domingo, 11 de novembro de 2007


ELIANE CANTANHÊDE

Tupi or not Tupi

BRASÍLIA - O Brasil e os brasileiros têm uma boa promessa a longo prazo e uma ameaça imediata. O campo de Tupi, na bacia de Santos (SP), poderá render 8 bilhões de barris de petróleo e gás natural, se a prospecção for adequada, se houver investimentos à altura, se essa expectativa afinal se confirmar. E só deve começar a produzir uns três ou quatro anos depois de 2010. Se... tudo der certo.

Já a ameaça de racionamento de gás é uma realidade bem mais palpável, tanto que o preço pode aumentar em até 25%, o Brasil empurra a Petrobras de volta para o colo de Evo Morales e o gás dos consumidores do Rio e de São Paulo foi desviado para as termelétricas.

A diferença é que o governo resgatou a máxima do então ministro Rubens Ricúpero, mais ou menos assim: "o que é bom a gente mostra, o que é ruim a gente esconde".

Faltou planejamento nesses seis anos, e a energia é fator de alerta para empresas e para novos investimentos, mas, num passe de mágica, o que se discute é Tupi. Lula é um homem sabidamente de sorte, e o governo é bom de marketing, sabe tirar proveito dessa sorte. O foco mudou, as manchetes mudaram.

Ninguém mais ousa dizer que Lula pode repetir FHC até no "risco de apagão", e ele já é chamado por Hugo Chávez, com ironia ou não, de "magnata do petróleo". Magnata e também magnânimo.

Em vez de fazer ele próprio o anúncio de Tupi, ou de encarregar o presidente da Petrobras de fazê-lo, Lula destacou Dilma Rousseff para brilhar sob os holofotes.

Retirou dela a sombra dos erros na área de energia (que ela comanda) e jogou luzes no seu nome no rol de presidenciáveis. Sem ônus pelos erros, com bônus pela sorte.

Se Tupi for mesmo todo esse Tupi, ótimo para o Brasil, para Lula e para Dilma, ufa!, salva pelo gongo. A única curiosidade será qual o destino que o "magnata do petróleo" vai dar à cruzada dos biocombustíveis. elianec uol.com.br

sábado, 10 de novembro de 2007



11 de novembro de 2007
N° 15415 - Martha Medeiros


Povoar a solidão

Permita que sua solidão seja bem aproveitada, que ela não seja inútil. Não a cultive como uma doença, e sim como uma circunstância

A sua é de que tamanho? Difícil encontrar alguém que tenha uma solidão pequena, ajustada, do tipo baby look. Geralmente, a solidão é larga, esgarçada, como uma camiseta que poderia vestir outros corpos além do nosso. E costuma ser com outros corpos que se tenta combatê-la, mas combatê-la por quê?

Se nossa solidão pudesse ser visualizada, ela seria um vasto campo abandonado, um estádio de futebol numa segunda-feira de manhã. Dói, mas tem poesia. Talvez seja por aí que devamos reavaliá-la: no reconhecimento do que há de belo na sua amplitude.

A solidão não precisa ser aniquilada, ela só precisa de um sentido. Eu não saberia dizer que outra coisa mais benéfica há para isso do que livros. Uma biblioteca com mil volumes é um exército que não combate a solidão, mas a ela se alia.

A solidão costuma ser tratada como algo deslocado da realidade, como um tumor que invade um órgão vital. Ah, se todos os tumores pudessem ser curados com amigos. Uma pessoa que não fez amigos não teve pela sua vida nenhum respeito.

Nossa solidão é nossa casa e necessita abrir horários de visita, hospedar, convidar para o almoço, cozinhar com afeto, revelar-se uma solidão anfitriã, que gosta de ouvir as histórias das solidões dos outros, já que todos possuem seus descampados.

A solidão não precisa se valer apenas do monólogo. Pode aprender a dialogar e deve exercitar isso também através da arte. Há sempre uma conversa silenciosa entre o ator no palco e o sujeito no escuro da platéia, entre o pintor em seu ateliê e o visitante do museu, entre o escritor e o seu leitor desconhecido.

Ah, os livros, de novo. De todos os que preenchem nossa solidão, são os livros os mais anárquicos, os mais instigantes. Leia, e seu silêncio ganhará voz.

Às vezes, tratamos nosso isolamento com certa afetação. Acendemos um cigarro na penumbra da sala, botamos um disco dilacerante e aguardamos pelas lágrimas. Já fizemos essa cena num final de domingo - tem dia mais solitário?

É comum que a gente entre na fantasia de que nossa solidão daria um filme noir, mas sem esquecer que ela continuará conosco amanhã e depois de amanhã, deixando de ser charmosa e nos acompanhando até o supermercado. Suporte-a com bom humor ou com mau humor, mas não a despreze.

Permita que sua solidão seja bem aproveitada, que ela não seja inútil. Não a cultive como uma doença, e sim como uma circunstância. Em vez de tentar expulsá-la, habite-a com espiritualidade, estética, memória, inspiração, percepções.

Não será menos solidão, apenas uma solidão mais povoada. Quem não sabe povoar sua solidão, também não saberá ficar sozinho em meio a uma multidão, escreveu Baudelaire.

Ah, os livros, outra vez.

Um ótimo domingo excelente início de semana


Diogo Mainardi

Tem algum procurador aí?

"O Brasil é um lugar sem lei. A Itália, pelo menos nesse ponto, é melhorzinha. A magistratura continua a escarafunchar os negócios da Telecom Italia no Brasil e a prender os membros do seu bando"

– Para tratar com um bandido, é preciso outro bandido.

A frase consta do depoimento do chefe do aparato de espionagem da Telecom Italia, Giuliano Tavaroli, ao juiz Giuseppe Gennari, do Tribunal de Milão. Giuliano Tavaroli atribuiu-a a Marco Tronchetti Provera, o maior acionista da empresa.

O primeiro bandido, de acordo com o homem da Telecom Italia, seria Daniel Dantas, que infernizava os italianos com seus métodos de faroeste. O segundo bandido seria Naji Nahas, contratado por Marco Tronchetti Provera para dar um metafórico tiro no peito de Daniel Dantas.

O Brasil é um lugar sem lei. A Itália, pelo menos nesse ponto, é melhorzinha. A magistratura milanesa continua a escarafunchar os negócios da Telecom Italia no Brasil e a prender os membros de seu bando. Quem é preso costuma falar.

Alguns dias atrás, revelou-se que Naji Nahas recebeu 25,4 milhões de euros da Telecom Italia. Até agora ninguém informou de onde saiu o dinheiro nem para onde ele foi. O que se sabe é que a empresa pagou propina no Brasil, conforme confessaram seus próprios diretores.

O que se sabe também é que a maior parte dos pagamentos a Naji Nahas foi realizada entre 2002 e 2003. No detalhe: 7,26 milhões de euros em 2002 e 11,28 milhões de euros em 2003. Lembre-se de que, na época, o euro estava cotado acima de 3 reais.

Mas o que realmente importa – muito mais do que o valor – é a data. Em 2002, houve a campanha eleitoral mais cara da história do Brasil. Em 2003, os petistas passaram a correr atabalhoadamente atrás de dinheiro para sustentar os mensaleiros.

Pelo que declarou Giuliano Tavaroli ao juiz Giuseppe Gennari, a principal área de influência de Naji Nahas era o Ministério da Fazenda. Eu acrescento dois dados. Primeiro: em 2002, o coordenador da campanha de Lula era Antonio Palocci.

Segundo: em 2003, ele assumiu a pasta da Fazenda, podendo contar com os conselhos desinteressados de Delfim Netto, amigo íntimo – de quem? – de Naji Nahas. Talvez Antonio Palocci possa ajudar a esclarecer o elo entre Naji Nahas e o Ministério da Fazenda. Tem algum procurador aí? Apresente-se! Tem algum tucano aí? Xô!

Um dos homens de Giuliano Tavaroli, Marco Bernardini, em depoimento prestado no fim de outubro ao Ministério Público italiano, declarou que, de acordo com seu chefe, alguém conhecido como "Chinês" teria embolsado dinheiro da Telecom Italia.

Marco Bernardini chegou até a dizer quem poderia ser o tal "Chinês". Tem algum procurador aí? Ainda estou esperando.

O que posso afirmar com certeza é que, nesse interminável spaghetti western trotskista, em que os italianos viram um bandido em duelo com o outro, um bandido comprando o outro, o lulismo entrou com todos os seus pistoleiros. E o melhor de tudo é que eles deixaram um rastro.

Ponto de vista: Claudio de Moura Castro

Aposentadoria de presidente

"Alguns ex-presidentes pedem que os esqueçam, outros fazem futrica política. Bill Clinton criou um genial esquema de recrutamento do empresariado internacional para as causas da educação, saúde, meio ambiente e pobreza"

il e trezentas pessoas no enorme salão de um hotel em Nova York. O relator de um dos temas discutidos apresentava a sua síntese e uma câmera de televisão enviava sua imagem a dois telões.

A projeção amplificava o visual de três figuras sentadas logo atrás do conferencista. Contrastavam com a elegância sóbria do auditório um alourado em dívida com o barbeador e um chinês de brinquinho, óculos enormes, cabelo com gel, que não conseguia fechar a boca.

O terceiro era um moreno, também com barba por fazer e uma camiseta de malha preta sob o paletó. Como deixaram entrar esse trio?

Minutos depois, o ex-presidente Bill Clinton anunciava uma doação de 20 milhões de dólares e chamava os donos do YouTube e do Google para receber o vasto diploma. Eram os três. Mais alguns minutos e terminaria a Clinton Global Initiative (www.clintonglobalinitiative.org).

Ilustração Atômica Studio

Alguns ex-presidentes pedem que os esqueçam, outros fazem futrica política. Alguns pontificam sobre os destinos do mundo.

Antes de virar pacificador do mundo, Jimmy Carter brandia martelo e serrote, reformando casas populares. Bill Clinton criou um genial esquema de recrutamento do empresariado internacional para as causas da educação, saúde, meio ambiente e pobreza.

A receita é imaginativa. Centenas de celebridades, incluindo cinqüenta presidentes e ex-presidentes, bem como outros tantos primeiros-ministros, falam de temas candentes em sessões plenárias.

Entre muitos outros, estavam Bill Gates, Desmond Tutu, Gordon Brown e Tony Blair. Além de seu trabalho sério, Brad Pitt, Angelina Jolie e Shakira zelavam pela integridade estética. Havia meia dúzia de prêmios Nobel, para que a integridade intelectual estivesse acima de qualquer suspeita.

Líderes das 500 maiores empresas enchiam o auditório. No lado técnico, havia quatro painéis temáticos com empresários e membros da academia. A operação desse grande circo ficou a cargo de 450 voluntários.

Participantes do Brasil eram apenas Eduardo Braga, governador do Amazonas, e eu. No meu caso, estava no grupo de educação, para discutir brain drain (fuga de cérebros) no Brasil, em sessão moderada por Larry Summers (cuja proverbial arrogância lhe custou o emprego de presidente da Universidade Harvard). Na África, os cérebros migram para pastagens mais verdes.

É curioso o contraste com a situação brasileira, em que praticamente não há perdas, sendo ínfima a diáspora de cientistas brasileiros no Primeiro Mundo. Isso é ruim, pois nos isola.

No Carnegie Hall, em uma das noites, quatro personalidades foram premiadas; uma delas era o tenista Andre Agassi, outra era Vicky Colbert, a colombiana que criou a Escuela Nueva.

No decorrer do evento, dezenas de empresários formularam seus compromissos financeiros e as metas quantitativas de seus programas – apoiando ONGs e governos de países pobres. Note-se que a fundação de Clinton não chega perto desse dinheiro, embora vigie para ver se a promessa foi cumprida. Puxa as orelhas de quem fica apenas na conversa.

A cada novo compromisso, nos intervalos entre as apresentações, os doadores subiam ao palco para receber o diploma e ser fotografados ao lado de Clinton ou dos moderadores. Ou seja, os temas candentes, o exército de celebridades e a imprensa criavam os atrativos para que o mundo ficasse sabendo dos gestos de generosidade de cada empresa.

O sucesso da fórmula é medido pelos resultados. Incluindo os dois eventos anteriores, 10 bilhões de dólares já foram comprometidos, permitindo melhorar a vida de 100 milhões de pessoas. Neste ano foram registradas 235 promessas. Permitirão, por exemplo, proteger ou reflorestar 34 milhões de hectares de florestas.

Mais 130 milhões de dólares foram comprometidos via internet. À exceção de um programa da Coca-Cola de proteção do meio ambiente, o Brasil foi pessimamente aquinhoa-do nesse grande leilão. Isolacionismo? Provavelmente. Mas podemos ser mais competentes nos próximos anos.

E quem sabe nos inspiramos na fórmula vencedora de Clinton, criando algum evento que reconheça publicamente os nossos doadores – que não são poucos.

Claudio de Moura Castro é economista - claudio&moura&castro@cmcastro.com.br


O cérebro a salvo
CILENE PEREIRA

O mesmo recurso que previne infartos agora também é usado para tratar aneurismas

O aneurisma é um dos mais traiçoeiros problemas que podem ocorrer no cérebro. Caracterizado por uma dilatação anormal de uma das artérias que irrigam o órgão, ele pode se romper, causar hemorragia e matar. Tudo isso de repente, e sem que ninguém nunca suspeitasse de sua existência.

Por isso, há um empenho muito forte da medicina para encontrar melhores formas de diagnosticá-lo e de tratá-lo. Uma das boas notícias na área é a utilização do stent, um recurso muito conhecido e bastante usado na cardiologia para “empurrar” as placas de gordura depositadas nos vasos sangüíneos do coração.

No tratamento dos aneurismas, esse artefato é empregado para aprimorar uma técnica que vinha sendo usada com sucesso mas tinha algumas limitações. Há alguns anos, sempre que possível, os médicos recorrem à introdução de uma espiral de platina no local da deformidade. Ela é levada por cateter até o ponto desejado.

Lá, estimula a formação de coágulos, fechando a “bolha”. Porém, essas espirais muitas vezes não ficam no lugar, principalmente se o aneurisma for grande. E cerca de 30% a 40% dos casos se encaixam nessa categoria. E é aí que entra o stent, conduzido até o local também por meio de cateter.

“Ele funciona como sustentação para que as espirais fiquem dentro do aneurisma, serve de malha para o crescimento de células que cobrirão seu orifício e facilita o fluxo sangüíneo”, explica o neurocirurgião Ricardo Hanel, da Clínica Mayo, um dos principais centros de referência médica dos Estados Unidos.

Esse recurso já vinha sendo aplicado. A novidade agora é a confecção de um stent bastante apropriado para o cérebro. Isso é muito importante porque os vasos cerebrais apresentam diferenças em relação aos cardíacos e exigem cuidados especiais.

Por exemplo, eles possuem mais células musculares e menos fibras elásticas. “Isso os torna mais frágeis”, afirma Hanel. Além disso, para alcançar a circulação intracraniana, é preciso passar pela base do crânio, onde os vasos estão fixos aos ossos e fazem muitas curvas.

Essa característica dificulta a passagem dos stents do pescoço até a região onde deve ser colocado. O risco de traumas ou de rompimento dos vasos é grande. Tratando- se do cérebro, qualquer acidente deste gênero pode ser devastador.

Entre outras características, o novo stent cerebral é mais flexível e por isso mesmo mais fácil de ser levado até o local do aneurisma. Também tem um sistema de abertura dentro do vaso sangüíneo que diminui o risco de traumas.

Mas os médicos querem ir além. “Espero que, num futuro próximo, exista um stent que funcione sozinho, sem a necessidade das espirais”, afirma Hanel.

sexta-feira, 9 de novembro de 2007


JOSÉ SIMÃO

Buemba! A BRA mandou um aBRAço!

Companhia cumpriu a missão (foi pro espaço), mas não a emissão: não emitiu as passagens

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta! Zona Aérea! Anarc! A BRA quebrou! Aliás, a BRA cumpriu sua missão: foi pro espaço.

Cumpriu a missão, mas não a emissão: não emitiu as passagens. Atenção, senhores passageiros que compraram passagens na BRA: um aBRAço! Aquele aBRAço! Rarará!

Atenção senhores passageiros que compraram passagens pela BRA: podem trocar seus bilhetes por ingressos do jogo São Caetano x Ituano a se realizar neste sábado! O Brasil é o único país em que a aviação afunda. Rarará!

Se essas companhias aéreas estão todas afundando por que elas não começam a fabricar submarino?! E a crise do gás? Quem segura esse bujão?!

E aí diz que o Pelé se separou da Assíria e foi pra França e Turquia. Já sei, trocou Assíria por uma turca! Pelé troca Assíria por uma turca! E diz que o São Paulo está perto de conquistar o BAMBIONATO Brasileiro!

Semana Melhores Momentos da Lucianta Gimenez! Sendo que os melhores momentos da Lucianta Gimenez foram com o Mick Jagger. Rarará!

Aí a Perla foi no programa da Lucianta e desafiou: "Diga aí uma palavra terminada em ado". E a Lucianta: "Melado". Ueba. Palmas. E a Perla: "Diga outra que termina em ado". E a Lucianta: "QUADRO". Rarará!

Palavras da Lucianta terminadas em ado: taradro, quadradro e viadro. Rarará! Outra: o Rally dos Sertões é tão famoso que vem gente de TODOS OS MUNDOS!. Vem sim. De Marte, Vênus, Urano. O Rali das Galáxias. Rarará!

É mole? É mole, mas sobe. Ou como diz aquele outro: é mole, mas trisca pra ver o que acontece! Antitucanês Reloaded, a Missão.

Continuo com a minha heróica e mesopotâmica campanha "Morte ao Tucanês". Acabo de receber mais um exemplo irado de antitucanês. É que eu recebi a foto de uma placa: "Entrada Proibida.

Cuidado. Vaca Brava. Cão Bravo. Búfalo Assassino. Cerca Elétrica e Empregado Louco". Rarará! Mais direto, impossível. Viva o antitucanês! Viva o Brasil!

E atenção! Cartilha do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Bravata": companheiro que vendeu passagens da BRA! O lulês é mais fácil que o inglês.

Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno. E vai indo que eu não vou!

simao@uol.com.br
09/11/2007 - 19h05 - PATRÍCIA DANTAS - da Folha Online

Roberto Carlos se incomoda com ruídos em som durante show

Roberto Carlos ficou ligeiramente incomodado com a estrutura de som montada na Hípica Paulista durante a festa de 15 anos do grupo CSU ontem (8) em São Paulo.

Ana Fuccia/Divulgação

Roberto Carlos encerra apresentação cantando a música "Jesus Cristo"

Principal atração da noite, o cantor tentava disfarçar a preocupação com pequenos ruídos e estalos que atrapalhavam esporadicamente o som, olhando constantemente os técnicos que se encontravam no palco.

Para sanar os problemas, as luzes do espaço foram apagadas várias vezes durante a apresentação.

"É um privilégio participar desta festa, obrigada por todo esse carinho que tenho recebido ao longo da minha carreira", agradeceu Roberto aos convidados, entre eles celebridades como Daniella Cicarelli, Sérgio Abreu e Adriane Galisteu.

Os hits "Emoções", "Além do Horizonte" e "Calhambeque" compuseram o repertório do show, que durou cerca de uma hora e meia. Especula-se que Roberto Carlos tenha recebido cerca de R$ 300 mil para se apresentar no evento.

Em um dos momentos de descontração do show, o cantor chegou a citar a célebre frase de Bebel, prostituta interpretada por Camila Pitanga na novela "Paraíso Tropical", para elogiar um de seus músicos. "Esse aí tem "catiguria", como diria a Bebel", comentou Roberto ao apresentar os integrantes de sua banda.

O cantor encerrou a apresentação com a música "Jesus Cristo", levando anônimos e famosos para frente do palco na tentativa de conseguir uma das flores jogadas pelo rei.

Ana Fuccia/Divulgação



Durante o show de Roberto Carlos na Hípica, houve referência à Maria Rita, que morreu em dezembro de 1999.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007


JOSÉ SIMÃO

Buemba! O Mal da Vaca Loira!

Olha a nova companhia aérea: QueBRAda Transportes Aéreos! Só aqui a aviação afunda

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da União! Direto do País da Piada Pronta! E sabe como se chama esta epidemia de leite com água oxigenada? Mal da vaca loira! Depois do mal da vaca louca, temos o mal da vaca loira.

E leite com soda cáustica? O Brasil agora é assim: soda cáustica a gente compra na padaria. E leite a gente compra em loja de produtos para limpeza?

E a zona aérea? A BRA faliu, quebrou. Agora, temos uma nova companhia aérea: QueBRAda Transportes Aéreos! O Brasil é o único país onde a aviação afunda.

Rarará! E continua a polêmica da peruca palha de milho da Suzana Vieira, a nossa Mortadela Versace. Vulgo Mãe Loura do Funk. Diz que a Suzana tá parecendo o Gandolf, de "Senhor dos Anéis"!

E a dona Marisa para as eleições 2010? Já tenho um slogan pra ela: "MUDA PRA MUDAR!". Ué, ela não fala mesmo.
E sabe o que a Bolívia vai exportar pro Brasil? COCA! Coca sem gás! Rarará!

E você confiaria num homem chamado Evo? Aliás, você confiaria numa mulher chamada Adã?! E diz que o Lula acordou com uma dúvida terrível sobre o terceiro mandato: como é que ele vai passar a faixa pra ele mesmo. "Galega, como é que eu vou passar a faixa pra mim mesmo?" Eu sei, tira cópia da faixa.

Ou então faz como bambolê: fica rodando. Rarará. E o site Pérolas Políticas revela que o ministro da Defesa do Corinthians, o Nelson Jobim, ficou muito satisfeito com a quebra da companhia BRA: "Agora, só falta a GOL e a TAM fecharem as portas que acabam as filas e os atrasos nos aeroportos". Rarará.

É mole? É mole, mas sobe! OU como diz o outro: é mole, mas trisca pra ver o que acontece. Antitucanês Reloaded, a Missão. Continuo com a minha heróica e mesopotâmica campanha "Morte ao Tucanês".

Acabo de receber mais um exemplo irado de antitucanês. É que em Veneza tem um bar chamado XIXI! Já sei: bebe no bar e mija no canal. Rarará!

É o Brasil exportando antitucanês! Mais direto, impossível. Viva o antitucanês. Viva o Brasil!

E atenção! Cartilha do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Gastança": companheiro que tá gastando muito gás.

O lulês é mais fácil que o inglês. Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje, só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno. E vai indo que eu não vou!

simao@uol.com.br


08 de novembro de 2007
N° 15412 - Nilson Souza


Sem fadas

Estou convencido de que as únicas certezas deste nosso passeio pelo planeta são a largada e a chegada. Entre esses dois pontos mora um duende esperto, chamado Livre-arbítrio, que representa o poder de que todos somos dotados para construirmos a nossa própria estrada.

Sábio Antonio Machado: caminante, no hay camino, se hace camino al andar. Mas, assim como os paranóicos também podem ser perseguidos, de vez em quando os céticos de carteirinha tropeçam em atordoantes coincidências. Acontece comigo seguidamente.

Aconteceu esta semana. Saí para almoçar com um amigo, e nossa conversa, sobre mulheres e livros, derivou para uma colega de ofício que escreve muito bem: Rosina Duarte. Fazia um século que não a via. Ela escreveu no ano passado um belo livro chamado Contos sem Fadas, que ainda pode ser encontrado na Feira.

Repórter competente e comprometida com causas sociais, ela passou três anos ouvindo depoimentos de mais de uma centena de mulheres idosas na região fronteiriça do Estado e organizou uma coletânea de histórias fantasticamente reais, que incluem simpatias, receitas de doces, cantigas de infância e a visão feminina daquelas vidas.

Li o livro e fiquei muito impressionado, tanto com a qualidade do texto quanto com um fato que me chamou a atenção, embora não fosse a intenção da autora evidenciá-lo: os depoimentos revelam que a maioria daquelas mulheres, quase a totalidade, passou a existência acumulando mágoas e ressentimentos de seus companheiros. Fiquei chocado com aquela constatação.

Relatava esse fato para o colega quando, no topo da escadaria do shopping onde fomos almoçar, deparamos com a autora do livro. Para quem não crê em fadas, uma coincidência monumental.

Parecia até que, de alguma maneira, havíamos evocado sua presença. Brincamos sobre o assunto. E ouvimos dela um breve relato de como realizou o trabalho de ouvir histórias esquecidas para costurar lembranças esparsas e transformá-las em contos sem fadas.

Minha amiga espírita me dirá, como já disse tantas vezes, que nada ocorre por acaso. Não sei como Rosina foi parar na vida daquelas mulheres que sobreviveram às próprias amarguras e protagonizaram belas histórias.

Mas sei bem quem me mandou escrever este texto, que pretende homenagear seu talento de escritora e talvez levar algum freqüentador da Feira a procurar no fundo do balaio um livro que merece ser lido.

Foi um duende.

Como a previsão é de chuva, mesmo assim, que tenhamos todos uma ótima quinta-feira.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007



07 de novembro de 2007
N° 15411 - Martha Medeiros


Livros perdidos

Na onda do 1001 livros para ler antes de morrer, de Peter Boxall, está chegando no mercado o inusitado O Livro dos Livros Perdidos, que nada mais é do que uma grande reportagem sobre os livros que nunca chegaram nem chegarão a nossas mãos, desde obras de filósofos gregos até algumas produzidas no último século.

Literatura é aquilo que está escrito. A oralidade dificilmente preserva a criação, é preciso que o texto seja materializado.

Mas esse material é sempre vulnerável, é o que sustenta Stuart Kelly, autor desse inventário às avessas, que, com bom humor, nos conta sobre as mais diversas formas de perda, a começar pela destruição provocada pelo próprio autor, por razões também várias, desde perseguição política até excesso de autocrítica.

Há obras que desapareceram depois que seus autores morreram antes de concluí-las, obras que foram queimadas, obras que sumiram em terremotos, obras que foram roubadas de dentro de carros, obras que existiram apenas como uma idéia embrionária e que não chegaram a ser escritas. Uma consternação.

Mas para que ninguém fique totalmente triste com esse desperdício, existe a defesa de que um livro perdido, assim como um amor platônico, pode ser infinitamente mais atraente do que muita coisa que já lemos, pelo simples fato de serem perfeitos em nossa imaginação.

No entanto, dói saber que há obras de Cervantes, Shakespeare e Goethe que foram abortadas antes de nascer e que nunca foram editadas.

Um tal Paul Labarrière confessou que perdeu um caderno com 50 poemas inéditos do amigo Rimbaud enquanto mudava de casa. Kafka era rigorosíssimo e chegou a pedir em testamento que sua obra fosse destruída, e pra nossa sorte não foi obedecido. No entanto, ele mesmo, ainda com saúde, queimou cartas, contos e uma peça de teatro inteira.

Ezra Pound, também chegado a umas labaredas, queimou dois romances e cerca de 300 sonetos. Hemingway colocou quase tudo o que escreveu até os 23 anos num baú e mandou para a Suíça aos cuidados de sua primeira esposa.

O baú nunca chegou. Foi roubado. Dizem que Hemingway entrou em curto-circuito quando soube, mas dias depois ressuscitou feito um leão e passou a escrever com muito mais vigor.

E Sylvia Plath, coitada, passou pelo pior tipo de censura: o marido, Ted Hugues, de quem ela já estava em processo de separação quando se suicidou, ficou com os direitos literários da poeta e simplesmente queimou os diários dos meses finais da vida de Sylvia para que os filhos dela não lessem. Nem eles, nem nós.

Particularmente, não fico entristecida com esses desaparecimentos históricos. Todos esses autores tiveram seus maravilhosos escritos publicados, e se não deixaram ainda mais, paciência. Não há motivo para desesperar-se diante de um não-acontecimento, de algo que não vingou.

O Livro dos Livros Perdidos é apenas um apanhado de curiosidades, e que me faz pensar menos nas obras extraviadas e mais nas que estão aí nas estantes me chamando, me implorando leitura, me exigindo tempo para elas. Os 1001 livros que preciso ler antes de morrer, esses sim me exasperam.

Uma ótima quarta-feira, aproveite este Dia Interncional do Sofá e namore muito.

terça-feira, 6 de novembro de 2007



06 de novembro de 2007
N° 15410 - Liberato Vieira da Cunha


A primeira Feira do Livro

Sou um dos raros sobreviventes da primeira Feira do Livro de Porto Alegre.

Ocorre que naquele ano de 1955 meu pai era secretário estadual de Educação e Cultura. Um seleto grupo de cavalheiros marcou uma audiência com ele, tendo à frente Say Marques e Maurício Rosenblatt. Incertos da acolhida, expuseram com um traço de timidez seu projeto.

Tratava-se de levar a literatura ao encontro dos leitores sob os jacarandás floridos da Praça da Alfândega. A SEC estaria disposta a dar-lhes apoio?

O dr. Liberato Salzano, que os ouvira calado, disse que sim, mas com uma condição: ele queria ser o orador da inauguração da mostra. A delegação deu um uníssono suspiro de alívio. Havia ido em busca de um aliado e encontrara um cúmplice.

O discurso que meu pai fez na abertura das barracas foi um dos mais inspirados de sua vida breve. Dizia em síntese que não há democracia sem cultura.

Mas ele não se limitou a ler as três páginas datilografadas nesta máquina Royal portátil que me espreita agora da estante. Confraternizou com o público, os editores e os livreiros, comprou obras de sua especial predileção. E tendo levado à solenidade a minhas irmãs e a mim, convidou-nos a imitá-lo.

Eu era um guri de 10 anos. Desde então nunca esqueci as poucas e acanhadas barracas, os livros que comprei, a cerimônia que logo se converteu num encontro afetuoso de amantes da leitura.

As barracas estão hoje de volta à praça. A cada vez que a percorro, agora monumental, estendendo-se da antiga Cinelândia, onde tudo começou, aos armazéns do porto, não deixo de recordar o princípio, que já me parece datado de uma existência anterior.

E lembro ainda o dia em que autografei ali o meu primeiro livro. Havia uma fila grande, gentileza de amigos, mas o que eu via mesmo era outro cenário.

Um jovem secretário de Educação dizendo que não há democracia sem cultura. Estou inclinado a crer que ele tinha razão.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007


MOACYR SCLIAR

Guerra é guerra

O despertador soava, ele jogava-o contra a parede e depois levantava da cama, muito alegre

Quem nunca teve vontade de atirar o despertador na parede numa segunda-feira de manhã? Foi pensando nisto que a empresa japonesa Tokyo Trading fez um despertador no formato de uma granada de mão.

Assim que o produto começa a tocar, seus usuários podem atirá-lo com toda força na parede. Um sensor de movimento "desarma" o despertador, que pára de tocar. Folha Online

VIVIAM JUNTOS havia muitos anos, e viviam bem. Como diziam os amigos, eram um magnífico exemplo de convivência harmoniosa.

Gostavam dos mesmos filmes, das mesmas bandas, dos mesmos livros, dos mesmos pratos. Torciam para o mesmo time, votavam nos mesmos candidatos. Casal perfeito, enfim.

Havia um único momento no dia em que a relação azedava: o momento de acordar. Porque aí, sim, eram diferentes. Ela pulava da cama lépida e fagueira, pronta a enfrentar os desafios do trabalho. Ele, pelo contrário, despertava sempre de mau humor.

Odiava a manhã. E odiava sobretudo o despertador que tocava diariamente às seis e meia -horário, a propósito, estabelecido por ela. Ele até que poderia acordar mais tarde, mas, afinal, eram um casal harmônico, e casais harmônicos acordam à mesma hora.

Só que o som do despertador estragava tudo. O relógio acabou tornando-se, para ele, um símbolo odiado. Pior que aquilo, dizia, só as trombetas do Apocalipse.

Um dia leu na Folha a notícia de que uma empresa japonesa tinha criado um relógio com o formato de uma granada de mão, um relógio que podia ser atirado com força contra a parede, sem quebrar.

O propósito do invento era muito claro: descarregar o mau humor das pessoas que não gostam de acordar de manhã. O caso dele.

Não vacilou: a um amigo que seguido viajava ao Japão encomendou o tal despertador. O amigo atendeu o pedido, e, quando o relógio chegou, ele teve certeza de que uma nova etapa começava em sua vida. Na vida do casal, para dizer a verdade.

Com a concordância dela, trocou o antigo despertador pelo novo. Na manhã seguinte, mal o relógio estilo granada soou ele agarrou-o e jogou-o contra a parede.

O estridente som de imediato cessou, com o que ele sentiu-se invadir por um imenso júbilo. Enfim, podia expressar seu protesto contra a vida matinal.

Enfim, podia dar vazão à sua contrariedade. O relógio-granada era a solução de seus problemas. Nos primeiros tempos correu tudo bem. O despertador soava, ele jogava-o contra a parede e depois levantava da cama, muito alegre.

Ela, porém, começou a mostrar-se contrariada. Não gostava de gente violenta. Sobretudo, não gostava daquele tipo de violência. Sentia como se a agressão fosse dirigida a ela. "É a mim que você quer jogar contra a parede", disse.

As discussões se sucediam, acabaram por separar-se e ela deixou o apartamento. Ele continua jogando o despertador contra a parede. Mas não com o mesmo entusiasmo, ao contrário.

Uma fantasia persegue-o, a fantasia de que a ex-namorada vai usar aquilo para se vingar. Uma noite, ele dormindo, ela entrará no apartamento (do qual ainda tem a chave) e trocará o relógio-granada por uma granada de verdade.

Quando ele atirá-lo, será aquela explosão. Mas não é em meio a uma explosão que terminam os grandes casos de amor?

MOACYR SCLIAR escreve, às segundas-feiras, um texto de ficção baseado em notícias publicadas na Folha

sábado, 3 de novembro de 2007



04 de novembro de 2007
N° 15408 - Martha Medeiros


Matando a saudade em sonho

Como vencer a saudade com algo que seja mais parecido com presença? Através do sonho

A saudade não tem nada de trivial. Interfere em nossa vida de um modo às vezes sereno, às vezes não. É um sentimento bem-vindo, pois confirma o valor de quem é ou foi importante para nós, e é ao mesmo tempo um sentimento incômodo, porque acusa a ausência, e os ausentes sempre nos doem.

Por sorte, é relativamente fácil exterminar a saudade de quase tudo e de quase todos, simplesmente pegando o telefone e ouvindo a voz de quem nos faz falta, ou indo ao encontro dessa pessoa.

Ou daquele lugar que ficou na memória: uma cidade, uma antiga casa. Podemos eliminar muitas saudades, enquanto outras vão surgindo.

A saudade do gosto de uma comida, de um cheiro do passado, de um abraço. Há muitas saudades possíveis de se conviver e possíveis de matar. A única saudade que não se mata é a de quem morreu. Matar, morrer. Que verbos macabros para se falar de nostalgia.

Já ouvi vários relatos sobre a saudade que se sente de um pai, de um avô, de um filho, de uma amiga, dos afetos que nos deixaram cedo demais - sempre é cedo para partir, não importa a idade de quem se foi.

Ficam as cenas guardadas na lembrança, mas elas se esvanecem, recordações são sempre abstratas.

De concreto, palpável, tem-se as fotos e as imagens de gravações caseiras, mas de tanto vê-las, já não vemos. Já a sabemos de cor. Não há o rosto com uma expressão nova, a surpresa de um gesto inusitado.

Como, então, vencer a saudade com algo que seja mais parecido com presença? Através do sonho.

Uma mãe que perdeu seu filho quatro anos atrás me conta que todos em casa sonham com ele, menos ela. Para sua infelicidade, ela não tem controle sobre isso, simplesmente não recebe essa bênção, e queria tanto.

E eu a entendo, porque através do sonho a pessoa que se foi nos faz uma visita.

Pode até ser uma visita aflitiva, mas a pessoa está de novo ali, ela está interagindo, ela está sorrindo, ou está calada, ou está dançando, ou escapando de nossas mãos, mas ela está acontecendo em tempo real, que é o período em que estamos dormindo, e que faz parte da vida, e não da morte.

De vez em quando sonho com minha avó e sempre acordo animada por ela ter encontrado esse meio de me dar um alô, de me fazer recordá-la. Observo seu jeito, ouço sua voz e penso:

quem roteirizou esse sonho? De onde vieram suas palavras para mim?

A resposta lógica: meu inconsciente falou através dela, só que isso tira todo o encanto da cena. Prefiro acreditar que ela é que esteve no comando da sua aparição, me dizendo o que tinha para dizer, nem que fosse uma frasezinha à toa.

Um colega de trabalho falecido há 20 anos num acidente de carro também já me apareceu em sonhos algumas vezes, e quando isso acontece acordo com a sensação de que morte, mesmo, é esquecimento:

enquanto eu abrir as portas do sonho para ele entrar, meu amigo seguirá existindo.

Nesse feriado de Finados, o que se pode desejar para os inúmeros saudosos de mães, de maridos, de netos? Que os sonhos abracem a todos.

Um excelente domingo ensolarado para todos nós.

Diogo Mainardi

A imundície continua lá

"O caso da Telecom Italia nunca rendeu nada de bom: só o enfado dos leitores e um processo judicial contra mim. Mas a Justiça italiana conseguiu juntar algumas das pontas que permaneciam soltas. Um dos diretores da empresa admitiu: em 2003, a Telecom Italia pagou propina no Brasil"

A Telecom Italia pagou propina no Brasil. Já leu isso em algum lugar? Sim: na coluna do autoproclamado Oráculo de Ipanema. A primeira vez em fevereiro de 2006, a segunda vez em outubro do mesmo ano, a terceira vez – chega, Diogo, chega – na semana seguinte.

O caso da Telecom Italia, apesar de tratado insistentemente na coluna, nunca rendeu nada de bom: só o enfado dos leitores e um processo judicial contra mim.

Mas todos sabem que eu sou um renomado parajornalista, e o que mais aborrece um renomado parajornalista é isto: uma trama em que as pontas permanecem soltas.

Nos últimos tempos, a Justiça italiana finalmente conseguiu juntar algumas dessas pontas. Depois de passar oito meses na cadeia, um dos diretores da Telecom Italia, Giuliano Tavaroli, admitiu ao juiz Giuseppe Gennari o que eu e meus leitores menos avoados já sabíamos: em 2003, nos primeiros meses do reinado lulista, a Telecom Italia pagou propina no Brasil.

O fato foi confirmado por outras duas testemunhas: o diretor financeiro da sucursal brasileira, Marco Girardi, e o chefe de segurança institucional da empresa, Marco Bonera.

A revista italiana Panorama acaba de publicar uma reportagem reconstruindo todos os eventos. Em 8 de abril de 2003, Marco Bonera foi encarregado de transportar 300 000 dólares a Brasília.

De acordo com seu depoimento, ele alugou um helicóptero, voou à capital e entregou o malote de dinheiro a duas pessoas num quarto do hotel Blue Tree. Sucessivamente, segundo ele, essas duas pessoas distribuiriam a propina a uma série de políticos relacionados numa lista.

Alguns dias depois, em 30 de abril, a Telecom Italia assinou um contrato de consultoria de 3,25 milhões de reais com o empresário Naji Nahas.

Recebi uma cópia desse contrato em janeiro de 2006, assim como o comprovante de que o pagamento havia sido feito em dinheiro vivo. Passei todo o material a VEJA.

A reportagem descobriu que parte do montante fora entregue a Ludgero Pattaro, uma das pessoas que – cito a matéria – "apareceram em relatórios da agência Kroll como sendo responsável por pagamento de propina da Telecom Italia a dirigentes do PT".

Ludgero Pattaro enfiou o dinheiro numa maleta e, acompanhado por guarda-costas, levou-o a uma saleta do hotel Renaissance, em São Paulo. Até agora ninguém podia apontar com certeza o destinatário do pagamento.

Aos juízes milaneses, Giuliano Tavaroli afirmou tratar-se da segunda parcela de uma propina destinada aos membros da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados.

Propina, propina, propina. Eu sei que o assunto se esgotou. Pode parar de bocejar. Isso tudo é velharia. Isso tudo pertence a um tempo em que a gente ainda tinha o ímpeto de espernear contra a imundície na política. O ímpeto passou. A imundície continua lá.

ótimo sábado e um excelente fim de feriadão.

Ponto de vista: Lya Luft

Paisagem com problemas

"Por ser complexa, a vida é interessante: por isso enchem-se os consultórios dos psicanalistas, escrevem os escritores, combatem os soldados"

Problemas são privilégio dos humanos. Quem mandou andar ereto, quem mandou pensar? Quem mandou inventar sociedade, trabalho, salário, teorias das mais abstrusas e, ainda por cima, política?

Altos e baixos, magros e gordos, belos e feios, pobres e ricos, inteligentes e menos iluminados, problemas sempre teremos: com filho, com cônjuge, com patrão, com funcionários, com o Fisco ou o governo, com amigos ou com a burrice alheia. Nosso envolvimento vai armando uma trama que nos atrapalha e não nos deixa enxergar a claridade ou curtir os não-problemas.

Outro dia, depois de uma palestra, um casal me abordou, simpático. Ele pediu: "Eu queria que a senhora escrevesse sobre a necessidade de reavaliar nossos problemas e aliviar a vida.

Pois minha mulher", ele a olhou com carinho, não com censura, "vive tão enrolada que pouco tempo resta para a alegria e para nós dois".

Ilustração Atômica Studio

"Bom", respondi, "isso depende dos problemas". E resolvi escrever este artigo, lembrando o que me disse uma amiga: "Quando a gente está muito atrapalhado, é bom parar e analisar o que sombreia nossa paisagem: são tragédias ou chateações?

Na imensa maioria das vezes são apenas chateações". Nunca esqueci essa fabulinha. Quando começo a querer me queixar da vida, penso nela.

"Com as perdas só há uma coisa a fazer: perdê-las", escrevi certa vez. Algo parecido ocorre com os problemas. Com eles, só há duas saídas: uma é resolvê-los. Com os insolúveis, o jeito é perceber e aceitar. Duro aprendizado.

Depois, relegá-los a um segundo plano, abrindo-se mais para a vida – que é breve, é difícil, e não deixa o bonde passar muitas vezes, ah, não. Um dia, talvez não distante, abriremos os olhos e lá estará o belo e terrível Anjo da Morte, curvando o dedo no gesto irrecusável: "Vim te buscar, pobre humano".

Não acho que problemas devam ser ignorados. Frivolidade também mata. Mas há sempre o momento de parar para pensar, ou pensar menos e viver mais. Rever nossas estruturas, internas e externas: O que posso resolver? O que devo esquecer ou superar para que não me sufoque ou me roube a luz de que preciso para enxergar outras coisas, coisas melhores?

A vida é dura lida. Por vezes altamente dramática. Aqui e ali, tragédia. Nem sempre podemos desviar os olhos e a alma, nem sempre podemos ignorar e superar, nem sempre podemos resolver. Vitórias são raras. "Do caos nasce a luz" e da derrota pode nascer uma nova pessoa, melhor que a de antes.

Mas do caos também pode surgir mais confusão, e da derrota pode resultar um pobre ser esmagado. Assim, dos problemas pode-se fazer uma seleção, em que alguns serão jogados fora. Deletou, acabou-se. Outros ficarão à margem do caminho, dando passagem ao otimismo e à vontade de vida, mas estarão ali, à espreita de um momento de fraqueza para nos assaltar feito bandoleiros.

Outros, ainda, necessitam de um longo tempo para que se desmanchem suas raízes no coração que se atormenta. Só que esse tempo não pode ser tão longo quanto a vida nem ocupar demasiado espaço dentro dela, ou desperdiçaremos o que há de melhor na paisagem.

Eu mesma, do alto dos meus tantos anos e duras lidas, não consigo resolver ou superar alguns de meus problemas nem ajudar pessoas que amo a se livrar de todos os seus. Às vezes o jeito é dar-se as mãos numa ciranda solidária, esperando que o bom senso vença a perplexidade e reduza nosso sofrimento inútil.

Seja como for, por ser complexa, a vida é interessante: por isso enchem-se os consultórios dos psicanalistas, escrevem os escritores, lutam os soldados, roubam os ladrões, enganam os crápulas e brincam, antes de se convencer da dureza dos combates, quase todas as crianças na paisagem em torno.

Não brincam as que morrem nos hospitais, fenecem nas ruas, sofrem nos lares violentos ou tristes: são responsabilidade nossa, grandes trapalhões que inventamos esta cultura, esta sociedade, esta injustiça, esta omissão, estas relações e esta vida.

Porque a morte, essa não inventamos nós. Diante dela, quase todos os problemas se resolvem, e empalidecem quase todos os dramas.

Lya Luft é escritora

FRANCISCO ALVES FILHO

Agora vem o mais difícil

Confirmado como sede da Copa de 2014, o Brasil terá o desafio de entregar o País em ordem e seguro

COMITIVA O anúncio da Copa foi acompanhado por 12 governadores.

Depois de uma campanha de 12 anos movida por governantes, cartolas e esportistas, o presidente da Fifa, Joseph Blatter, confirmou na terça-feira 30, em Zurique, o Brasil como país-sede da Copa de 2014. Passada a euforia pela conquista, é hora de encarar com firmeza os desafios que virão pela frente.

A tarefa é duríssima. Para que a organização do torneio seja um sucesso, será preciso fazer várias obras monumentais, como a construção de quatro estádios, além de melhorar a infra-estrutura de transportes – em especial, nos aeroportos – e, desafio dos desafios, garantir a segurança pública.

O custo anunciado para o evento, de US$ 6 bilhões, deverá crescer bastante. Presente à solenidade, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mostrou que está confiante. “A Fifa pode estar certa de que faremos o dever de casa e em 2014 teremos um Mundial para argentino nenhum botar defeito”, declarou, provocando os eternos rivais.

É bom cumprir a promessa. Nos planos de melhoria da infra-estrutura de transportes estão previstas muitas ousadias.

Como a criação do trem-bala que fará a ligação entre Rio e São Paulo e a construção da ferrovia Transnordestina. Até mesmo a finalização de Angra 3 e das usinas do complexo do Rio Madeira foram incluídas pelo governo em um plano de esforço para evitar um apagão durante o evento.

“É preciso criar o PAC da Copa”, defende Roberto Bernasconi, presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia. “Mas a maior parte dos investimentos deve sair da iniciativa privada”, defendeu. A partir de agora, o País terá que se modernizar, organizar e equipar em todas as áreas, principalmente nos Estados em que haverá disputas.

O presidente Lula, com a taça Fifa, diz que fará o dever de casa

A julgar pela quantidade de políticos presentes em Zurique, não faltará torcida. Além do presidente, dois ministros, 12 governadores e dezenas de assessores presenciaram a escolha da sede da Copa. José Serra (SP), Jaques Wagner (BA), Eduardo Campos (PE) e José Roberto Arruda (DF) disseram ter viajado por conta própria.

Os governadores Eduardo Braga (AM) e Ana Júlia (PA) alegaram que a CBF pagou suas despesas. A entidade, no entanto, nega. Quanto aos demais, ainda não se sabe. Na cerimônia, Romário e Dunga representaram os esportistas, mas a ausência de Pelé foi muito comentada.

O ex-jogador negou que o motivo seja inimizade com o presidente da CBF. Tampouco confirmou que a razão seria incompatibilidade comercial: Pelé é garoto- propaganda da Mastercard, enquanto a Copa é patrocinada pela Visa.


03 de novembro de 2007
N° 15407 - Cláudia Laitano


Fantasminha camarada

Todas as histórias de amor deveriam começar pelo fim. O desenlace de um relacionamento amoroso, como o último parágrafo de um romance, pode mudar radicalmente a leitura de tudo que houve antes. No amor, os fins iluminam os meios.

Mesmo no tempo em que os casamentos duravam 120 anos, era o final da história que distinguia um bom casamento de um casamento apenas longo.

Um casal um dia apaixonado pode terminar seus dias atormentando-se mutuamente ou ainda desfrutando a companhia um do outro. E tanto um epílogo quanto o outro definem o que foi o amor - ou o que não conseguiu ser.

Em relacionamentos que não duram uma vida inteira, mas são suficientemente intensos para deixar marcas perceptíveis, encerrar um capítulo amoroso é ainda mais delicado.

Exatamente porque nenhuma separação é fácil, enfrentá-la com dignidade mobiliza todas as energias de bom senso disponíveis. Poucas situações são tão reveladoras do caráter e da maturidade quanto a que coloca duas pessoas outrora íntimas em uma situação de rompimento.

A tentação de agir de forma egoísta é enorme, quase irresistível - como se o último bote do Titanic estivesse passando à frente, e a sobrevivência dependesse da capacidade de não pensar em mais ninguém.

Todos conhecem histórias de pessoas perfeitamente razoáveis que se atrapalharam na hora de terminar um casamento - brigando pela casa, pelo dinheiro, pelos filhos ou simplesmente desfrutando o prazer mórbido de se fazer presente na vida do outro como um espectro raivoso.

Um casamento que termina junto com o respeito e um mínimo de cordialidade é um casamento que deu errado, um encontro infeliz entre pessoas que não conseguiram encontrar um idioma comum em um momento de crise - malbaratando as boas memórias e penalizando os espectadores mais frágeis desse espetáculo, os filhos.

Mas nem sempre uma história de um amor que termina é o relato de um fracasso. No outro extremo dos sentimentos que se transformam em ódio ou indiferença, há o amor que vira uma espécie de fantasminha camarada - uma criatura nova, desencarnada do papel original, mas nem por isso maligna.

Vai-se o romance, fica o sentimento - reciclado, mas nem por isso menos profundo. Quando isso acontece, pode-se dizer que o amor deu certo - cumpriu o ciclo de todas as coisas vivas e se transformou.

Esse "amor depois do amor", raro na vida real, também não é comum na ficção - que obviamente prefere as grandes paixões. O escritor argentino Alan Pauls tentou contar essa história no romance O Passado, levado para o cinema agora pelo diretor Hector Babenco.

"A separação também pode ser parte de uma história de amor", anuncia o trailer. O filme, infelizmente, acaba fazendo um desvio para a perspectiva masculina mais banal, mostrando as mulheres como criaturas desvairadas e sufocantes.

Descontado o viés misógino, inegável, o filme tem o mérito de retratar o enorme desafio que é colocar o ponto final em uma relação amorosa com a devida solenidade - honrando o passado sem que isso signifique abrir mão do futuro.

Luciano Trigo tem um livro chamado Todas as Histórias de Amor Terminam Mal. Mas isso talvez não seja uma maldição, mas um lamento. Se terminou vergonhosamente mal, o mais provável é que nunca tenha sido amor.


03 de novembro de 2007
N° 15407 - A Cena Médica | Moacyr Scliar


Sono é desperdício? Não, sono é vida

Em New Jersey, nos Estados Unidos, visitei os famosos laboratórios de Thomas Edison em Menlo Park. Ali, estavam os instrumentos que usou trabalhando nas invenções que mudaram o mundo (o fonógrafo, por exemplo, precursor dos iPods).

Ali, estavam também seus livros e objetos diversos. Mas a coisa mais curiosa e surpreendente era uma pequena cama, colocada no meio mesmo da área de trabalho.

Ali, disse o guia que orientava a visita, Edison dormia um pouco, umas duas horas, mas somente quando estava muito fatigado. Em seguida, voltava ao trabalho. Para ele, sono era sinônimo de preguiça. Dormir muito seria tão prejudicial à saúde como comer muito.

Edison não foi a única pessoa de gênio a considerar o sono uma perda de tempo. Benjamin Franklin, político, intelectual, cientista, também era da mesma opinião.

A ele, são atribuídos ditos como "Raposa que dorme não pega a caça" e "Há bastante tempo para dormir - no túmulo", além do famoso e até hoje repetido "Early to bed and early to rise makes a man healthy, wealthy, and wise" ("Dormir cedo e acordar cedo faz um homem saudável, rico e sábio") - uma frase que o humorista James Thurber mudou para "Early to rise and early to bed, makes a man healthy and wealthy - and dead" ("Dormir cedo e acordar cedo faz um homem saudável, rico - e morto").

Outros que dormiam pouco, e por razões óbvias, eram Napoleão e Winston Churchill.

Para o poeta romano Virgílio, o sono é o irmão da morte, irmãos que, acrescenta o poeta americano William Hamilton Hayne (1856-1929), durante a noite, "dão-se suas estranhas e evanescentes mãos".

Ou seja: para pessoas que vêem no trabalho e na produtividade as prioridades da vida, as horas em que o sono nos desliga do mundo são absolutamente inúteis.

Será? Será que temos de subtrair de nossas vidas o tempo que passamos dormindo? Por mais que isso tenha parecido óbvio ao grande Edison, não é o que as pesquisas demonstram.

A falta de sono, seja pelo estresse cotidiano, seja por enfermidades várias, seja por medicamentos, é um distúrbio da saúde. E tem conseqüências. A pessoa fica menos alerta, menos atenta, sua memória e sua cognição são prejudicadas, a tensão emocional (não raro resultando em brigas e conflitos) aumenta.

Nos Estados Unidos, um estudo mostrou que a falta de sono causa cerca de 100 mil acidentes por ano, com 71 mil pessoas feridas e 1,5 mil mortos.

E a privação do sono também está associada com hipertensão, doença cardíaca, acidente vascular cerebral e obesidade - mostrando que Edison estava errado.

Dormir pouco não é o mesmo que comer pouco, ao contrário - Edison, aliás, também achava que exercício físico seria perda de tempo. Problemas de sono afetam cerca de um quarto da população americana - é, portanto, uma questão de saúde pública.

Dormindo, vivemos. E a melhor prova disso são os sonhos que se constituem, como mostrou Freud, numa forma de elaborar nossos problemas e nossas fantasias.

Durante o sono, nós nos transformamos em escritores, em cineastas: criamos personagens, inserimos esses personagens numa trama que, às vezes, nos parece absurda, mas que sempre tem um significado.

De fato, e ao contrário do que pensavam os antigos, o sonho não serve para adivinhar o futuro, como fez o José bíblico em relação aos sonhos do faraó.

O sonho serve para revelar a nossa face culta. E o sonho nos permite dormir. Com o que nos recuperamos e podemos acordar prontos para as tarefas do dia.

Temos de dar ao nosso cérebro o sono de que ele precisa. Ele nos retribuirá em criatividade, em produtividade e - por que não? - em felicidade.

sexta-feira, 2 de novembro de 2007



02 de novembro de 2007
N° 15406 - Paulo Sant'ana


Animais solidários

De uma vez por todas, é preciso que a população de Porto Alegre saiba qual é o órgão destinado ao salvamento dos animais.

Segunda-feira passada, uma leitora me telefonou desesperada porque um pássaro estava preso numa fenda de um caule de árvore já fazia 48 horas e o Corpo de Bombeiros se recusava a ir libertar o animalzinho. Isso aconteceu numa árvore da Rua Tomás Flores. Do Corpo de Bombeiros, informaram que era caso para o órgão de proteção ambiental.

No órgão de proteção ambiental, informaram que era caso para o Corpo de Bombeiros, que, no entanto, encurralado, disse que só poderia tomar providências no dia seguinte, não atendiam esses casos à noite. Este é um país em que quem tem câncer no intestino entra em fila de cirurgia que demora três anos e em que Corpo de Bombeiros não trabalha à noite.

É melhor ir embora daqui.

Ontem Zero Hora mostrou a sorte de outro pássaro preso num poste da esquina das avenidas Panamericana e Quito, no Jardim Lindóia.

Um filhote de chupim, pássaro que costuma morar nos ninhos dos outros, ficou com a perna presa num fio de náilon, no alto de um poste elétrico, entre duas casas de joões-de-barro.

Foi um deus-nos-acuda para chamar um órgão que salvasse o passarinho, que estava de cabeça para baixo. Chama a CEEE e lá dizem que é com os Bombeiros. Chama os Bombeiros, não atende porque é em cima de um poste e, se é em cima de um poste, tem de ser a CEEE.

Até que o clamor dos populares, ansiosos pela salvação do pobre passarinho, fez chegar ao local uma equipe da CEEE.

Mas veio o pelotão de choque da CEEE, aquele que está melhor preparado para enfrentar brigas com moradores que furtam energia elétrica do que fazer consertos na rede.

E o que decidiu o Bope da CEEE? Escolheu entre duas alternativas, dinamitar o poste ou destruir a casa do joão-de-barro, a segunda. E pôs-se o Bope da CEEE, em vez de subir lá no ninho e libertar o pássaro, a destruir a casa do joão-de-barro, com uma barra longa acionada lá de baixo.

Rasparam, rasparam na casinha de barro até que a demoliram. E junto com a casinha despencou lá de cima o passarinho que estava com a perna presa. Espatifou-se no chão o chupim e morreu.

Que salvamento desastrado esse do pelotão de choque da CEEE. Por preguiça, não puseram uma escada e não foram lá em cima libertar o animalzinho.

Que idéia estúpida a de escarafunchar na casa do joão-de-barro até derrubá-la, e com ela o pássaro que estava preso e morreu estatelado no chão. Que tropelia, que operação desastrada! Que trágica trapalhada.

Terminou o casal de joões-de-barro ficando sem casa, vão ter de chamar o Demhab.

E terminou principalmente o pobrezinho do chupim morto.

Restou uma lição de solidariedade animal jamais vista em nossa cidade. Tanto no episódio da Rua Tomás Flores quanto no do Jardim Lindóia, os dois pássaros presos pelas pernas e pendurados de cabeça para baixo foram socorridos, no primeiro caso por dois dias, no segundo por várias horas, por pássaros de outras espécies, que lhes alcançavam alimentos em seus bicos.

Outras aves socorristas alimentando, bico a bico, as duas avezinhas em apuros. Que solenidade de ternura. Que humanidade entre os animais!

E ainda vêm me dizer incautos cientistas que os animais não têm inteligência.

quinta-feira, 1 de novembro de 2007



01 de novembro de 2007
N° 15405 - Nilson Souza


O Laçador de bermuda

A estátua desceu do pedestal e invadiu minha sala de trabalho na tarde da última terça-feira.

Estava descaracterizada, é verdade. Em vez da conhecida pilcha, vestia uma prosaica bermuda de brim azul.

Mas o bigode inconfundível não deixava dúvidas: era ele mesmo, o monumento que saúda os visitantes na entrada da cidade, um símbolo da nossa hospitalidade e do nosso mais saudável orgulho de pertencer ao Rio Grande.

Oitenta anos completados em julho passado, João Carlos DÁvila Paixão Côrtes, o Laçador em carne e osso, deu um show de conhecimento, simpatia e vitalidade para um público de seis pessoas - este cronista curioso e seus companheiros da lida diária de pealar letrinhas.

Questionei-o sobre tudo o que me veio à cabeça, até levá-lo para o terreno da música tradicionalista. Então, lembrei-me da enquete que o Macedão está fazendo no seu programa matinal da Rádio Gaúcha, e perguntei-lhe de supetão:

- Qual a canção que você escolheria como hino popular do Rio Grande?

O gauchão não perdeu o embalo. Disse que cabe ao povo rio-grandense fazer esta escolha, mas que receberá com agrado os votos para a música de Simão Goldman, que ele mesmo interpreta e que se chama exatamente Hino ao Rio Grande.

Disse e cantou, para não deixar dúvidas: "Rio Grande do Sul,/ o gaúcho quer cantar/ a querência, o céu azul,/ os verdes pampas e o mar..."

Para manter o clima, fiz rodar no meu computador o mini-CD que acompanha o livro Flores da Cunha de Corpo Inteiro, de Lauro Schirmer, que abre com a interpretação de Paixão Côrtes do épico O Caudilho, música de Antonio Augusto Fagundes e Airton Pimentel.

Então o Laçador cresceu dentro de suas bermudas e acompanhou a própria voz, com gestos entusiasmados. Show. Depois disso, contou histórias, falou de seu trabalho de pesquisador da cultura gaúcha e ainda deu uma sapateada na sala, para nos fazer entender melhor determinado passo de dança.

Só então retirou-se, lépido e faceiro, provavelmente para retomar a sua condição de monumento.

Fiquei pensando no poema de Jayme Caetano Braun que faz parte do mesmo disco. Termina com versos definitivos: "Nunca haverá outro Rio Grande/ nem outro Flores da Cunha". Nem outro Jayme Caetano Braun. Nem outro Paixão Côrtes.

Haja pedestal!

Ainda que com chuva que teima em não parar, que tenhamos todos uma ótima quinta-feira, véspera de Feriadão.