sábado, 22 de setembro de 2012



23 de setembro de 2012 | N° 17201QUASE PERFEITO |
Fabrício Carpinejar

Retroceder jamais

“Tenho 31 anos, um filho de 10, e moramos juntos com minha namorada há seis anos. De repente, surgiu a vontade de ir morar só com meu filho. Não pretendo terminar o relacionamento, apenas quero viver no meu canto, ser mais independente. É egoísmo? Isso pode dar certo? Beijos, Heloísa.”


Querida Heloísa,

Esta é a encruzilhada: recuar no relacionamento sem sacrificá-lo. Você pretende morar sozinha depois de seis anos. Quais os motivos? É necessário explicar muito bem e várias vezes para a atitude não ser compreendida como deserção.

Não há incompatibilidade no momento, brigas e ruídos, o que complica o entendimento da companhia.

Vocês formam uma família. A mudança representa uma mudança de rotina para o filho. Já projetou como seria dividir as tarefas entre duas residências, duas vidas e ainda conciliar namoro, trabalho e maternidade?

O que desejo dizer com esses questionamentos: acho que você deseja se separar e não pretende assumir a bronca. Criou uma transição diplomática para acomodar as forças contrárias e sair por cima. É um modo de se afastar pouco a pouco para se separar definitivamente ao final.

É evidente que o relacionamento vai esfriar. Ela terá desconfiança de seus sentimentos a partir de agora.

O amor não aceita menos do que já recebeu. Nunca.

Será que não ambiciona uma relação sem trabalho, apenas com o prazer no final de semana? Uma relação sem as dificuldades de convivência? Não será um amor preguiçoso que se pretende adolescente toda a vida?

Independência não é isolamento, mas também é dividir o teto com alguém e manter sua individualidade. Independência também é casamento.

É não ser sufocado pelas diferenças, nunca abandonar ou cair fora.

O noivado é um altar movediço

“Tenho um amigo muito querido que conheci no final da faculdade. Desde então, mantemos contato diário, eis que trabalhamos juntos. Ele é casado há sete anos; eu sou noiva. Esses dias, enquanto conversávamos, ele acabou me beijando e eu correspondi. Ficamos apenas uma vez. Sei que ambos somos comprometidos, mas confesso que gostaria de ficar com ele novamente. Estou perdida num turbilhão de dúvidas. Maria Teresa

Querida Teresa,

O noivado é um poço de intrigas. Uma tensão amorosa. Um festival de desculpas.

É a fase mais delicada e perigosa de uma relação, rica em desmanche de casais. Purgatório que criamos para manter o envolvimento do namoro e acalentar promessas de paraíso.

É como experimentar uma perturbadora tomada de decisão: será que me entrego para um único sujeito ou permaneço solteira para desfrutar de outras opções? Será que tomo uma história conjunta ou sigo com minhas alternativas de carreira e viagens sem ninguém para me incomodar?

O noivado é fatalista. Existe para não se casar, em vez de ajudar o enlace. Apesar do avanço do comportamento, temos a ideia do casamento para o resto da vida e pretendemos fugir dessa condenação com o primeiro que surgir em nossa frente. Você está vulnerável, fragilizada, pois está contaminada pelo complô romântico de que não há como desistir depois.

Então, para se ver livre da escolha, vem forçando um caso. Transferiu a responsabilidade para o colega de trabalho. Houve apenas um beijo, e já desenvolveu uma saída romanceada para largar os compromissos, já sofre de palpitações, já tem vontade de desabafar para seu noivo e contar a verdade. Extremou ao máximo um flerte, exagerando sua importância, criando pretextos para romper o noivado.

Na sua mente idealizada, elaborou a seguinte defesa: é mais justo desistir de um noivado por um amor verdadeiro.

Sua imaginação não está permitindo que a memória desenvolva lembranças.

Seja fiel a si mesma: você não está amando seu noivo. Não case por dote social.


22 de setembro de 2012 | N° 17200
NILSON SOUZA

Paradigmas

Trocávamos gibis na fila do cinema. Quando relato isso para os jovens da minha família, eles me lançam um olhar de dúvida e deboche, como se dissessem:

– Conta outra, tio! Conto, e arranco outros sorrisos irônicos.

Só fui conhecer supermercado na adolescência. Custei a me convencer de que podia tocar nas mercadorias sem que ninguém suspeitasse de que estava roubando. Vinha de uma educação rigorosa, de jamais pegar nada que não me pertencesse. O rigor disciplinar também era observado na escola: a gente levantava toda vez que a professora entrava na sala de aula. Todos os alunos levantavam e só sentavam quando ela autorizasse.

Desta outra a garotada tem o direito de duvidar: íamos a pé para a escola, que ficava a mais de um quilômetro de distância, sem qualquer preocupação com assaltos ou atropelamentos. Digo íamos porque as crianças da vizinhança formavam grupos e saíam chutando latas pela rua, em divertidas excursões diárias. Bah, essa não devia contar: usávamos guarda-pó (ou tapa-pó, se preferirem). Eram aventais brancos obrigatórios, espécie de uniforme da escola pública.

O mundo mudou – e muda numa velocidade cada vez mais vertiginosa. Não creio que a minha infância tenha sido melhor nem pior do que a dos meninos de hoje, que vivem gradeados em suas casas, passam horas na internet e têm relações, digamos, mais permissivas com os professores e com os adultos em geral. É outro paradigma. Outra forma de ver o mundo. O que podia ser considerado um grave pecado no meu tempo, hoje faz parte da rotina.

E aí chegamos a Monteiro Lobato e à polêmica em torno do racismo identificado no livro As Caçadas de Pedrinho. É inquestionável o viés racista na comparação entre a negra tia Nastácia e uma macaca. Hoje. Na época, não era. Isso acho que ninguém discute. A dúvida é se o livro, com a infeliz comparação, deve continuar sendo divulgado nas escolas.

Antes da decisão do Supremo, dou o meu palpite: censurar é sempre pior. Só serve para despertar a curiosidade das pessoas e para ampliar a visibilidade daquilo que se tenta esconder. Mais sensato é, como tentei fazer no nariz de cera desta crônica, contextualizar os fatos.

Monteiro Lobato usou uma comparação racista, sim, mas na sua época isso era normal. Felizmente não é mais. Evoluímos. O episódio não diminui a importância de sua obra. Por mim, continuaríamos mostrando o livro para as crianças, aproveitando para reforçar conceitos de igualdade e respeito racial.

Mas, ao contrário do Supremo, aceito recursos.


22 de setembro de 2012 | N° 17200
CLÁUDIA LAITANO

Feitiço da fila

A fila não só anda, mas fala. Se as filas pudessem ser conservadas em âmbar, seriam como fósseis sociológicos à espera de um Indiana Jones disposto a decifrar os segredos de uma época. Diga-me por que te perfilas e te direi quem és.

Há basicamente dois tipos de fila, as compulsórias e as eletivas. A compulsória é aquela que sequestra o tempo e a disposição da vítima: fila para ser atendido no hospital, fila para matricular o filho na escola, fila para receber a aposentadoria...

Em situações extremas, o primeiro sinal de que a sociedade entrou em colpaso é a fila para satisfazer necessidades básicas. Quanto mais filas compulsórias uma pessoa é obrigada a enfrentar, menos desenvolvido é o lugar em que ela vive. Fila é o IDH sem estatística.

A fila eletiva é aquela que enfrentamos por nossa conta e risco de desconforto: para visitar um museu pela primeira vez, para ver o time jogar uma final, para ficar perto de um ídolo. Claro que a fila eletiva dos outros sempre pode nos parecer sem sentido, mas exatamente porque os motivos que levam algumas pessoas a enfrentar uma fila nos parecem insondáveis é que elas são tão interessantes.

Não é absurdo imaginar que algumas são retroalimentadas pelo “fetiche da fila”: se existe uma fila, e eu não estou nela, devo estar perdendo algo. Não sei se é lenda urbana ou fato, mas já ouvi dizer que algumas casas noturnas de Porto Alegre dificultam a entrada para provocar filas e atrair mais gente ainda – para a casa e para a fila.

A fila na frente daqueles lugares que no pleistoceno eram chamados de “boate” sempre me comove. Apesar da roupa de festa e do cabelo arrumado, a fila do sabado à noite é quase compulsória, já que a maioria dos que estão ali – de pé, no frio, as meninas de salto alto – é movida pela universal necessidade básica de se dar bem no fíndi.

Exótica mesmo é a fila que atrai um sujeito capaz de dormir na frente de uma loja para comprar um produto que ele poderia adquirir alguns dias depois – sem fila. Devidamente registradas para a posteridade, as filas para comprar o último modelo do iPhone são o fóssil da nossa época que os estudiosos do futuro irão examinar com curiosidade e espanto.

Diante das lojas, em Nova York, na Alemanha ou Hong Kong, adultos aparentemente normais erguem o aparelhinho como se fosse o troféu de uma maratona. E de certa forma é, já que a fantasia que alimenta é a de que seus usuários poderão ultrapassar os limites do próprio corpo. Saber mais, viajar mais, comunicar-se mais, divertir-se mais. Navegar pelo cybercosmos com liberdade infinita e numa velocidade cada vez mais alucinante.

Talvez os geeks na fila do iPhone se vejam assim, como aventureiros de um novo mundo, ansiosos para expandir fronteiras em suas embarcações portáteis de última geração (até o próximo modelo) . Vistos de longe, porém, a única liberdade que os maratonistas do iPhone parecem exercer é a de escolher a marca a que decidiram ficar presos.

terça-feira, 18 de setembro de 2012



18 de setembro de 2012 | N° 17196
FABRÍCIO CARPINEJAR

Venha, por favor

Eu espero alguém que não desista de mim mesmo quando já não tem interesse. Espero alguém que não me torture com promessas de envelhecer comigo, que realmente envelheça comigo. Espero alguém que se orgulhe do que escrevo, que me faça ser mais amigo dos meus amigos e mais irmão dos meus irmãos. Espero alguém que não tenha medo do escândalo, mas tenha medo da indiferença.

Espero alguém que ponha bilhetinhos dentro daqueles livros que ela tem certeza que vou ler até o fim. Espero alguém que se arrependa rápido de suas grosserias e me perdoe sem querer. Espero alguém que me avise que estou repetindo a roupa na semana. Espero alguém que nunca desista de conversar mesmo quando não sei mais falar. Espero alguém que, nos jantares entre os amigos, dispute comigo para contar primeiro como nos conhecemos.

Espero alguém que goste de dirigir para nos revezarmos em longas viagens. Espero alguém que confie se a porta está fechada e o café desligado, se meu rosto está aborrecido ou esperançoso. Espero alguém que prove que amar não é contrato, que o amor não termina com nossos erros.

Espero alguém que não se irrite com a minha ansiedade. Espero alguém que possa criar toda uma linguagem cifrada para que ninguém nos recrimine. Espero alguém que arrume ingressos de teatro de repente, que me sequestre ao cinema, que cheire meu corpo suado como se ainda fosse perfume.

Espero alguém que não largue as mãos dadas nem para coçar o rosto. Espero alguém que me olhe demoradamente quando estou distraído, que goste de me telefonar para narrar como foi seu dia. Espero alguém que procure um espaço acolchoado em meu peito quando cansada. Espero alguém que minta que cozinha e só diga a verdade depois que comi. Espero alguém que leia uma notícia, veja que haverá um show de minha banda predileta, e corra para me adiantar por e-mail. Espero alguém que ame meus filhos como se estivesse reencontrando minha infância e adolescência fora de mim.

Espero alguém que fique me chamando para dormir, que fique me chamando para despertar, que não precise me chamar para amar. Espero alguém com uma vocação pela metade, uma frustração antiga, um desejo de ser algo que não se cumpriu, uma melancolia discreta, para nunca ser prepotente. Espero alguém que tenha uma risada tão bonita que terei sempre vontade de ser engraçado.

Espero alguém que comente sua dor com respeito e ouça minha dor com interesse. Espero alguém que prepare minha festa de aniversário em segredo e crie conspiração dos amigos para me ajudar. Espero alguém que pinte o muro onde passo, que não se perturbe com o que as pessoas pensam a nosso respeito. Espero alguém que vire cínico no desespero e doce na tristeza. Espero alguém que goste de domingo em casa, de acordar tarde e de andar de chinelos, e que me pergunte o tempo antes de olhar para as janelas.

Espero alguém que me ensine a me amar porque a separação apenas vem me ensinando a me destruir. Espero alguém que tenha pressa de mim, eternidade de mim, que chegue logo, que apareça hoje, que largue o casaco no sofá e não seja educada a ponto de estendê-lo no cabide. Espero encontrar uma mulher que me torne novamente necessário.

sábado, 15 de setembro de 2012



16 de setembro de 2012 | N° 17194QUASE PERFEITO |
Fabrício Carpinejar

Filho único do amor

“Tenho 30 anos, ele, 42. Nunca casou, é jovial sem ser ridículo. Viajamos, nos divertimos. A receita parece dar certo. Amigas sabiam do passado negro dele. No e-mail, enquanto ele dormia, vi comunicação com outras meninas. Por que homens precisam de outras janelas quando uma porta está aberta? Mirna”

Querida Mirna,

Já matou a charada intuitivamente: ele é o solteirão convicto. Não se interessa em casar. Sua rotina é falar com várias amigas ao mesmo tempo e manter sua dominação territorial. Não entrega a carteira de sedutor. Acompanhado ou não, mantém uma rede de contatos sempre atualizada.

É como um chefão preso; continua dando ordens de dentro do presídio. Seus amigos mandam as últimas notícias da farra e o mantém informado dos movimentos de conhecidas.

Homem sem antecedentes matrimoniais até os 40 é pior do que boneco inflável. Poderá encher ou esvaziar seu ego que ele não mudará a concepção de independência. Dificilmente se dispõe a trocar o estado civil e abdicar da fama junto às mulheres. Prefere o conforto da privacidade ao trabalho de ceder espaço e abdicar do próprio passado. É um tipo decidido, costuma ter profissão consolidada, que serve como desculpa para a falta de tempo.

Seu namorado nasceu para relações curtas e efêmeras. Deve preferir namorar no inverno, ideal para programas a dois e viagens românticas, mas encerra a relação no verão, quando deseja estar com condicionamento físico em dia e aproveitar a liberdade das baladas.

Não é o perfil que trai, é o que termina e não oferece chance para intimidade mais longa. É inconcebível a ideia de morar com outra pessoa e partilhar seus segredos e perder suas manias. É o filho único do amor. O filho mimado. Não admite dividir o quarto.

Saída de emergência

“Vamos não vamos, nos perdemos, voltamos. Ele mudou de cidade, mas sempre ia me ver. Uma semana antes de eu ir para a Suécia, ele pediu que eu ficasse, propôs morar com ele. Foi da boca para fora. Ele vasculha minhas fotos e mural no Facebook, mas não manda mensagem. Será que não sou nada? Graça”

Querida Graça,

Vocês criaram aquilo que chamo de “romance de saída de emergência”. É um relacionamento que não conhece paz, harmonia e calma, adora crises e cresce com a possibilidade do fim.

Quando estão perto de romper em definitivo, as juras são renovadas e alimentam a ilusão de que o relacionamento engatou de vez. Em seguida, com a estabilidade, a convivência retoma o batimento e voltam a provocar um ao outro por uma nova declaração e picos de audiência cardíaca.

Ele ama você, mas não ama a vida que pode ter com você.

Ele ama você, mas odeia estar amando. Compreende o amor como uma maldição, uma pegadinha do destino. Pretende ficar próximo, mas rejeita o cenário de simbiose e dependência.

Confia que o amor é uma fragilidade a ser evitada. Atrapalhará sua liberdade de ir e vir, prejudicará os negócios e o desempenho profissional. O amor é uma espécie de inimigo insaciável, a exigir disponibilidade para gentilezas, mimos e cuidados.

Ele experimenta a seguinte crise: não se separa e também não se entrega. Procura se livrar do amor, mas não de sua companhia.

Isso explica a vigília em silêncio (vasculhando seu Facebook) e a natural resignação diante dos adiamentos e promessas quebradas (como a do aeroporto).

Entendeu a contradição?

Não construiria minha vida para chamar seu retorno. Não mudaria os hábitos ou inventaria viagens loucas para atrair seu desespero. Vai sofrer muito.

Não pode ser metade do que você é porque ele não é inteiro.


16 de setembro de 2012 | N° 17194
MARTHA MEDEIROS

A era do compacto

Estava num avião, voando do Rio para Porto Alegre. Ao meu lado, um casal. Ele lia Retrato em Sépia, de Isabel Allende. No finalzinho da viagem, fechou o livro e fez o seguinte comentário pra esposa: Por mim, os livros não precisariam ter este número de páginas, um resumo da história estaria mais do que bom.

Há quem escolha um livro pelo número de páginas. Se tiver mais que duzentas, não chega nem perto. Livrão: taí uma coisa que não me inibe. É bem verdade que um tijolaço não é lá muito agradável de segurar, mas nada impede que seja devorado com prazer. No entanto, é uma exceção que abro para a literatura. Para quase todo o resto, sou fã dos compactos.

Cinema, por exemplo. Não entendo por que esta mania agora de filme com três horas de duração. Era tão bom quando os filmes duravam no máximo duas horas. Sessões às 14h, 16h, 18h, 20h. Agora as sessões começam em horários mais esdrúxulos: 14h10min, 17h25min, 20h50min. E o troço não termina nunca.

Peça de teatro, nem me fale. deveria ser lei: não durar mais do que 90 minutos – que o Zé Celso Martinez Corrêa não me ouça. Gosto muito de teatro, mas também gosto muito de jantar. Em tempo: tampouco gosto de me estender demais nos restaurantes. Não gosto de me estender em festas. Não gosto de me estender demais fora da minha casa e fora da minha rotina. Não gosto de nada que extrapole o tempo regulamentar do meu humor e da minha capacidade de simpatia.

Reconheço que nada do que estou dizendo é digno de aplauso. Manda a etiqueta não se apressar, usufruir de tudo com calma, dar tempo para que as coisas se desenvolvam. Na teoria, concordo. na prática, sou menos paciente. Não lido bem com situações que se arrastam, com falta de objetividade, com rodeios.

Fico nervosa com gente que fala muito pausadamente e leva 10 minutos pra dizer o que poderia ser dito em três. Pessoas que perdem horas ao telefone sem chegar logo ao ponto. Música que repete à exaustão o estribilho: eu cortaria uns quatro “lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, hey, Jude...” no final da música dos Beatles. Que heresia: sobrou até para os Beatles.

E o que dizer de um palestrante que ama a própria voz – e e-mails do tamanho de teses de mestrado? E de doutorado? E novelas? Alguém me explica por que ainda fazem novelas que duram oito meses?

Estou dando a impressão de que fui abduzida por esse mundo que não enaltece o prazer, que não se entrega à reflexão, que não curte as travessias. Mas a verdade é que eu ainda me regalo – e muito – com prazeres, reflexões e travessias, sem achar que para isso é necessário que elas me esgotem, que me obriguem a chegar na outra margem sem fôlego.

Para provar que não sou um caso totalmente perdido, algumas coisas ainda aprecio que sejam longas, como as amizades, as caminhadas, as conversas em volta da mesa, nosso tempo de vida. E uma boa transa, claro.

Já sexo tântrico é outro exagero. Cinco horas pra atingir o orgasmo? Esse pessoal não tem que trabalhar no dia seguinte?

Martha Medeiros está em férias e volta na próxima edição. Esta coluna foi originalmente publicada em 27 de maio de 2009 e faz parte do livro Feliz por Nada. 



16 de setembro de 2012 | N° 17194
MARTHA MEDEIROS

A era do compacto

Estava num avião, voando do Rio para Porto Alegre. Ao meu lado, um casal. Ele lia Retrato em Sépia, de Isabel Allende. No finalzinho da viagem, fechou o livro e fez o seguinte comentário pra esposa: Por mim, os livros não precisariam ter este número de páginas, um resumo da história estaria mais do que bom.

Há quem escolha um livro pelo número de páginas. Se tiver mais que duzentas, não chega nem perto. Livrão: taí uma coisa que não me inibe. É bem verdade que um tijolaço não é lá muito agradável de segurar, mas nada impede que seja devorado com prazer. No entanto, é uma exceção que abro para a literatura. Para quase todo o resto, sou fã dos compactos.

Cinema, por exemplo. Não entendo por que esta mania agora de filme com três horas de duração. Era tão bom quando os filmes duravam no máximo duas horas. Sessões às 14h, 16h, 18h, 20h. Agora as sessões começam em horários mais esdrúxulos: 14h10min, 17h25min, 20h50min. E o troço não termina nunca.

Peça de teatro, nem me fale. deveria ser lei: não durar mais do que 90 minutos – que o Zé Celso Martinez Corrêa não me ouça. Gosto muito de teatro, mas também gosto muito de jantar. Em tempo: tampouco gosto de me estender demais nos restaurantes. Não gosto de me estender em festas. Não gosto de me estender demais fora da minha casa e fora da minha rotina. Não gosto de nada que extrapole o tempo regulamentar do meu humor e da minha capacidade de simpatia.

Reconheço que nada do que estou dizendo é digno de aplauso. Manda a etiqueta não se apressar, usufruir de tudo com calma, dar tempo para que as coisas se desenvolvam. Na teoria, concordo. na prática, sou menos paciente. Não lido bem com situações que se arrastam, com falta de objetividade, com rodeios.

Fico nervosa com gente que fala muito pausadamente e leva 10 minutos pra dizer o que poderia ser dito em três. Pessoas que perdem horas ao telefone sem chegar logo ao ponto. Música que repete à exaustão o estribilho: eu cortaria uns quatro “lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, hey, Jude...” no final da música dos Beatles. Que heresia: sobrou até para os Beatles.

E o que dizer de um palestrante que ama a própria voz – e e-mails do tamanho de teses de mestrado? E de doutorado? E novelas? Alguém me explica por que ainda fazem novelas que duram oito meses?

Estou dando a impressão de que fui abduzida por esse mundo que não enaltece o prazer, que não se entrega à reflexão, que não curte as travessias. Mas a verdade é que eu ainda me regalo – e muito – com prazeres, reflexões e travessias, sem achar que para isso é necessário que elas me esgotem, que me obriguem a chegar na outra margem sem fôlego.

Para provar que não sou um caso totalmente perdido, algumas coisas ainda aprecio que sejam longas, como as amizades, as caminhadas, as conversas em volta da mesa, nosso tempo de vida. E uma boa transa, claro.

Já sexo tântrico é outro exagero. Cinco horas pra atingir o orgasmo? Esse pessoal não tem que trabalhar no dia seguinte?

Martha Medeiros está em férias e volta na próxima edição. Esta coluna foi originalmente publicada em 27 de maio de 2009 e faz parte do livro Feliz por Nada. 



15 de setembro de 2012 | N° 17193
NILSON SOUZA

Crônica para ler no bonde

Andei lendo sobre o grande escritor Malba Tahan, pseudônimo de um modesto professor de escola pública que transformou a Matemática em tema de histórias encantadoras, além de ter revelado profundo conhecimento do mundo árabe sem jamais ter viajado ao Oriente.

O carioca Júlio Cezar de Mello e Souza, que não era meu parente apesar do sobrenome bonito, também militou no jornalismo – como bico, pois em 1918 os professores já ganhavam mal – antes de se transformar no reconhecido autor de mais de cem livros, entre os quais o best-seller O Homem que Calculava. E foi na seção de literatura do seu jornal que tentou emplacar sua primeira obra literária – um conto curto para ser lido no bonde.

Ponto na história de Malba Tahan, quem quiser que busque mais informações sobre ele – e vale a pena. O que me chamou a atenção na biografia, e o que gostaria de compartilhar com os heroicos leitores e leitoras deste texto de mais de 30 linhas, é exatamente essa questão da leitura rápida, da literatura de ocasião, pensada para ocupar a atenção dos passageiros do tempo.

O livro de bolso, que já foi moda nos países que viajam de trem ou metrô, também virou literatura longa numa sociedade que leva a internet na palma da mão. Outro dia observei seis pessoas numa parada de ônibus: três falavam ao celular, uma consultava sua caixa de mensagens, outra digitava torpedos e a última segurava uma pasta junto ao corpo, provavelmente um tablet, que só não estava visível por motivos de segurança. Livros, nem pensar.

A rendição às poucas letras é tamanha, que até a própria Academia Brasileira de Letras promoveu recentemente um concurso de microcontos para Twitter, sob o pretexto de atrair escritores (leitores?) jovens. Milhares mandaram os seus recados, e a vencedora, uma conterrânea de Malba Tahan chamada Bibiana (nome pra lá de literário), até que escreveu uma coisa interessante e divertida: “Toda terça ia ao dentista e voltava ensolarada. Contaram ao marido sem a menor anestesia. Foi achada numa quarta, sumariamente anoitecida”.

Dá, sim, para escrever pouco e dizer muito. Mas esta economia de palavras e pensamentos não pode servir de justificativa para a preguiça. Veja-se, por exemplo, o conto Os Trinta e Cinco Camelos, escrito pelo homem que calculava as suas histórias: nem curto nem longo, com diálogos significativos, enredo engenhoso e final surpreendente. Dá para ler no bonde, no ônibus, no trem-bala, no avião e até na internet. Não perca.

Se você ainda não leu – e chegou, com fôlego, ao final desta crônica –, considere-se habilitado para a aventura. Bom proveito.


15 de setembro de 2012 | N° 17193
CLÁUDIA LAITANO

Ideias fora do lugar

Dois livros mais ou menos da mesma época, de dois dos maiores escritores do nosso tempo, apresentam professores de literatura enrascados com o politicamente correto. Em Desonra (1999), de J. M. Coetzee, a história é a de um professor que se envolve com uma aluna e acaba caindo em desgraça na universidade. Em A Marca Humana (2003), de Philip Roth, uma expressão considerada racista, dita em sala de aula, obriga um professor veterano a pedir demissão.

A coisa não anda mesmo fácil para professores de literatura. Houve um tempo em que pedir que um aluno decorasse o primeiro canto de Os Lusíadas era banal. Ninguém estava preocupado se o aluno ia gostar ou sequer entender quem eram os barões assinalados e onde ficava a ocidental praia lusitana. O importante era introduzir o garoto na vasta tradição de conhecimento acumulado pela humanidade, nas artes e nas ciências, ampliando seus horizontes e despertando sua curiosidade. Gosto, literalmente, não se discutia.

Quando a minha geração chegou à escola, já ninguém decorava Camões ou mesmo um poema curto de Drummond. Decorar poesia caíra de moda, mas decorar datas e classificações ainda parecia sensato. O professor de literatura já não tinha tanto prestígio quanto em meados do século, mas ainda era respeitado como alguém com conteúdo para ensinar.

Nos últimos anos, a moda é se aproximar dos alunos, mostrar que literatura “é isso tudo que está aí” – jornal, quadrinhos, publicidade, Crepúsculo, blog de maquiagem. Exigir que o aluno saia da escola sabendo pelo menos o básico sobre o assunto, método que ainda funciona no ensino de física ou biologia, não emplaca mais na literatura. Ler deve ser tão fácil e “intuitivo” quanto redigir um torpedo ou aprender a mexer no celular.

Até pouco tempo, portanto, a pior coisa que poderia acontecer a um professor de literatura no Brasil era ter alunos convencidos de que não precisam mais de aulas de literatura. O fundamentalismo politicamente correto que Roth e Coetzee criticavam em seus livros ainda não havia mostrado os dentes no Brasil – talvez porque a leitura por aqui seja tão secundária que sequer desperta o interesse das diferentes patrulhas.

Nos últimos dias, porém, tem ficado claro que mesmo um país que lê pouco pode ler ainda menos: Monteiro Lobato está sendo alvo de um julgamento póstumo digno do realismo mágico, enquanto Dalton Trevisan foi banido de uma lista de leituras no Paraná por ter sido considerado “inadequado” para adolescentes. (Onde esses pais vivem? Na Disney?)

O crítico Roberto Schwarz criou a expressão “ideias fora de lugar” para explicar como no Brasil escravocrata de Machado era possível (ou não) cultivar ideias “europeias” de justiça e liberdade. Pois exigir literatura politicamente correta em um país que não lê é uma espécie de ideia fora de lugar, um molho de salada derramado sobre o prato de um morto de fome.

Para quem esqueceu para que servem os professores de literatura, aí vai o lembrete: são eles que podem ajudar os alunos a entender por que Lobato tratava Tia Nastácia do jeito que tratava e por que um conto de Trevisan vale mais do que todos os milhões de exemplares vendidos de 50 Tons de Cinza – lidos, aliás, com surpreendente voracidade por adolescentes. Sem que seus pais sequer desconfiem, é claro.

terça-feira, 11 de setembro de 2012



11 de setembro de 2012 | N° 17189
FABRÍCIO CARPINEJAR

Os potinhos fora do prédio

Na saída do meu prédio, sempre piso em pratinhos de água e restos de comida, destinados por algum vizinho a um cachorro de rua.

Molho a bainha da calça, espirro polenta na roupa, mas o incômodo físico é o de menos.

Pressinto uma falsidade involuntária na assistência.

Quando criança, era natural oferecer, totalmente escondido, leite para ninhada de gatos, até os pais admitirem sua entrada em nossa vida.

O cenário diante do meu condomínio é outro: adultos repassam comida sigilosamente sem nenhum motivo. Escondem de quem? De si?

Por que o tráfico de ternura?

Toda manhã, a refeição é renovada e o coitado do bicho comparece para matar a fome e a sede. Só que ninguém mata sua orfandade.

O que sugere ser uma boa ação, na minha crença, é crueldade.

É trazer o cãozinho para perto e não permitir-lhe entrar. É oferecer a isca e abandoná-lo. É fingir que preserva sua saúde durante alguns minutos para largá-lo à sorte no restante do dia.

É criar uma série de mendigos de quatro patas aguardando a esmola da entrada.

Cada morador que entra no conjunto residencial recebe uma mirada funda, triste, implacável.

O olhar canino tem carências de chapéu – e o coração se contrai como niqueleira vazia.

O animal não se vê recompensado e satisfeito, mas viciado e perdido. Suga as nossas sobrancelhas. Abana o rabo por qualquer contração do rosto, na expectativa de uma família adotiva.

Está sendo torturado: não sabe como agir para ser aceito, não sabe se deve ficar imponente de vigília ou desaparecer discretamente e retornar no sol seguinte.

Ele se frustra perante a porção. Não tem um afago demorado, sinal de permanência, um assobio confiante para libertá-lo.

Quem alimenta no portão está se enganando e enganando o bichinho.

Não tem coragem de colocá-lo em sua sala, em sua cozinha e integrá-lo definitivamente a um teto.

Faz de conta que ama e se preocupa, porém recusa o trabalho inteiro de recuperação e treinamento.

É um cumprimento de mão frouxa. Mantém próximo, jamais protegido.

Não existe generosidade parcelada, é uma prestação única e à vista.

Desse jeito, é ajudar para receber o título de bondoso, nunca porque deseja realmente ajudar.

Oferecer sobras é assistencialismo, é populismo, é paliativo.

A responsabilidade é a única caridade por inteiro. O resto é adiamento.

Se quer cuidar do bicho, leve para casa. Dê um lar. Assuma o compromisso do convívio.

É abrir a primeira porta, a porta do meio e a porta de dentro.

As três portas que separam a aparência do caráter.

sábado, 8 de setembro de 2012



09 de setembro de 2012 | N° 17187
MARTHA MEDEIROS

Seu apartamento é feliz

Dia desses, fui acompanhar uma amiga que estava procurando um apartamento para comprar. Ela selecionou cinco imóveis para visitar, todos ainda ocupados por seus donos, e pediu que eu fosse com ela dar uma olhada. Minha amiga, claro, estava interessada em avaliar o tamanho das peças, o estado de conservação do prédio, a orientação solar, a vizinhança. Já eu, que estava ali de graça, fiquei observando o jeito que as pessoas moram.

Li em algum lugar que só há uma regra de decoração que merece ser obedecida: para onde quer que se olhe, deve haver algo que nos faça feliz. O referido é verdade e dou fé.

Não existe um único objeto na minha casa que não me faça feliz, pelas mais variadas razões: ou porque esse objeto me lembra de uma viagem, ou porque foi um presente de uma pessoa bacana, ou porque está comigo desde muitos endereços atrás, ou porque me faz reviver o momento em que o comprei, ou simplesmente porque é algo divertido e descompromissado, sem qualquer função prática a não ser agradar aos olhos.

Essa regra não tem nada a ver com elitismo. Pessoas riquíssimas, aristocráticos e maçantes com suas torneiras de ouro, quadros soturnos que valem fortunas e enfeites arrematados em leilões. São locais classudos, sem dúvida, e que devem fazer seus monarcas felizes, mas eu não conseguiria morar num lugar em que não me sentisse à vontade para colocar os pés em cima da mesinha de centro.

A beleza de uma sala, de um quarto ou de uma cozinha não está no valor gasto para decorá-los, e sim na intenção do proprietário em dar a esses ambientes uma cara que traduza o espírito de quem ali vive. E é isso que me espantou nas várias visitas que fizemos: a total falta de espírito festivo daqueles moradores. Gente que se conforma em ter um sofá, duas poltronas, uma tevê e um arranjo medonho em cima da mesa, e não se fala mais nisso.

Onde é que estão os objetos que os fazem felizes? Sei que a felicidade não exige isso, mas pra que ser tão franciscano? Em estímulo visual torna o ambiente mais vivo e aconchegante, e isso pode existir em cabanas no meio do mato e em casinhas de pescadores que, aliás, transpiram mais felicidade do que muito apê cinco estrelas. Mas grande parte das pessoas não está interessada em se informar e em investir na beleza das coisas simples.

E quando tentam, erram feio, reproduzindo em suas casas aquele estilo showroom de megaloja que só vende móveis laqueados e forrados com produtos sintéticos, tudo metido a chique, o suprassumo da falta de gosto. Onde o toque da natureza? Madeira, plantas, flores, tecidos crus e, principalmente, onde o bom humor? Como ser feliz numa casa que se leva a sério?

Não me recrimine, estou apenas passando adiante o que li: pra onde quer que se olhe, é preciso alguma coisa que nos deixe feliz. Se você está na sua casa agora, consegue ter seu prazer despertado pelo que lhe cerca? Ou sua casa é um cativeiro com o conforto necessário e fim?

Minha amiga ainda não encontrou seu novo lar, mas segue procurando, só que agora está visitando, de preferência, imóveis já desabitados, vazios, onde ela possa avaliar não só o tamanho das peças, a orientação solar, o estado geral de conservação, mas também o potencial de alegria que ela pretende explorar.

Martha Medeiros está de férias e volta na edição do dia 23 de setembro. Esta crônica foi originalmente publicada em 24 de janeiro de 2010 e faz parte do livro Feliz por Nada.



09 de setembro de 2012 | N° 17187QUASE PERFEITO |
Fabrício Carpinejar

Envolvimento demais

“Tenho 31 anos, sou profissional liberal bem-sucedida, culta, bem-humorada. Meu relacionamento terminou há quatro meses, quando pressionei meu namorado para alugarmos um apartamento. Ele confessou não estar pronto. Era uma pessoa muito ligada à mãe. Abraços, Magda”


Querida Magda,

Não sei se isso é uma pergunta ou uma propaganda pessoal. Você está extremamente partidária de si. Numa campanha eleitoral ostensiva. Nunca errou, pisou na bola? Aparece pregando suas virtudes, o que provoca uma severa desconfiança do eleitorado.

Quem se elogia antes não oferece espaço para elogio depois. Acho que somente espera que eu concorde com sua vitimização, mas vamos pensar juntos. Quando tememos um amor, ele fica. Quando desejamos desesperadamente um amor, ele some.

Temer é viver a dúvida, a inquietação, ouvir o contraponto com interesse. Já ambicionar o casamento antes do amor é atropelar o namorado com nossa ansiedade. Está tão faminta de uma relação que não sente o sabor das pequenas ofertas.

Sua ânsia de se estabelecer rapidamente (e encontrar um parceiro à altura de seus predicados) aniquila qualquer relacionamento. Cheira como um golpe, trote, insanidade. A decisão de morar junto deve ser conjunta, senão haverá recaída logo mais adiante. Se ele diz que não está pronto, não estava brincando. Tanto que acabou. É como alguém disposto a acampar enquanto você anseia o conforto do quarto de um hotel.

Quando o primeiro pressiona, e o segundo resiste, é um sinal de desentendimento futuro. Não iria mudar sua mentalidade, ou vencer o concurso materno com a sogra. No amor honesto, é mais fácil desistir de nossas convicções do que convencer o outro. Minha dica: use talheres e guardanapo, pare de comer com as mãos.

Sem envolvimento

“Resolvi não me envolver com mais ninguém, mas não consegui. Estou saindo com um cara há quatro meses. Ele deixou claro que não vai se envolver, e eu aceitei. Não começamos e por isso não temos como terminar. Todos me orientam para sair dessa: mãe, amigas. Beijo, Penélope”.

Querida Penélope,

Amor não é contrato onde rubricamos cláusulas ou respeitamos promessas logo na entrada. Dizer que não vai se envolver é o mesmo que pedir em casamento de cara. A mesma arbitrariedade. A mesma ditadura. A mesma falta de senso. O mesmo assalto.

Estabelecer regras do jogo antes de jogar é constranger a namorada. Entendo que tenha concordado, fingido desinteresse. Entendo que é um modo de não pressionar.

Mas ele usará suas palavras contra você. Sua expectativa é que ele mude de opinião e confesse que a ama para seguir com aquilo que realmente se propõe (um namoro sério). Sofrerá todos os encontros aguardando a declaração amorosa libertadora. Criou uma dependência desnecessária. Uma fissura que prejudica o entendimento dos fatos.

Está empenhada em alcançar um fim, e é natural desprezar o andamento ou não se ligar com detalhes importantes da aproximação. É um blefe. Todo blefe custa caro. Como não há como ganhar com sua verdade, ele precisa perder. Torce para que ele morda a língua e assim não ser derrotada. O fracasso dele é sua vitória. O êxito dele é seu fiasco.

Quando o sujeito confessa que não deseja se envolver não é franqueza, é cara-de-pau. Nas entrelinhas, está avisando o seguinte: terá que me agradar muito para me conquistar. Ele lava as mãos para que trabalhe dobrado pela relação. Ele apenas quer receber e ser mimado. É o escravagismo do silêncio.

Abolição já!

domingo, 2 de setembro de 2012


DANUZA LEÃO

Certa pobreza

A pobreza urbana é agressiva; são mulheres com uma criança no colo, duas pela mão

Outro dia tive que ir ao centro da cidade, onde não ia havia anos. Conheci esse centro quando ainda era criança e tinha chegado do Espirito Santo para viver no Rio. Na zona sul não havia lojas, ainda não existiam as butiques, e uma vez por semana ia com minha mãe ao centro.

Era onde se faziam compras, desde as mais banais, até as mais importantes, que na época era um par de sapatos ou o tecido para fazer um vestido. Não existiam vestidos prontos, e cada família tinha sua costureira. Comprava-se o figurino (revista de moda), a costureira dizia de quantos metros precisava, fazia-se uma prova, e um dia chegava um embrulho de papel cor de rosa, fechado com alfinetes -o durex ainda não tinha sido inventado-, trazendo o vestido.

Era uma emoção ir ao centro, onde havia um comércio que me parecia o luxo dos luxos. Havia até lojas que vendiam casacos de pele, e imagino que fazia frio no Rio para usar peles -devia fazer-, pois as vitrines das lojas Canadá e Sibéria mostravam as mais lindas.

Depois das compras, um lanche na Colombo, e a volta para casa de bonde. Era um dia completo, de total felicidade. Foi lá que pela primeira vez tomei um sundae e comi uma coxinha de galinha; em Vitória não existiam essas coisas chiques.

O mundo mudou, há anos não ia ao centro, mas tive que ir, semana passada. Passei pelas mesmas ruas e me deu uma tristeza tão grande que era melhor não ter ido.

Fui parar no largo da Carioca; é um largo, como diz a palavra, onde hoje as lojas são barraquinhas, e havia uma que, para animar, tocava um som bem alto. Das músicas, nem vou falar. Mas o que me impressionou mesmo foi a quantidade de pessoas que circulava por ali. Eram muitas e todas, absolutamente todas, muito pobres.

Em qualquer bairro do Rio existe gente pobre, mas não tantas assim, nem tão pobres. Era uma miséria absoluta, que se via nas roupas, nos sapatos -a maioria com uma sandália havaiana já bem usada- e nos rostos. Muitas lanchonetes pela rua, e numa delas o cartaz: "Arroz, feijão e batata frita por R$ 10,50".

Fiquei pensando nos pobres do Nordeste, que se veem na televisão e em alguns filmes brasileiros; eles moram em casebres com chão de terra batida, sempre muito bem varrido. E têm uma dignidade; não sei bem de onde ela vem, mas ela existe. Talvez por terem um pedacinho de chão só deles, talvez.

A pobreza urbana é agressiva; são mulheres com uma criança no colo, duas pela mão, levadas pelas mães porque não têm com quem ficar, adolescentes de short e camiseta que devem ser a única roupa que têm. Ninguém pedia esmola, todos estavam ali fazendo alguma coisa, trabalhando, encarando um bico qualquer, talvez de ambulante, talvez de ajudante de camelô.

E notei que apesar dessa miséria tão evidente, tão dramática -essas pessoas não pertenciam, seguramente, à tão falada classe C-, quase todas as mulheres, e as crianças que iam junto, tinham as unhas dos pés pintadas de esmalte colorido.

E me ocorreu que talvez seja esta a única fantasia a que têm direito.

danuza.leao@uol.com.br

FERREIRA GULLAR

Amar o perdido

O menino, hoje um senhor idoso, não esquece o dia em que sua moeda caiu pela fresta do assoalho e sumiu

O quintal, relativamente grande, ficava ao lado da casa e ao fundo das casas vizinhas, de muro baixo. Rente ao muro estavam as bananeiras, onde ele e suas irmãs se embrenhavam, brincando de esconde-esconde. Do lado do quintal, havia uma pitangueira e uma mangueira, cujos ramos se estendiam sobre a cerca que limitava com a residência de um coronel do Exército.

O resto do quintal era coberto de mato-burro, um tipo de vegetação que chegava à cintura dele e encobria a irmãzinha menor. Ali, certo dia, descobriu um ninho cheio de ovos da galinha-d'angola que, com seu parceiro, habitava o lugar.

Mas, atravessando um pequeno portão, ao lado da casa, chegava-se a um quintal menor, de terra batida, sem vegetação, limitado, de um lado pela casinhola do banheiro e, de outro, pela varanda que se estendia até a sala de jantar. À esquerda, ficava o muro coberto de um musgo verde brilhante.

Este quintal menor era o domínio de um galo de crista vermelha e penas marrons, que caminhava garboso, exibindo suas esporas e observando com aqueles olhos redondos, especialmente as quatro galinhas que constituíam sua corte.

Além delas, havia ali um frango, de penugem incipiente, que às vezes se atrevia a cantar de galo e era logo reprimido pelo rei do terreiro, que partia para cima dele a bicadas. O menino, que simpatizava com o frango, intervinha na briga e evitava a agressão.

A família era, no total, dez pessoas, o pai, a mãe e sete filhos (entre meninas e meninos) e uma tia da mãe, que cuidava da casa. O pai, comerciante ambulante, um dia apareceu na casa com um animal esquisito, que parecia um bezerro, mas não era, pois, além do mais, tinha o focinho dividido em dois. Era uma anta.

A mãe, ao ver aquele animal estranho no quintal, ficou perplexa. "Que diabo de bicho é esse que você trouxe para nossa casa?", perguntou ela. Ele respondeu que o tomara de um sujeito que lhe devia dinheiro e não pagara. "E você acha que alguém vai comprar um bicho esquisito como esse, de dois focinhos, e que não serve para nada?", ela perguntou.

As crianças da vizinhança subiam no muro para espiar o animal. Os adultos chegavam até o portão, espiavam e saíam rindo e fazendo troça. A mãe deu um ultimato ao marido: ou ela ou a anta. Ele então decidiu levar a anta não se sabe para onde. Quando subiu a rua, puxando-a pelo cabresto, a molecada o seguiu, gritando e rindo, muito excitada.

A casa era grande, tinha vários quartos, todos assoalhados. Assoalhos antigos, de tábuas corridas, debaixo das quais, às vezes, surgiam ratos, que ali se metiam pela fresta de alguma tábua apodrecida. Se saíam, eram perseguidos pelos gatos que habitavam a casa.

Exceto os pais, que dormiam numa cama de casal, todos os demais dormiam em redes armadas nos cantos dos quartos e, nessas redes, se embalavam, às vezes cantarolando, às vezes disputando lugar com um ou outro irmão. Com frequência, algum deles se estatelava no chão e saía chorando a procurar a mãe, para se queixar.

Faz muitos e muitos anos que isso aconteceu, embora a casa ainda exista e os assoalhos de tábuas corridas tenham sido substituídos por piso de cimento. Nem o pai nem a mãe existem mais. As meninas e os meninos cresceram, foram cada um inventar sua própria vida: casaram-se, tiveram filhos e netos e alguns mudaram até mesmo de cidade. Uns poucos continuam na mesma casa, cujo quintal foi vendido para uma família, que ali construiu sua casa.

O menino, que hoje é um senhor idoso, não esquece o dia em que uma moeda sua caiu pela fresta do assoalho e sumiu. Ele não se conformou. Com um pé de cabra, arrancou uma das tábuas que estava quase solta e mergulhou debaixo do assoalho. Teve uma surpresa: foi como se tivesse passado a outro planeta, já que o chão, ali embaixo, era como um talco negro, em que seus pés afundaram até os tornozelos.

Em pânico, conseguiu escapar daquele solo de pó, onde sua pequena moeda se perdera para sempre. Mas, pelo resto da vida, de quando em vez, em sonho, voltava, em prantos, àquele território lunar em busca da pequena moeda para sempre perdida.

sábado, 1 de setembro de 2012



02 de setembro de 2012 | N° 17180
MARTHA MEDEIROS

Vida parte 2

Uma menina me perguntou certa vez: a vida da gente melhora da metade para o final? Ela deveria ter uns 14 anos, jovem demais para dividir a existência em duas partes e colocar suas esperanças na segunda. Já eu havia recém feito 40: estava me despedindo do ensaio geral e estreando na Parte 2, ainda sem saber o que estava por vir. Logo, o que responder?

Admiti que considerava encantadora a primeira parte: a virgindade existencial, os primeiros amores, a juventude do corpo, os sonhos projetados para frente, a morte a uma distância teoricamente segura. Não tinha como afirmar se a segunda parte possuiria munição suficiente para superar tanta vitalidade e expectativa, mas, dali onde eu me encontrava, seguia confiante, o futuro não me assustava. Apesar de ter vivido muito bem os primeiros 40, secretamente desejava que a resposta ao questionamento dela fosse um categórico sim.

Hoje aquela menina deve estar em torno dos 24 e ainda não tem sua resposta, mas garanto que anda tão ocupada que isso deixou de importar. Eu, no entanto, avancei um pouquinho na parte 2, porém continuo sem um parecer. Tenho apenas uma intuição.

Menina que não sei o nome: decretar o que é melhor, se a primeira ou a segunda metade da vida, é uma preocupação inútil – não perca tempo com isso. A única coisa que você deve ter em mente é o seguinte: o que fizer na primeira metade terá conseqüências na segunda, para o bem ou para o mal.

Se você for muito seletiva e insegura, acabará transferindo para mais tarde projetos que já poderiam ter sido experimentados. Procure viver as delícias de cada idade, arrisque-se. Se não conseguir, ok: então morra de amor, vá morar sozinha em Londres, entre para uma seita, monte uma banda, tudo isso aos 60, aos 70, e danem-se as convenções.

A maturidade traz ganhos reais. A ansiedade diminui, a teatralidade também: já não vemos sentido em agradar a todos, a opinião alheia deixa de nos influenciar. Essa liberdade de ser quem realmente somos me parece o benefício maior – os jovens não percebem, mas sua liberdade é muito restrita. São pressionados a fazer escolhas tidas como definitivas (casamento, filhos, profissão) e as dúvidas se amontoam.

A sociedade exige eficiência na condução desse script. Depois dos 40, a boa notícia: que sociedade, que nada. Não é ela que banca suas ideias, não é ela que enxuga suas lágrimas, não é ela que conhece suas carências. Você passa, finalmente, a ser dona do seu desejo. Não é pouca coisa.

A segunda metade trará vista cansada, um joelho menos confiável, um rosto não tão viçoso, umas manias bobas, mas o fato de já não haver tempo a desperdiçar nos torna mais focados e até mais aventureiros – pensar demais deixa de ser producente.

Perder a ilusão da eternidade traz, sim, conquistas instantâneas, mas, para isso, é preciso ter cabeça boa, conhecimento e uma forte base moral e ética. E isso você adquire na primeira metade da vida – ou padecerá na última.



01 de setembro de 2012 | N° 17179O PRAZER DAS PALAVRAS |
CLÁUDIO MORENO

Se sim

Um leitor que mantém na internet um serviço de relacionamento entre solteiros de vida alegre vem pedir que eu o ajude a polir uma frase que aparece bem na entrada de seu saite (os portugueses, mais elegantes, chamariam de sítio): “Você faz parte deste grupo? Se sim, digite o seu número de inscrição; se não, preencha o formulário de registro”.

Ele próprio é o autor da frase, mas, como honestamente me informa, ela tem arranhado seu ouvido desde o dia em que a concebeu. “Professor, tem alguma coisa aí que não me cai muito bem. Usar as expressões se sim ou se não como resposta a uma pergunta não é considerado mau Português? Por exemplo: ‘Você vai sair hoje? Se sim, não esqueça o guarda-chuva’. Não sei justificar, mas a expressão soa esquisito, e as alternativas que me ocorrem – “em caso afirmativo”, “em caso negativo”, etc. – parecem um pouco pernósticas para um saite descontraído como o meu”.

Ora, ora, quem diria! Um internauta preocupado com sutilezas da linguagem! É ave rara? Claro que não; conheço centenas deles. Aqueles profetas do apocalipse que vivem dizendo que a internet será o túmulo da boa linguagem esquecem que a rede - assim como o tinteiro, a pena de ganso ou a máquina de escrever - é apenas um meio de trocar e estocar informações, e que as pessoas articuladas vão sempre escrever melhor que as outras, mesmo que utilizem sinais de fumaça.

Como podes ver, meu amigo, “mau Português” nunca poderá ser, já que Machado, Camilo, Miguel Torga e Saramago, entre outros, usaram e usam o se sim (o se não dispensa maiores cuidados, de tão corriqueiro que é). Dois excelentes exemplos nos vêm de Machado (em Dom Casmurro e em Memorial de Aires, respectivamente): “Não sei se alguma vez tiveste dezessete anos. Se sim, deves saber que é a idade em que a metade do homem e a metade do menino formam um só curioso”;

“A ideia é saber se Fidélia terá voltado ao cemitério depois de casada. Possivelmente, sim; possivelmente não. Não a censurarei, se não: a alma de uma pessoa pode ser estreita para duas afeições grandes. Se sim, não lhe ficarei querendo mal, ao contrário”.

Não se costuma condenar uma construção aprovada por autores da primeira água. Agora, usá-la, isso quem vai decidir és tu, porque ninguém é obrigado a seguir o gosto deste ou daquele escritor. Sempre existem outras formas também corretas de dizer a mesma coisa – basta queimar um pouquinho as pestanas. No exemplo apresentado – “Você faz parte deste grupo?

Se sim, digite o seu número de inscrição” –, aquele “se sim”, que te soa tão mal (mas que a mim não desagrada), pode ser trocado por “se fizer, digite...”, “caso faça, digite...”, “se a resposta for sim, digite...”, “em caso afirmativo, digite...”, e mais outras, certamente, que não me ocorrem no momento. Não te esqueças: o idioma nos oferece centenas de recursos possíveis, e entre eles vamos escolhendo aqueles que mais nos agradam. A soma de nossas escolhas é, no fundo, aquilo que chamamos de “estilo”.

E já que estamos falando de escolhas, aproveito para dar uma satisfação aos leitores que estranharam uma construção que utilizei numa coluna da série Homens e Mulheres, publicada no Segundo Caderno há pouco mais de um mês.

Falando das Musas, escrevi que “as roupas diáfanas e esvoaçantes que usavam mal e mal ocultavam o seu corpo escultural”; três leitores, o que não é pouco, escreveram no dia seguinte para sugerir, cada um à sua maneira, que deveria teria havido aqui um erro de revisão da Zero Hora (forma diplomática de perguntar se eu não tinha cometido um erro de concordância): se tudo está no plural – as Musas e todo o resto -, a forma correta não deveria ser “as roupas diáfanas e esvoaçantes que usavam mal e mal ocultavam os seus corpos esculturais”?

Não, meus amigos, não deveria – poderia, mas não deveria. Em casos como este, embora também esteja correto o plural, o mais elegante, para mim, é usar o singular, como fazem dezenas de escritores que respeito e admiro. Em outras palavras, apesar de me referir a um conjunto de pessoas, posso deixar no singular esses vocábulos que se trazem implícita a ideia de “cada um com o seu”: “Os professores torceram o nariz diante da proposta” (os narizes?); “Ali eles perderam a vida” (as vidas?); “Dê o nome dos rios navegáveis da Amazônia” (os nomes?);

“Aqui vai a lista com o endereço dos participantes” (os endereços?); “Os alunos escreviam com a cabeça baixa” (as cabeças baixas?). Repito: o plural, aqui, embora correto, parece-me desajeitado e desnecessário, o que me levou a falar no “corpo escultural das Musas”. Eu estava apenas exercendo o direito de escolher, entre duas formas corretas, aquela que mais me agrada – o mesmo direito, aliás, exercido pelos três leitores que preferiram o plural.



01 de setembro de 2012 | N° 17179
NILSON SOUZA

O mascote

Sou mesmo um ingênuo. Tão logo li a notícia de que uma empresa multinacional patrocinadora da Fifa estava lançando um concurso para escolha do animal que representará a Copa de 2014, no Brasil, pensei no nosso simpático canarinho – que, afinal, já se consagrou como sinônimo da Seleção Brasileira, por causa da cor amarela.

Ao seguir adiante na leitura, porém, percebi que vários leitores já haviam mandado suas sugestões, quase todas criativas mas também autodepreciativas: burro, preguiça, hiena, mosquito da dengue, sanguessuga, rato de gravata e outros bichos mais ou menos asquerosos que, na visão desses irreverentes, poderiam representar a cultura nacional.

Animal é o que não falta neste país de florestas e pantanais. Temos tantos, que os especialistas divergem sobre o mais adequado para virar símbolo pátrio. A ave-símbolo já existe, foi escolhida por decreto presidencial há uma década. É o sabiá-laranjeira. Uma boa escolha, na minha opinião.

Tenho, inclusive, um para chamar de meu, solto evidentemente, mas visitante assíduo do meu pátio, com a mordomia de um pote com água renovada todas as manhãs para o seu banho matinal. Em troca, ele cantou tanto nos últimos dias, que até a primavera apareceu em agosto.

Mas outros bichos maiores disputam a preferência nacional, da onça-pintada ao tamanduá-bandeira, passando por jacarés, lobos-guarás e araras. Qualquer um deles poderia simbolizar o nosso país, como a águia americana e o leão inglês.

Só que nenhum desses passou pelo crivo da Fifa. O anúncio oficial sairá em outubro, mas parece que deu zebra. Ou melhor: deu tatu-bola. O motivo da escolha é nobre: o animalzinho, nativo do cerrado e da caatinga, só existe em nosso país e está em extinção. Com a escolha, ele poderá ganhar a visibilidade necessária para uma campanha eficiente de preservação.

Pelo que li a respeito, o bichinho tem certa de 50 centímetros, hábitos noturnos e alimenta-se de cupins, formigas, raízes de plantas e frutas. E tem uma característica que o torna merecedor do pódio de mascote brasileiro para a Copa: quando ameaçado, encolhe-se e assume a forma de uma bola.

Mais emblemático, impossível.