sábado, 17 de maio de 2025



17 de Maio de 2025
INFORME ESPECIAL

Desmatamento no RS cresce, enquanto no Brasil cai

Dados divulgados nesta semana pela rede de monitoramento do MapBiomas apontam que o desmatamento recuou 32,4% no Brasil em relação a 2023 - 1,24 milhão de hectares de vegetação nativa suprimida. No Rio Grande do Sul, os dados não são os melhores: o Estado foi o segundo, em proporção, que mais aumentou o desmatamento. Enquanto o Brasil registrou a diminuição de 32,4%, o RS cresceu 70%.

Segundo o pesquisador do MapBiomas Eduardo Vélez, entre 2022 e 2023 ocorreu uma queda na perda de florestas no RS, contudo o aumento em 2024 já era esperado devido aos eventos climáticos que o Estado enfrentou:

- Houve muitos deslizamentos de encostas de morro que tinham florestas. Nós monitoramos toda a remoção de vegetação florestal, seja ela causada por um evento natural, climático ou causada por ação humana.

Mata Atlântica

O RS passou de 2.343 em 2023 para 3.998 hectares de áreas desmatadas em 2024, sendo dois terços - 2.805,8 hectares - somente em função dos eventos climáticos.

O pesquisador explica que no RS estão presentes dois biomas: do total de 3.998 hectares, 3.102 foram perdidos na Mata Atlântica, enquanto 896 no Pampa:

- O Pampa praticamente não teve efeito dos eventos climáticos na perda florestal. Foi tudo concentrado na região de Mata Atlântica. E essa área que foi suprimida por causa natural, não costumamos denominar de desmatada, porque desmatada pressupõe uma ação de origem humana. Por isso, descrevemos como uma perda de vegetação nativa por eventos climáticos.

Os principais municípios com registro de aumento de desmatamento foram Veranópolis, Cotiporã e Bento Gonçalves. Os três figuram na lista das 10 cidades que mais perderam floresta na Mata Atlântica em todo o Brasil em 2024.

Já comparando os dados do desmatamento somente no Pampa entre 2023 e 2024, houve uma redução de 42%.

Na comparação nacional entre os Estados, o RS ficou em 20º lugar, ou seja, há 19 Estados da federação que desmataram uma área maior do que a registrada para o Rio Grande do Sul. _

Embaixador do Brasil se reúne com o Papa

O papa Leão XIV realizou, na sexta-feira, sua primeira audiência com o corpo diplomático do mundo inteiro. Durante o encontro, o embaixador do Brasil no Vaticano, Everton Vieira Vargas, convidou o Pontífice para participar da COP30 - a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que ocorrerá em Belém, em novembro.

Em entrevista à coluna, o embaixador contou que, primeiramente, o Papa o saudou em português e ambos seguiram a conversa no idioma:

- Comentei que o presidente Lula havia enviado sua saudação com desejos de muito êxito no pontificado e falei também que esperamos uma visita dele ao Brasil, preferencialmente junto com a COP30.

A coluna questionou sobre o trabalho que o Brasil pode realizar junto à Santa Sé:

- Temos um grande interesse em conversar com a Santa Sé a respeito de como estão as tratativas, ou como atuar para diminuir as guerras que estão por aí, de se buscar fórmulas para a agenda de paz. Temos também o combate à fome e à pobreza e a questão dos direitos humanos. Bilateralmente, um tema muito relevante é a celebração dos 200 anos das relações entre o Brasil e a Santa Sé, em janeiro do próximo ano. _

Família é "união entre o homem e a mulher"

Na mesma audiência com o corpo diplomático, o Papa afirmou que a família é fundada pela "união estável entre o homem e a mulher". Foi a primeira vez em que o Pontífice falou publicamente sobre questões de costumes.

- Cabe aos responsáveis governamentais esforçarem-se por construir sociedades civis harmoniosas e pacíficas. Isto pode ser feito, principalmente, investindo na família, fundada na união estável entre o homem e a mulher, uma sociedade muito pequena, certamente, mas real e anterior a toda a sociedade civil. Além disso, ninguém pode deixar de favorecer contextos em que a dignidade de cada pessoa é protegida, especialmente a das mais frágeis e indefesas, do nascituro ao idoso, do doente ao desempregado, seja ele cidadão ou imigrante - discursou.

Palavras-chave

A fala foi feita ao elencar três palavras-chave que constituem pilares da ação missionária da Igreja e do trabalho da diplomacia da Santa Sé: paz, justiça e verdade.

Em outro trecho, ao falar sobre "verdade", disse que a Igreja não pode se furtar a dizer a verdade "sobre o homem e sobre o mundo", mesmo recorrendo a uma linguagem franca e que pode provocar alguma incompreensão inicial. _

Arcebispo de Porto Alegre discute COP30 no Vaticano

O arcebispo metropolitano de Porto Alegre, cardeal dom Jaime Spengler, também presidente do Conselho Episcopal Latino- Americano e Caribenho (Celam), reuniu-se com o papa Leão XIV para uma audiência na quinta-feira. O encontro ocorreu na biblioteca do Palácio Apostólico, no Vaticano.

- Dois pontos foram abordados: primeiro, a maneira como estamos desenvolvendo junto ao Celam os processos indicados pelo sínodo do ano passado. Segundo, a questão da COP30 e qual seria essa posição da Santa Sé. Pensar quem são os representantes durante a COP30 - contou Spengler à coluna.

Foi apresentado ainda o trabalho que o Celam, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) - da qual dom Jaime Spengler também é presidente -, e o Conselho Episcopal da Ásia e da África vêm preparando para a COP30.

Pauta ambiental

O cardeal lembrou que a Campanha da Fraternidade já tratou do tema meio ambiente e que, neste ano, completam-se 10 anos da encíclica Laudato Si?, do papa Francisco, que abordou o assunto.

Questionado pela coluna sobre os primeiros dias do pontificado e sobre o contato com o novo líder da Igreja Católica, Spengler afirmou que as conversas com Leão XIV têm sido de "simplicidade e muita proximidade". 

INFORME ESPECIAL

sábado, 10 de maio de 2025



11/05/2025 - 15h35min
Martha Medeiros 

As mães mantêm o instinto que não as deixa esquecer que, no fundo, ainda somos suas garotinhas

Hoje darei voz às filhas de 50+, 60+, que há muito tempo cuidam sozinhas de si mesmas e agora têm que assumir a maternidade da própria mãe

Nós, que penteamos seu cabelo, que propomos um jogo de cartas e que fingimos escutar pela primeira vez uma história mil vezes repetida.

Semanas atrás, escrevi sobre um assunto de interesse de milhões de mulheres. Mergulhada nele também, o elegi como a nova questão a invadir as redes (menopausa, abra um espacinho aí). Trata-se de quando os papéis se invertem e os filhos passam a cuidar dos pais. Em tese, é a oportunidade para extrair mais amor da relação, mas a realidade não costuma dar essa colher para teses. O lado prático é que se impõe.

Hoje é dia delas, das nossas mães e das mães que também somos. É muita mãe para um domingo só. Escrevo colunas há décadas e já esgotei meu repertório de homenagens, então hoje darei voz às filhas de 50+, 60+, que há muito tempo cuidam sozinhas de si mesmas e agora têm que assumir a maternidade da própria mãe – também é muita filha para um único domingo. Sei que os pais deveriam entrar nessa equação, mas sendo um dia tão feminino, é para elas – nós – que escrevo.

Nós e nosso pânico quando surge “Mãe” escrito no visor do celular: é ela chamando, desconfiada de que tomou duas vezes o mesmo medicamento. É ela avisando que a janela está emperrada e é preciso chamar alguém para consertar (já foi consertada semana passada). 

É ela dizendo que não encontra o casaco azul que tanto gosta (um dia encasquetou que azul não lhe caía bem e passou o agasalho adiante). É ela certa de que tem gente estranha no quarto ao lado (é a cuidadora).

Todos no lucro: ela não levou nenhum tombo no banheiro, que é a notícia que nós não queremos escutar. Nós, que temos que lembrá-la de que as mensagens publicitárias do WhatsApp não precisam ser respondidas. De que nhoque sempre foi seu prato preferido, por que a implicância agora? De que sábado foi ontem, e hoje não tem novela.

Nós, que a incentivamos a passar um batonzinho, a velhice não precisa cancelar a vaidade. Que temos que dar o braço para ela caminhar do sofá até a cozinha. Que a levamos ao cinema e nos emocionamos ao ver seus olhos brilharem diante da tela, mesmo ela tendo reclamado, ao final, que o filme foi muito longo.

Nós, que tentamos fazê-la desistir de usar um tricô já manchado pelo tempo (ela quer poupar os novos). Nós, que penteamos seu cabelo, que propomos um jogo de cartas e que fingimos escutar pela primeira vez uma história mil vezes repetida. 

Nós, que nos afligimos quando temos que viajar, que nos culpamos a cada afastamento e que torcemos para que ela não nos ligue no exato momento em que o avião estiver aterrissando – mas é bem nessa hora que ela liga, ela pressente que estamos voltando. 

Apesar de nossa atenção estar 99% voltada para o bem-estar dela, como se ela fosse uma garotinha, nem tudo está perdido: ela mantém ao menos 1% do instinto que não a deixa esquecer que sua garotinha ainda somos nós. 


10 de Maio de 2025
CARPINEJAR

O amor de colher

Mães não são todas iguais - mas são parecidas no excesso de proteção. Na minha infância, a mãe tinha obsessão por fortificantes.

Eu era franzino, um bambu, sustentado à base de fotossíntese particular. Comia pouco. Era o rei das bainhas e das dobras nas roupas.

Ela vivia me dando Emulsão de Scott para estimular o apetite e prevenir o raquitismo: um xarope feito de óleo de fígado de bacalhau, com gosto forte e marcante de peixe adormecido e ferrugem. Nem o dulçor da fragrância de laranja disfarçava o seu ranço.

No rótulo da garrafa de vidro âmbar escuro, num fundo amarelo-claro, havia o desenho de um homem de suíças, terno e chapéu, carregando nas costas, mediante cordas, um bacalhau enorme, quase do seu tamanho.

Eu achava que Dona Maria queria que eu me transformasse no Scott. Não compreendia bem o que ele significava: um pescador executivo? Um entregador de peixe do Mercado Público?

Como ele sorria com aquele peso? Ele bebia a Emulsão que levava seu nome?

Na minha fantasia, cumpria o papel moderno de um herói grego mitológico, a exemplo de Hércules. Seu conteúdo correspondia a um castigo líquido, um pesadelo para o paladar, a certeza do nó górdio no estômago.

Por mais que eu fugisse para o pátio, a mãe me localizava. Cessava a perseguição unicamente diante da minha careta ao sorver tudinho sem cuspir. Experimentei, nos anos 1970 e início dos 1980, uma época efervescente dessas poções miraculosas. Lembro-me de algumas:

Biotônico Fontoura - Tônico de ferro com sabor adocicado. Virou jingle popular na televisão:

A de Abre o apetite

B de Bom de tomar

C de Comer, de crescer, fortalecer

E de Entender

D de Decorar

T de Tá na hora de tomar

B A BÁ

B E BÉ

B I Biotônico Fontoura!

Sadol - Indicado para recuperação após gripes ou fadiga. Tinha fórmula com vitaminas do Complexo B e ferro. O slogan grudava: "Sadol dá força!".

Capivarol - Um tônico também à base de extrato de fígado. O nome, que lembra "capivara", desencadeou uma confusão entre os usuários que supunham que ele funcionava como antiparasitário.

Ferrograd - Suplemento de ferro prescrito para combater a anemia infantil, geralmente em comprimidos ou gotas. Sustagen - Suplemento alimentar em pó, misturado com leite, muito usado para reforçar a nutrição das crianças.

Karo - Um xarope de milho dado como fonte de energia e calorias. Hemolitan - Suplemento vitamínico líquido, com ferro, muito receitado por pediatras.

Citoneurim - Vitaminas do Complexo B, para casos de fraqueza ou convalescença.

A mãe sempre acreditou que poderia me salvar da imundície do pátio e da minha compulsão pela várzea de futebol. A colher de sopa era extensão de sua mão, materialização do seu afeto.

Eu me distraía e ela surgia com o antídoto, jurando que eu tinha engolido terra ou posto os dedos sujos na boca. Os remédios pararam quando entrei na adolescência e encorpei.

Mas Dona Maria só trocou a obsessão antiga por uma nova: a vitamina C.

Tornou-se, pelo jeito, sua prescrição eterna. O curioso é que ela não se detém nos primeiros sintomas de resfriado - espirros e coriza.

É todo santo dia. Ela defende que a vitamina é um escudo. Uma muralha contra a gripe. Quando me telefona, antes de desligar com seu típico "até logo" - ela não diz "tchau", mas "até logo", assim como não diz "alô", mas "pronto" -, ela já emenda:

- Já tomou a sua vitamina C hoje? Será que ela trabalha secretamente para a indústria farmacêutica? Ou será só amor escancarado?

A mãe não cansa de me cuidar. Mesmo distante, continua tentando me curar do mundo. _

CARPINEJAR

10 DE MAIO DE 2025
MARCELO RECH

O muro dos estereótipos

Narva, Estônia - De um lado do rio, a Estônia e a União Europeia, com suas democracias, liberdade de expressão, livre mercado e apoio à Ucrânia. A 150 metros, na outra margem, separada pelo Rio Narva, está a russa Ivangorod. As duas cidades se ligam por uma ponte, ora fechada para veículos, mas na prática estão separadas pela ameaça russa de retomar as Repúblicas Bálticas, independentes da União Soviética desde 1991.

Se houver um lugar em que a Rússia testará a capacidade de resposta da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), será aqui, onde a língua franca é o russo e grande parte da população local se sente ligada por origem a Moscou. A Estônia e seus aliados sabem disso e não brincam em serviço. Para se entrar e sair da cidade, na extremidade nordeste da Estônia, para-se em barreiras do exército. Nas estradas, são corriqueiros os comboios de viaturas e blindados da Otan.

Desde a invasão da Ucrânia, Narva e arredores se transformaram em zonas militares, em tensão permanente. Na cidade, patrulhas do Exército circulam pelas ruas quase desertas. Em termos bélicos, é o ponto mais quente da União Europeia. Nos mastros às margens do rio tremulam bandeiras da Otan - algo que não se vê todo dia na Europa - e uma vistosa bandeira da Ucrânia, bem na frente dos russos.

A separação dos dois mundos, tão longe e tão perto, me remeteu ao Muro de Berlim, que conheci adolescente, em 1975, quando ainda se subia em plataformas para espiar o lado comunista. Na época, alemães ocidentais e orientais pareciam viver em universos paralelos. A queda do muro, em 1989, revelou que a política produziu diferenças, mas os estereótipos eram mais fortes do que a realidade.

Estereótipos são a mais preguiçosa forma de julgamento de sociedades, povos, religiões, profissões e assim por diante. Porque se limitam à superfície, eles impedem que se conheça de fato os indivíduos. Os EUA, por exemplo, não podem ser reduzidos ao trogloditismo de um Donald Trump. O americano médio é uma figura gentil, simpática com estrangeiros e sempre prestes a ajudar desconhecidos. Idem os russos. É muita injustiça transformar a complexa sociedade russa em apêndice criminoso de Vladimir Putin. Em geral, os russos são cultos, amantes das artes e ávidos por se relacionarem com outras culturas e sociedades. Já viajei extensivamente pelos EUA e pela Rússia. Nada é perfeito, nada é tão ruim, e as necessidades e os anseios são os mesmos em toda parte.

Nunca se deve confundir, portanto, países e sociedade com seus governos. Não gostaríamos que os estrangeiros resumissem o Brasil e os brasileiros a Lula ou Bolsonaro, porque somos muito mais do que isso. Nós sabemos disso. Seria bom que todos soubessem sobre os outros povos também. 

MARCELO RECH

10 de Maio de 2025
OPINIÃO RBS

Opinião RBS

Esta série de editoriais contempla temas apontados como prioridade para o desenvolvimento do Rio Grande do Sul por entidades da indústria, do comércio, do agronegócio e pelas bancadas estadual e federal de deputados em reuniões com o Conselho Editorial do Grupo RBS. Os temas abordados serão:

Fundo constitucional do Sul

Formação profissional e recuperação da Educação Básica

Falta de mão de obra e impacto de benefícios sociais

Inovação e expansão de centros de tecnologia

Infraestrutura logística e contenção de cheias

Valorização e consumo dos produtos gaúchos

Relevância do agronegócio

Bancada federal no Congresso

Um fundo constitucional para o Sul

O momento decisivo atravessado pelo Rio Grande do Sul após a enchente de maio exige dos gaúchos a postura de enfrentar de forma resoluta os gargalos que, nas últimas décadas, atravancam o desenvolvimento local. São obstáculos que se tornaram ainda mais inadiáveis de serem encarados pela constatação de que as mudanças climáticas se precipitaram como um desafio adicional que põe em risco o futuro do Estado e o bem-estar nas próximas gerações de rio-grandenses. É hora de agir e reforçar o engajamento em torno das grandes demandas do RS.

Uma dessas frentes de batalha é a criação de um fundo constitucional para a região Sul, a exemplo do de que dispõem o Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste. É um instrumento essencial para assegurar financiamentos em condições mais competitivas para atrair, manter e expandir investimentos produtivos. Trata-se de uma questão de isonomia e justiça. Embora Paraná e Santa Catarina somem-se à reivindicação, não há por que negar: o RS, que nos últimos anos cresce a taxas inferiores à média nacional e também abaixo dos vizinhos, é neste momento o Estado que mais precisa de apoio em crédito com condições diferenciadas.

O setor de energia eólica é um exemplo escancarado das distorções hoje vigentes. O RS foi pioneiro e liderou setor com a instalação dos primeiros parques, mas perdeu protagonismo a partir da maior competitividade do Nordeste, que por meio de seu fundo constitucional conseguia oferecer financiamento mais atrativo aos empreendedores. O Estado e a ampla maioria dos seus municípios, ademais, não conta com a farta distribuição de royalties do petróleo e da mineração, caso do Sudeste.

Essa é uma pretensão voltada a reequilibrar regionalmente o desenvolvimento nacional. Mesmo no Sul há regiões deprimidas e outras em processo de estagnação. Os eventos climáticos extremos, como secas e enchentes, vêm espalhando prejuízos e reduzindo o avanço do PIB gaúcho. A perda de dinamismo é patente. Uma das estratégias para reverter esse quadro é diversificar a economia, com o incentivo a setores florescentes, como os vinculados à transição energética. Será mais árduo sem um novo instrumento que eleve a atratividade do Estado.

A boa notícia é que essa é uma luta com etapas vencidas. Tramita na Câmara dos Deputados a proposta de emenda à Constituição (PEC) 27/2023, que prevê a criação de fundos constitucionais para o Sul e o Sudeste. É o texto legislativo mais adiantado. No ano passado, teve parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Os fundos têm como fonte de recursos parte da arrecadação com Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Renda. 

A Federação das Indústrias do Estado do RS (Fiergs) apoia a PEC, assim como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), que incorporou a pauta a sua Agenda Legislativa 2025, que reúne os temas defendidos pela entidade no Congresso. Ainda que o texto precise de ajustes, é nesta proposta que o Estado, seus representantes políticos e entidades devem se concentrar neste momento para ter êxito em uma demanda vital para o Rio Grande do Sul. _

OPINIÃO RBS

10 DE MAIO DE 2025
TRAMA GOLPISTA

TRAMA GOLPISTA

Supremo forma maioria para manter ação penal contra Alexandre Ramagem

Trama golpista

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para derrubar parcialmente a resolução aprovada pela Câmara dos Deputados, que anulou a ação penal a que o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) responde pela tentativa de golpe em 2022.

Os ministros votaram para suspender a acusação por apenas dois crimes: dano qualificado e deterioração contra o patrimônio da União.

Essas duas acusações são relacionadas aos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 - ou seja, ocorreram após a diplomação de Ramagem como deputado.

Em seu voto, o relator Alexandre de Moraes afirmou que "não há dúvidas" de que a Constituição só permite à Câmara suspender ações sobre crimes cometidos após a diplomação.

Assim, Ramagem seguirá respondendo pelos crimes de abolição violenta do Estado democrático de direito, golpe de Estado e organização criminosa.

Moraes também deixou claro que a suspensão só se aplica ao parlamentar e não a outros réus da ação - entre eles, o ex-presidente Jair Bolsonaro. Segundo ele, os requisitos da Constituição são "claros e expressos, no sentido da impossibilidade de aplicação dessa imunidade a corréus não parlamentares e a infrações penais praticadas antes da diplomação".

"Indevida ingerência"

O voto de Moraes foi seguido pelos ministros Cristiano Zanin e Flávio Dino.

O voto mais duro foi o de Dino, que afirmou que a Câmara, ao aprovar a resolução, tentou promover "indevida ingerência em processo judicial de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal".

"Somente em tiranias um ramo estatal pode concentrar em suas mãos o poder de aprovar leis, elaborar o orçamento e executá-lo diretamente, efetuar julgamentos de índole criminal ou paralisá-los arbitrariamente - tudo isso supostamente sem nenhum tipo de controle jurídico", escreveu o ministro.

Até o fechamento desta edição, ainda faltavam votar os ministros Cármen Lúcia e Luiz Fux. Eles têm até a próxima terça-feira, dia 13, para registrar os votos.


10 DE MAIO DE 2025
DESVIOS BILIONÁRIOS

DESVIOS BILIONÁRIOS

INSS vai devolver R$ 292 milhões para vítimas de fraude até o dia 6 de junho

Valores foram deduzidos dos contracheques em abril, mas não chegaram a ser repassados para associações devido ao bloqueio, que ocorreu após revelação do esquema. Presidente do órgão afirma que venda de bens de investigados vai garantir o ressarcimento de todo o dinheiro que foi desviado

O INSS informou na sexta-feira que vai devolver R$ 292,7 milhões referentes aos descontos indevidos na folha de pagamento de aposentados e pensionistas. Segundo o órgão, essa devolução será feita entre os dias 26 de maio e 6 de junho.

Os valores referem-se a descontos ocorridos nas mensalidades de abril. O valor já havia sido descontado do pagamento de aposentados e pensionistas, mas foi bloqueado antes de ser repassado para as associações e sindicatos.

A devolução ocorre na esteira da operação da Polícia Federal (PF) e Controladoria-Geral da União (CGU) que revelou esquema que pode ter desviado até R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024 por meio de descontos não autorizados em benefícios a título de mensalidades associativas.

Na próxima terça-feira, 9 milhões de pessoas serão notificadas, por meio da plataforma Meu INSS, sobre a ocorrência de descontos associativos nos últimos cinco anos. A partir disso, os beneficiários poderão informar se reconhecem ou não os descontos e, caso não tenham autorizado, será gerada uma cobrança à entidade responsável (leia mais ao lado).

R$ 2 bilhões recuperados

Em entrevista ao Gaúcha Atualidade na sexta-feira, o presidente do INSS, Gilberto Waller Júnior, afirmou que parte do valor para ressarcir as vítimas do esquema poderá ser obtida com a venda de bens dos investigados.

Até agora, segundo ele, foram recuperados cerca de R$ 2 bilhões. Ao todo, 12 entidades são investigadas.

- Nós entramos, via Advocacia- Geral da União, com outras medidas para bloquear não só os bens das instituições, mas os bens dos sócios. Então, é deles que a gente tem de tirar primeiramente - alegou.

Waller, porém, não estabeleceu um prazo para que todos os segurados que foram afetados sejam ressarcidos. _

Como será a notificação?

O INSS vai notificar, na terça-feira, 9 milhões de pessoas que tiveram descontos associativos desde março de 2020. A notificação será pelo Meu INSS.

Como saber se houve desconto indevido no benefício?

A partir do dia seguinte, quarta-feira, será possível consultar o valor que foi descontado e a entidade. Os canais para isso serão o Meu INSS e a central de atendimento 135.

Como informar que o desconto foi indevido?

Após a consulta, o beneficiário poderá informar se reconhece ou não o desconto. Segundo o INSS, bastará dar um clique. Como as entidades serão cobradas?

Caso o desconto não seja reconhecido, será gerada uma cobrança para a entidade, que terá prazo de 15 dias úteis para comprovar a filiação do segurado ou ressarcir o valor.

Como será feito o pagamento ao segurado?

O INSS creditará o valor ressarcido na mesma conta onde o segurado recebe o benefício. Não haverá transação por Pix ou qualquer outro método.

O que acontece se o valor não for devolvido pela entidade?

Caso a entidade não faça a devolução do valor, a Advocacia-geral da União (AGU) afirma que ajuizará ações judiciais para fazer a cobrança.


10 de Maio de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

Inflação desacelera, mas está resiliente

Apesar de desacelerar - o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de abril subiu 0,43%, depois de haver aumentado 0,56% em março -, a inflação ainda faz economistas verem resiliência de preços altos ante a altitude do juro no Brasil. E boa parte avalia que isso pode significar que o viés de parada na trajetória do juro básico fica sob risco.

- A abertura do índice (análise de itens que indicam tendência) ainda mostra resiliência na inflação, principalmente nos serviços subjacentes, componentes mais sensíveis à política monetária - observa Sara Paixão, analista de macroeconomia da InvestSmart XP.

Entre os serviços subjacentes, estão comércio, alojamento e alimentação fora do domicílio. O índice de difusão - que mostra quanto a alta de preços está espalhada - aumentou de 65% para 67%. Por isso, na avaliação da economista, seria um sinal de que o juro ainda pode subir 0,25 ponto percentual na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em 18 de junho.

A avaliação é compartilhada por Igor Cadilhac, economista da PicPay, que - em razão de inflação, economia ainda aquecida e risco de alta do dólar - também prevê nova alta de 0,25 p.p. À espera de desaceleração na atividade no segundo semestre, afirma não projetar cortes de juro neste ano, mas admite que "a probabilidade tem aumentado". _

o nome do papa

Nomes de papa significam. O apóstolo Simão mudou de nome para Pedro para ser a pedra sobre a qual a Igreja Católica seria edificada. Não foi por falta de opção que Jorge Bergoglio se fez chamar Francisco. Ao escolher Leão XIV, Robert Prevost aponta o tom que vai dar a seu pontificado. Quer se identificar com a doutrina social de Leão XIII, mas também com sua diplomacia e conciliação.

Uma tarifa de 80% sobre a China parece correta. Depende do Scott B.

Donald Trump

Presidente dos EUA, mencionando o secretário do Tesouro, Scott Bessent, para sugerir início de negociações.

Coca-Cola refeita no Rio Grande

Resultado de investimento de R$ 675 milhões, a fábrica de Coca-Cola Femsa de Porto Alegre alagada no dilúvio de maio de 2024 teve cerimônia de reabertura na sexta-feira.

A água invadiu a unidade no bairro Sarandi no dia 2 de maio e chegou quase a cobrir o primeiro pavimento, comprometendo insumos e equipamentos.

- A retomada total da operação em Porto Alegre é resultado da união de esforços e reforça a nossa confiança no potencial do RS - afirmou Luciana Batista, presidente Brasil e Cone Sul na The Coca-Cola Company. _

Lucro da Renner salta 58,7% e ajuda em plano de R$ 850 milhões

Com lucro líquido de R$ 221 milhões no primeiro trimestre, a Lojas Renner teve salto de 58,7% nesse resultado em relação a igual período de 2024. O bom início de ano, conforme o CEO da empresa, Fabio Faccio, deve-se ao aumento da base de clientes e da satisfação e da lealdade medida pelo NPS (net promoter score).

- É um salto importante no ano em que temos datas relevantes, fechamos 20 anos como a primeira corporation (empresa sem controlador definido) brasileira e completamos 60 anos de história - disse Faccio à coluna.

Os bons resultados e o cenário que, se não é o ideal ao menos permite a manutenção dos planos, confirmam o plano de expansão de R$ 850 milhões.

- Boa parte será destinada à abertura de novas lojas e a reformas em já existentes. Vamos melhorar as da Avenida Otávio Rocha e do BarraShoppingSul, em Porto Alegre, e a do Park Shopping em Canoas - detalhou.

É bom também, admite o executivo, começar bem um ano marcado pelo desembarque de uma concorrente de peso no Brasil. A sueca H&M pretende abrir quatro lojas no país até dezembro - nenhuma no RS.

- Competição sempre é boa, principalmente quando tem as mesmas leis, impostos e regras. Já competimos com a H&M no Uruguai e temos o maior desempenho - observa Faccio. 

GPS DA ECONOMIA

10 de Maio de 2025
EM FOCO

EM FOCO

Na primeira missa como Pontífice, Leão XIV lamentou o que chama de redução da imagem de Jesus, como se fosse um "super-homem". Apresentação oficial aos fiéis ocorrerá no domingo do dia 18 de maio, na Basílica de São Pedro. Milhares de pessoas são esperadas, incluindo autoridades mundiais

Novo Papa

Críticas contra culto ao dinheiro e ao poder

Um dia após ser escolhido como o novo líder da Igreja Católica, o papa Leão XIV celebrou a primeira missa do seu pontificado na sexta-feira. O Pontífice conduziu a celebração na Capela Sistina, com a presença dos cardeais que o elegeram no conclave encerrado quinta-feira.

Leão XIV conduziu a missa em inglês, italiano e alguns trechos em latim. O americano homenageou São Pedro, considerado o primeiro papa e discípulo de Jesus, e pediu a bênção do santo para o seu pontificado.

Durante a homilia, Leão XIV alertou sobre a ideia de reduzir a figura de Jesus a um "líder carismático ou a super-homem". A celebração começou por volta das 6h (horário de Brasília) e terminou pouco antes das 7h30min.

- Ainda hoje, Jesus, embora apreciado como homem, é simplesmente reduzido a uma espécie de líder carismático ou super-homem e isso não apenas entre os não crentes, mas também entre muitos batizados, que acabam por viver, a este nível, num ateísmo prático - afirmou o Pontífice.

Ainda lamentou o declínio da fé em favor do "dinheiro", do "poder ou do prazer":

- Hoje, não faltam contextos em que a fé cristã é considerada uma coisa absurda, para pessoas fracas e pouco inteligentes; contextos em que, em vez dela, preferem outras seguranças, como a tecnologia, o dinheiro, o sucesso, o poder e o prazer.

A Igreja deve ser "arca de salvação que navega sobre as ondas da história, farol que ilumina as noites do mundo", acrescentou o líder espiritual de 1,4 bilhão de católicos no mundo.

Embora sua eleição seja considerada um sinal de continuidade com o papado de Francisco, também se espera que ele seja um papa mais formal nas questões litúrgicas.

- Buscávamos alguém que seguisse os passos de Francisco, mas acho que o papa Leão XIV não será uma fotocópia (do antecessor) - disse o cardeal americano Robert W. McElroy.

Ao contrário de Francisco, Leão XIV vestiu durante sua apresentação aos fiéis na Basílica de São Pedro a estola papal, mas calçou, como o jesuíta argentino, sapatos pretos - e não os tradicionais vermelhos papais.

Apresentação oficial

No mesmo dia, o Vaticano informou que a missa de entronização de Leão XIV será em 18 de maio na Basílica de São Pedro. A celebração vai empossar oficialmente o Papa aos fiéis. Há expectativa de que líderes mundiais e religiosos estejam presentes.

A Santa Sé também informou que Leão XIV ainda não indicou nomes para os cargos da Cúria Romana - Secretaria de Estado do Vaticano. O Pontífice pediu um tempo para refletir, orar e dialogar. Por enquanto, seguem nos cargos os secretários e autoridades nomeados por Francisco. _

Chiclayo, no Peru, celebra com fervor popular

"O Papa é chiclayano. Viva o Papa!", repetiam em coro dezenas de fiéis, tomados pela emoção, em frente à catedral de Chiclayo, no norte do Peru, onde Leão XIV foi bispo durante oito anos. Entre cânticos, orações e aplausos, todos expressavam, na noite de quinta-feira, a "emoção" e o "orgulho" por terem convivido com o monsenhor Robert Francis Prevost, que passou mais de 20 anos no Peru, país do qual também se tornou cidadão.

- Todos os chiclayanos, os peruanos estamos muito emocionados por ter tido o monsenhor Robert tão perto - disse Lula Botey, gerente de agência imobiliária.

A cidade tem 600 mil habitantes e fica a 15 quilômetros da costa norte do Peru.

- Ele te cumprimentava na rua - recordou Luis Cherco, de 57 anos.

Perto da catedral, o restaurante Las Américas exibia cartaz com a inscrição: "O papa comeu aqui". Rodrigo Vásquez, gerente, disse que Prevost adorava chicharrón (frango frito) com molho Las Américas. 

sábado, 3 de maio de 2025



03/05/2025 - 14h00min
Martha Medeiros

Essa reconexão pessoal promovida pelos finais de romance não deveria assustar

É triste perder alguém, mas a separação só será desesperadora se você estiver perdido de si mesmo, se já nem souber mais quem é.

O problema é que muitas pessoas, ao saírem de um relacionamento, não se querem de volta.

A relação acabou de comum acordo, disseram. A gente sabe que não é bem assim, sempre tem um que lidera o desfecho e o outro concorda, mas, ainda assim, são finais civilizados. Decidida a separação, vem a fase do “quem fica com o quê”, que pode ser complicada quando se trata de um longo casamento, mas se era um namoro em casas separadas, é só cada um buscar suas roupas, livros e seguir a vida em frente. 

Seria menos sofrido, realmente, se a questão da devolução ficasse restringida apenas a coisas materiais. O problema é que muitas pessoas, ao saírem de um relacionamento, não se querem de volta. Não aceitam ser devolvidas para elas mesmas. Relacionamentos suprem carências. Casais não trazem apenas objetos para dentro da relação: trazem seus parentes, seus amigos, seu universo profissional.

Novos olhares e abraços. Infelizmente, na hora de separar, essa turma entra no inventário. Por mais que o afeto se mantenha, terminará a convivência. Você não será apenas a ex-mulher ou o ex-marido de alguém. Será também ex-cunhado, ex-genro, ex-nora, ex-madrasta, ex-padrasto. Mesmo tendo ampliado sua rede de contatos, precisará de equilíbrio emocional para voltar para si mesmo e ser bem recebido por aquele que você era antes da relação iniciar.

Nosso RG traz foto, assinatura e um número, mas essa é apenas a parte burocrática da nossa identidade. A matéria-prima que nos constitui vem de alegrias, traumas, aprendizados, bullying, conquistas e rejeições, enfim, tudo o que foi vivido antes de crescer e escolher alguém para compartilhar sua história. Não dá para iniciar uma relação esvaziado disso tudo. A pessoa que não consegue lidar com o adulto que se tornou, e que não preserva o lugar dentro dela que deveria chamar de “casa”, vira uma sem-teto hospedada na vida alheia.

Toda separação é uma devolução. Você é devolvido para si. Com mais bagagem e mais lembranças, mas tem que retornar ao seu eu essencial. Você é o seu próprio lar, diz a música. É triste perder alguém, mas a separação só será desesperadora se você estiver perdido de si mesmo, se já nem souber mais quem é. 

Machistas inseguros chegam a ponto de entrar em surto diante do rompimento e cometem feminicídio: no Rio Grande do Sul, seis mulheres foram assassinadas por seus ex-parceiros na última Sexta-Feira Santa. Tudo o que o criminoso consegue com essa violência é arranjar um novo lugar para morar: atrás das grades, onde aprenderá na marra a conviver consigo próprio.



03 de Maio de 2025
CARPINEJAR

Quem ronca não sabe que ronca

Não enxergamos os nossos defeitos. Como evoluir se não reparamos as nossas falhas? E não é por mal, é porque estamos viciados em nos proteger, condicionados a nos defender.

Parece que, com o erro exposto, deixaremos de ser amados. Entramos numa desvalia emocional, como se estivéssemos perdendo valor na hora da repreensão.

Não admitimos o ciclo natural do aprendizado, de absorção das críticas para o constante aperfeiçoamento. Se alguém próximo faz um comentário sobre algo para mudar em seu comportamento, você aceita de primeira?

Dificilmente. Você vai refutar, vai discutir, vai - talvez num processo compensatório - tentar encontrar um problema no outro para neutralizar o que você toma como um ataque. Ou seja, você não analisa os seus erros, o que precisa transformar em si para o bem da sua saúde emocional.

Você passa a vida inteira procurando aprovação, não transformação. Esta é a grande senha para o amadurecimento: quando você não quer mais a aprovação e finalmente acolhe a transformação, caminho que só pode ser feito a partir da aceitação.

Ao aceitar quem você é, reconhecer seus pontos fracos, você começa a se transformar, adquirindo novas habilidades. A equação matemática seria:

ACEITAÇÃO = TRANSFORMAÇÃO

Assim você combateria a fórmula:

APROVAÇÃO = RESISTÊNCIA À MUDANÇA

Ao se preocupar excessivamente com a opinião de terceiros, com o que fica na vitrine, com a sua reputação e imagem pública, sempre se sentirá ofendido com a verdade ou com observações alheias. Entenderá qualquer avaliação de sua postura como condenação (muito mais do que um julgamento). Oferecerá uma relutância mal-humorada e indisposta de acatar o contraditório, o contraponto, vivendo uma idealização de si, numa couraça impenetrável. Não se conhece - e odeia quem se mostra íntimo, capaz de apontar as suas imperfeições.

Uma ilustração desse modus operandi, inconsciente e involuntário, de não naturalizar as limitações - do ego cego - é o ronco.

Quem ronca não sabe que ronca. Não escuta o seu ronco. Seu ronco atrapalha quem está ao lado. Ele não sabe o quanto pode ser uma britadeira, o quanto pode ser enervante, o quanto pode ser insuportável, o quanto pode tirar o sono dos demais - já que não ouve o seu próprio defeito. Ele não testemunha a sua aterrorizante apneia, a sua falta de ar, o seu afogamento seco. Não sofre com aquilo que causa ao redor. Envolvido em sua cortina de dormência, sequer suspeita que a sua presença é nociva para os seus afetos.

É provável que rebata as advertências achando que são exagero, drama, perseguição ou ausência de apoio e compreensão. O maior prejudicado acaba sendo ele mesmo. Não percebe que a sua saúde está em risco com a baixa oxigenação do cérebro e a possibilidade de uma parada cardiorrespiratória.

Quando não conseguimos identificar o que devemos retificar, somos nossos maiores malfeitores. Somos, simultaneamente, vítimas e carrascos. _

CARPINEJAR

 
03 de Maio de 2025
ANDRESSA XAVIER

O país dos resignados

Pessoas que passam por situações difíceis vão criando o que chamamos de casca. É um anticorpo para não serem tão afetadas ou pelo menos reagirem diferente na próxima vez que a vida lhes der uma rasteira. Quando o inesperado vem, já estão preparadas. Nada mais surpreende. É assim que sinto o brasileiro hoje. Calejado com Mensalão, Petrolão, Lava-Jato e afins, o cidadão já não espera mais nada. Quando deposita a confiança em um político que promete o mundo, invariavelmente vai quebrar a cara. Nem sempre nota na hora, mas o arrependimento vem. Sabe que não pode colocar a mão no fogo por ninguém. Às vezes o faz, pois é um otimista por natureza, mas não é o recomendado.

O brasileiro é resignado. Além da corrupção, ainda lida com a impunidade. Não só nos roubos descarados, mas até em mortes provocadas por motoristas bêbados, que dificilmente seguem presos, para dar um exemplo. Ou ainda os mil recursos de um condenado e dribles dentro das brechas que as leis proporcionam.

Enquanto o cidadão comum enfrenta o ônibus lotado, a fila do SUS e rebola para se sustentar com um salário que não cobre as despesas básicas da casa, o grupo dos que se acham espertos cria quadrilhas institucionalizadas, como foi o que aconteceu no INSS e descobrimos recentemente, embora o tenha sangrado por anos a fio. Uma operação que não para de dar frutos podres. Seis bilhões de reais descontados indevidamente e sem autorização entre o governo anterior e o atual. Em português bem claro, roubo direto da fonte.

De novo, os mais vulneráveis são vítimas de um sistema que usa e abusa das falhas para colocar a mão no dinheiro dos outros. Se achávamos que a histórica fila de espera do INSS era problemática, seja por falta de gestão ou por incompetência e má vontade, agora descobrimos que esse era o menor dos problemas.

É de um cansaço tremendo ver os mesmos erros se repetindo. Temos a sensação de abandono e de não poder fazer nada para mudar os rumos de um país que tem a corrupção entranhada em sua história. O Brasil precisa de um Estado que respeite seu povo, que proteja seus mais frágeis, que puna os culpados sem medo ou conivência. Quando o ministro responsável pela indicação no INSS e pela pasta, que também foi alertado sobre o golpe que havia lá dentro e ignorou o aviso, continuou por semanas no cargo, se estende um sangramento desnecessário. Em nome da governabilidade, o governo Lula errou mais uma vez ao manter Carlos Lupi, o omisso, no cargo. Somente na sexta-feira, depois de todo o desgaste, é que o ministro, enfim, caiu.

Enquanto isso, seguimos como os resignados e determinados fazem, trabalhando e nadando contra a maré. A indignação das pessoas já não constrange mais Brasília. _

ANDRESSA XAVIER

03 de Maio de 2025
MARCELO RECH

Cumpra-se a Constituição

Neste 3 de maio, quando se celebra o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, é bom lembrar que toda essa discussão no STF e alhures sobre regulação das mídias sociais poderia ser tratada, sem censura ou tortuosas ameaças de controle estatal, com uma medida prática e um conceito básico.

A medida: as plataformas, como qualquer empresa que faz negócios no Brasil, passam a cumprir a Constituição brasileira. O Artigo 5º, inciso IV, que é a síntese da defesa da liberdade de expressão, diz textualmente: "É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato". Por conveniência, as big techs só levam em consideração a primeira parte da frase, mas é depois da vírgula que está a chave para se aplacar as aberrações das redes sociais.

Ao proibir o anonimato, os constituintes fixaram sabiamente que somos livres para nos expressarmos, mas não pode haver - salvo exceções em lei, como paródias - manifestações anônimas, exatamente porque, em caso de abuso, todos podemos ser responsabilizados. E que restrições são essas? Nada de novo. Eu as aprendi nos primeiros anos de faculdade de Jornalismo, e lá se vão uns 45 anos, quando nem se cogitava de internet. São os Artigos 138, 139 e 140 do Código Penal, os conhecidos calúnia, difamação e injúria, que valem para qualquer cidadão e abarcam a maioria das baixarias das redes sociais.

Aplique-se a Constituição às plataformas, pois, e elas terão de limpar a sujeira dos robôs e de suas contas falsas e anônimas, por onde verte boa parte do esgoto digital. De quebra, teremos uma sanitização adicional nas fraudes dos cliques artificiais em anúncios e dos seguidores de mentirinha. Todo mundo, menos quem fatura com as contas fakes, naturalmente, sairá ganhando.

Agora ao conceito. Um supermercado que vende alimento vencido e intoxica seus consumidores não pode alegar que não tem responsabilidade porque é apenas um intermediário - como, aliás, fazem algumas big techs quando lavam as mãos sobre fraudes e abusos em conteúdos impulsionados, ou seja, sobre como acumulam fortunas.

A responsabilização das plataformas pela forma como fazem dinheiro poderia se chamar Lei Drauzio Varella. Há alguns dias, o respeitado e popular médico desabafou em artigo na Folha de S. Paulo que a Meta, dona do Facebook e do Instagram, se omite descaradamente sobre as quadrilhas que usam sua imagem e voz recriada com inteligência artificial para enganar incautos com propagandas de tratamentos tão miraculosos quanto inúteis.

Em qualquer atividade, o ideal seria a autorregulação, mas quando empresas se negam a cumprir preceitos éticos mínimos, é hora de, em benefício final dos usuários e consumidores enganados, retirar o certificado de isenção concedido ingenuamente às big techs. _

MARCELO RECH

03 de Maio de 2025
CONSELHO EDITORIAL

Pois nessa semana que passou, completamente desavisada, vivi um turbilhão de emoções despertado por reportagens históricas do Brasil e do mundo, pelas grandes coberturas das últimas décadas, pelos personagens de novelas, trilhas sonoras, artistas, comediantes, apresentadores, pelas cenas do esporte e nossos atletas de todos os tempos.

O show dos 60 anos da TV Globo, que espetáculo! O Jornal Nacional ao vivo dentro da casa dos brasileiros, quanta competência e sensibilidade. As homenagens aos que tornaram tudo isso possível com o seu empreendedorismo, talento, criatividade, determinação e muito trabalho, todas merecidas.

Aprendi com meu pai e com a cultura nipônica a atenção aos detalhes, o valor do trabalho (muito) bem-feito e a busca pela excelência. Com a minha mãe, entendi o impacto que a beleza e a ordem trazem para a vida da gente. Assim, impossível não reconhecer que a Globo carrega em seu DNA o compromisso com a estética, com o cuidado artístico, com o desejo de entregar algo impecável ao público.

Sejamos justos: essa busca incessante por excelência, somada ao amor pelo Brasil e pelos brasileiros, foi decisiva para promover neste nosso país gigante, de tantos sotaques, desafios e divergências, uma identidade única, visual e cultural, a nossa brasilidade. A Globo construiu um modelo de televisão, da qual a RBS TV faz parte desde o princípio, que soube valorizar as regionalidades e, ao mesmo tempo, conectar esse país continental consigo mesmo, ajudando-nos a construir nossa autoestima, a sentir orgulho de quem somos.

Quanto a gente dá conta de ver, aprender, sentir e viver em 20, 40 ou 60 anos? Muito, mas infinitamente menos, se o fizermos sozinhos. Por isso, ao passar a limpo esses 60 anos da TV Globo, com seus erros e acertos como qualquer pessoa, empresa ou instituição, enxerguei minha própria história e senti gratidão. 

CEO da ANK Reputation e membro do Conselho Editorial da RBS contatoconselhoeditorial@gruporbs.com.br


OPINIÃO RBS

Um ano depois do momento mais agudo da pior enchente de todos os tempos no Rio Grande do Sul - que deixou 183 mortos, 27 desaparecidos e milhares de desabrigados em quase todos os municípios do Estado -, percebe-se que a população gaúcha se divide entre dois sentimentos antagônicos: o orgulho de sua própria resiliência e uma grande preocupação em relação às promessas públicas de reconstrução.

No entanto, muito já foi feito nesse sentido. Desde o primeiro momento, governantes, autoridades e lideranças comunitárias se mobilizaram no socorro e no atendimento básico às famílias desalojadas. Em poucos meses, pontes e ligações asfálticas foram recuperadas e as principais atividades econômicas já podem ser consideradas praticamente normalizadas. Com raras exceções, as cidades atingidas se sentem mais preparadas para enfrentar calamidades.

Em âmbito estadual, o Plano Rio Grande - o programa de recuperação e resiliência climática apresentado pelo governo do Estado - contempla aspectos importantes para o enfrentamento de futuros desafios climáticos. Porém, como a destruição foi rápida e a reconstrução depende de trabalho, recursos e superação de barreiras burocráticas, é natural que alguns setores da sociedade cobrem medidas mais efetivas.

Além disso, algumas comunidades ainda se sentem expostas aos riscos provocados por eventos climáticos extremos que, segundo os especialistas, tendem a se repetir com maior frequência no futuro. É compreensível: mesmo quando existem vontade política e recursos públicos disponíveis para a execução de obras recomendadas, como é o caso do dique localizado na zona norte da Capital, a dificuldade em remover moradores da área de risco para habitações dignas acaba entravando todo o processo.

Enquanto o setor privado trabalha em ritmo alucinante para normalizar a atividade produtiva, como acaba de constatar o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em relação ao crescimento da produção agropecuária do Estado, o setor público esbarra em trâmites burocráticos. Estudos e projetos necessários à liberação de recursos demoram a ser concluídos, obras públicas sofrem interrupções injustificadas por qualquer motivo e até mesmo providências aparentemente simples, como limpeza de bueiros e recomposição de barreiras de proteção, esbarram nas limitações do poder público.

Ainda assim, é impositivo reconhecer que o Rio Grande avançou muito neste ano de convalescença. Considerando-se as dimensões da catástrofe, o povo reagiu com coragem insuspeitada e nunca faltou empenho às nossas lideranças políticas para buscar soluções, tanto no âmbito federal quanto no estadual e nos municípios.

Só que a corrida contra o tempo continua. Enquanto as populações vulneráveis não forem retiradas das áreas de risco, a infraestrutura de transporte e serviços essenciais não for totalmente reparada, os sistemas de proteção e contenção de rios não estiverem concluídos, a drenagem dos grandes centros urbanos não for melhorada e a população não for adequadamente educada para reagir a situações extremas, o trabalho de reconstrução de um Rio Grande melhor não estará concluído.  


Saída de Lupi não reduz erros do governo no INSS

Era tão insustentável a permanência de Carlos Lupi no Ministério da Previdência que ele comunicou sua saída no final da tarde de sexta-feira. A substituição foi feita às pressas - o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem viagem a Rússia e China - e não deixou no comando do maior orçamento da União alguém blindado a qualquer suspeita. A indicação do número 2 da Previdência, Wolney Queiroz, dá sinal de... continuidade. É o oposto do que deveria ser o objetivo de uma mudança.

A lista atualizada dos sete erros

1. Falta de reconhecimento da dimensão e da gravidade: o relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) estima que a fraude alcançaria R$ 6,3 bilhões. Só a escala deveria ter derrubado todo e qualquer responsável pelo malfeito e pela falta de vigilância que permitiu chegar a esse valor. É mais grave por atingir pessoas vulneráveis, com renda mais baixa e menor letramento digital.

2. Desarticulação na entrevista que detalhou a operação: causaram perplexidade a defesa feita pelo ministro da Previdência, Carlos Lupi, do presidente do INSS já afastado, e o aceno distraído do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, que previu ressarcimento dos beneficiários pelos danos para "um dia".

3. Demora na demissão do presidente do INSS: com Alessandro Stefanutto afastado, não havia motivo para hesitar. O vaivém custou quase um dia de desgaste, até que a decisão fosse enfim tomada. Esse já foi corrigido, mas deixou de herança a corrosão de credibilidade.

4. Hesitação na substituição no Ministério da Previdência: afastar não é pré-julgar que Carlos Lupi tem envolvimento na fraude. Mas o ministro é o responsável pela gestão do maior orçamento da União. Sua manutenção reforçava as acusações de leniência do governo com corrupção. O problema é que a substituição, feita às pressas e sem que o indicado seja blindado a qualquer suspeita, prorroga o equívoco.

5. Atraso na suspensão dos acordos suspeitos: só na tarde do dia seguinte ao da operação. O mecanismo da fraude era conhecido muito antes. A comunicação deveria ter ocorrido no dia anterior. Gerou indignação dos possíveis afetados, dos mais vulneráveis aos com maior poder de pressão.

6. Conta-gotas na apresentação de dados: só dias depois da operação foram expostos detalhes como o que envolve Virgílio Oliveira Filho, ex-procurador do INSS. Conforme a PF, teria recebido R$ 11.997.602,70 e um carro de luxo avaliado em R$ 500 mil, transferido à esposa do ex-diretor. Uma transferência de R$ 11 milhões é muito, mas o prejuízo estimado é 572 vezes maior.

7. Bate-cabeça na definição do ressarcimento: desde o "um dia" do ministro da Justiça até a ordem de Lula para que seja feito pelas associações fraudulentas, ainda não houve sinal concreto sobre como fazer a compensação devida com a rapidez e a eficiência que faltaram na detecção da fraude. _

Gaúcha em Jurerê

Foi batido o martelo de um residencial à beira-mar com infraestrutura durante todo o ano e apartamentos de até 600 m2 em Jurerê entre a gaúcha Melnick e a catarinense Dimas Construções. O plano é dotar de atrativos que vão além da temporada de verão, para atender os moradores nas quatro estações.

Está prevista área de até 5 mil m2 de comércio e serviços de alto padrão. O projeto tem um terceiro parceiro, a dona do terreno HSH Empreendimentos. As empresas estudam outros quatro projetos. _

Conversa de EUA e China dá alívio

Foi uma sexta-feira com muitas emoções no mercado, sem que isso provocasse fortes variações em câmbio e bolsa. No Brasil, o dólar recuou 0,41%, para R$ 5,653 e a bolsa fechou praticamente estável, mas com sinal positivo (0,05%) depois de um dia inteiro no vermelho.

Os sinais refletem projeção mista. Uma é favorável, aos sinais - sem confirmação - de início da negociação de tarifas entre Estados Unidos e China. Isso fez quase todos os pregões subirem, da Ásia aos EUA.

Outra avaliação foi desfavorável do ponto de vista nacional: os dados do mercado de trabalho nos EUA vieram mais fortes do que se esperava, reduzindo a chance de corte de juro por lá. Se houvesse redução, ajudaria o Brasil a atrair capital.

As duas interpretações estarão na mesa do Comitê de Política Monetária (Copom) na próxima semana. Está contratada uma alta de juro, mas há suspense: as apostas vão de 0,75 ponto percentual até 0,25 ponto.

O sinal de possíveis tratativas veio de um comunicado do Ministério do Comércio chinês, afirmando que "os EUA enviaram mensagens, por meio de partes relevantes, na esperança de iniciar conversas". O presidente Xi Jinping tentará ser o adulto na sala. _

Os EUA precisam mostrar sinceridade, corrigir suas práticas e cancelar tarifas unilaterais.

Ministério do Comércio da China

Em comunicado que informou sobre iniciativa americana para abrir negociações tarifárias.


03 de Maio de 2025
REPORTAGEM -Bruna Oliveira - Kathlyn Moreira

REPORTAGEM

ZH encontrou algumas das pessoas chamadas de refugiadas climáticas e mostra como está o reinício de laços afetivos, as lembranças do que ficou para trás e o que elas esperam do futuro. Estudo aponta que cerca de 1 milhão teve de se deslocar de suas casas, de forma permanente ou temporária

Migrantes da cheia

Esperança de dias melhores e vontade de recomeçar

Em questão de horas, milhares de gaúchos mudaram drasticamente as suas vidas. Em maio do ano passado, muitos foram obrigados, para evitar serem levados pela água que avançava pelas ruas, invadia casas, derrubava grades e portões de fábricas e subia ferozmente, a deixar suas casas.

Um ano depois, os chamados refugiados climáticos recomeçam as suas vidas em novos locais, fugindo da força da natureza e buscando novos horizontes. A reportagem de ZH encontrou algumas dessas pessoas e mostra como está o recomeço em distâncias que chegam a centenas de quilômetros das antigas moradias.

Fernanda Paula Silva teve a casa, comprada meses antes da enxurrada e o comércio, inundados pela força do Jacuí em Eldorado do Sul, na Região Metropolitana. A decisão foi recomeçar em Porto Alegre. O casal Paulo Roberta Silva e Chaiane Nunes dos Santos saíram às pressas, com a água já no tornozelo, para viver em Quintão. Alessandra, que cresceu na região da Ilhas se viu obrigada a deixar a moradia que podia desabar, carregando apenas as lembranças para uma nova vida na zona norte da Capital. _

Uma saída para não voltar mais

Na madrugada de 2 de maio de 2024, Fernanda Paula Silva, 39 anos, e dois filhos, de 13 e cinco anos, saíram às pressas da residência no bairro Centro Novo, em Eldorado do Sul, enquanto a água tomava praticamente por completo a moradia. E o comércio de venda de frango assado de Fernanda, que ficava no bairro Chacará, foi castigado de forma severa pela enxurrada.

Com o pouco que deu para salvar, eles deixaram Eldorado do Sul em direção a Porto Alegre. E nunca mais voltaram. Fernanda conta que a decisão foi baseada no medo de reviver tudo de novo:

- Desde aquela madrugada em que eu fechei a minha casa não voltei mais. Acabei ficando em Porto Alegre por medo mesmo, porque a qualquer chuva que dá, a gente já fica desesperada.

A altura da água chegou a 1,5 metro na residência e atingiu o teto do estabelecimento comercial. Poucas peças e equipamentos puderam ser recuperados do local.

A morada deixada para trás, agora alugada por outra família depois da limpeza, foi entregue à Fernanda meses antes da tragédia climática. O lugar que concretizava a realização de um sonho mal teve tempo de abrigar outras memórias.

- A Caixa me entregou a chave, a casa novinha, recém-financiada, tudo lindo, tudo branquinho. Sabe? As minhas tomadas, as minhas janelas. Não passei um Natal e um Ano-Novo na minha casa - conta Fernanda.

O recomeço na Capital tem sido "a passos de formiguinha" e conta com o suporte de amigos e familiares. O endereço fica no bairro São José, na zona leste da Capital, distante de inundações, e recebe casa e comércio lado a lado.

- Ainda estou começando a existir aqui em Porto Alegre. Sei que, de repente, não vou acessar o centro da cidade, mas não preciso, porque tenho o mercado e a escola dos meus filhos perto. Então, as coisas estão, sim, caminhando para o melhor - celebra a empreendedora, embora relata que sente muita saudade do pôr do sol visto da janela de sua antiga casa em Eldorado do Sul. _

Mudança para um local provisório

Alessandra Lacerda, 25 anos, cresceu na Ilha Grande dos Marinheiros, em Porto Alegre. Percorrendo as ruas vazias, a líder comunitária recorda os jogos de taco e as correrias de quando era criança. A casa, repleta de memórias, se tornou inabitável e com risco de desabamento. A água, além de levar embora os materiais que ela utilizava para vender açaí, arrastou a vontade de voltar a viver na região das Ilhas, apesar do amor que ela demonstra pelo local.

- Por um lado, me parte ter que estar saindo daqui, mas, por outro, não dá para ficar. A ilha não é mais segura por conta da enchente - resume.

Alessandra diz que ainda paga contas de móveis que nem tem mais. O sentimento de abandono carregado pela comunidade fez com que Alessandra decidisse ir embora.

Vivendo provisoriamente em estadia solidária no bairro Vila Farrapos, em Porto Alegre, Alessandra aguarda o processo do Compra Assistida, da Caixa Econômica Federal, para morar em um imóvel escolhido em Alvorada, com o filho de cinco anos.

- Fui para a casa do meu irmão em Eldorado do Sul. A gente não sabia que a enchente ia ser tão grande. De lá, fomos para a Mathias (bairro Mathias Velho, em Canoas), com água no peito. Depois, a gente foi para Guajuviras (em Canoas), na minha irmã. Nisso, fui para Alvorada e depois aluguei na Vila Farrapos - diz Alessandra.

Mesmo trocando de município, Alessandra afirma que não deixará de atuar como líder comunitária para ajudar seus vizinhos e a mãe, que ainda mora no mesmo terreno e também aguarda o processo para adquirir uma nova casa.

- Ela não está aceitando muito bem sair da ilha, mas falei para ela que não tem como ficar, não tem mais posto de saúde. Hoje tem uma carreta com atendimento maravilhoso, mas a gente não sabe até quando - desabafa Alessandra, relatando que, a cada nova chuva, o coração ainda fica aflito pensando na mãe e nos moradores que seguem na ilha. _

O que são refugiados climáticos?

Junto à escalada dos desastres ambientais, popularizou-se expressão para designar os que deixam as suas casas, de forma permanente ou temporária, para escapar da força da natureza. São os refugiados climáticos.

Mas, ao contrário de outros conceitos como migrante, refugiado ou asilado político, não há definição legal no Brasil ou de organismos internacionais sobre refugiados climáticos. O que existe é uma interpretação muito ampla sobre o que se enquadraria neste grupo de pessoas, explica o professor de Relações Internacionais da ESPM-SP, Roberto Uebel.

A falta de definição legal sobre o conceito, diz, resulta em uma série de entraves, seja para a elaboração de políticas públicas, seja para a obtenção de auxílios por parte dos atingidos.

"Isso dificulta a obtenção de auxílio financeiro, por exemplo, ou leva ao caso que vimos de cidadãos sem nenhum documento tendo que lidar com a burocracia", afirma o pesquisador.

Estudo conduzido pelo pesquisador mostrou que mais de 2 milhões de pessoas foram diretamente afetadas pela cheia no Rio Grande do Sul. Metade delas precisou se deslocar de suas casas, de forma permanente ou temporária.

No Litoral, com uma nova vida chegando

Berço montado, enxoval encaminhado, ansiedade e planos pela frente. Completando sete meses de gravidez, a autônoma Chaiane Nunes dos Santos, 34 anos, prepara a chegada de Lorenzo, ao lado do marido, Paulo Roberto Silva, 64 anos. O casal deixou Eldorado do Sul no dia 2 de maio de 2024 e decidiu ficar na casa de praia da família, em Quintão, acompanhados da cadelinha e da gatinha de estimação.

Aposentado, Paulo conta que viveu no município da Região Metropolitana desde 2000 e já havia enfrentado outras inundações, mas nada comparado ao que aconteceu no ano passado, quando os dois saíram já com a água batendo no tornozelo dentro de casa.

- Na de 2024, perdi tudo. Tem roupas aqui que estou usando até hoje que ganhamos de doação. A gente foi levantando tudo, achando que não ia ser tão alto. A água chegou em cima do telhado, quebrou telha, quebrou tudo - lembra Paulo.

Um ano depois, ele conta que é difícil lidar com o psicológico e com a saudade dos filhos do primeiro casamento, que ficaram em Eldorado do Sul. O contato é mantido pelo celular.

- Não consigo dormir direito desde a enchente. Começo a pensar na minha casa lá. A minha filha morando lá. A minha cabeça está sempre voando, não consigo descansar - relata.

Chaiane diz que a chegada do bebê despertou mais insegurança e pavor de ter que lidar com os alagamentos outra vez:

- Não quero voltar para lá, porque tenho medo de pegar mais uma enchente. E se vier mais uma até que venha um dique novo?

Sentado no gramado da frente da nova casa, Paulo comenta o adesivo que fez questão de manter na traseira do carro com a frase "Eu amo Eldorado do Sul".

- Vou uma vez por mês lá rever os amigos e depois retorno. A saudade é muito grande. Vou continuar amando Eldorado. É a minha segunda cidade. Nasci em Porto Alegre, me criei em Viamão, mas hoje eu sou eldoradense de coração - confessa ele, ainda alimentando a esperança de um dia poder retornar ao município pelo qual nutre tanto carinho.