domingo, 20 de julho de 2008



20 de julho de 2008
N° 15668 - Martha Medeiros


O luxo de cara lavada

Gosto de moda, mas gosto ainda mais de atitude. Roupas bacanas a gente compra, basta dinheiro e informação. Mas atitude é outra coisa: é saber se destacar e inventar um novo estilo, deixar sua marca pessoal.

Garotas como Luiza Lovefoxxx e Amy Winehouse estão na vitrine do showbiz, lançam tendências para uma geração adolescente (ou com alma de adolescente) e exploram ao máximo o visual inusitado.

Mas escrevo sobre outro tipo de atitude: o da mulher que ousa, mas faz isso com elegância, sem apelar para um visual de circo.

Recentemente, uma loira e uma morena chamaram minha atenção por conseguirem fugir completamente do script sem perder a classe.

Uma foi a Xuxa, que foi a um casamento usando um lindíssimo e vaporoso vestido comprido e, por cima, em vez de uma echarpe, um xale ou qualquer obviedade para se proteger do frio, vestiu uma jaqueta jeans.

Se eu não tivesse visto a foto, se apenas tivesse ouvido falar a respeito, teria torcido o nariz e considerado um desrespeito aos noivos, que estavam dando uma festa chique e não promovendo uma rave.

Mas eu vi a foto. E gostei do que vi: Xuxa estava surpreendentemente adequada. O vestido, as jóias, a maquiagem, tudo conspirava pra fazer da jaquetinha jeans um acessório compatível com a ocasião.

E ao mesmo tempo que ela dava um toque moderno à produção, dava também um recado importante: o simples é sempre um artigo de luxo, desde que não seja usado como forma de agressão, de provocação, e sim para firmar uma personalidade.

No entanto, no quesito eu-sou-mais-eu, quem ficou com o cetro e a coroa foi a Miss Universo do ano passado, a japonesa Riyo Mori (aquela que tirou o primeiro lugar da nossa Natália Guimarães).

Domingo passado, durante a escolha da Miss Universo 2008, ela foi chamada para entrar no palco para seu desfile de despedida, e eu logo a imaginei vestindo um longo de paetês, portando colares e brincos de 200 toneladas e com aquela mão mole, abanando para seu passado.

Pois eis que entra uma mulher de calça comprida preta, fraque preto, rabo-de-cavalo e apenas um brilhantezinho minúsculo na orelha. Peraí. Calça comprida? Rabo-de-cavalo? Sem esmeraldas exuberantes?

Os concursos de miss, que eram um acontecimento décadas atrás, tiveram uma queda-livre em prestígio. Esse ostracismo durou até bem pouco tempo. Agora voltaram a despertar algum interesse, ainda que nem perto do que provoca um desfile de modas.

Houve uma certa agilização no formato e as misses, hoje, podem até mudar de cara se quiserem e mudam. Injetam e lipoaspiram tudo o que manda a cartilha para alcançar um padrão miss venezuela país que, não por acaso, levou o título esse ano, repetindo pela quinta vez o feito.

Ficam quase todas com o mesmo visual travesti-chic, a bordo de vestidos que nem a Sarah Jessica Parker se atreveria a usar e olha que Carrie segura qualquer exagero.

É aí que entra Ruyo Mori para fazer um desfile de despedida que mais parecia um desfile de abertura - de uma nova era. Surgiu para dar adeus ao seu reinado de miss usando calça comprida, e ainda assim esbanjando sofisticação e feminilidade.

Foi a queima de sutiãs do mundo encantado das peruas.

Aplaudo quebras de protocolo feitas com categoria. Eu teria despachado a miss Venezuela pra casa e manteria a faixa com a japa.

sexta-feira, 18 de julho de 2008



18 de julho de 2008
N° 15666 - Liberato Vieira da Cunha


Da caixa de guardados

Há pessoas que colecionam amores, notas de cem, carimbos de passaporte. Eu há muito coleciono frases que gostaria de ter escrito.

Sobre a felicidade. "Felicidade é a certeza de que a nossa vida não está se passando inutilmente." (Erico Verissimo)

Sobre o passado. "É o futuro, usado." (Millôr Fernandes)

Sobre o futuro. "Tenho, às vezes, saudades do futuro." (Teixeira de Pascoaes)

Sobre a saudade. "Que me quereis, perpétuas saudades? Com que esperança ainda me enganais?" (Camões)

Sobre a paixão. "Nós só conhecemos as paixões dos outros, e o que chegamos a saber das nossas, é deles que pudemos saber." (Proust)

Sobre a sabedoria. "Deus conceda sabedoria aos que já a possuem e permita que os tolos se valham de seus talentos." (Shakespeare)

Sobre o tempo. "Perdido está todo o tempo que em amor não se gasta." (Tasso)

Sobre o amor. "Distante o meu amor, se me afigura / O amor como um patético tormento / Pensar nele é morrer de desventura / Não pensar é matar meu pensamento." (Vinícius de Moraes)

Sobre o pensamento. "Os pensamentos são tentações; são as que nos vêm de Deus; não propriamente que Deus nos mande; elas nascem da própria busca de Deus." (André Gide)

Sobre a solidão. "Nunca encontrei companhia mais sociável do que a solidão." (Thoreau)

Sobre a leitura. "Gosto de perder-me nas mentes de outras pessoas. Quando não estou caminhando, leio; não sei ficar sentado e pensar. Os livros pensam por mim." (Charles Lamb)

Sobre os livros. "Todos os livros se parecem por serem mais verdadeiros do que se tivessem acontecido realmente." (Hemingway)

Sobre a beleza. "A beleza é o acordo entre o sentido e a forma." (Ibsen)

Sobre a liberdade. "Liberdade, liberdade, / Abre as asas sobre nós." (Medeiros de Albuquerque).

Uma ótima sexta-feira e um excelente fim de semana.

quarta-feira, 16 de julho de 2008



16 de julho de 2008
N° 15664 - Martha Medeiros


Tive uma idéia!

Se você escutar alguém dizendo que teve uma idéia, pare tudo e ouça com atenção, mesmo que você suspeite que vá ouvir bobagem. Não importa. O que interessa é que você está diante de alguém que tem esperança, que leva fé em si mesmo, que acredita em alguma coisa. Não vale artista.

Artistas têm idéias por dever de ofício, por hábito vocacional, porque nasceram para ter idéias.

E o resto da população espera as que chegam prontas, as industrializadas, produzidas em série e divulgadas em revistas. Idéias para decorar seu lar com pouco dinheiro, idéias para renovar seu visual em 10 minutos, idéias para fazer um jantar de última hora apenas com o que você tem na geladeira.

Não. Estou falando sobre outro tipo de gente: daqueles raros que têm uma idéia que pode mudar uma vida.

Uma idéia como a que teve Beto, protagonista do filme O Banheiro do Papa, que vivia miseravelmente num povoadinho esquecido por Deus e que, na iminência da visita do representante maior do dito-cujo, pensou: vou dar outro final para minha história.

Teve uma idéia! Qual seja: muitos peregrinos viriam ver o Papa de perto, iriam passar o dia pelas ruas da cidadezinha, iriam rezar, comer, beber, e depois? Onde iriam fazer suas necessidades?

Eureca! Beto resolveu construir um banheiro público, ali, na frente da sua casa, e num único dia ganharia dinheiro suficiente para pavimentar o pátio, para pagar a conta atrasada de luz, para comprar uma moto e para mandar a filha estudar na capital.

Nós, na platéia, assistimos a tudo isso com o coração na mão, porque estamos diante de um sonhador, de um idealista, de um cara que cometeu a doidice de acreditar numa idéia sem antes encomendar uma pesquisa de opinião, fazer um planejamento estratégico, buscar um patrocinador e contratar um marqueteiro, que é como as idéias se viabilizam hoje.

Beto apenas teve a sua original idéia e colocou o plano em prática, sozinho, como se esperança bastasse para fazer as coisas darem certo.

Deveria bastar. Mas, infelizmente, aqui na terra dos céticos, nada é garantido, tudo é risco. E é isso que nos comove no entusiasmo de Beto.

Ele acha que não há risco e que não está sendo sonhador, ele tem uma convicção interna que é inquestionável: dará certo porque ele vai fazer dar certo. Alguém segura um sujeito desses?

Melhor perguntando: alguém conhece um sujeito desses?

Fazem falta os Betos, esses que têm idéias que ora parecem malandras, ora parecem ingênuas, mas que são levadas adiante com tanta garra, que não nos deixam outra saída a não ser torcer por eles, pois fazendo isso estamos torcendo também por nós e pela humanidade, que anda tão carente de otimismo.

Aproveite este Dia Internacional do sofá - Uma ótima quarta-feira para todos nós.

terça-feira, 15 de julho de 2008


ELIANE CANTANHÊDE

Desânimo

BRASÍLIA - Enquanto se discute se o foco é no corruptor (banqueiro, megaempresários...) ou no corrupto (agentes públicos variados);

se Celso Pitta deveria ou não ser exposto ao vivo e em cores metido em pijamas na própria casa; se pode ou não usar algemas em peixe graúdo...ninguém mais fala da Santa Casa de Misericórdia do Pará.

A medida de um Daniel Dantas, de um Naji Nahas ou de um Eike Batista é em bilhões de dólares, e a medida de uma tentativa de suborno de delegados está na bagatela de um milhão e pouco de reais.

Já a medida da Santa Casa de Misericórdia do Pará é em míseras centenas -centenas de bebês: 262 bebês morreram ali neste ano, foram enterrados e ninguém soube explicar por quê, nem alguém mais quer saber exatamente o que ocorreu.

Bilhões de dólares saem pelo ralo, seja da corrupção, seja da mera ganância patológica, e faltam migalhas para salvar bebês, mães e famílias, não só da morte como do abandono e do desalento. Morrem seis bebês, é coisa comum.

Morrem 20, dão de ombro. Morrem 100 e não se acende uma luz amarela. São necessários 262 mártires para a maternidade acordar, o Estado acordar, o país acordar?

O debate nacional escorrega do possível corruptor para um leque infernal de supostos corruptos. Um deputado daqui, um advogado de lá, um juiz daqui, um assessor palaciano de lá e, quanto mais aumenta a rede, menos chance de se pegar o(s) peixe(s) graúdo(s).

No oceano de acusações cruzadas, de reputações periclitantes, ninguém ouve mais falar dos bebês, nem se horroriza mais com suas covinhas, uma atrás da outra, fantasmagóricas e conformadas. E ainda se fala, e se chora, hoje a morte do menino João Roberto no Rio.

Mas só até a próxima bala policial perdida, a próxima vítima indefesa, a próxima família destroçada. Bem-vindo, Salvatore Cacciola! Sinta-se em casa.

elianec@uol.com.br

Bem e não estamos falando de 262 gatinhos...nem cachorrinhos...mas de 262 bebês que poderiam tornar-se cidadãos honrados desse País se lhes deixassem..

sábado, 12 de julho de 2008



13 de julho de 2008 | N° 15661
Martha Medeiros


O que o bafômetro não sabe

Nessa caça às bruxas que virou o caso dos motoristas embriagados, divulgou-se que as mulheres praticamente estão fora de perigo: por beberem menos, ou por serem mais obedientes à lei, parece que só uma, em todo o Estado, foi presa até agora.

As mulheres bebem, e não é chazinho, mas temos a cabeça no lugar e não vamos nos arriscar.

Álcool nunca foi motivo para cometermos barbaridades no trânsito. Quanto a isso, a Polícia Rodoviária pode ficar tranqüila. Agora, se virem uma mulher dirigindo em estado de profunda dor-de-cotovelo, detenham-na.

Eu tenho umas teorias estapafúrdias e essa é mais uma. Estou divulgando-a aqui na coluna para, dependendo do recall das leitoras, confirmar se ela é estapafúrdia mesmo ou se há nela alguma legitimidade. Trata-se do seguinte: o amor é que é nossa cachaça.

Tenho três exemplos pra contar, todos reais.

1. Eu a conhecia bem. Ela não havia bebido, eram 10 horas da manhã. Seu único problema é que estava embriagada de desgosto. Abissalmente triste.

Garoava, um carro travou em frente ao dela e não houve tempo para frear: quando viu, já havia colidido. A cabeça estava em outro mundo, menos no trânsito. Chorou ali mesmo, no meio da rua. Chorou tudo o que estava represando há dias. Álibi perfeito.

2. Uma outra saiu muito irritada do prédio do namorado. Mas muito irritada. Eu a entendo. Homens têm essa capacidade congênita de tirar a gente do sério.

Pois então: a louca saiu da garagem dele sem nem esperar o portão eletrônico abrir totalmente. Raspou todo o teto do carro e a antena ainda ficou de presente pra ele, torta, ali no chão.

Ela nem se deu o trabalho de sair do carro e buscá-la, seguiu em frente cantando pneu. Foi a partilha de bens do casal. Ele ficou com a antena, e ela com um baita arranhão no carro e um machucado maior ainda por dentro.

3. A última. Havíamos nos encontrado por acaso na rua, sentamos para tomar um suco e ela me contou que não suportava mais uma determinada situação.

Estava com ódio de si mesma por não conseguir dar fim ao seu tormento. Quando nos despedimos, perguntei se ela estava em condições de dirigir. Imagina! Estava na fossa, só isso.

Ela me abraçou e prometeu dar notícias. E deu. Me contou que naquele mesmo dia, logo depois de nos despedirmos, ela fez uma ultrapassagem, digamos, mais dinâmica, e provocou um batidazinha. Coisa boba, mínima. "Mas eu não precisava mais essa".

Nenhuma lei vai nos pegar, já que felizmente não existe o teste do "fossômetro", mas mulheres que acabaram de ter uma séria discussão com o namorado ou o marido, não abusem. Melhor pegar um táxi.

Não está provado por nenhuma estatística, mas um coração agredido também altera nossa conduta, também diminui nossos reflexos, também pode comprometer nossa perícia no trânsito. Ou seja, uma paixão mal correspondida é que nos torna perigosas.

Diogo Mainardi

Nassif, o banana

"Luis Nassif foi demitido da Folha pela suspeita de ter usado seus artigos no jornal para achacar o governo de Geraldo Alckmin. Falei sobre o episódio com o diretor da Folha. Ele confirmou. Com a carreira arruinada, Luis Nassif refugiou-se na internet, como Mengele em Bertioga"

Eu sou lobista de Daniel Dantas. É o que diz o blogueiro Luis Nassif. Como foi que eu ajudei Daniel Dantas? Acusando-o de ter financiado Lula.

E também acusando Naji Nahas de ter financiado Lula. O fato de eu ter publicado uma série de documentos judiciais sobre Naji Nahas e a Telecom Italia me incrimina, segundo Luis Nassif.

Entende-se: em meu lugar, ele teria picotado e obedientemente engolido esses documentos, que denunciam as ilegalidades cometidas pela empresa e pelo governo. Quem patrocina o site de Luis Nassif? A Telecom Italia. Quem impediu que ele falisse e perdesse até as cuecas? O BNDES.

Eu já ridicularizei Luis Nassif três anos atrás, demonstrando que ele reproduziu integralmente em sua coluna a nota de um lobista ligado a Luiz Gushiken.

Ele foi demitido da Folha de S.Paulo pouco tempo depois, por causa de um fato ainda mais nauseabundo: a suspeita de ter usado seus artigos no jornal para achacar o governo de Geraldo Alckmin. Em 2004, Luis Nassif convidou o secretário Saulo de Castro para um fórum de debates organizado por sua empresa, Dinheiro Vivo.

O detalhe sórdido era o seguinte: para o secretário poder participar do evento, o governo paulista teria de desembolsar 50.000 reais. Saulo de Castro negou o pedido.

Em 2005, Luis Nassif voltou à carga, cobrando uma tarifa ligeiramente mais modesta, de 35.000 reais. A assessora de Saulo de Castro mandou um e-mail para o chefe com este comentário: "Não é à toa que a empresa se chama Dinheiro Vivo". Saulo de Castro negou o pedido mais uma vez. Luis Nassif decidiu retaliar.

Em sua coluna, passou a atacar sistematicamente o governo Alckmin, em particular o secretário Saulo de Castro. Quando o diretor da Folha de S.Paulo, Otavio Frias Filho, foi informado das suspeitas em torno de Luis Nassif, demitiu-o imediatamente. Nesta semana, falei sobre o episódio com Otavio Frias Filho. Ele confirmou.

Com a carreira no jornalismo arruinada, Luis Nassif refugiou-se na internet, onde seu passado era desconhecido, como o de Mengele em Bertioga. O bando de Luiz Gushiken arranjou-lhe uma sinecura no iG.

Enquanto fazia um blog para meia dúzia de leitores, ele era obrigado a escapar de seus credores no BNDES, que queriam penhorar seus carros e apartamentos para tentar recuperar uma parte do rombo de 4 milhões de reais da Dinheiro Vivo.

No fim de 2007, depois de um misterioso encontro com a diretoria do BNDES, ele conseguiu fechar um acordo judicial altamente lesivo para o banco, que lhe garantiu os seguintes mimos: o abatimento de 1 milhão de reais de sua dívida, o prazo de dez anos para saldá-la, a retirada de todas as garantias para o pagamento do empréstimo e a dispensa de uma multa de 300.000 reais.

Algumas semanas depois, ele retribuiu a generosidade estatal usando o único método que conhece: uma campanha de mentiras descaradas contra mim e contra VEJA, tidos como inimigos do governo.

Luis Nassif é um banana. Ninguém dá bola para ele. Por isso mesmo, minha idéia era persegui-lo apenas judicialmente. De fato, estou processando o iG.

Tenho uma tonelada de mensagens, documentos e testemunhas que desmoralizam toda a imundície publicada em seu blog. Mas suas calúnias ganharam outro peso depois que Daniel Dantas e Naji Nahas foram presos.

Claramente, o pessoal que o emprega está preocupado com o rumo que esse inquérito pode tomar. Há um empenho para impedir que os dois sejam associados a Lula, como eu sempre fiz.

Quando Daniel Dantas e Naji Nahas foram presos, eu comemorei. Luis Nassif deve ter pensado em todos os documentos que terá de picotar e engolir. E em todos os patrocinadores que poderá ganhar.

Ponto de vista: Stephen Kanitz

Por que sexo é tão divertido

"Sexo precisa ser divertido, mas o segredo do divertimento são o comedimento, a surpresa e o mistério, e não essa massificação e banalização a que estão nos submetendo"

Por que os homens só pensam "naquilo"? Por que nossas novelas só mostram "aquilo"? Por que nossos anúncios e propagandas insinuam "aquilo", sem parar? Porque fomos geneticamente programados a pensar "naquilo" com muita freqüência.

Podemos esquecer de fazer uma série de coisas na vida. Podemos nos esquecer de tomar café ou de dizer bom-dia ao vizinho, mas de uma coisa jamais podemos nos esquecer: de nos reproduzir e ter filhos.

Cada um de nós está vivo porque somos o último elo de milhões de antepassados, nenhum dos quais se esqueceu de reproduzir-se. Quando as mulheres reclamam que homens só pensam "naquilo", elas estão sendo tremendamente injustas porque o instinto do "não esquecimento" está em ambos os sexos, e com a mesma intensidade.

Afinal, nenhuma das mulheres que fazem parte da nossa genealogia se esqueceu de reproduzir-se. Hoje se suspeita até que mais mulheres traiam o marido do que vice-versa.

Coloque-se na posição de Deus no dia da criação. Você tem de decidir que tipo de ser humano criar. Você precisará definir a intensidade de qualidades como agilidade, inteligência, força, solidariedade e que grau de instinto sexual atribuir ao homem e à mulher. Como a energia é escassa, você não poderá dar grau 100 a cada qualidade humana.

Você daria 100 à inteligência, 60 à agilidade e 40 ao instinto sexual? Ou você daria 40 à inteligência, 60 à agilidade e 100 a nosso interesse "naquilo"?

Você preferiria criar um ser humano inteligente, mas desligado, ou um ser humano mais bobão, mas com pouco risco de ser levado à extinção? Foi por essa segunda opção que Ele parece ter se decidido: criou um ser humano bobo, mas que vive pensando "naquilo".

Ilustração Atômica Studio

Pela lei da probabilidade, entre nossos 4 milhões de ancestrais, mais de uma vez tivemos um antepassado meio esquecido e desligado, que só teve um filho aos 36 anos, pouco antes de ser comido pelos leões.

O suficiente para ele deixar você como descendente. Todos nós escapamos por um triz de não estar lendo este artigo. Se Deus tivesse atribuído grau 40 em vez de 100, o que provavelmente muitos teólogos, papas e moralistas teriam escolhido, a sua história familiar seria outra, ou seja, inexistente.

Essa decisão divina explica muita coisa deste mundo maluco: esta burrice coletiva que assola o mundo e o Brasil e as besteiras que homens e mulheres cometem.

Uma sábia decisão que hoje provoca uma série de problemas, como o erotismo desenfreado, a preocupação exagerada com o sexo, o desempenho e a traição, que trazem como conseqüência esta sociedade de consumo e de ostentação. Mas que nos permitiu chegar até aqui como somos: lerdos, burros, mas vivos.

A encrenca é que a maioria dos nossos publicitários, autores de telenovela, artistas, cineastas, a turma do "trair é normal" e do "tudo é permitido", usa e abusa desse nosso instinto supercaprichado para os próprios interesses.

Um jovem hoje em dia terá sido exposto a 12.000 apelos sexuais antes de completar 14 anos, uma aberração cultural sem precedentes na história da humanidade.

Hoje não precisamos ter doze filhos baseados na chance de que dois chegarão até a vida adulta. Estão deliberadamente abusando desse nosso gene de preservação para ganhar dinheiro para suas empresas e para si.

Se você acha divertido assistir a novelas que só tratam "daquilo", se você vive na internet procurando "aquilo", se você acha o máximo os livros que só tratam "daquilo", saiba que você está sendo usado e correndo risco de extinção.

Estão afastando-o de sua verdadeira tarefa de procurar alguém ideal para fazer "aquilo" com amor e diversão. Estão usando o instinto mais caprichado que Deus nos deu para fazer justamente o contrário, deixar você isolado na frente do computador ou da televisão.

Nossos professores, artistas e cineastas, nossos líderes espirituais, nossa Igreja, nossos intelectuais estão se esquecendo de que sexo precisa ser de fato divertido, mas o segredo do divertimento são o comedimento, a surpresa e o mistério, e não essa massificação e banalização a que estão nos submetendo.

Stephen Kanitz é administrador (www.kanitz.com.br)

SUZANE FRUTUOSO

Os fiéis do sexo

Cada vez mais segmentadas, igrejas evangélicas se voltam para a conversão e o acolhimento de atores pornôs e prostitutas

TENTAÇÃO O pastor Ferreira, ex-ator de filmes pornôs

As religiões pregam que todo ser humano deve ser acolhido por uma igreja, independentemente do "pecado" que carregue. Mas para que o fiel se sinta à vontade para bater às portas de um templo, elas vão ficando cada vez mais segmentadas, formando tribos com perfis parecidos.

Atualmente, estão em expansão as denominações evangélicas que se identificam com a questão sexual. Elas abrigam atores pornôs, prostitutas, homossexuais e travestis, entre outros. Nesses templos, a conversão é desejável, não obrigatória. Importante é se aproximar de Deus.

O conceito faz parte do discurso do pastor Giuliano Ferreira, 29 anos. Ele comanda desde 2005 a Assembléia de Deus Ministério de Madureira, em Ribeirão Bonito, interior de São Paulo.

As pessoas que freqüentam o lugar se sentem confortadas pela história de salvação do religioso. Há quatro anos, ele ainda era conhecido como Juliano Ferraz, um dos mais atuantes atores pornôs brasileiros, com cerca de 300 filmes nacionais e internacionais.

Giuliano entrou para a indústria pornô em 1999. Com o ofício, conseguiu comprar três casas e ajudar a família. "Mas a angústia crescia junto com a prosperidade financeira", afirma. Largou tudo quando alguns colegas contraíram o vírus da Aids. "Era um sinal para eu parar.

" O pastor diz que não proíbe ninguém de participar de seus cultos por causa de escolhas pessoais. "Sei que minha história fortemente ligada ao sexo atrai, por exemplo, prostitutas. Elas se identificam com meu passado e acham que também podem mudar de vida. Mas não forço nada nem as recrimino", diz.

As igrejas que acolhem profissionais do sexo despontaram em Michigan, nos Estados Unidos, há cinco anos. Lá, um grupo de jovens pastores criou a XXX Church - as três letras "x" fazem um som parecido com a palavra sex.

O alvo é a indústria de filmes pornôs. Empunhando a Bíblia, os pastores pornôs, como se auto-intitulam, invadem os sets de filmagem, na tentativa de tirar alguns atores da carreira. Mas, explicam, recebem da mesma forma aqueles que não desistem da profissão.

SALVAÇÃO Atrizes da indústria pornô americana seguram camisetas nas quais se lê "Jesus ama astros pornôs". A idéia já chegou ao Brasil


Em feiras eróticas, pregam e vendem camisetas em que se lê "Jesus ama astros pornôs". O site xxxchurch.com recebeu no último mês um milhão de visitas. Em janeiro de 2009, a igreja inaugurará o templo oficial, em Las Vegas.

No Brasil, a igreja Projeto 242, em São Paulo, se inspirou no exemplo americano para criar o site Sexxx Church, que existe há nove meses.

Ainda não há diálogo com a indústria pornô, conta Jota Mossad, responsável pela página. Houve contato com a produtora Brasileirinhas, mas ninguém retornou.

O objetivo é converter? "A idéia é criar uma amizade, não apontar o dedo e dizer 'o que você faz é errado'. Mas mostrar que a pornografia alimenta a indústria da exploração sexual", afirma.

O nome 242 vem de uma passagem do Novo Testamento, no livro Ato dos Apóstolos, capítulo 2, versículo 42 ("E perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações").

"A mensagem desse trecho da Bíblia mostra que Jesus e os apóstolos creram num espírito comunitário. É a nossa filosofia", diz o pastor Sandro Baggio. Entre os planos da igreja está a venda de uma camiseta nos mesmos moldes da americana na Erótica Fair, feira programada para outubro, em São Paulo.

Com o dinheiro arrecadado, será dado início à produção de um Novo Testamento. Na capa, a sugestiva mensagem "Jesus ama
Todos"


12 de julho de 2008
N° 15660 - Nilson Souza


Boas notícias

Às vezes, parece mesmo que os políticos são todos iguais. Na Romênia, os senadores aprovaram na semana passada uma lei que obriga as estações de rádio e televisão do país a divulgar notícias positivas e negativas em igual proporção.

O autor do projeto disse que seu objetivo é melhorar o clima geral e oferecer ao público a oportunidade de ter uma visão equilibrada da vida cotidiana. Se os fatos mostrarem o contrário, como dizia Nelson Rodrigues, pior para os fatos.

Além da interferência indevida no direito dos cidadãos de conhecer a verdade inteira, por pior que ela seja, os parlamentares do país do Drácula largaram um pepino nas mãos dos jornalistas: encontrar notícias boas em número suficiente para promover o desejado equilíbrio.

Comecemos pela definição mais clássica de notícia, feita por um jornalista americano no início do século 19: "Quando um cachorro morde uma pessoa, isto não é notícia. Mas quando uma pessoa morde um cachorro, isto é notícia". Neste caso, na visão dos senhores parlamentares, tanto a notícia quanto a não-notícia entrariam no lado negativo.

Como contrabalançar? Jornalista não inventa notícia. Pelo menos, não deveria. E as pessoas não querem saber apenas dos acontecimentos normais. Querem conhecer o diferente, o inusitado, o surpreendente.

E fatos positivos com tais ingredientes são raros. Não acho que seja apenas por morbidez que o público consome noticiário sobre tragédias e escândalos. É, muito mais, porque tais fatos mexem com a imaginação e com as emoções das pessoas.

Jornais só com boas notícias já foram tentados muitas vezes, mas sempre acabaram na pior notícia para eles: a falência.

O poeta Affonso Romano de SantAnna, que esteve recentemente por aqui para participar do Fronteiras do Pensamento, conta que na década de 60, quando trabalhava no Diário de Minas, ele e seus colegas de Redação resolveram fazer uma brincadeira de 1º de abril.

Reproduziram a primeira página do jornal na capa do segundo caderno, com desenho igual, mas apenas com boas notícias, todas inventadas:

Descoberta a cura do câncer, Valeriodoce (time mineiro) ganha o Mundial de Clubes etc. Alguns leitores acharam graça, mas vários outros ficaram muito decepcionados quando se deram conta de que tudo não passava de um bem-humorado logro.

As pessoas não gostam de ser enganadas, nem de brincadeira.

Por isso, o melhor e o mais honesto é retratar a realidade exatamente como ela é. Sem disfarces nem imposições. Ao contrário do que pensam os políticos romenos, a tentativa de interferir na vida das pessoas com um decreto autoritário não é uma notícia boa.

sexta-feira, 11 de julho de 2008



11 de julho de 2008
N° 15659 - Liberato Vieira da Cunha


Uma garota na neblina

É raro ver desfilando em meio à paisagem gris de inverno um instante de pura beleza.

Foi o que me aconteceu no último sábado na que é talvez a mais larga avenida de Porto Alegre. O sinal fechou e os carros pararam comportados para assistir à passagem de uma única pedestre.

Era uma garota de uns 20 anos, meio surreal em sua travessia. Vestia roupas coloridas que contrastavam com o cinza da manhã.

Puxava uma dessas pequenas malas dotadas de rodas que se vê muito nos aeroportos. Não tinha pressa.

Cruzou descansada as quatro pistas que se projetavam à minha frente e, quando transpôs o canteiro que separava as pistas opostas, incendiou-se de luz. Uma ponta de sol havia rompido a cerração e pousado nela, revestindo-a de uma extraordinária lindeza.

Quase perdi a respiração ao vê-la assim tão bela, atravessando, perfeita e descuidada, o outro trecho da perimetral. E iluminada seguiu rumo à calçada, que foi quando a perdi. O sinal havia aberto e os carros arrancavam, apressados.

Quem não arrancou fui eu. Isto é, meu carro moveu-se, tomou outras ruas, dobrou esquinas, subiu ladeiras, parou em sinais, mas dentro de mim persistia intacta a claridade da menina em toda a sua formosura.

Percebo que usei a palavra formosura, que soa antiquada como uma serenata antiga, mas não encontro outra para descrever o que presenciei. Aquela garota encantou meu dia e me fez prisioneiro de perguntas sem resposta.

De onde vinha? De uma primeira noite de amor com seu enamorado? Para onde ia? Pegar um avião vermelho que a alçasse sobre as nuvens, lá onde tudo é azul?

O que a tornava tão linda, a ponto de convocar o sol para dentro das névoas de julho? A magia de sua formosura?

Nunca saberei. Sei no entanto o bastante: por um momento desceu a primavera sobre este inverno.

Ótima sexta-feira e um excelente fim de semana

quinta-feira, 10 de julho de 2008





Relato de uma Professora:

Semana passada comprei um produto que custou R$ 1,58. Dei à balconista R$ 2,00 e peguei na minha bolsa 8 centavos, para evitar receber ainda mais moedas.

A balconista pegou o dinheiro e ficou olhando para a máquina registradora, aparentemente sem saber o que fazer.

Tentei explicar que ela tinha que me dar 50 centavos de troco, mas ela não se convenceu e chamou o gerente para ajudá-la. Ficou com lágrimas nos olhos enquanto o gerente tentava explicar e ela aparentemente continuava sem entender. Por que estou contando isso?

Porque me dei conta da evolução do ensino de matemática desde 1950, que foi assim:

1. Ensino de matemática em 1950:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de
produção desse carro de lenha é igual a 4/5 do preço de venda .
Qual é o lucro?

2. Ensino de matemática em 1970:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de
produção desse carro de lenha é igual a 4/5 do preço de venda ou R$ 80,00.
Qual é o lucro?

3. Ensino de matemática em 1980:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de
produção desse carro de lenha é R$ 80,00. Qual é o lucro?

4. Ensino de matemática em 1990:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de
produção desse carro de lenha é R$ 80,00. Escolha a resposta certa, que
indica o lucro:
( )R$ 20,00 ( )R$40,00 ( )R$60,00 ( )R$80,00 ( )R$100,00

5. Ensino de matemática em 2000:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de
produção desse carro de lenha é R$ 80,00. O lucro é de R$ 20,00.
Está certo?
( )SIM ( ) NÃO

6. Ensino de matemática em 2007:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$100,00. O custo de
produção é R$ 80,00. Se você souber ler coloque um X no R$ 20,00.
( )R$ 20,00 ( )R$40,00 ( )R$60,00 ( )R$80,00 ( )R$100,00

Recebido da minha amiga Tania Lyra, que aliás sempre encaminha umas preciosidades - Uma ótima quinta feira para todos nós

quarta-feira, 9 de julho de 2008



09 de julho de 2008
N° 15657 - Martha Medeiros


Sobre alguns beijos

Já deve ter acontecido com você também. É o seguinte: você se considera uma pessoa de cabeça aberta, até que um fato qualquer lhe causa algum desconforto e você não entende: ué, o que está havendo comigo?

Pois aconteceu quando vi a foto da Daniela Mercury beijando uma outra cantora que eu não conhecia, Alline Rosa. O beijo aconteceu durante a gravação de um DVD da banda Cheiro de Amor, em que elas dividiram o palco.

Quando terminaram de cantar uma música juntas, Daniela se ajoelhou em frente a sua anfitriã e em seguida se levantou e tascou-lhe um beijão na boca.

Grande novidade. Muito antes disso, Madonna e Britney Spears fizeram o mesmo, e desde então só vem aumentando a troca de bitocas em público, para deleite dos fotógrafos.

Luiza Brunet com Adriane Galisteu, Adriane Galisteu com Hebe, Hebe com Gil, Gil com Lulu Santos, Lulu Santos com não-sei-quem, e daí? Vou ficar chocadinha agora?

Nunca dei a mínima. Mas o beijo da Daniela Mercury me surpreendeu, e eu fiquei surpreendida por ter me surpreendido. Um momento de entusiasmo sob os holofotes, uma performance corriqueira, um beijo a mais no showbiz, qual a diferença?

Preconceito contra a homossexualidade não era, já cansei de defender o respeito à diversidade sexual, e essa questão nem entrou em pauta, era só uma cena para os flashes, uma brincadeira, nada mais. O que me incomodou, então?

Me incomodou o fato de que eu estou me transformando numa caretona, só pode ser isso. Eu tinha uma idéia de que a Daniela Mercury era uma mulher imune à propagação de factóides.

Sempre admirei pessoas que se preservam, que não se expõem desnecessariamente, que mantém um certo mistério. Santa nostalgia. Isso já não existe.

Há muito que trocamos o sensacional pelo sensacionalismo. Amanhã o João Gilberto poderá dar um beijo na boca do Chico Buarque e isso só provará que o mundo está mais alegre e desestressado. E que eu parei no tempo.

Ainda sobre beijo, agora sob outro aspecto. A Argentina é um país de homens viris. Uma demonstração clara disso é que lá os homens se cumprimentam com um beijo no rosto.

Parentes e amigos se beijam a cada vez que se encontram na rua ou num bar. Eu acho uma imagem bonita de se ver.

Aqui no Brasil esse hábito ainda está engatinhando, mas quando vejo pai e filho se beijando, ou um amigo beijando outro, automaticamente penso: é um homem de classe. Não sei se isso me redime da caretice ou se agora não adianta mais, já sou um caso perdido.

sábado, 5 de julho de 2008



06 de julho de 2008
N° 15654 - Martha Medeiros


Quando menos se espera

Algumas revistas, de vez em quando, resolvem dar uma facilitada para seus leitores e publicam matérias revelando qual é o melhor lugar para paquerar, assim como o melhor horário e os melhores alvos. "Onde, quando e quem", tudo de mão beijada para quem está à procura de um amor.

Não custa fazer o teste. Vá até o bar sugerido, na hora em que estiver mais lotado, e selecione seu objetivo conforme orientação da revista: alguém com determinada idade, modo de vestir, jeito de segurar o copo, tudo como foi indicado. Encontrou?

Agora espere o garçom acordá-la e avisar que o bar está fechando, baby. Você pegou no sono e não aconteceu na-da.

Não estou fazendo pouco da sua solidão, eu bem que estava torcendo por você, mas a maldita experiência ensina: quando a ansiedade é grande, as chances são mínimas.

Portanto, dê um tempo para as dicas dos outros e arrisque seguir as minhas. Pois é, eu também sei palpitar sobre o "onde, quando e quem". Principalmente quando estou sem assunto.

Onde menos se espera. É esse o lugar. Não é preciso fornecer endereço, bairro, CEP, até porque você não tem que ir a lugar algum.

Onde menos se espera pode ser exatamente aí onde você está. Na fila do banco, numa farmácia, dentro da igreja, na ante-sala de um consultório, numa reunião de condomínio, na parada de ônibus, numa clínica veterinária, até mesmo dentro da sua própria casa. Juro, o amor pode bater à porta, conheço casos.

Por exemplo, você está esperando um eletricista e, de repente, o eletricista vem acompanhado do arquiteto responsável pela obra. Blim-blom, e seu destino está traçado. O que nos leva ao parágrafo seguinte.

Quando menos se espera. É este o melhor horário. Mas há riscos. Digamos que o arquiteto bateu à porta quando você havia se programado para passar o dia trabalhando em casa, e, portanto, estava parecendo um molambo. Sabe o que é um molambo? Um pedaço de pano velho.

Você escolheu pra vestir a coisa mais medonha e surrada que encontrou no armário e deixou para lavar o cabelo só no dia seguinte, quando pretendia ir a um bar procurar um amor e aquela coisa toda.

A gente nunca sabe quando vai ser nosso dia de sorte, mas pode ter certeza de que ele não será anunciado com antecedência.

Por isso, é bom estar sempre arrumadinha, mesmo que seja para descer até à garagem do prédio para buscar o celular que você esqueceu dentro do carro. Sabe como é, entre o seu apartamento e a garagem existe algo chamado elevador. Humm.

Por fim, quem! Quem menos se espera. Você fica de olho no dono da festa, mas é o pai dele - mais charmoso que o filho, aliás - que vem perguntar se você usa o MSN. Você encasqueta de querer ser mulher de jogador de futebol e cai um professor de literatura na sua rede.

Você cumprimenta, toda alegrinha, o sujeito que cruza diariamente com você nas suas caminhadas de sábado, mas é o cara barrigudinho que lava o carro ali por perto que costuma avaliá-la com olhos mais atentos. Pode não ser animador, mas assim é a vida: você mira no plano A, mas é sempre o plano B que vinga.

Conclusão? Deixe de ser óbvia e tire os olhos do arquiteto. O eletricista é que é um homão, trabalha no que gosta, lê nas horas de folga, está solteiro e com a agenda lotada - ou você ainda não confia na ascensão dos prestadores de serviço?

O arquiteto está matando cachorro a grito e ainda vai te pedir um troco pro ônibus.

Diogo Mainardi

O país do Zé Pretinho

"O lulismo se especializou em surrupiar as glórias nacionais. Agora está tentando surrupiar a principal delas: o nosso longo histórico de alegre e sincera subalternidade.

É bom lembrar: nós já éramos obstinadamente servis antes de Lula, e permaneceremos assim depois dele" Lula - ?

É isso que consta na lista de pagamentos do empreiteiro Zuleido Veras, dono da Gautama, preso no ano passado. O nome de Roseana Sarney, que também faz parte da lista, é seguido por um número: 200 000. O nome do tio de Roseana, o "Gaguinho", é seguido por outro número, bem mais modesto: 30 000. E Lula?

Lula, no momento em que a lista foi feita, no começo da última campanha eleitoral, ainda era um ponto a ser respondido. Um ponto particularmente importante, sublinhado.

Ninguém sabe se Lula acabou recebendo algum número da Gautama. Pior: ninguém se interessou em saber.

Duas semanas atrás, VEJA reproduziu a lista de pagamentos do empreiteiro, que está em poder da PF, contendo o nome de Lula. O resto da imprensa ignorou o assunto. O Congresso Nacional ignorou o assunto. Os leitores ignoraram o assunto.

A idéia de que é perfeitamente inútil continuar a denunciar Lula se alastrou por aí. Leio uns dez blogueiros amargurados por dia dizendo que ele é imune a tudo.

Que o Brasil está rendido. Que está entorpecido. Que está em coma. Na falta de outros argumentos, esse acabou se transformando também no maior fator de orgulho para os lulistas.

Eles sempre se gabam do fato de Lula conseguir manter-se imensamente popular a despeito de todas as ilegalidades de que é acusado. Mas esse é um grande embuste. E eu me recuso a aceitá-lo.

O lulismo se especializou em surrupiar as glórias nacionais. Agora está tentando surrupiar a principal delas: o nosso longo histórico de alegre e sincera subalternidade.

É bom lembrar: nós já éramos obstinadamente servis antes de Lula, e permaneceremos assim depois dele.

Quem Lula pensa que é? Em 1937, Getúlio Vargas deu seu golpe de estado. Poucos meses depois, os sambistas se acotovelavam para determinar quem conseguia lamber as botas do ditador de maneira mais degradante:

Surgiu Getúlio Vargas,
O presidente brasileiro,
Que entre seus filhos
Como um herói foi o primeiro.

Essa marchinha foi composta por Zé Pretinho. Encontrei-a na página da internet do ministro da Propaganda de Lula, Franklin Martins, um dos maiores estudiosos do nosso cancioneiro político.

É muito apropriado que, nestes últimos anos, Franklin Martins tenha se tornado um símbolo do adesismo da imprensa lulista, um Zé Pretinho do jornalismo.

Recomendo uma atenta consulta à sua página. Há desde a ode à Petrobras ("Brasil, meu Brasil / Vais crescer ainda mais / Com a Petrobras") até a embolada em defesa da prática do nepotismo ("O meu irmão / Pru sê um moço de talento / Punha no Saninhamento"), que deve ser especialmente estimada por Franklin Martins.

Quando algum lulista vier importuná-lo ostentando a popularidade de Lula, pegue o bandolim e entoe o sambinha getulista:

Brasil, meu Brasil de verde mar,
Gigante que desperta de um sono secular.
Brasil, orgulho do brasileiro,
Tens no leme do teu barco
Um herói por timoneiro.

Ponto de vista: Lya Luft

Três destinos femininos

"Neste país, a fronteira entre justo e injusto, verdadeiro e falso, correto e maldoso precisa ser urgentemente restabelecida"

Ayaan Hirsi Ali, uma jovem política e escritora somaliana, naturalizada holandesa e residente nos Estados Unidos, disse numa palestra que "as verdadeiras fronteiras são as do pensamento". Referia-se a toda sorte de discriminação e preconceito que tanta violência e desgraça geram.

Vitimada desde criança por um fanatismo brutal, destinada a casar com um homem que não conhecia, conseguiu fugir e acabou uma figura admirada no mundo inteiro. Jurada de morte por certos grupos muçulmanos em seu país de origem, ela só pode circular com forte segurança.

Olhei aquela quase-menina tranqüila, mas de olhar profundo e muito atento. Pensei no quanto, por qualquer bobagem, nos fazemos de vítimas, enquanto aquela jovem não apenas sobrevive, mas age e se afirma: sem desejo de vingança e sem o detestável espírito de mártir, que produz o ressentimento mais maligno.

Acabo de emprestar minha voz para o documentário sobre outro fato espantoso, o das Noivas do Cordeiro. Um vilarejo com esse nome, perto de Belo Horizonte, é habitado por algumas famílias – mais mulheres, pois os homens têm de buscar fora o sustento de seus filhos e só vão para casa nos fins de semana. Elas vivem ainda hoje isoladas e discriminadas de uma forma cruel.

Por serem bandidas? Não. Uma antepassada delas foi excomungada pela Igreja há mais de 100 anos, por haver tentado ser um pouco feliz com seu novo companheiro. Como era casada, foi execrada pelos fariseus de plantão. A maldição atingiria quatro gerações de seus descendentes.

Ilustração Atômica Studio

Tiveram muitas filhas, que geraram muitos filhos, com os rapazes que ousaram delas se aproximar.

Fundaram uma comunidade singular em tudo: pela duração desse isolamento e pela dimensão de sua luta para provar que são dignas de respeito e afeto. São mulheres de idade ou bem jovens, saudáveis, cara limpa, sorriso aberto, numa fraternidade e cumplicidade comoventes.

Ali tudo é de todos, todas se ajudam, todas suportam juntas o isolamento e as calúnias. "Cuidado, lá vêm elas!", comenta-se quando chegam a outro povoado ou à capital para alguma compra necessária. T

udo lhes é dificultado: escola, atendimento médico e qualquer direito de cidadania. Os rapazes que com elas se relacionam, quando vão à cidade, são atormentados com insultos do tipo:

"Como se atreve a deixar sua mulher? Todo mundo sabe que elas não prestam. Meu amigo outro dia esteve lá, e foi uma farra".

Nos depoimentos, algumas choraram relatando a dureza dessa situação. Que talvez esteja acabando, pois, com muito trabalho e desejo de progredir, elas conseguiram instalar televisão e começam a conhecer o mundo. Botaram também a internet, outra janela para fora de sua condenação.

Finalmente, elegeram uma vereadora, fundaram uma associação e, após quatro gerações, talvez possam ser olhadas com o respeito que merecem mais do que tantas pessoas daqui de fora. O que vão ganhar na realidade, para além dos limites de seu delicioso e feliz povoado?

Tenho minhas dúvidas sobre as vantagens todas: vão conhecer corrupção e omissão, logro e malogro, frivolidade, violência e competição desleal.

Imagino que seja inevitável libertarem-se da difamação e serem integradas ao mundo. Mas quem sabe seria melhor botar o país inteiro dentro daquele vilarejo, vivendo de maneira simples, limpa, fraterna e feliz?

Não posso encerrar sem mencionar Ruth Cardoso. Uma das pessoas mais discretas e dignas entre nós.

Intelectual respeitada e generosa cuidadora dos desvalidos, que fundou o Comunidade Solidária, verdadeiro berço de iniciativas como o Bolsa Família, apenas com outros contornos – amparar, mas preparando para que os favorecidos logo possam ganhar seu sustento.

Pois essa verdadeira dama, em seus últimos meses, com a saúde frágil, foi achacada por quem pretendia (talvez ainda pretenda) expor suas contas e de seu marido, procurando ali algumas das tão comuns falcatruas atuais.

Neste país, a fronteira entre justo e injusto, verdadeiro e falso, correto e maldoso precisa ser urgentemente restabelecida.

Lya Luft é escritora
A aurora dos cinqüentões

Eles têm experiência e vitalidade.

Em vez de esperarem passivamente pela velhice, criam seus próprios negócios, estudam para manter a mente ativa e enveredar por outra profissão. Também se divertem na intimidade. No Brasil de hoje, o 50 é o novo 40

Quando se trata de desfrutar a vida com as vantagens da maturidade, mas a uma distância ainda segura dos desconfortos da velhice, o 50 é o novo 40.

Ou, dito de outra maneira: a combinação de experiência e vitalidade que até pouco tempo atrás caracterizava os quarentões agora também distingue homens e mulheres que ultrapassaram a barreira dos 50 anos.

A explicação de fundo para isso é, digamos, de saúde pública: as pessoas estão vivendo mais, e envelhecem melhor. As conseqüências da mudança são as mais diversas. Fazem-se sentir no mercado de trabalho, nas universidades, na vida privada.

As próximas páginas mostram que, hoje, cinqüentões trocam de bom grado o pijama de aposentado (ou a perspectiva iminente de vesti-lo) pela ousadia de abrir uma empresa – ou então preenchem vagas de destaque, e muito bem remuneradas, num mercado carente de mão-de-obra qualificada. Seu contingente aumenta nas carteiras do ensino superior, no qual eles são calouros com pinta de veteranos.

E, como não poderia deixar de ser, gente madura que faz ioga, musculação ou corrida, ainda que não exiba as formas extraordinárias da cinqüentona Madonna, fica bem mais à vontade entre quatro paredes.

As reportagens a seguir confirmam, enfim, que um número crescente de pessoas dá valor à bagagem de vida que acumularam. Como disse o satirista inglês P.G. Wodehouse, elas sabem que não existe cura verdadeira para os cabelos grisalhos – e, por isso mesmo, fazem deles o melhor uso possível.

Velhice? fica para mais tarde

Com cuidados estéticos, alimentação saudável e atividade física, quem faz 50 anos (e não parece) adia a hora de envelhecer

Silvia Rogar e Sandra Brasil

Tony Barson/Wireimagem/Getty Images

Old girl, jamais: fanática por exercício físico e empenhada em disfarçar todo e qualquer sinal da idade, Madonna chega ao meio século em pleno palco, pulando, dançando, cantando e se contorcendo de maneira insinuante

No dia 23 de agosto, Madonna estará dançando, pulando e se contorcendo de maneira insinuante em Cardiff, País de Gales, a primeira parada de sua turnê com o novo show, Sticky & Sweet, que vai até o fim de novembro.

Será, a essa altura, uma senhora de 50 anos, idade que completa uma semana antes, no dia 16. Isto mesmo: Madonna, a loira de músculos definidos, magérrima e conservadíssima, é cinqüentona.

Sua figura é produto de uma dose excepcional de disciplina (e de exercícios), mas estar bem na sua idade não tem nada de incomum. Só no mundo dos artistas, onde imagem não é tudo mas chega perto, também acabam de dobrar o cabo dos 50 anos as atrizes Sharon Stone (em março) e Michelle Pfeiffer (em abril), beldades de parar o trânsito em qualquer tapete vermelho.

Ultrapassou a mesma barreira no ano passado a atriz Christiane Torloni, que na novela das 7 da Rede Globo, Beleza Pura, disputa com a própria filha o amor de Guilherme (Edson Celulari, 50 em março).

Como comprovam as contas do dermatologista, da academia e da farmácia, as mulheres precisam se dedicar com afinco à missão de estar bem na metade da vida. Homens, um pouco menos, para a eterna inveja delas.

Como cabelo grisalho e rugas discretas nunca foram impedimento para o sucesso social masculino, permanecem galãs apesar (ou por causa) da idade madura os irresistíveis Pierce Brosnan, um poço de charme aos 55, Richard Gere, inalterável jeitinho carente aos 58, e José Mayer, que, aos 59 e longe de sua melhor forma (por força do papel, ressalte-se), anda aos beijos com Juliana Paes em A Favorita, folhetim das 8 da Globo.

Com ou sem muito esforço, o fato é que a população de meia-idade (termo, por sinal, cada vez mais impopular) envelhece (mais impopular ainda) com muito menos marcas, internas e externas, do que seus pais.

Reginaldo Teixeira
Lalo Yasky/Wireimage/Getty Image




Galã em qualquer situação: Mayer, 59, faz papel de hippie desleixado. Mesmo assim, beija Juliana Paes Quanto mais velho, melhor: Gere, 58, rugas e cabelo branco. E as mulheres ainda querem pôr no colo

Cinqüentões hoje adotam hábitos alimentares mais saudáveis (quem é do grupo e não usa adoçante, inclusive na caipirinha, levante a mão) e põem o corpo para trabalhar, em academias e em treinos de corrida.

"A turma na faixa dos 50 anos foi a que mais cresceu nas nossas escolas. Em 1993, essas pessoas representavam menos de 4% do total. Hoje são 13%", diz Richard Bilton, presidente da Companhia Athletica, a maior rede de academias do Brasil.

Ao cuidarem da forma, os atletas maduros incrementam sua vida social. Em outras palavras: treino físico também é badalação. A corrida é seguida de jantar com os amigos – quando não significa uma viagem em grupo.

Danilo Borges
A vaidade compensa: Christiane, 51, disputa o mesmo homem com a filha (na novela). Deve ganhar

Lailson Santos

Arvorismo nas horas vagas: Flor, 53, e Silva, 55, namoraram, se separaram, se reencontraram, voltaram a namorar, foram morar juntos e vão se casar. "Quero ter saúde para curtir tudo o que pudermos por mais trinta, quarenta anos", diz ela

"Minha mulher não quer saber de correr, mas adora me acompanhar nas viagens", diz o executivo gaúcho Paulo Tonding, 54 anos, corredor há quatro. Tonding aderiu a esse esporte por recomendação médica – era hipertenso e tinha colesterol alto.

"De cada dez pessoas com mais de 50 que nos procuram, oito foram aconselhadas pelo médico a perder peso e praticar atividade física", observa o preparador físico Mario Sergio Andrade Silva, dono da Run&Fun, de São Paulo, onde 11% dos alunos estão nessa faixa de idade.

"Eles são os mais dedicados, porque sabem o que querem", diz Andrade Silva. Tonding, por exemplo, quer acumular medalhas de participação: já tem 83, entre elas as de cinco meias maratonas e as de três maratonas inteiras.

No momento, prepara-se para a maratona de Nova York, em novembro, para onde embarca com a mulher, Jussara, o filho, a filha e namorados. "Eles me aplaudem na chegada e eu ofereço a eles uma semana de turismo", diz.

Inevitavelmente, a boa disposição aos 50 anos produz ondas gigantes no mar dos relacionamentos, como comprovam a explosão de casamentos (mais 113% eles, mais 131% elas) e a de separações (mais 55% no total) nos últimos dez anos (veja o quadro). "É uma mudança que acompanha o aumento da expectativa de vida", diz a psiquiatra Carmita Abdo, da Universidade de São Paulo.

Carmita publicou no ano passado os resultados de uma pesquisa realizada com 10 161 pessoas com idade média de 52 anos. Pois 96,8% dos homens e 77,6% das mulheres se disseram sexualmente ativos nos doze meses anteriores. "Como um cinqüentão não aparenta a idade, nem se sente velho, sua vida afetiva está em aberto.

Ele precisa reinventar continuamente um casamento que ainda vai durar décadas, ou buscar novos caminhos", afirma a psiquiatra. Entre as mulheres, as mudanças são mais notáveis. "Elas estão mais confiantes e confortáveis.

A grande novidade está na palavra ‘opção’. Hoje as mulheres de 50 podem escolher o que querem fazer", diz a psicóloga americana Nancy Etcoff, professora da Universidade Harvard, que coordenou uma pesquisa entre quase 1 500 mulheres de 50 a 64 anos em nove países, inclusive o Brasil, encomendada pela Dove, marca de produtos de higiene e beleza, para identificar a imagem que elas têm de si mesmas. Conclusão: a imagem é positiva, embora morram de medo de engordar.

E elas juram que têm orgulho da idade (veja o quadro).

Lailson Santos
Arvorismo nas horas vagas: Flor, 53, e Silva, 55, namoraram, se separaram, se reencontraram, voltaram a namorar, foram morar juntos e vão se casar. "Quero ter saúde para curtir tudo o que pudermos por mais trinta, quarenta anos", diz ela

Boa forma, boa viagem:

Tonding, 54, treina corrida, coleciona medalhas e se prepara para a maratona de Nova York, para onde vai com a família toda. "Eles me aplaudem na chegada e eu ofereço a eles uma semana de turismo", diz

Exemplo da disposição para encarar mudanças radicais, a paulistana Flor Mascarenhas, maquiadora de filmes publicitários, 53 anos, de bem com a idade ("Não ando mais de minissaia, mas também não me escondo num tailleur"), reencontrou há quatro anos um namorado da adolescência, o analista de sistemas Antônio Carlos da Silva, 55 – ela, sozinha, ele enredado num casamento malsucedido.

Silva se separou, foram morar juntos e neste ano, pela primeira vez, Flor vai se casar no papel. "Casar marcará esse reinício de vida", resume Silva, que com a mulher pratica mergulho e arvorismo nos fins de semana.

"Quero ter saúde para curtir tudo o que pudermos por mais trinta, quarenta anos", diz ela. E assim, pouco a pouco, o caminho já andado se transforma em alvorada de uma longa e profícua segunda metade da vida.




Paulo Moreira Leite e Murilo Ramos

A luta de Meirelles contra a nova inflação

Diante de um cenário global turbulento, o Brasil enfrenta o desafio de conter a alta dos preços sem comprometer as conquistas recentes da economia. Para isso, o BC deverá subir o juro. Mas será que o resto do governo fará sua parte?

Meirelles em seu gabinete, em Brasília. Na prateleira, o artigo de um admirador que o chamou de heróiNo 20º andar do Edifício do Banco Central, onde fica o gabinete do engenheiro Henrique Meirelles, presidente do BC, avista-se uma das mais belas paisagens de Brasília. O cenário combina a arquitetura modernista da cidade com a vegetação original do Cerrado brasileiro – sob um céu de azul magnífico.

Numa das estantes da sala de reuniões, uma pequena moldura guardou para a eternidade a carta de um admirador. O texto é um legítimo troféu de guerra. Mencionando as críticas que a CUT, o PT, o MST e toda a sopa de letras da base do governo fizeram a Henrique Meirelles desde sua posse no Banco Central, um cidadão comum lembrou a contínua prosperidade alcançada pela economia brasileira nos últimos anos para fazer uma confissão.

“Estou perplexo”, escreveu, em agosto de 2007. “Gênio ou louco? Em qualquer dessas opções, (Henrique Meirelles) é o herói da gestão Lula”.

Comandante da taxa de juro, a mais poderosa e rápida arma que o capitalismo inventou para controlar a alta de preços no curto prazo, nos últimos três meses Henrique Meirelles foi colocado diante da primeira ameaça grave que a economia globalizada oferece ao Brasil desde a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Planalto, em janeiro de 2003.

Encerrando uma temporada de ventos favoráveis, mercado em alta e elevação do poder de consumo, a economia mundial enfrenta uma mudança ampla e radical, que já produz reflexos no Brasil.

A alta dos preços preocupa a dona de casa, os assalariados de olho nos empregos e os empresários ocupados em preservar seus investimentos. Nesse ambiente novo e imprevisível, Meirelles tem a missão prioritária de proteger o dinheiro dos brasileiros e impedir o retorno da inflação – mas sem destruir as conquistas recentes da economia.

Num esforço para encarar um desafio que poderá definir o destino do governo Lula em 2010, é possível acompanhar a agenda de Meirelles pelos retratos em seu gabinete no BC. Perto de uma janela, avistam-se fotos da festa junina de 2007, na Granja do Torto. Numa delas, Meirelles dança quadrilha com a primeira-dama Marisa.

Noutra, o presidente Lula, Meirelles e as respectivas mulheres estão sentados num sofá. Inútil perguntar por imagens semelhantes da festa junina de 2008. Não há. Meirelles estava em Lucerna, na Suíça, participando de um seminário sobre as perspectivas cada vez mais ásperas da economia internacional.

"É viável que o Brasil possa costear essa onda. Mas terá de trabalhar" - Paulo Guedes, economista

São encontros demorados e informais, em que os mandarins da globalização trocam impressões, fazem confidências – e se reúnem em momentos de preocupação e perplexidade. Disciplinado e correto, Meirelles não dá entrevistas nem faz revelações sobre tais eventos.

Um dos personagens mais curiosos nessas ocasiões costuma ser o presidente do banco central da Arábia Saudita. Há dois anos ele não consegue fazer uma previsão acertada sobre o preço do oxigênio negro que garante a vida de todos os habitantes de seus país.

Suas estimativas sempre ficam abaixo da realidade. Isso dá uma idéia das incertezas que envolvem o petróleo e afetam desde o transporte de pessoas e mercadorias até a produção de plástico, a indústria e os fertilizantes.

De uns tempos para cá, essas conversas têm sido cada vez mais preocupantes, em relatos que acumulam sinais de turbulência, insegurança e risco em vários pontos do planeta. O número de países com inflação na casa de dois dígitos já não é desprezível.

São 53 nações, que precisam alimentar, abrigar e dar emprego a 3 bilhões de seres humanos. Envolvida por um pântano de créditos artificiais e balanços de ficção, a economia americana arrasta-se como um animal ferido e desorientado, incapaz de emitir sinais seguros de recuperação.

Estimulado pelo apetite dos países asiáticos – a começar pela China – e também pelos programas de etanol e bioenergia dos países desenvolvidos, o preço dos alimentos enfrenta uma situação de superaquecimento que o professor Fernando Homem de Melo, da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo, define como “a maior alta de preços da história do capitalismo”.

"Aqui o problema é de política fiscal. Há tempos esse cenário se desenha" - Gustavo Franco, ex-presidente

do BC“A inflação é um problema que vai concentrar as atenções nos próximos 18 meses em todo o mundo”, diz Paulo Leme, do Goldman Sachs, um dos maiores bancos de investimento do mundo.

É bom entender que, na pura matemática, o Brasil está longe de constituir uma pré-catástrofe. Pelos números atuais, a inflação deverá chegar ao fim do ano no patamar de 6,5% – número ainda dentro da meta fixada pelo Conselho Monetário Nacional.

A economia cresce na faixa de 5%, um motivo de alegria geral. O problema é o que se vê nas prateleiras de supermercados. Ali, a dança de preços lembra uma situação que o país imaginava pertencer às paginas dos livros de História (leia a reportagem).

Em Natal, no Rio Grande do Norte, a cesta básica já subiu 51,82% em um ano. Em Belo Horizonte, 42,34%. No Rio de Janeiro, 36,25%, e em São Paulo, 30,83%. Só para ter uma idéia do significado desses números.

Um dos orgulhos do atual governo, o salário mínimo, está fixado em R$ 415, patamar mais alto desde sua criação, por Getúlio Vargas. Em 1o de maio, a elevação foi de 9,21% – ou menos de um terço do aumento da cesta básica em São Paulo, menos de um quinto do salto ocorrido em Natal.

A alta dos alimentos não tem origem na economia brasileira. O país produz quase toda a comida que consome, mas a alta no mercado internacional afeta o Brasil do mesmo jeito – pois os preços da exportação passam a ser mais vantajosos, reduzindo a oferta no mercado interno.

“Nesse cenário, é natural que os grandes produtores prefiram exportar para quem paga melhor. E os preços aqui sobem junto”, afirma Roberto Dias, gerente do supermercado Futurama, loja de Pinheiros.


05 de julho de 2008
N° 15653 - Nilson Souza


A máquina do apocalipse

Li uma reportagem sobre o acelerador de partículas que os cientistas pretendem acionar na Suíça antes do final do ano e me veio à cabeça este verso de Jorge Drexler, que nos próximos dias se apresentará em Porto Alegre:

"No somos más/ que una gota de luz,/ una estrella fugaz,/ una chispa, tan solo,/ em la edad del cielo..."

Somos mesmo quase nada diante da grandiosidade do universo, mas somos bem pretensiosos. Agora mesmo, vamos tentar reproduzir na experiência científica referida o momento da criação do mundo, por meio do experimento mais ousado da história da física.

A idéia é recriar, num gigantesco equipamento enterrado no solo europeu, o badalado Big Bang - a explosão inicial que a ciência identifica como origem de tudo o que existe, em contraposição ao criacionismo religioso.

O que buscam os cientistas com o tal acelerador? Um troço inimaginável para qualquer cérebro normal. Uma coisa ínfima conhecida pelos físicos como "Bóson de Higgs", que seria a partícula original da transformação de energia em massa.

Segundo li, o tal bóson, se aparecer, não durará mais do que algumas frações de segundo. Mas será o suficiente para comprovar a teoria científica da criação explosiva do mundo. Os especialistas em átomos estão bem excitados.

Mas já apareceram alguns agourentos para dizer que pode dar tudo errado, que o tal acelerador tende a criar um buraco negro capaz de engolir tudo o que já foi criado.

Ou seja: uma vez acionada a máquina do começo do mundo, produziria o seu fim, seríamos todos sugados para a invisibilidade eterna, levando conosco o planeta inteiro, casas, automóveis, cidades, continentes, a Lua, as estrelas, a galáxia inteira.

Dizem os especialistas que os tais buracos são terríveis e insaciáveis, concentram tamanha força gravitacional que nem a luz lhes escapa. Ou seja, até o final do ano poderemos todos ser condenados a viver para sempre na escuridão.

Vá entender uma maluquice dessas!

Prefiro a teoria romântica de Jorge Drexler. Não somos mais que uma piada de Deus, diz o inspirado cantor uruguaio na sua bela canção Edad del Cielo. Ele certamente vai cantá-la no próximo dia 21, no Teatro do Bourbon Country.

Acho que devemos ir lá, antes que o acelerador do apocalipse seja acionado.

quinta-feira, 3 de julho de 2008



SOBRE A LEI SECA

É incrível como o brasileiro pode ser cínico e duvidar de coisas sagradas.

Por exemplo, da lei. Conheço gente que, embora apoiando a Lei Seca para quem vai dirigir, garante estar sentindo o cheiro de que ela não vai pegar.

É um cheiro de álcool. Há quem duvide até da idoneidade dos nossos policiais e jure que vai ter guarda fazendo plantão em porta de boate com uma pergunta na ponta do bafômetro: 'Com nota ou sem nota?'.

Os mais explícitos dirão, segundo essas más línguas, 'prefere pagar R$ 900 ou 50 pilas?'. Não creio que funcione assim. Deve ser mais sutil.

Esse pessoal cético acha que de noite todos os gatos são pardos e bêbados, o que facilitaria um entendimento com base no toma-lá-dá-cá ou no toma-lá-e-dá-aqui. Se bebeu, cara, tem que pagar.

Se a lei realmente for aplicada, pensem bem, todos os problemas do Estado estarão resolvidos. Basta colocar um fiscal na frente de cada bar, boate, restaurante e bordel. A coleta de dinheiro será extraordinária.

Além disso, não haverá mais desemprego. Será necessário um verdadeiro exército de controladores. Dizem que já funcionou em outros países. O princípio é bom.

Tem especialista afirmando que o importante não é o controle de cada motorista, mas a punição prevista em caso de acidentes graves. Em conseqüência, haverá um efeito dissuasivo, sem contar a possibilidade de punir realmente os infratores.

O problema, contudo, são os efeitos perversos: indústria da multa e corrupção. Dos males, sustentam alguns, o menor. É comum ouvir motoristas bradar contra a indústria da multa. Quando perguntados, porém, se cometeram as infrações, não têm como negar.
A vida, enfim, está ficando organizada.

O sujeito vai ao bar, mas não bebe nem fuma. No restaurante, come salada e evita alimentos gordurosos. Parece que o principal efeito da nova lei será o incentivo às festas em casa. Um retorno à família. Só que o anfitrião terá de aceitar que muitos convidados fiquem para dormir.

Claro que tudo isso é bom para os táxis. Os mais otimistas garantem que essa lei obrigará o Brasil a investir em metrôs. É o único jeito de transportar em segurança todos os bêbados de cada noite.

Outra hipótese é de uma influência sobre os casamentos, com o crescimento do número dos casais em que só um saberá dirigir.

Talvez, sem querer, o Brasil esteja descobrindo a solução para os engarrafamentos. Não, não dá para se entusiasmar, os engarrafamentos noturnos ainda são bastante raros.

Certos casais vão usar um sistema de rodízio. Um dia, bebe a mulher, no outro, bebe o marido.

No caso de um deles ser abstêmio, o outro terá mais chances de virar alcoólatra. Todos podem imaginar a cena: o marido bebendo todas, e a mulher, pacientemente, esperando para levá-lo para casa.

O contrário também pode ser imaginado. Difícil é crer que aconteça. Sem dúvida, essa lei vai contribuir para melhorar a parceria entre marido e mulher. Eu sou totalmente a favor dessa lei.

Já era a favor da proibição da venda de bebidas alcoólicas em estádios de futebol. Não tem outro jeito. Tenho todas as razões para ser favorável a esse tipo de legislação. Defendo a vida. Sem contar que não sei dirigir. Nem pretendo aprender.

Carro é um trambolho: tem o estacionamento, há sempre um ladrão de olho, taxas, tem de levar no mecânico, passa-se a vida trocando e pagando o carro. Pensando bem, a partir de agora, a vantagem de ter carro é não poder beber.

juremir@correiodopovo.com.br

Ainda que com chuva que seja uma excelente quinta-feira para todos nós.

sábado, 28 de junho de 2008



29 de junho de 2008
N° 15647 - Martha Medeiros


Compro, logo existo

Uma amiga acabou de chegar de Londres. Adorou, lógico. Mas ela disse que os preços estão um escândalo, uma exorbitância. Pensei: então é pra lá que eu vou.

Explico: eu também cheguei de viagem, estive em Buenos Aires, e os preços por lá estão igualmente um escândalo... de tão baixos! Algum problema nisso? Sim, há um problema nisso.

Óbvio que é sensacional ter transporte público barato (uma viagem de metrô está por cerca de R$ 0,60 e qualquer corrida de táxi dentro dos bairros mais procurados não custa mais do que R$ 5).

Nada como tomar um bom vinho sem ter vontade de chorar quando chega a conta, e comprar um casaco pra vida toda pagando três vezes menos o valor que pagaríamos aqui.

O problema? Já digo.

Quem gosta de viajar, mas gosta mesmo, aproveita seu tempo para caminhar pela cidade, apreciar prédios históricos, conhecer parques, entrar em livrarias, visitar museus e galerias de arte, vasculhar lojas de discos atrás de alguma novidade, jantar bem, ir a espetáculos e tomar um café com calma em algum lugar charmoso enquanto observa os transeuntes. Claro, fazer umas comprinhas também está no roteiro.

O problema, enfim: numa cidade com preços atraentes como Buenos Aires todo o resto (museus, shows, parques, cafés) fica para quando sobrar tempo - no caso de. O objetivo passa a ser comprar. Ir a todos os shoppings. Gastar até o último centavo, trazer tudo o que puder, abandonar-se à compulsão.

Eu, que estou longe de ser uma consumista crônica e me orgulho do meu comedimento, também fiquei impressionada com os preços argentinos. Uma pessoa controlada faz o quê?

Aproveita uma tarde para comprar o que precisa e segue seus dias curtindo o que a cidade tem a oferecer em termos culturais, ambientais, artísticos.

A questão é saber diferenciar o que se precisa e o que não se precisa, e se formos honestos, chegaremos à conclusão de que não precisamos nem da metade do que consumimos.

Eu gosto de bugigangas, e minhas compras em viagem quase sempre se restringem a artigos de papelaria, acessórios (pulseiras, echarpes) e algum artesanato, são os meus suvenires habituais, coisinhas coloridas e inventivas que me fazem lembrar da viagem pra sempre.

Mas se você entra em surto por causa de preço bom, vai encher três malas extras de coisas volumosas que, tudo bem, são baratas, mas que também são encontradas em Porto Alegre, e em Porto Alegre você nem olharia para elas, não importa quanto custassem.

Teve um momento em que me vi dentro de uma loja revirando cabides e me deu um estalo: o que estou fazendo aqui? Que ânsia é essa de "aproveitar" os preços?

Tenho que aproveitar a cidade, o meu tempo livre, a minha companhia, o meu olhar estrangeiro, a minha sede de informação, a minha curiosidade, e não me sobrecarregar de sacolas. É preciso estabelecer uma fronteira entre se apaixonar de verdade por um artigo e se apaixonar por comprar, simplesmente.

Da próxima vez, Londres. É perfeito. Olha-se algumas vitrinas, suspira-se e toca-se em frente até um dos arrebatadores parques da cidade para fazer um belo e barato piquenique.

Consumo consciente: Rui Spohr, preocupado em viabilizar projetos de inclusão social, colocou à venda uma camiseta confeccionada por ele onde se lê a frase: "A sofisticada originalidade do simples".

Quem comprar a camiseta, estará contribuindo para a Instituição Kinder, que presta atendimento educacional a crianças e adolescentes com deficiências múltiplas. Maiores informações no site http://estilistaruispohr.blogspot.com

Excelente domingo, um ótimo início de semana e um Feliz mês de julho.