elis não fosse
gaúcha, teria se naturalizado naquele instante, em algum cartório no céu.
Mas voltemos a Maria Rita. Toda de branco,
ela entrou no palco com uma túnica diáfana que ia até os pés: praticamente um
anjo de bons modos. Até que, quatro ou cinco músicas depois do início do show,
ela retirou a túnica e ficou só de macacão branco decotado, com as costas de
fora, colado no corpo. Pensei: é peituda essa mulher.
Peituda porque, além de peito, Maria Rita
tem coxa, tem bunda, tem barriguinha, tem sustância, tem o corpo da brasileira
típica, que passa longe das esquálidas das revistas, das ossudas das
passarelas. A numeração de Maria Rita não é 36, mas vestiu aquele macacão
branco como se fosse.
Quaquaraquáquá, quem riu? Quaquaraquáquá,
foi ela. Cantando Vou Deitar e Rolar e outros tantos hits da sua talentosa
progenitora, Maria Rita rebolou, sambou, jogou charme, braço pra cima, braço
pro lado, ajeitadinha no cabelo, caras e bocas, dona e senhora do pedaço e com
o namorado bonitão (Davi Moraes, na guitarra) ali na retaguarda, babando – se
não estava, deveria.
Porque
Maria Rita, além de cantar divinamente, mostrava 100% seu lado fêmea, segura e
incomparável. Que nem as modelos de revista? Quaquaraquaquá. Muito melhor.
Fiquei pensando depois: como mulher se
preocupa com besteira. Usa roupa preta pra afinar, veste bermudas compressoras
pra chapar a barriga, manga pra esconder os braços roliços, e mais isso, e
aquilo, quando o maior segredo de beleza consta do seguinte: sinta-se num
palco, mesmo que nunca tenha chegado perto de um.
Imagine-se
com 60 mil pessoas te aplaudindo, te admirando pelo que você faz, pelo que você
é, imagine-se com o público na mão, pois você é competente e tem uma elegância
natural (tem, né?).
Conscientize-se
de que sua inteligência é superior às suas medidas, que ser magrinha não atrai
amor instantâneo, que sua personalidade é um cartão de visitas, que a
felicidade é a melhor maquiagem, que ser leve é que emagrece.
E dá-se a mágica.
Quem de nós pode vestir um macacão branco
decotado na frente e nas costas, colado ao corpo, sem antes passar por uma
lipoescultura, uma sessão de bronzeamento e ficar duas semanas sem comer?
Qualquer uma de nós, ora.







Era uma senhora alegre, faceira. Mas morreu, como
acontece com todos. Sem salamaleques, sem longas internações. Morreu rápido,
como muitos desejam, e viveu demoradamente, como se deseja também: tinha 99
anos.
Elis vive e volta a cantar em Porto Alegre hoje,
reencarnada em sua filha. Maria Rita é Maria Rita, tem ideias próprias, voz
própria, talento próprio. Mas é também Elis, porque, querendo ou não, somos
como nossos pais. 

