24/12/2011
e 25/12/2011 | N° 16927
MARTHA
MEDEIROS
Natal para ateus
De
minha parte, não festejo o aniversário de Jesus, mas nem por isso minha casa se
transforma num iglu habitado por abomináveis corações de gelo. Me emociono,
confraternizo, abraço, beijo e brindo à paz, acreditando que essa abertura
sincera para o afeto é uma espécie de religião também.
Recentemente, o escritor e filósofo suíço
Alain de Botton esteve no Brasil lançando Religião para Ateus, livro em que ele
defende a tese de que, mesmo sem acreditar em Deus, é possível ter fé. E mesmo
sem ter fé, é possível encontrar na religião elementos úteis e consoladores que
suavizam o dia-a-dia.
Botton
condena a hostilidade que há entre crentes e ateus, e diz que em vez de atacar
as religiões, é mais salutar aprender com elas, mesmo quando não compactuamos
com seu aspecto sobrenatural.
Não é de hoje que admiro esse autor, e mais
uma vez ele me empolga com sua visão. Fui criada numa família católica, mas já na
adolescência minha espiritualidade se divorciou dos rituais de celebração, já que
deixei de acreditar em fatos bíblicos que me pareciam implausíveis. Nem por
isso fiquei órfã dos valores éticos que as religiões pregam.
Solidariedade, gentileza, tolerância, princípios
morais, nada é furtado daqueles que descartam a existência de Deus. Claro que,
se não houver o hábito constante da reflexão, podemos nos tornar materialistas
convictos e acabar exercendo a bondade só em datas especiais.
É nesse
ponto que Alain de Botton defende o lado prático e benéfico das religiões: elas
funcionam como lembretes sobre a importância de nos introspectarmos e de
fazermos a coisa certa todos os dias. Quem prefere não buscar esses lembretes
na igreja, pode buscar na arte, no contato com a natureza ou onde quer que sua
alma se revitalize.
Do que concluo que é possível encontrar o
sentido do Natal sem montar presépio, sem assistir à missa do Galo e sem
servilismo religioso. Basta que sejamos uma pessoa do bem, consciente das
nossas responsabilidades coletivas e que passemos adiante a importância de se
ter uma conduta digna. Nós todos podemos ser os pequenos “deuses” de nossos
filhos, de nossos amigos e também de desconhecidos.
Dentro desse conceito, posso afirmar que o
Natal é frequente aqui em casa: hoje, amanhã, depois de amanhã. A diferença é que
nos outros dias estamos de moletom em vez de vestido de festa, e a ceia vira
uma torrada americana, mas o espírito mantém-se em constante estado de alerta
contra o vazio e a superficialidade da vida.
Feliz Natal – para todos.
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