sábado, 13 de abril de 2024


13/04/2024 - 09h00min
Claudia Tajes

Os pêssegos em calda sempre foram um doce sério

Eles fizeram parte dos almoços de família sempre que a minha mãe não estava inspirada para fazer a torta de bolacha dos domingos

O homem jovem, 40 e poucos anos, bonito, todo moderno em seus gostos culturais, sempre vestido com camisetas de bandas de rock – as mais clássicas ou as tão obscuras que só ele e mais meia dúzia de aficionados conhecem –, chegou ao churrasco dos amigos levando uma lata de pêssegos em calda e outra de creme de leite.

Pêssegos em calda com creme de leite.

Os convidados mais novinhos, muito provavelmente, jamais tinham visto uma lata daquelas fora das prateleiras do supermercado. E quase dá para apostar que nenhum havia parado no corredor das caldas de pêssegos, abacaxis, figos, goiabas, abóboras.

Que fique claro: não estou falando mal dos pêssegos em calda. Eles fizeram parte dos almoços de família sempre que a minha mãe não estava inspirada para fazer a torta de bolacha dos domingos. Mas então éramos crianças e os pêssegos em calda sempre foram um doce sério, não tinham o mesmo encanto do pudim, outra sobremesa que ela fazia bem.

A lata de pêssegos em calda me lembrou de outras coisas que eram parte da vida das famílias e que hoje amargam o ostracismo. Novamente: não que o pêssego em calda esteja arquivado, fabricantes e apreciadores, não me cancelem. Foi só que aquela lata me levou a uma viagem no tempo, e de repente me vi na casa dos meus pais, com tantos e diversos caprichos hoje desaparecidos.

A roupinha xadrez do liquidificador, que combinava com a roupinha do botijão de gás. O Fabrício Carpinejar escreveu que as famílias se transformaram na hora em que a mãe parou de vestir o botijão de gás.

Os conjuntinhos de privada. Uma capa sempre meio peluda que cobria a tampa do vaso sanitário e fazia par com o tapetinho peludo que tornava o ato de sentar ali mais reconfortante. O tal do conjuntinho acabava ficando meio nojento pela água que pingava da descarga e pela sua própria natureza, e de vez em quando era substituído por outro. O cheiro era o de um cachorro molhado eternamente deitado no banheiro.

O abajur de uísque. Esses dias vi um filme da diretora Lucia Murat sobre o golpe de 1964 e lá estava, na casa de uma das entrevistadas, o abajur de uísque JB, um clássico dos anos 1970. Quem não teve um não viveu um capítulo marcante da decoração da casa brasileira.

A TV ligada no programa Sílvio Santos da manhã até a noite. Tudo o que acontecia no domingo era em função do Programa Silvio Santos. Almoço na hora do Qual é a Música? – duas notas, Maestro Zezinho –, banho quando entrava algum quadro chato de competição entre estudantes, janta na mesa tão logo começava o Show de Calouros. Ninguém precisava de relógio no domingo, qualquer criança sabia que ia para a cama quando o Quem Quer Dinheiro? acabasse.

Depois, bem depois, veio o Fantástico e a terrível sensação de fim do mundo com aquela musiquinha da abertura anunciando que o domingo já era.

Para encurtar o caso, o churrasco dos amigos chegou ao fim, e a lata de pêssegos em calda se ofereceu para quem quisesse desbravar sabores de outros Carnavais. O creme de leite se mistura com a calda e ameniza a doçura, disse o homem da camiseta de banda, expert no assunto. E todos gostaram e repetiram até limpar a lata.

No próximo encontro com seus pais, os jovens presentes certamente contarão que naquele domingo, ao som de phonk, trap, hyperpop ou outra dessas modernidades, experimentaram uma sobremesa diferente, pêssegos em calda. Eles já ouviram falar?


13 DE ABRIL DE 2024
CARPINEJAR

De onde vem minha habilidade no futebol

Quem já me viu jogando futebol - sim, eu jogo bem, apesar da minha postura inofensiva e cômica de gafanhoto - sabe que evito cair. Não tombo com facilidade. Não rolo no chão. Posso levar peteleco no calcanhar, carrinho, trombada, voadora, e faço de tudo para me manter de pé. Cambaleio, porém jamais me entrego. Tento me segurar em corrimões imaginários ou nas costas dos meus adversários.

Eu mesmo me driblo, se for o caso. Prefiro seguir adiante a cavar uma falta ou um pênalti e parar o jogo. Minha resiliência partiu de um trauma, que me condicionou a jamais beijar o gramado na boca.

A quadra da escola em que estudei no Ensino Fundamental - Escola Municipal Imperatriz Leopoldina, no bairro Petrópolis - era simplesmente de piche e brita. Uma BR seria mais convidativa. Uma pista de aeroporto seria mais confortável.

As pedras saltavam do solo escuro, pequenas lâminas e facas refletindo o sol. Cair ali somente em último caso. Não fingia, não me dava ao luxo de fazer cera. Eu me desequilibrava, tonteava, e permanecia ereto, de queixo erguido, aos trancos e barrancos.

Tinha que sobreviver. Tinha noção do quanto custaria cada queda. Ficaria absolutamente esfolado, como presunto fatiado em guilhotina de açougue.

Você não se machucava, você se acidentava. Tão grave quanto cair de uma moto. As feridas terminavam absolutamente infeccionadas com o betume.

Havia a necessidade de limpar a pele com água oxigenada - e como ardia - e depois pincelar camadas de mercúrio-cromo - e como ardia. As sequelas continuavam doendo na hora de tomar o banho e de dormir.

Minha habilidade com a bola foi forjada a evitar aquela sensação da calça colando no corpo. Nenhum band-aid era capaz de cobrir os ferimentos. Ao me machucar, sofria para colocar ou tirar a roupa.

Isso quando o abrigo não rasgava por inteiro e vinha o suplício. Pois meus irmãos e eu contávamos com um par de abrigos para o ano, e os pais não compravam outro. Se estragávamos um deles em nossas peladas indevidas durante o recreio, a família mandava para a costureira com o propósito cafona de colocar remendo de couro.

Começava o bullying. Vivíamos vestidos para uma festa junina. Lembro que uma vez rasguei os fundilhos da calça descendo um barranco e, para minha surpresa, recebi de volta a peça com um remendo de couro no traseiro.

Eu entrava na escola já com uma sela embutida em mim. Diante da piada pronta, precisava ser, pelo menos, rápido como um cavalo nas notas, e nunca lento como um burro.

CARPINEJAR

13 DE ABRIL DE 2024
FLÁVIO TAVARES

MUDAR DE SEXO?

Existem posições que parecem conservadoras e atrasadas, mas que são um descobrimento positivo de algo que não vemos nem vislumbramos porque se esconde tal qual um ladrão noturno.

Isso é o que nos deixa o mais recente documento do papa Francisco, em que alerta sobre a "indignidade" das cirurgias de mudança de sexo e a "fluidez" de gênero. A "barriga de aluguel" torna-se também "mero meio subordinado ao ganho arbitrário ou desejo de outros" para quem carrega o bebê ou escolhe se submeter a isso livremente.

O documento é comparável à encíclica Laudato Sii, que nos fez conhecer o descaso com a defesa da vida do planeta e nos levou a identificar o perigo das mudanças climáticas.

Agora, o novo documento papal (preparado ao longo de cinco anos) qualifica o sexo de nascimento como "um presente irrevogável de Deus". De fato, trata-se de uma enciclopédia sobre a existência humana e, assim, critica com veemência também a exploração de pobres, mulheres, migrantes e pessoas vulneráveis.

"Toda intervenção de mudança de sexo corre o risco de ameaçar a dignidade única recebida pela pessoa desde o momento da concepção", adverte o documento. Faz ver ainda que todos aqueles que almejam "autodeterminação pessoal, como prescreve a teoria de gênero", arriscam-se a ceder "à tentação milenar de se fazerem Deus".

A posição do Papa me leva a recordar que só no reino vegetal existem hermafroditas, mas são plantas. É impossível encontrar um eucalipto que busque ser roseira ou vice-versa. Já pensaram se, no mundo animal, um sabiá buscasse virar canário? Cada um sabe cantar, mas cada qual tem um canto próprio e inconfundível que não imita nem se atrita com o outro.

Meses antes desse documento, o papa Francisco permitiu que os sacerdotes abençoassem a união de homossexuais e outros da chamada área LGBT+. O documento de agora pode ser só o início de uma verdadeira revolução na maior e mais influente confissão religiosa do mundo ocidental. É um novo aggiornamento do catolicismo, iniciado pelo papa João XXIII no final do século passado.

Jornalista e escritor - FLÁVIO TAVARES

13 DE ABRIL DE 2024
CONSELHO EDITORIAL

EDUCAÇÃO, INOVAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO

Os aspectos centrais da atividade jornalística estão relacionados com a busca da verdade, a transparência e o compartilhamento de valores globais fundamentais para a sociedade, como a paz, os direitos humanos e a liberdade. Ao definir suas bandeiras editoriais, as empresas de comunicação ao mesmo tempo refletem e pautam as discussões relevantes que ajudam a sociedade a se conhecer, a refletir criticamente sobre seu passado e a construir seu futuro. Emergem assim temas atuais como mudanças climáticas, energias renováveis, ESG, educação, inovação e desenvolvimento social.

Uma visão mais propositiva do papel do jornalismo profissional e de seu compromisso com a sociedade em que atua envolve uma dimensão pedagógica relevante. Sob um certo aspecto, significa uma busca constante de um novo jornalismo para uma sociedade em transformação para o tempo que vivemos. Para o nosso tempo.

E quanto mais se configura o mundo digital, em que as dimensões física, digital e social se confundem, mais importante é estarmos atentos aos vetores da transformação que vivemos. As redes sociais e as novas tecnologias, como inteligência artificial, terapias gênicas, ciência de dados e internet das coisas, não são elementos neutros ou passivos nos processos de comunicação e interação entre as pessoas. As novas tecnologias, em especial as deep techs, quanto mais pervasivas se tornam, mais influenciam e afetam nossas relações. E mais atentos devemos estar a elas.

Voltando ao tema da dimensão pedagógica do jornalismo profissional na busca da verdade com transparência, um bom exemplo envolve a discussão, tanto nacional como regional, da construção de planos e definição de estratégias de desenvolvimento. E a identificação das relações entre o desenvolvimento, a inovação e a educação. No tempo em que vivemos, desenvolvimento deve envolver sempre as perspectivas econômica, social, cultural e ambiental.

Quando falamos de inovação, globalmente aceita como um atributo essencial na busca de produtividade e de competitividade no mundo empresarial, devemos ter também em mente que ela (a inovação) sequer faz sentido se não se traduzir em impacto social e melhorias na qualidade de vida das pessoas ao longo do tempo.

A educação é em si o fator principal e preliminar para qualquer processo de desenvolvimento. Além de ser o mais eficaz processo de mobilidade e justiça social, a educação é fator crítico para o desempenho de uma economia e uma sociedade moderna. Uma educação inclusiva e de qualidade, que ofereça oportunidades para o pleno desenvolvimento das pessoas, seu preparo para a cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Todos os países do mundo que se desenvolveram de forma destacada a partir da revolução da tecnociência da metade do século 20, primeiro realizaram uma transformação na educação de seu povo. Somente depois definiram e implantaram planos nacionais de desenvolvimento, tendo a inovação como um dos pilares do processo. Não adianta a inovação ser uma prioridade sem ter a educação como o elemento central da estratégia de desenvolvimento.

Conectando novamente com o papel do jornalismo neste mundo cada vez mais complexo e com fontes de informações diversas e pouco confiáveis, os veículos de comunicação, ao darem espaço para discussões relevantes e atuais, como a do desenvolvimento, acabam atuando, também, como propulsores dessas transformações.


13 DE ABRIL DE 2024
OPINIÃO DA RBS

DILEMAS A PONDERAR

Há preocupações legítimas e boas razões elencadas por todos os envolvidos na controvérsia sobre a busca do Estado para elevar a arrecadação. De um lado, o Piratini quer assegurar um aumento de receitas que não ameace a manutenção de serviços básicos, salários em dia e a garantia de verbas para investimentos prometidos após perder recursos por uma decisão eleitoreira tomada em Brasília no período eleitoral.

No outro polo, empresários rejeitam qualquer aumento de carga por princípios e pelo temor de perda de competitividade das empresas gaúchas. Na posição alternativa, entidades ligadas especialmente ao agronegócio sugeriram a elevação da alíquota do modal de ICMS de 17% para 19% como opção ao corte de incentivos fiscais, o plano B do governo. Algo como um mal menor. 

O mais recente lance foi o envio pelo governo gaúcho de novo projeto de lei à Assembleia nos moldes propostos por esta última corrente empresarial, formada por setores que seriam os mais atingidos pelo fim abrupto de benefícios tributários. A principal diferença em relação à ideia inicial do Piratini, que sequer foi a votação em dezembro do ano passado pela alta resistência, é que a alíquota subiria para 19%, e não 19,5%.

Como o projeto de lei foi protocolado em regime de urgência, deve ser votado no próximo dia 14 de maio pelos deputados. As próximas semanas prometem ser de intensas negociações e pressões. Espera-se que exista, de parte a parte, disposição para preservar o espaço de diálogo e abertura para transigir. Parece claro que o governador Eduardo Leite está disposto a enfrentar o desgaste e, de alguma forma, obter o aumento de receita que diz necessitar. Assim, está posto o desafio de construir uma saída negociada, que contemple, da forma possível, as necessidades do Estado, sem que as atividades produtivas, geradoras de emprego e renda, sejam sufocadas.

Não há empresário que goste de pagar mais tributos ou cidadão que queira ver o preço dos produtos e serviços consumidos subir. Ainda assim, a vida em sociedade exige um poder público que consiga cumprir seus compromissos com a população, em especial os essenciais, como saúde, educação e segurança. Para isso, também é basilar que busque eficiência nas despesas para que se constate retorno dos impostos recolhidos.

Se é verdade que a maioria dos demais Estados do país fez o mesmo movimento de elevar o ICMS, também é fato que a vizinha Santa Catarina optou por permanecer com a alíquota de 17%. Pela proximidade, é a unidade da federação que mais compete com os gaúchos por investimentos. E o Rio Grande do Sul, pela posição geográfica, tem desvantagens logísticas que poderiam ser diminuídas pela manutenção do ICMS no patamar atual. Dilemas não faltam.

Ao fim, a definição sairá do parlamento, casa democrática onde estão representados todos os segmentos da sociedade. Aguarda-se ponderação e responsabilidade para se encontrar o desfecho menos traumático. Em caso de elevação da alíquota modal, é possível até que exista margem para negociar um patamar inferior a 19%. O tema da elevação da carga tributária se arrasta desde novembro do ano passado e chega a hora de uma definição. Por outro lado, deve ser cobrado do Estado máxima transparência em relação ao quadro e às perspectivas para as finanças públicas.

OPINIÃO DA RBS


13 DE ABRIL DE 2024
PRIMEIRO TRIMESTRE

Estado teve ao menos seis estupros por dia

Nos três primeiros meses deste ano, em média, seis mulheres procuraram a polícia por dia no RS para relatar um caso de estupro. Ou seja, um registro do crime foi realizado a cada quatro horas. Foram 559 ocorrências entre janeiro e março. No comparativo com o mesmo período de 2023, quando foram 739, houve redução de 24,3%. Os indicadores de violência contra a mulher são da Secretaria da Segurança Pública.

A média é formada só pelos casos que chegam à polícia. No entanto, boa parte dos delitos cometidos contra mulheres por razões de gênero é impactado pela subnotificação. Nos casos de crimes sexuais, isso não é diferente.

- Estima-se que só 10% dos casos (de violência contra a mulher) são notificados. Os crimes sexuais existem numa quantidade muito maior do que a gente imagina. As mulheres são estupradas dentro dos relacionamentos, e nem sequer sabem que é um estupro - alerta a promotora de Justiça do Centro de Apoio Operacional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher, Ivana Battaglin.

Provas

Fatores como vergonha, medo, culpa e receio de ser vítima de violência institucional são apontados como aspectos que acabam influenciando as mulheres a não buscarem ajuda.

Nos casos de estupro, segundo a delegada Ana Luiza Caruso, que responde pela 1ª Delegacia da Mulher de Porto Alegre, quanto mais cedo a vítima pedir ajuda, maior a chance de coletar indícios para identificar e punir o autor. A maioria dos casos ocorre sem qualquer testemunha, fazendo com que a prova pericial seja ainda mais relevante.

- Depois que o fato já ocorreu, solicitamos que as vítimas façam uma coisa que muitas vezes é difícil, que é não tomar banho. Após um caso de estupro, a mulher quer retirar qualquer vestígio do corpo dela. Mas esse material genético do autor é muito importante como prova. A palavra da vítima vale muito, mas quanto mais elementos de prova conseguirmos, melhor - diz Ana Luiza.

LETICIA MENDES

13 DE ABRIL DE 2024
CARTA DA EDITORA

CARTA DA EDITORA A cobertura do Brasileirão

A dupla Gre-Nal inicia neste final de semana a participação no Brasileirão. O Inter, instável na Sul-Americana (dois pontos somados em seis disputados), estreia com o desafio de quebrar um jejum de 45 anos sem o título da competição nacional. O Grêmio, que preocupa a torcida na Libertadores (soma zero ponto em seis disputados), almeja encerrar a seca de 28 anos sem o título. Juventude, o terceiro representante gaúcho na Série A, tem outras pretensões, como seus próprios dirigentes dizem. O objetivo é a permanência na elite do futebol. Leitores, ouvintes e espectadores que acompanham os produtos da Redação Integrada terão ampla cobertura da competição, em diferentes plataformas.

O jornal que você tem em mãos, e que pode também ser acessado em GZH, tem um guia de oito páginas com todas as informações sobre os 20 clubes envolvidos na competição. O Guia do Brasileirão revela que o campeonato de 2024 será o mais "estrangeiro" da história. Nunca, desde que foi criado com este nome, ou desde 1959 com os nomes de Taça Brasil e Robertão, houve um número tão grande de jogadores nascidos fora do país.

- É um conteúdo que já consta no calendário de Zero Hora. Sempre no começo do campeonato, trazemos um diagnóstico de cada um dos adversários da dupla Gre-Nal na competição. Levamos o leitor para mais perto das facilidades e adversidades que nossos times vão encarar até dezembro - diz o narrador e comunicador Gustavo Manhago, responsável pelo guia.

Em GZH, além dos gols e dos melhores momentos das partidas, teremos o especial "palpitômetro": projeção da equipe de Esporte sobre times que "lutam por título", "disputam vaga na Libertadores", "tentarão vaga na Sul-Americana" e "lutarão contra o rebaixamento".

Na Gaúcha, será mantida a tradição de narrar nos estádios todos os 38 jogos de Inter e Grêmio. Nos dois turnos, as equipes estarão em 11 cidades que hospedam clubes da Série A. Repórteres, técnicos e narradores percorrerão mais de 88 mil quilômetros (o equivalente a duas voltas ao redor do mundo) para narrar os jogos da Dupla e contar os bastidores.

- A riqueza de detalhes sobre o ambiente do jogo, seja ele no estádio ou na concentração, só é possível em função da presença da Gaúcha junto aos times - avalia Leonardo Acosta, um dos coordenadores do Esporte da Gaúcha.

E por falar em coberturas esportivas, em breve falaremos de Olimpíadas.

DIONE KUHN

sábado, 6 de abril de 2024



06 DE ABRIL DE 2024
MARTHA MEDEIROS

Caça aos avulsos

Escutei de uma funcionária de uma indústria automotiva. "Depois de me separar, fiquei mais de 10 anos sem namorar. Minhas amigas não se conformavam, viviam perguntando: e aí, onde estão os crushs, vai ficar sozinha para sempre? Como insistiam nisso. Não aceitavam que eu estivesse legal comigo mesma. Até que conheci um cara e a gente começou a se relacionar. Parecia que eu tinha ganhado na loteria. Elas diziam: agora sim! Você está muito melhor!! Como podiam saber se eu estava melhor?"

Elementar: as amigas estavam falando delas mesmas. Elas, sim, agora se sentiam melhores. Uma mulher solta no bando é sempre inquietante.

Estimular as solteiras a formarem um par pode ser um carinho, mas também é um sintoma do medo que a sociedade tem das pessoas avulsas, principalmente se forem mulheres. As solteiras desapegaram do conceito arcaico de que uma mulher só tem valor com um homem do lado. Elas não topam qualquer arranjo para ter alguém. 

A solitude deixou de ser um bicho papão e ter filhos não é a única saída para dar sentido à vida: elas se sentem preenchidas pelo trabalho, pelas viagens, pelos livros e pelos amigos, inclusive aqueles que tentam "salvá-las" de tanta independência. A estrutura social do casal ainda embute a ideia de adequação, enquadramento - duas pessoas com o destino entrelaçado parecem previsíveis, nenhum susto virá dali.

Já a mulher avulsa é um enigma. O que faz, do que se alimenta, com quem acasala? Ela pode estar na cidade hoje e amanhã embarcar para a Índia. Não mora com ninguém, não dá satisfações, troca de planos em dois minutos. Se não tem um namorado, talvez tenha vários. Virgem Santíssima, e se ela seduzir nossos maridos?

Case logo, criatura. Case para deixar de ser um risco aos nossos casamentos. Case para que você se vista de forma menos extravagante e engorde um pouco. Para que você não nos faça lembrar de como era boa a liberdade de ir e vir, e de como a vida era mais barata quando não tínhamos que sustentar uma família. 

Case logo e tire esse sorriso do rosto, não fique escancarando que é possível ser feliz sozinha. Case e vamos jantar a quatro numa cantina, porque mesa com três pessoas desequilibra a ordem social. Case e contribua para a conversa da turma com as queixas habituais, em vez de falar sobre filmes que não vimos, cursos que não fizemos e noites bem dormidas, sem ninguém roncando ao lado. Não nos irrite.

Parece assunto do século passado, mas ainda há quem não sossegue antes de apresentar um bom partido para a coitada da amiga solteira, aquela que finge que está tudo bem. É CLARO QUE ELA ESTÁ MENTINDO!! Calma, não grite. Evite o descontrole. Eu sei, é um stress essa gente que se faz de moderna.

MARTHA MEDEIROS

06 DE ABRIL DE 2024
CLAUDIA TAJES

Pêssegos em calda

O homem jovem, 40 e poucos anos, bonito, todo moderno em seus gostos culturais, sempre vestido com camisetas de bandas de rock - as mais clássicas ou as tão obscuras que só ele e mais meia dúzia de aficionados conhecem -, chegou ao churrasco dos amigos levando uma lata de pêssegos em calda e outra de creme de leite.

Pêssegos em calda com creme de leite.

Os convidados mais novinhos, muito provavelmente, jamais tinham visto uma lata daquelas fora das prateleiras do supermercado. E quase dá para apostar que nenhum havia parado no corredor das caldas de pêssegos, abacaxis, figos, goiabas, abóboras.

Que fique claro: não estou falando mal dos pêssegos em calda. Eles fizeram parte dos almoços de família sempre que a minha mãe não estava inspirada para fazer a torta de bolacha dos domingos. Mas então éramos crianças e os pêssegos em calda sempre foram um doce sério, não tinham o mesmo encanto do pudim, outra sobremesa que ela fazia bem.

A lata de pêssegos em calda me lembrou de outras coisas que eram parte da vida das famílias e que hoje amargam o ostracismo. Novamente: não que o pêssego em calda esteja arquivado, fabricantes e apreciadores, não me cancelem. Foi só que aquela lata me levou a uma viagem no tempo, e de repente me vi na casa dos meus pais, com tantos e diversos caprichos hoje desaparecidos.

A roupinha xadrez do liquidificador, que combinava com a roupinha do botijão de gás. O Fabrício Carpinejar escreveu que as famílias se transformaram na hora em que a mãe parou de vestir o botijão de gás.

Os conjuntinhos de privada. Uma capa sempre meio peluda que cobria a tampa do vaso sanitário e fazia par com o tapetinho peludo que tornava o ato de sentar ali mais reconfortante. O tal do conjuntinho acabava ficando meio nojento pela água que pingava da descarga e pela sua própria natureza, e de vez em quando era substituído por outro. O cheiro era o de um cachorro molhado eternamente deitado no banheiro.

O abajur de uísque. Esses dias vi um filme da diretora Lucia Murat sobre o golpe de 1964 e lá estava, na casa de uma das entrevistadas, o abajur de uísque JB, um clássico dos anos 1970. Quem não teve um não viveu um capítulo marcante da decoração da casa brasileira.

A TV ligada no programa Sílvio Santos da manhã até a noite. Tudo o que acontecia no domingo era em função do Programa Silvio Santos. Almoço na hora do Qual é a Música? - duas notas, Maestro Zezinho -, banho quando entrava algum quadro chato de competição entre estudantes, janta na mesa tão logo começava o Show de Calouros. Ninguém precisava de relógio no domingo, qualquer criança sabia que ia para a cama quando o Quem Quer Dinheiro? acabasse.

Depois, bem depois, veio o Fantástico e a terrível sensação de fim do mundo com aquela musiquinha da abertura anunciando que o domingo já era.

Para encurtar o caso, o churrasco dos amigos chegou ao fim, e a lata de pêssegos em calda se ofereceu para quem quisesse desbravar sabores de outros Carnavais. O creme de leite se mistura com a calda e ameniza a doçura, disse o homem da camiseta de banda, expert no assunto. E todos gostaram e repetiram até limpar a lata.

No próximo encontro com seus pais, os jovens presentes certamente contarão que naquele domingo, ao som de phonk, trap, hyperpop ou outra dessas modernidades, experimentaram uma sobremesa diferente, pêssegos em calda. Eles já ouviram falar?

CLAUDIA TAJES

06 DE ABRIL DE 2024
SARA BODOWSKY

EMOÇÕES COLORIDAS

Escrever à mão sempre foi terapêutico para mim. Sinto falta do acolhimento das texturas da papelaria, que acabou sendo deixada de lado aos poucos, por conta da facilidade do toque e das teclas no ambiente digital.

Mas, aos poucos, estou retomando a escrita, os cadernos e as canetas coloridas, inspirada pela história da jornalista Sabrina Passos. Profissional requisitada no mercado de transformação digital, com passagem pelas principais empresas do mundo, ela começou, durante a pandemia, a misturar em aquarelas as emoções da maternidade recente com as incertezas do período.

Sá Passos, como assina suas coloridas obras, foi se apaixonando, em suas próprias palavras, "pela falta de controle da tinta com a água, pela beleza da imperfeição quase precisa da aquarela". Seus quadros abstratos e cheios de cores ganharam o Brasil e, de presentes para os amigos, hoje são encomendas pelo mundo - já chegaram até os Estados Unidos e a Europa. Sá, inquieta e criativa, criou também uma coleção de papelaria com cadernos, blocos, agendas, planners e diários.

Ela segue trabalhando na área de transformação digital (é diretora de uma consultoria americana), mas hoje equilibra o mundo virtual com um novo mundo colorido, cheio de amor e carinho.

Para conhecer mais do trabalho da jornalista e artista, acesse o Instagram @bysapassos ou @sapassos. Contatos e encomendas também podem ser feitas no e-mail bysapassos@gmail.com.

FANTASPOA

Apaixonados pelo cinema fantástico, anotem aí: o imperdível Fantaspoa, Festival Internacional de Cinema Fantástico de Porto Alegre, começa dia 10 e vai até 28 de abril, aqui na Capital.

A 20ª edição do evento traz 114 longas-metragens, 22 deles em estreia mundial, e 123 curtas-metragens, totalizando 237 obras participantes, tornando esta edição do festival a mais grandiosa de sua história até o momento. O festival apresenta uma seleção de filmes em exibição especial, incluindo o recente sucesso do cinema argentino O Mal Que Nos Habita.

No site fantaspoa.com é possível conferir a programação e as salas participantes.

NOITE FRANCESA

O delicioso restaurante Catherine Gramado recebe no dia 12 de abril a chef Janete Borges (foto), de Florianópolis (SC), para um menu a quatro mãos com o anfitrião da casa, o chef gaúcho Nícolas Heckel.

O evento Noites Francesas reúne arte e gastronomia, terá menu harmonizado e atrações musicais. A proposta é o encontro do mar com a montanha - no menu de cinco tempos, os protagonistas serão peixes, camarões, vieiras, técnicas de maturação e conservas de frutos do mar, entre outras especialidades da chef Janete.

Janete Borges trabalhou com o chef Alex Atala e com o chef mergulhador e pesquisador Narbal Correa, em uma cozinha pé na areia, tradicional em produtos de caça submarina.

Reservas e informações podem ser feitas no site catherinegramado.com.br, no perfil do Instagram @catherinegramado ou pelo telefone (54) 2136-5252. O Catherine fica na Rua Emílio Sorgetz, 200, no centro de Gramado.

SARA BODOWSKY


06 DE ABRIL DE 2024
LEANDRO KARNAL

Tocou o celular. Seis da manhã, como sempre. O som selecionado era de harpa. Parecia menos estridente do que os outros. Ele abriu os olhos e fechou novamente. Já havia luz que invadia, pelas frestas, o quarto. Pressionou a tela para adiar o alarme.

Fazia frio; o trabalho estressante. O dinheiro não era ruim; sentia apenas o tédio de quase 20 anos no mesmo escritório. Até as novidades... repetitivas. Meio da semana, longe da sexta redentora e dos feriados para respirar. Era um dia comum, e ele pensou em não ir. Sim, poderia alegar doença, mas queimaria um bônus de confiança. E se ficasse doente de verdade na semana seguinte? O trabalho não parecia ruim, unicamente necessário. E se pedisse demissão e fosse empreender? Sabia dos riscos. Isso injetaria o ânimo que não mais sentia. Mas... e se desse errado? Ele nunca empreendeu e já tinha 45 anos.

Recomeçar? Os livros diziam que isso seria ótimo. A vida real desafiava o entusiasmo dos textos. E se jogasse tudo para o alto? Os filhos já maiores e encaminhados. Havia riscos de ficar avô nos próximos anos. Venderia o apartamento, um dos dois carros e sairia com a esposa em uma viagem de volta ao mundo? Mas... a Terra era redonda. Toda "volta ao mundo" acabaria retornando. Viajaria com sua mulher?

A esposa estava despertando também. Vivia esse casamento há 24 anos. Ela havia informado que fariam bodas de opala dali a três semanas. O que será uma opala? Lembrava-se do carro do pai, porém a pedra? O que seria da vida dele se não tivesse pedido Ana em casamento? E... se ele se separasse? Não estavam mal, apenas... era como o emprego: uma sucessão de dias repetitivos. Imagine se os colegas de faculdade tivessem feito a bizarra profecia: "Você vai casar-se com ela. Farão bodas de opala!". Que cor era o carro do pai mesmo? E se ele se separasse? Não havia ninguém. Em toda crise matrimonial, pensava na Clarinha, do Ensino Médio. Namoraram dois anos. Ele foi completamente apaixonado. E se tivesse casado com a Clarinha? Teria chegado a bodas de opala?

Tocou o segundo alarme. 6h05min. O limite! Tinha de levantar-se, tomar banho, passear com o labrador, beber café e sair. Ana acordou e, com um sorriso, beijou-o. Havia no zap uma mensagem de trabalho. A rotina seguia. Tudo era funcional. Ele levava uma vida boa. O mundo só pode ser refeito entre dois toques de despertar. As coisas só pesavam entre 6h e 6h05min, porque era a fronteira da decisão do dia à frente. O resto era fumaça e esperança.

LEANDRO KARNAL

06 DE ABRIL DE 2024
RANCISCO MARSHALL

DESMEMÓRIA

Embora aplique-se perfeitamente a muitos casos romanos e também egípcios, sumérios e gregos, o termo damnatio memoriae é invenção moderna, cunhado em 1689, em uma dissertação tedesca; significa condenação da memória e indica a remoção de nomes e imagens de referências oficiais, com a raspagem de monumentos ou retoques em pinturas e fotografias. 

O caso mais célebre é o do tondo (pintura em painel circular) da família Severo, em que aparecem os quatro membros desta família imperial romana, todos com trajes suntuosos, coroas e cetros: na parte superior, o imperador, Septímio, ladeado pela esposa, Julia Domna, sobre os retratos dos dois filhos do casal, Geta e Caracalla, um dos quais com o rosto removido por raspagem. Pintado em têmpera sobre madeira em Fayum, no Egito, e datado de c. 200 d.C., o retrato hoje está em Berlim. 

O espaço do rosto removido foi besuntado com excrementos, sinal adicional da cólera dessa condenação. Provavelmente trata-se de Geta, cujo nome foi removido também de vários monumentos, após ser assassinado pela guarda petroriana do irmão Caracalla, nos braços de sua mãe Julia Domna, em 26 de dezembro de 211 d.C..

Eis poderosa ironia da história: essa remoção, como ocorre em casos similares, em vez de eliminar, termina por reforçar a memória e agravar o contexto, em favor da vítima e com denúncia e vergonha de quem ordenou a eliminação da memória. No Brasil, há o caso célebre da ordem para a queima de todos os registros cartoriais de compra e venda de escravos, assinada pelo então ministro da Fazenda, Ruy Barbosa, em 14 de dezembro de 1890, e consumada no Rio de Janeiro em 13 de maio de 1891. 

Essa nódoa na fama da Águia de Haia visava a dificultar ou impedir a reivindicação de indenizações por senhores e por escravos, e foi então denunciada como iconoclastia, com a destruição de documentos históricos preciosos. O caso mais pitoresco parece ser o da sistemática remoção de opositores em fotos da União Soviética, por Stalin. Os personagens deletados ganharam fama; cresceu a memória, quando esperava-se eliminá-la.

A história trata dos documentos e de sua interpretação consistente, ao passo que a memória tem teor mental e cultural, opera por imagens, oscila e estabelece pontos de referência e recuperação (Halbwachs, 1925). Quando conciliadas, história e memória podem ajustar mundos objetivos e subjetivos, criar identidades e consciências, promover a experiência no tempo e fomentar a sensatez no trato político. Eis o ponto em que o passado brasileiro ainda pede resgate, conhecimento e reparo. 

A memória reclama e a história exige que se rememorem e se evidenciem os horrores e autorias da ditadura, vividos de 1964 a 1985, e não haverá covardia oficial, contra este dever cívico, que possa suprimir a força e a verdade desse processo social. Nossa dívida histórica inclui a inaceitável impunidade de todos os delinquentes que cometeram crimes contra a humanidade, e os reparos às muitas vítimas, sobretudo a dignidade da pátria ainda ultrajada pela violência de golpistas e usurpadores. Ditadura nunca mais, estamos atentos.

FRANCISCO MARSHALL

06 DE ABRIL DE 2024
CRISTINA BONORINO

NÃO É SÓ LÁ

Viajando por esse mundão a gente conversa com as pessoas e pergunta o que elas fazem, e elas perguntam da gente. Sempre que falo que trabalho com câncer, alguém traz uma pergunta que é variação de: "As empresas farmacêuticas já sabem a cura do câncer né? Elas devem ter vacina para isso, mas não revelam...".

A fantasia da conspiração é uma tentação em que a gente invariavelmente cai. Minha resposta sempre foi que, se elas tivessem essa vacina, estariam vendendo - e seria bem caro. E hoje, realmente, já existem vacinas para diferentes tumores, que funcionam mais como uma terapia do que uma vacina convencional.

Falando nisso, hoje, as vacinas em testes mais adiantados são as de mRNA - na verdade, foram a origem e inspiração dos imunizantes desse tipo usados na pandemia da covid-19. Foi o sucesso na pandemia que revitalizou essa área da indústria farmacêutica. E uma das vacinas em fase de aprovação é, inclusive, da Moderna, que produziu um dos imunizantes para o SARS-CoV-2. E como funcionam essas vacinas? 

Os tumores são células com uma alta taxa de mutações. As vacinas usam essas mutações como um código de barras para treinar as células do sistema imune a ler apenas as células que as apresentam. E a vantagem do sistema imune é que ele tem memória, então elas protegem de recidivas.

Na prática, ao menos por enquanto, essas vacinas não funcionarão sozinhas, mas em combinação com outras terapias que já existem. Por exemplo, os anticorpos que são usados atualmente que reativam a resposta imune contra o tumor - que deram o Prêmio Nobel em 2018 aos seus criadores. Ou as células T, que são transformadas com um receptor que chamamos quimérico, porque liga a célula imune no tumor e promove a destruição das células tumorais. 

Ou anticorpos sintéticos que fazem isso, os BiTEs. Todas essas alternativas estão sendo intensamente exploradas pela indústria farmacêutica. Que vende isso a preços bem altos. Lá fora e aqui. E a maioria das pessoas, então, acha que isso é inacessível - e aí fomentam-se mais teorias da conspiração.

Não é só lá fora que se desenvolve isso. No Brasil, temos cientistas focados em desenvolver alternativas para essas terapias - pessoas com o trabalho reconhecido no mundo todo. Na USP, vacinas anticâncer são estudadas e testadas há anos. No Inca desenvolvem-se células T com receptores quiméricos. Na UFCSPA, em Porto Alere, desenvolvemos anticorpos que desbloqueiam a resposta antitumoral. Jovens cientistas que vêm retornando ao Brasil trazem ideias novas e fazem um trabalho de vanguarda em universidades e institutos de pesquisa.

Não, não se sabe ainda como curar câncer. Mas sabemos que é um dos grandes problemas da nossa civilização - porque aumenta com as modificações que há a cada geração, devido ao nosso estilo de vida. Então, estudar e prevenir câncer não é e não deve ser considerado algo que vem de fora do país. Não podemos deixar de estudar as doenças infecciosas que ainda afetam a população, mas também não podemos ignorar o avanço do câncer e de suas terapias. Lá fora, mas, principalmente, aqui.

CRISTINA BONORINO

06 DE ABRIL DE 2024
DRAUZIO VARELLA

MACONHA AUMENTA RISCO DE DOENÇAS CARDIOVASCULARES

Está clara a relação entre maconha e aumento do risco de doenças cardiovasculares. Embora estudos anteriores tenham demonstrado essa correlação, sempre houve críticas às metodologias empregadas. Como confiar nos dados obtidos a respeito do uso de uma droga ilícita, quando o usuário enfrenta repressão social e até risco de encarceramento?

Com a legalização e o afrouxamento da legislação punitiva em vários países e em diversos Estados americanos, foi possível realizar pesquisas mais rigorosas. Os Estados Unidos são o lugar ideal para inquéritos com grandes números de participantes, por ser o país com mais usuários de drogas psicoativas no mundo, no qual o consumo de cannabis cresce a cada ano que passa.

Em 2002, a pesquisa National Survey of Drug Use and Health mostrou que 25,8 milhões dos americanos com 12 anos ou mais tinham fumado maconha pelo menos uma vez na vida. Esse número tinha ido para 48,2 milhões em 2019. Se as leis não tivessem mudado, quantas cadeias teriam que ser construídas?

Num trabalho que acaba de ser publicado na revista Nature Communications, foram entrevistados 430 mil adultos de 18 a 74 anos, com a média de 45 anos. Os que se identificavam como negros eram 11%, e as mulheres, 60%.

Cerca de 90% não usavam maconha, 7% usavam, mas não todos os dias, e 4% faziam uso diário. Fumavam maconha na forma de cigarros 74% dos usuários. Os demais faziam-no ingerindo ou vaporizando o THC.

Mais de 60% de todos os participantes nunca haviam fumado cigarros com nicotina industrializados. Entre aqueles que não usavam cannabis, esse número era de 64%, contra 44% nos usuários que faziam uso menos frequente e 28% nos que usavam todos os dias. Fumar maconha diariamente seria fator de risco para se tornar dependente de nicotina?

As conclusões mais importantes da publicação foram:

1) Fumar, ingerir ou vaporizar cannabis aumenta a probabilidade de desenvolver enfermidades cardiovasculares graves: doença coronariana, infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral, o AVC.

2) Quanto maior a frequência do uso, mais alto é o risco.

3) A relação se mantém independentemente da presença ou ausência de doenças cardiovasculares prévias, do consumo ou não de tabaco, de álcool, do Índice de Massa Corpórea, o IMC, de diabetes tipo 2 e dos níveis de atividade física.

Dito com outras palavras: seu risco de morrer de doença cardiovascular será mais alto, ainda que você seja magro, não fume, não beba, tenha glicemia normal e se mate de fazer exercício na academia.

4) O uso frequente, diário ou não, de cannabis aumenta em média 25% o risco de ataque cardíaco e de 42% o de AVC, quando comparado aos dos não usuários. Doses mais altas e mais frequentes provocam aumentos maiores.

5) Entre adultos mais jovens em risco de doença cardiovascular prematura (definida como a que ocorre em homens com menos de 55 anos ou em mulheres com menos de 65 anos), a probabilidade combinada de sofrer infarto do miocárdio e AVC foi 36% mais alta, independentemente de fumar cigarros, eletrônicos ou não, contendo nicotina.

6) Entre os usuários de cannabis que nunca fumaram cigarros industrializados ou eletrônicos contendo nicotina, o aumento de risco de doença cardiovascular persiste.

Na discussão da pesquisa, os autores reconhecem que os diagnósticos estudados foram relatados diretamente pelos entrevistados, não por seus médicos, dado que fica sujeito à memória dos participantes.

Por outro lado, o inquérito incluiu 430 mil adultos, número significativo que permitiu avaliar a associação de cannabis com doenças cardiovasculares em fumantes de tabaco ou não, numa época em que o número de usuários de cannabis aumenta, enquanto o de cigarros industrializados diminui.

Abra Jefferson, do Massachussetts General Hospital, em Boston, primeiro autor da publicação, diz que "fumar cannabis não é tão diferente de fumar tabaco, exceto pelo componente psicoativo, THC ou nicotina (...). O estudo mostra que fumar cannabis carrega risco de doença cardiovascular tão significativo quanto o tabaco".

Muitos fumantes de maconha tendem a menosprezar os efeitos indesejáveis. "Faz menos mal do que o cigarro", "é uma erva natural" ou "fumo todos os dias há 20 anos e nunca me viciei". Estão enganados.

DRAUZIO VARELLA

06 DE ABRIL DE 2024
NOITE

QUANDO DORMIR É UM DESAFIO

COMO LIDAR COM OS PRINCIPAIS DISTÚRBIOS DO SONO

Durante a noite, o corpo realiza as principais funções reparadoras, tornando o horário de repouso essencial para a saúde física e mental. Mas muitas pessoas sofrem para dormir.

Os distúrbios do sono mais comuns são a apneia, a insônia, a síndrome das pernas inquietas, o sono insuficiente e o atraso de fase de sono. Todas essas doenças podem causar cansaço do corpo e da mente, irritabilidade e dificuldade de concentração, por exemplo.

Saiba mais:

Apneia obstrutiva do sono

A apneia obstrutiva do sono, doença caracterizada pela obstrução da via aérea na região da garganta durante o sono, é considerada preocupante. A condição leva a uma parada da respiração que dura alguns segundos. Responsável por causar o ronco, a apneia pode acontecer várias vezes durante a mesma noite.

Entre cinco e 15 apneias por hora, é considerado um quadro leve. Entre 15 e 30, é moderado. E, acima de 30 apneias por hora, representa uma situação mais acentuada. Idosos e pessoas com sobrepeso costumam ter essa condição com frequência. Nos casos leves, perder peso já pode ajudar a resolver - pontua o médico Denis Martinez, da Clínica do Sono.

Além da idade e do peso, o sexo também influencia. Segundo Martinez, a apneia é mais comum em homens, mas nos últimos anos, mais mulheres têm procurado ajuda para solucionar o problema. Quanto mais grave o quadro, mais o paciente acha que dorme bem - acrescenta.

Martinez conta que os pacientes costumam aparecer no consultório por causa dos cônjuges, que, por dividirem a mesma cama, acabam tendo o seu sono perturbado pelos roncos.

Além da perda de peso, as opções de tratamento podem incluir exercícios com fonoaudiólogo, medicações para casos leves, utilização de dispositivos que aumentam o calibre da via aérea e, até mesmo, cirurgias. O CPAP, aparelho que envia fluxo de ar para as vias respiratórias e impedem que elas fechem, é uma das alternativas frequentemente recomendadas para pacientes com quadros mais graves.

Insônia

O paciente com insônia costuma ter três tipos de queixa: dificuldade para começar a dormir, para manter o sono ou o despertar mais cedo do que o planejado. Se esses sintomas aparecerem ao menos três vezes por semana por três meses ou mais, se caracteriza um quadro de transtorno de insônia crônica. A doença causa dificuldades ao longo do dia, que vão desde humor mais ansioso e irritadiço até pouca vontade de interação social, diminuição do rendimento no trabalho e nos estudos, por exemplo.

- Uma das hipóteses para explicar a insônia é a conhecida como 3Ps. Predisponente, ou seja, fatores que favorecem o desenvolvimento da insônia. Mulheres e pessoas entre 20 e 40 anos com história familiar de insônia estão incluídas neste grupo (costumam ter mais esse quadro). Precipitante, que é um evento dramático na vida da pessoa que pode engatilhar a doença, como ficar desempregado ou a condição de saúde de algum parente próximo. E perpetuante, com crenças e hábitos pouco saudáveis para o sono, que é o que pode tornar a doença crônica - afirma o neurologista Fernando Stelzer, coordenador do Laboratório do Sono da Santa Casa de Porto Alegre.

A falta de higiene do sono pode fazer com que a insônia deixe de ser um sintoma pontual e vire uma doença crônica. Isso significa que se deitar sem estar com sono, assistir à televisão ou mexer no celular antes de dormir e usar a cama para outros fins que não descansar podem impactar diretamente na qualidade do sono e, consequentemente, na gravidade da situação.

- O principal tratamento é o suporte psicológico mesmo. A primeira escolha é a terapia cognitiva comportamental para insônia (TCCI), mas o psicólogo que não é especialista nisso também pode tratar a insônia. Pode-se fazer uso de remédios, mas eles vão apenas tratar o sintoma, e não a causa - defende Stelzer.

Síndrome das pernas inquietas

Na síndrome das pernas inquietas, o paciente costuma se queixar de sentir uma aflição entre o joelho e o tornozelo que só melhora ao mexer a perna. Essa sensação geralmente ocorre de tarde ou à noite, quando a pessoa está em repouso, sentada ou deitada. Os sintomas melhoram com o movimento, como caminhar, alongamento, ou mesmo com massagem. Segundo o especialista, a condição costuma ser confundida com outras condições, como ansiedade e, até mesmo, neuropatia do diabetes, que pode causar sensação de formigamento nos membros inferiores.

- A síndrome das pernas inquietas é a doença mais comum da qual ninguém nunca ouviu falar. Apesar do nome não ser conhecido, ela é bem comum, com estudos mostrando frequência de cerca de 6,5% entre os brasileiros. Nessa situação, em que a sensação só melhora ao mexer a perna, a pessoa tem dificuldade de pegar no sono e, em alguns casos, se movimenta muito durante a noite e, com isso, o sono fica picotado - explica Stelzer.

A doença melhora com a prática de exercícios físicos e com melhoria em alguns hábitos de vida, como a diminuição no consumo de cigarro e bebida alcóolica. Em casos em que os sintomas são mais frequentes ou intensos, é necessário tratamento com medicações, que pode incluir reposição de ferro ou uso de medicações psicoativas.

Sono insuficiente

O sono insuficiente, um dos distúrbios do sono considerados comuns pelo Ministério da Saúde, não é considerada uma doença grave. Segundo o neurologista Stelzer, essa condição pode ser considerada uma epidemia da sociedade moderna.

Pacientes com essa condição costumam não dormir o suficiente. Ou seja, a quantidade de horas de sono é inferior ao recomendado para a idade. Assim, a pessoa fica cronicamente privada de sono. A causa pode estar associada ao estresse, ansiedade, aos hábitos alimentares e à rotina, por exemplo.

Stelzer afirma, ainda, que a lógica do banco de horas não funciona para o sono. Portanto, não é possível dormir horas a mais ou tirar cochilos durante a tarde com o objetivo de compensar o sono insuficiente.

Atraso de fase de sono

A condição é caracterizada por quando o paciente demora a dormir, atrasando o início da fase de sono. Stelzer pontua que algumas pessoas costumam dormir e acordar mais cedo, enquanto há aquelas que preferem dormir e acordar mais tarde. O paciente com atraso de fase de sono costuma ter dificuldade para começar a dormir e, consequentemente, acaba acordando mais tarde.

O neurologista explica que o transtorno é mais comum em adolescentes, fase da vida em que os horários do sono nem sempre estão alinhados com os desejos sociais. Mas a condição pode aparecer em todas as idades, a depender da rotina e dos hábitos de cada paciente.


06 DE ABRIL DE 2024
J.J. CAMARGO

A IMPESSOALIDADE ENCOLHE A MEDICINA

"Um amigo me chamou para ajudá-lo a cuidar da dor dele. Guardei a minha no bolso. E fui. Não por nobreza: cuidar dele faria com que eu me esquecesse de mim." (Caio Fernando Abreu, em Pequenas Epifanias)

Durante o meu curso de Medicina, muitas vezes ouvi de professores renomados que o médico não devia se aproximar emocionalmente do paciente porque isso lhe reduziria a imparcialidade do julgamento nas decisões mais difíceis.

Esta é uma das mais antigas e reiteradas falácias da antiga pedagogia médica. Como a nossa tendência é acreditar em tudo o que os mestres dizem, desperdicei um tempo precioso até perceber que o que me deixava tão desconfortável era, na verdade, uma teoria fajuta, pseudocientífica, propalada por médicos que, de tão rígidos de afeto, não conseguiam de nenhuma maneira desenvolver empatia com o paciente em sofrimento, e essa desculpa esfarrapada possivelmente lhes aliviava a sensação de culpa, se é que sentiam alguma.

Minha redenção, que já tinha começado durante a residência médica, quando percebi o quanto os pacientes gostavam de ser abraçados, se sacramentou ao deparar com esta famosa frase de Hélio Pellegrino (1924-1988), um maravilhoso psiquiatra carioca, que escreveu: "As pessoas adoecem por falta de relações pessoais sólidas. Se lhes oferecermos impessoalidade e neutralidade, estaremos dando o que lhes provocou a doença. Temos que promover o encontro, e não existe encontro impessoal. Impessoal é o desencontro".

A recomendação de que o médico deve preservar a sua integridade emocional porque ela lhe dará condições plenas de melhor proteger quem está no turbilhão do sofrimento é uma obviedade. Assim também como se reconhece que o convívio prolongado com situações extremas de desespero e morte pode causar transtornos emocionais agudos, como a Síndrome de Burnout, atribuível a uma exagerada sobrecarga na nossa "mochila emocional", multiplicada pela sensação repetida de impotência, como se observou, à exaustão, durante a pandemia.

Mas não era dessa circunstância, felizmente rara, que se precaviam os arautos da impessoalidade. O que falharam em convencer era que devíamos manter uma independência protetora dos sentimentos dos pacientes, como se isso nos preservasse mais habilitados a ajudar.

Quem já adoeceu e de alguma maneira se sentiu ameaçado reconhece que nenhum socorro significa tanto quanto a parceria incondicional no sofrimento, essa que dá naturalidade ao abraço como um substituto natural do discurso.

E que faz da disponibilidade permanente a afirmação de que não existe hora extra na tarefa, às vezes exaustiva, mas sempre gratificante, de cuidar do outro.

J.J. CAMARGO

06 DE ABRIL DE 2024
CARPINEJAR

Da água para o fogo: o dia da minha infância

Há cenas que jamais vão se repetir. Quem viveu, viveu. Quando partia para a escola, levantava os pés por onde passava.

As ruas, escadarias e a frente dos comércios eram lavadas pelos vizinhos com mangueira. Predominava uma coreografia coletiva de remadores das lajes. Cada um dava conta da sua porção de universo, do seu quadrado residencial. Movimentavam-se alinhados, devotos na tarefa de expiar os pecados dos pedestres antes do almoço.

Todo mundo limpava as calçadas de manhã cedo. Lavava-se a vida no primeiro gesto do dia. Recordo com nitidez o barulho, a vitrola do esfregão: tchum-tchum-tchum.

Eu tinha que cuidar para não escorregar, não deslizar, não cair e sujar o uniforme escolar. Ainda mais calçando a sola fina do tênis da época. Exigia malabarismo, equilíbrio percorrer os cinco quarteirões da casa à escola e escapar dos esguichos distraídos.

O piso escorregadio de alvejante, de sabão, poderia produzir tombos e vexames diante dos colegas em procissão. Enfrentava grandes riscos de me tornar motivo de gargalhada por alguns meses.

As entradas das casas transformavam-se em saboneteiras. Havia poças espumosas e passarinhos estourando bolhas de sabão. Amanhecia com o vapor subindo do chão, o perfume renovado das pedras e dos paralelepípedos.

Entre 7h e 9h, os moradores empunhavam o rodo e recolhiam a sujeira em busca do brilho, obcecados em repor o cinza do asseio do concreto. A correnteza seguia pelo meio-fio para ser engolida pela boca de lobo. Desapareciam pouco a pouco as freadas das bicicletas, as marcas duplas do rolimã, o jogo da amarelinha, nossas brincadeiras do ontem.

Era uma dinâmica que jamais vai se repetir hoje, devido ao controle geral contra o desperdício de água.

Se eu começava o dia com o bairro molhado, eu terminava o dia testemunhando o fogo. No fim da tarde, as mesmas pessoas regressavam ao batente doméstico. Abandonavam o observatório de suas varandas outra vez para varrer as calçadas, agora sem água, num arremate da faxina.

Juntavam as folhas em montinhos nas esquinas e ateavam fogo. Parte do lixo seco era incinerado. Trilhas de fumaça invadiam o céu, fatiavam o horizonte. Tanto que, até hoje, o pôr do sol para mim tem cheiro de queimado.

Mais um capítulo que jamais será reiterado na minha existência, em função do perigo atual de a chama se alastrar com as altas temperaturas do verão. Vejo que envelheci pelas recordações que nunca voltarão a acontecer. A infância, para ser antiga mesmo, precisa de lembranças extintas.

CARPINEJAR

06 DE ABRIL DE 2024
OPINIÃO DA RBS

RECURSOS NA VEIA

Tem méritos a proposta que pode ser votada nos próximos dias pela Assembleia Legislativa para permitir a empresas a destinação de até 5% do ICMS devido diretamente a hospitais filantrópicos e santas casas do Rio Grande do Sul. A proposição pode fazer a diferença em muitas localidades com instituições de saúde que enfrentam dificuldades estruturais ou de atendimento em áreas específicas para prestar um bom serviço à população. Um esforço concentrado na própria comunidade pode fazer com que eventual deficiência detectada possa ser solucionada de forma direta por lideranças locais, de maneira mais ágil.

A iniciativa é inspirada no Programa de Incentivo ao Aparelhamento da Segurança Pública (Piseg), que igualmente permite o repasse de recursos equivalentes a 5% do ICMS que seria recolhido para o Estado. Em quatro anos e meio de funcionamento, o Piseg já soma mais de R$ 130 milhões em doações e valores acima de R$ 90 milhões investidos em viaturas, armamentos, itens de proteção aos policiais, equipamentos de informática e outros fins. Os recursos destinados são crescentes ano a ano e ajudam a equipar as forças de segurança do Estado no combate à criminalidade.

O projeto de lei para a área de saúde é dos deputados Airton Artus (PDT), Cláudio Tatsch (PL) e Thiago Duarte (União Brasil). Espera-se para esta segunda-feira uma reunião dos parlamentares com a secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann. É um diálogo importante entre os proponentes e o Executivo, que afinal é quem tem o melhor conhecimento por ser responsável direto pelo atendimento à população. Ajustes e sugestões podem melhorar a proposta, tornando-a ainda mais factível e capaz de gerar resultados positivos para o cidadão.

Conforme os deputados, há acordo com o governo para a aprovação em plenário e a implementação da iniciativa. A votação está prevista para esta terça-feira. Há tempo, portanto, para aperfeiçoar o que for necessário. Depois, confirmando-se a sanção do governador Eduardo Leite, será necessária uma boa regulamentação para tornar o programa efetivo.

O texto autoriza o uso dos recursos para destinações como compra de insumos, materiais e equipamentos, despesas de custeio e construção e ampliação e conservação dos hospitais. Deve-se apenas ter cuidado em relação aos gastos de custeio, evitando o risco de que o dinheiro destinado não tenha um emprego estruturante. É importante também prever colegiados e mecanismos para uma análise criteriosa das demandas candidatas a receberem recursos e para que desvios sejam evitados. Não menos relevante é ter um acompanhamento dos resultados.

A saúde, ao lado da segurança e da educação, é um dos serviços básicos mais importantes a ser prestado para a população. Não são raros, porém, os problemas de financiamento do setor. Trata-se, afinal, de um segmento com custos altíssimos e com índices de inflação também consideráveis. Em cada município do Estado, é a própria comunidade que consegue identificar melhor as suas prioridades. Para quem destina o recurso, há a satisfação de enxergar a utilização do recurso empregado gerando benefícios concretos, sem depender de toda a intermediação do Estado. Ainda mais em um período de dificuldades de caixa dos hospitais filantrópicos e santas casas.



06 DE ABRIL DE 2024
CHAMOU ATENÇÃO

História do RS nos degraus

A ideia de revitalizar a Escadaria 14 de Outubro, em Guaíba, surgiu ao notar que a passagem de pedestres não estava sendo tão valorizada como merecia. Afinal, o espaço tem bastante história: próximo da escadaria, fica o Cipreste Farroupilha, a árvore que se tornou símbolo oficial de Guaíba.

Conforme o folclore gaúcho, foi à sombra do Cipreste que, na véspera do dia 20 de setembro de 1835, líderes farroupilhas como Bento Gonçalves, Onofre Pires e Gomes Jardim traçaram os planos para a invasão de Porto Alegre, dando início à Revolução Farroupilha. No topo da escadaria, há o Museu do Gaúcho, com entrada gratuita, e que conta a história deste período histórico. Lá também fica a casa de Gomes Jardim, local que hoje é um patrimônio histórico e que está aberto para visitação.

Projeto

A escadaria foi construída no lugar da Lomba do Inferno, uma rua íngreme que existia no local. O nome é em homenagem à fundação da cidade, que ocorreu em 14 de outubro de 1926. Ela está localizada em frente ao Píer de Guaíba e oferece ampla visão para o lago.

A diretora do Projeto Rua das Artes, Simone Schlottfeldt, explica que desde o princípio a iniciativa buscava apresentar, na arte da escadaria, fatos da Revolução Farroupilha. Ela, que atua como produtora cultural, foi convidada, assim como o produtor cultural Wagner Seelig, para desenvolver o projeto em parceria com a prefeitura da cidade ainda em 2022, por meio da Secretaria de Turismo, Desporto e Cultura de Guaíba.

O projeto foi aprovado pela Lei de Incentivo à Cultura (LIC) e conta com o patrocínio de empresas que estão na cidade. De acordo com Simone, essa seria a primeira escadaria do Brasil neste formato, que contém fatos históricos representados visualmente nos mosaicos:

- Existe a Escadaria Selarón, no Rio de Janeiro. Ela é um pouco maior em degraus. Mas, realmente, retratando fatos históricos no mosaico, que é um trabalho artístico incrível, a nossa escadaria é a única.

Ainda segundo a produtora cultural, a principal diferença entre a Escadaria Selarón e a 14 de Outubro é de que a primeira tem mosaicos montados de maneira aleatória. Não se forma nenhuma figura, diferente do que ocorre nos painéis que compõem a de Guaíba.

KÊNIA FIALHO