terça-feira, 15 de julho de 2025



15 de Julho de 2025
POLÍTICA E PODER - Rosane de Oliveira

Leite perde a chance de se mostrar como alternativa

Está difícil entender a estratégia do governador Eduardo Leite para 2026, dado que seu sonho confesso é concorrer a presidente da República. É verdade que Leite não cometeu o erro de Tarcísio de Freitas (Republicanos), Romeu Zema (Novo) e Ronaldo Caiado (União Brasil), que no primeiro momento se jogaram na cerca elétrica para ficar bem com o eleitorado de Bolsonaro. Depois, quando perceberam o estrago provocado pelo tarifaço, Tarcísio e Zema tentaram dar uma polida no discurso.

Leite também nunca usou o boné com a sigla MAGA, de Make America Great Again, mesmo que essa "grandeza" signifique prejuízo para o Brasil, como se viu agora. O episódio deu ao governador gaúcho uma oportunidade de ser voz forte em defesa da soberania brasileira, das empresas, do agronegócio e dos trabalhadores brasileiros que poderão ficar desempregados se o tarifaço de 50% for mantido. E se quer ser "alternativa", "terceira via" ou seja lá o que for, tem de mostrar independência na relação com o presidente Lula e com o ex-presidente Bolsonaro.

Leite só se manifestou quando foi perguntado sobre o tarifaço e deu uma resposta evasiva:

- Os seres humanos são falíveis. Falham, erram, acertam, e, naturalmente, nós temos muitas virtudes e tantos defeitos nas nossas instituições. Mas quem define e corrige as nossas instituições somos nós, os brasileiros.

Faltou uma condenação dura

Leite alinhou obviedades, mas não fez uma condenação dura da chantagem de Trump, nem da estratégia da família Bolsonaro que acaba punindo a economia brasileira. Se Leite não quer melindrar os bolsonaristas porque espera ter seus votos se passar pela corrida de obstáculo no PSD e chegar a candidato, perde tempo. Aos olhos do bolsonarismo, ele é um esquerdista - mesmo que se defina e adote políticas liberais.

O PSD só terá candidato próprio se Tarcísio optar por disputar a reeleição. E o partido tem também Ratinho Júnior, governador do Paraná. Se Leite for candidato ao Senado, será cobrado pelas posições em momentos dramáticos como este. _

MDB sente a falta que Ibsen faz na política gaúcha

A homenagem que o MDB fez ao ex-deputado Ibsen Pinheiro ontem é um reconhecimento ao líder que foi vítima de uma injustiça e viu sua carreira desmoronar depois de ter sido presidente da Câmara dos Deputados.

No mês em que completaria 90 anos, Ibsen virou nome de auditório. Não de um auditório qualquer, mas o da sede estadual do MDB, adquirida em 2012, ano em que ele foi presidente do partido.

Ibsen foi vereador de Porto Alegre, deputado estadual, deputado federal e presidiu a Câmara. Teve papel decisivo na elaboração da Constituição de 1988, mas caiu em desgraça quando foi associado à CPI do Orçamento e teve uma informação errada sobre seu patrimônio divulgada na revista Veja. Perdeu o mandato e, anos mais tarde, o autor da reportagem admitiu que a reportagem tinha um zero a mais no patrimônio. _

Presidente da Fiergs irá à Assembleia falar sobre tarifaço

Preocupado com os impactos do tarifaço anunciado pelo presidente Donald Trump, especialmente na indústria gaúcha, o líder da bancada do PT na Assembleia Legislativa, deputado estadual Miguel Rossetto, reuniu-se ontem com o presidente da Fiergs, Claudio Bier.

Bier aceitou convite para participar de uma audiência na Comissão de Economia, marcada para amanhã às 10 horas, para tratar das consequências da taxação.

A reunião já foi combinada por Rossetto com o deputado Gustavo Victorino (Republicanos), presidente da comissão. _

Eduardo Bolsonaro cogita renunciar

A cada post nas redes sociais ou a cada entrevista que dá, o ainda deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) avança uma casa na direção da renúncia, por absoluta falta de condições de retornar ao Brasil até 21 de julho, quando termina o prazo de sua licença para tratamento de interesses particulares.

Ontem, ele voltou a afirmar que pode renunciar. Considera que, se voltar, será preso e terá o passaporte retido, mesmo que não seja réu nem alvo de denúncia no caso dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.

Sem renda, o deputado terá de vender patrimônio ou viver das vaquinhas organizadas pelo pai, já que o PL não mostra disposição de sustentá-lo nos Estados Unidos, onde está com a esposa e os filhos. _

Capital zera fila de duas especialidades

A prefeitura de Porto Alegre tem índices a celebrar. Na última sexta-feira, o município encaminhou o atendimento de todos os pacientes que aguardavam pelo início dos tratamentos oncológicos de mama e radioterapia no SUS.

Com a fila zerada, o tempo médio de espera também foi reduzido. Na oncologia de mama, por exemplo, a espera que era de 11 dias para agendamento em dezembro de 2024 caiu para dois. _

Eduardo Leite se manifestou contra a recriação da licença-prêmio para membros de carreiras jurídicas do Estado. Questionado, o governador lembrou que foi o proponente da emenda responsável por acabar com o benefício para todo o funcionalismo, em 2019.

POLÍTICA E PODER

15 de Julho de 2025
INFORME ESPECIAL - Rodrigo Lopes

A América Latina ainda é quintal dos EUA?

A ameaça de tarifaço ao Brasil traz a expressão, que, volta e meia, ronda a relação entre os americanos e os países ao sul do Rio Grande. Seria ainda hoje a América Latina quintal dos EUA?

A metáfora, obviamente, precisa ser reinterpretada à luz de um mundo no qual as potências globais competem, cada vez mais, por zonas de influência. É quase consenso entre especialistas de que o mundo está voltando a ser fatiado pelo poder, como em outros momentos turbulentos da história que nos levaram ao abismo.

A China criou a nova Rota da Seda como instrumento de influência, financiando obras de infraestrutura em mais de 150 países, tecendo uma rede de influência econômica e dependência financeira que vai do Sudeste Asiático à África e América Latina. Em resposta, os EUA reforçaram alianças por meio de parcerias militares estratégicas, como AUKUS (EUA, Reino Unido e Austrália) e Quad (EUA, Índia, Japão e Austrália).

A invasão da Ucrânia é uma tentativa explícita de o Kremlin manter sua esfera de influência na região pós-soviética e impedir o avanço da Otan. A Turquia tem se tornado o novo ator no Oriente Médio, com braços estendidos sobre o Cáucaso, a Líbia e até a África.

No caso latino-americano, a relação com a potência hegemônica, os EUA, sempre foi de aproximações e distanciamentos. A expressão "América Latina como quintal dos EUA" surgiu entre os séculos 19 e 20 como crítica ao intervencionismo em assuntos latino-americanos.

Doutrina Monroe

Historicamente, essa visão foi construída a partir da Doutrina Monroe (1823). Ao mesmo tempo em que estabelecia que as Américas deveriam estar livres da intervenção europeia, servia como justificativa para a influência dos EUA na região - algo como um pai protetor, mas, ao mesmo tempo, punitivo.

Além do "quintal", que remete a um local periférico da casa, outra metáfora comum nessa relação é a do "big stick" (porrete). A política de Theodore Roosevelt defendia a intervenção militar dos EUA para proteger seus interesses, como nas ocupações de Cuba, Haiti, Nicarágua e República Dominicana, além dos golpes apoiados pela CIA, como no Chile (1973) e no Brasil (1964).

Faz sentido ainda hoje? Por um lado, há uma continuidade da influência política e econômica - a maioria dos investimentos externos no Brasil vem dos EUA -, e Washington costuma apoiar governos aliados e manifestar hostilidade contra regimes ditatoriais, como de Venezuela e Cuba.

No entanto, há clara ascensão de outros atores na região, como a China, principal destino das exportações brasileiras, o que reduz a centralidade dos EUA. Latino- americanos também têm buscado diversificar parcerias, por meio de grupos, como Brics, Mercosul e Celac. _

Direito de pergunta: Donald Trump brinca de "Banco Imobiliário" (Monopoly) com a economia global?

O que é a Lei de Reciprocidade

Após Donald Trump anunciar tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, o presidente Lula mencionou a possibilidade de resposta à decisão do americano com base na Lei de Reciprocidade Comercial.

A lei entrou em vigor em abril deste ano. O texto estabelece critérios para a "suspensão de concessões comerciais, de investimentos e de obrigações relativas a direitos de propriedade intelectual" em resposta a medidas unilaterais de países ou blocos econômicos que prejudiquem a competitividade do Brasil no mercado internacional.

A legislação pode ser aplicada em casos em que ações estrangeiras:

Interfiram em escolhas legítimas e soberanas do Brasil;

Violem ou sejam inconsistentes com acordos comerciais;

Ou em outras situações que causem danos econômicos ao país.

O Artigo 3o, por exemplo, autoriza o Executivo a adotar "contramedidas na forma de restrição às importações de bens e serviços ou suspensão de concessões comerciais e obrigações".

Além disso, o país pode implementar medidas como:

Imposição de sobretaxas a produtos importados;

A suspensão de cláusulas específicas em acordos comerciais;

Interrupção temporária do reconhecimento de patentes e pagamento de royalties.

Suspender temporariamente princípios da Organização Mundial do Comércio (OMC), que exigem tratamento igualitário entre parceiros, salvo casos de acordos bilaterais. _

Incidentes registrados nas comemorações da Bastilha

O 14 de julho é data emblemática para os franceses, de comemoração da Queda da Bastilha. Presidente da França, Emmanuel Macron pretendia usar as celebrações para exibir o poderio das Forças Armadas, mas incidentes roubaram a cena.

Um dos cavalos do desfile escorregou e caiu, derrubando o cavaleiro. Outro animal se desgarrou e circulou sozinho. Já um soldado foi flagrado com o ouvido sangrando, aparentemente ferido por sua própria espada. _

RS se despede de mais um pracinha

Morreu, ontem, o pracinha gaúcho Elmo Diniz, aos 103 anos. Ele lutou na Europa ao lado das forças aliadas do Brasil na Segunda Guerra Mundial. O militar faleceu de causas naturais. O velório será hoje, a partir das 9h, no 3º Regimento de Cavalaria de Guarda - Regimento Osório, em Porto Alegre. Uma cerimônia está prevista para as 11h.

Na Segunda Guerra, Diniz atuou como auxiliar da seção de logística, responsável por levar o fardamento e outros itens aos soldados no front.

No mês passado, morreu o tenente Oudinot Willadino. _

Brasil tem novo Patrimônio Mundial

O Brasil tem mais uma beleza natural reconhecida como Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco. O cânion do Peruaçu, em Minas Gerais, foi incluído na lista, domingo, na 47ª reunião do Comitê do Patrimônio Mundial, em Paris, na França. O local, com 38 mil hectares de extensão, tem formação geológica resultante do desabamento de uma caverna.

Entre os pontos mais visitados, estão a Gruta do Janelão, com galerias de mais de cem metros, e a Perna da Bailarina, considerada a maior estalactite do mundo (formação rochosa que se assemelha a um pingente de gelo). A região reúne mistura de ecossistemas, como Mata Atlântica, Cerrado e Caatinga, e abriga mais de 114 sítios arqueológicos. _

INFORME ESPECIAL

sábado, 12 de julho de 2025


12/07/2025 - 12h34min
Martha Medeiros

O que pode ser mais potente do que um primeiro beijo?

É só a vida amenizando o peso dos dias e lembrando que toda relação adulta, sempre inicia com um resgate adorável da adolescência

Mas dentro de um carro, motor desligado, coração disparado, vem tudo à cabeça em um segundo.

Conversa entre amigas íntimas sempre nos leva de volta às farras dos nossos tempos de colégio. Daí que, dia desses, veio o assunto dos primeiros beijos: onde aconteciam? Existia uma situação recorrente? Várias. Durante uma caminhada na beira da praia. Numa festa que acabou dentro da piscina. Na porta do elevador. Na cozinha da mãe de alguém, durante um trabalho em grupo. Dificilmente se fugia ao clichê. Durante uma obturação dentária, na fila da comunhão e durante um assalto é que não ia rolar. Caso eu esteja sendo inocente, me conte tudo, quero detalhes. 

Então entrávamos na maturidade e, a partir daí, o primeiro beijo quase sempre acontecia dentro do carro, ao ser deixada em casa depois de um jantar, de um show ou de onde quer que o casal estivesse antes. Perfeito: ambos pertinho um do outro, ninguém olhando, música tocando, enfim, passamos a vida assistindo a este momento-chave nas novelas, quase dá para imaginar as câmeras em volta e o diretor gritando: ação!

Uma das cenas geniais de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa, filme de Woody Allen, é quando ele convida a personagem de Diane Keaton para sair e, enquanto caminham pela calçada, durante um papo aceleradíssimo, ele estanca de repente e diz a ela: “Que tal se a gente se beijasse de uma vez para terminar com a tensão?”. Ela concorda, ele a beija por alguns segundos e então voltam a caminhar, prosseguindo a conversa do ponto onde haviam parado. Resolvido.

O que pode ser mais potente do que um primeiro beijo? Há um clima no ar, mas vá saber, pode ser apenas delírio de uma das partes. Nada parece estar acontecendo, mas se estiver mesmo acontecendo, só passará a valer a partir do primeiro beijo. É o que irá transfigurar a cena. Se antes as vozes eram graves, suavizam. Se antes havia cerimônia, ela se desfaz assim que os lábios se desgrudam. Se antes eram apenas amigos, agora se instalou a indefinição. O primeiro beijo remete ao início de uma nova fase – ou de fase nenhuma, pois tem isso também: se o beijo decepcionar, a fantasia termina ali mesmo.

Quando se está no meio da rua, no meio da pista, no meio de um bloco de Carnaval, não dá tempo de pensar nisso tudo. Mas dentro de um carro, motor desligado, coração disparado, vem tudo à cabeça em um segundo: que lingerie estou usando? Quando foi a última depilação? Estarei preparada para mais um turning point? Só conferindo. É fechar os olhos e se entregar ao desfecho habitual dos encontros às escuras. Poderá acontecer de tudo depois, inclusive nada. Não é assinatura de contrato. É só a vida amenizando o peso dos dias e lembrando que toda relação adulta, não importa a idade que se tenha, sempre inicia com um resgate adorável da adolescência. 


12 de Julho de 2025
CARPINAJER

Quando?

Meus pais andam concordando com tudo o que eu digo. Passei a estranhar. Não é que eles têm sido mais ecumênicos, generosos, compreensivos, tolerantes com as minhas excentricidades.

Há algo obscuro no ar. - Vou vender meu carro. Eles concordam. - Vou colocar implante de cabelo. Eles concordam. - Vou para a Ucrânia. Eles concordam. - Vou pôr piercing no nariz.

Eles concordam. Ainda que sejam altamente informados, nenhum comentário suscita críticas, apreensões, reclamações ou conselhos. Não se alvoroçam com minha saúde, finanças ou aparência. Comecei a desconfiar da televisão exagerada durante os nossos telefonemas. Pois meus pais interagem comigo com o aparelho no volume máximo.

O fundo da conversa é o noticiário. Tradicional sonoplastia caseira. Se prevalece a quietude, é engano. Não são eles. Os apresentadores dos canais de notícias (Globonews/CNN) formam seu coro grego.

Minha primeira impressão foi que abusam da tecla + do controle remoto porque não estão escutando direito. Pela idade (86 anos), deduzi que falham na recepção. Não pedem para repetir porque invariavelmente me mostro apressado e cheio de compromissos. Não insistem por educação - e acabam não se dando conta de que se afogam nos diálogos por causa da poluição sonora.

Creditei o problema à presbiacusia inevitável, perda auditiva comum em idosos, provocada pelo envelhecimento natural do ouvido. Ocorrem alterações no ouvido interno e no nervo auditivo, situação que pode ser agravada pela diabetes e hipertensão.

Mas existe um dado emocional por trás do costume, que deve ser considerado nas famílias. Na velhice, você se sente vivo com a casa habitada de sons e imagens. É o rádio. É a tela grande. É a tela pequena do celular. É um cruzamento infinito de vozes e trilhas. Os pais preferem ligar o arsenal completo do entretenimento ao mesmo tempo. Não conseguem se ausentar. Não escolhem um ou outro equipamento. Por onde vão, acendem as luzes e os barulhos.

Trata-se, na verdade, do efeito do ninho vazio. Os filhos cresceram, são adultos, não estão mais por perto - e os pais tentam ocupar os cômodos desesperadamente com os meios de comunicação.

Buscam reproduzir a nossa algazarra da infância. Combatem a solidão humana com a algaravia eletrônica. Precisam que o lar grite no nosso lugar.

Pois o silêncio arde no aluvião da falta, da carência, do desapego. Nada dói mais do que o desamparo do espaço: percorrer os aposentos parados e arrumados, que antes viviam em desordem e transbordavam com a nossa agitação.

Tanto que, quando falo para eles "estou indo aí para fazer uma visita", eles sempre escutam. Escutam muito bem. E logo emendam: - Quando? Hoje? Que horas? É uma audiometria infalível. A audição amorosa permanece absolutamente íntegra. Demonstram atenção perfeita para as frequências do coração.

Para a saudade, qualquer pai ou mãe é todo ouvidos. 

CARPINAJER

12 de Julho de 2025
COM A PALAVRA - Philip Shaw

COM A PALAVRA

Psiquiatra, pesquisador na área do neurodesenvolvimento e diretor da Parceria King?s Maudsley para Crianças e Jovens do Instituto de Psiquiatria, Psicologia e Neurociências do King?s College London

"Há uma forma de TDAH persistente,e uma forma que melhora"

Psiquiatra da infância e adolescência, Philip Shaw é referência na área do neurodesenvolvimento, com ênfase no transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Ele esteve no Brasil para participar do Brain Congress 2025 - Congresso de Cérebro, Comportamento e Emoções, realizado em Fortaleza, em junho. Em entrevista para Zero Hora durante o evento, Shaw falou sobre os avanços científicos em relação ao TDAH, como a depressão e a ansiedade entre os jovens têm representado preocupação, a importância do diagnóstico precoce e novas possibilidades de tratamento com o auxílio da tecnologia.

Quais são as descobertas e os avanços mais recentes relacionados ao TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade) em crianças e adolescentes?

Há três grandes descobertas. A primeira é que o curso da vida do TDAH é muito mais complexo do que pensávamos. Costumava-se pensar que começava na infância e persistia na idade adulta, ou melhorava gradual e lentamente ao longo do tempo e depois remitia (reduzia a intensidade) ou desaparecia na idade adulta. O que parece estar acontecendo é que essas duas formas existem. Há uma forma persistente, e uma forma que melhora ou remite. 

Há também uma forma de TDAH de agravamento. No TDAH, pode haver alguns sintomas na infância, mas só se torna realmente evidente na adolescência. Isso é TDAH emergente, emergente tardio ou diagnosticado tardiamente. E a última coisa, que é uma grande surpresa, é que, provavelmente, para cerca de 20% das crianças com TDAH, o transtorno é intermitente. Então, em um ano eles têm TDAH, no ano seguinte não se encontra, no ano seguinte se encontra. E esse curso flutuante é surpreendentemente comum no TDAH.

O que são as outras duas descobertas?

A segunda são as grandes descobertas sobre a genética do TDAH. O TDAH é uma das condições mais hereditárias da infância. E agora sabemos muito sobre quais genes, o que é realmente empolgante. E a última questão são os insights sobre as diferenças cerebrais no TDAH. Isso aconteceu porque muitas pessoas com TDAH gentilmente concordaram em permitir que seus exames cerebrais fossem compartilhados com a comunidade internacional. Então, agora temos cerca de 20 mil exames cerebrais de pessoas com TDAH compartilhados em todo o mundo. Isso nos mostra muito sobre as diferenças cerebrais no TDAH. A grande lição é que elas são muito sutis. Parece haver padrões diferentes em pessoas diferentes com TDAH.

E quando se trata de problemas de saúde mental em geral, entre os jovens, o que é mais preocupante hoje?

Para mim, e esta é uma opinião pessoal, o mais preocupante é o aumento de problemas de humor e ansiedade entre os jovens. Novamente no Reino Unido, mas acho que há evidências em todo o mundo, de que a ansiedade e a depressão estão aumentando entre os jovens. Acho que o aumento é real, e acho que isso é uma grande preocupação. Não acho que nenhum sistema de saúde no mundo possa atender a essa necessidade. Então, teremos de pensar em como podemos ajudar melhor esses jovens e suas famílias. É uma crise. É realmente uma crise.

Qual é a importância da identificação precoce do TDAH? Pode ajudar a prever desfechos na vida adulta?

A identificação precoce é vital. Se você conversar com um pai ou mãe de criança pequena com TDAH, a preocupação dele é: como meu filho se sairá na escola? E como será o futuro dele? Se tratarmos e gerenciarmos precocemente, as coisas vão melhorar.

Qual é a contribuição de fatores genéticos e ambientais no desenvolvimento do TDAH?

Genética. Os genes se expressam em um ambiente, então a interação dos genes com o ambiente é muito clara. A genética é muito importante aqui. E acho que, na verdade, para o Brasil em particular, é muito importante que todos participem da pesquisa genética, porque, no momento, a maioria dos nossos dados genéticos é de europeus brancos, e isso é um grande problema. Existem diferenças genéticas pequenas, mas importantes, de acordo com a sua ancestralidade. Para a medicina genética, que virá, para ajudar a todos, precisamos da participação de todos. Principalmente de indivíduos de origens que não conseguimos alcançar. Deveríamos estar trazendo-os para a ciência.

Quando falamos de tratamentos e intervenções, há novas possibilidades envolvendo tecnologia e realidade virtual. Seu grupo vem realizando estudos nesse sentido. Qual foi o impacto demonstrado até agora?

É para o futuro, é um trabalho muito empolgante. Os resultados iniciais são muito promissores. Ainda estamos aguardando os grandes testes para mostrar que eles funcionarão. Portanto, isso está em estágios iniciais, e os resultados iniciais são muito bons. A ideia é que crianças com TDAH querem tratamentos sem medicamentos. 

Todos gostariam disso. Então, tentaremos analisar as diferenças de pensamento cognitivo no TDAH e tentar ajudar as crianças com essas diferenças. Uma maneira de ajudar crianças com diferenças cognitivas são jogos inteligentes, jogos de realidade virtual, nos quais a criança pensa que está jogando, mas está fazendo treinamento cognitivo.

No Rio Grande do Sul, há uma pesquisa sendo conduzida para avaliar os benefícios do tratamento do TDAH com realidade virtual e exercícios para adolescentes.

Isso tudo é muito emocionante. O exercício é muito poderoso. É para tudo. Para todas as condições de saúde mental, exercícios são importantes. Dormir é outra coisa muito importante. Coisas simples. Não devemos esquecer o básico. Garantir que as crianças comam bem, se exercitem, durmam bem e tenham quantos amigos quiserem. Alguns querem mais do que outros. Tudo bem. Dê-lhes oportunidades. Certificar-se de que eles não passem todo o tempo no celular. 

De que eles também interajam com as pessoas. Bom senso. Acho que precisamos de pesquisas melhores para dar diretrizes mais claras aos pais. Primeiro, para todas as crianças, deve haver algumas diretrizes. E, depois, para grupos específicos de crianças, porque elas são diferentes. Crianças com autismo, por exemplo, terão necessidades diferentes das crianças sem autismo. Precisamos ser sensíveis a isso. Algumas diretrizes gerais também são necessárias, especialmente em relação a aspectos como o uso de mídia e a quantidade de sono. Precisamos desse tipo de coisa. _


12 de Julho de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

Sem OMC, Lula está sozinho contra Trump

Embora tenha mencionado a possibilidade de recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC) para que defina "quem está certo ou quem está errado" na ofensiva tarifária de Donald Trump, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sabe que a entidade não pode socorrer nem o Brasil nem os outros 22 países ameaçados com alíquotas de 25% a 50% a partir de 1º de agosto.

Por obra e graça dos Estados Unidos, ainda antes de Trump, a OMC está sem instrumentos para sancionar países que descumprem a "Constituição do comércio global" - mesmo que 1.111 entre 10 especialistas no tema saibam que Trump está errado. Isso significa que, na prática, assim como os demais chefes de Estado afetados pelo tarifaço, Lula está sozinho para enfrentar Trump.

Nos bastidores, cresce a possibilidade de adotar outras medidas, como flexibilização de patentes de medicamentos. Nesse caso, o objetivo não é obter ganho para o Brasil, mas provocar reações internas em setores econômicos americanos para dissuadir Trump de aplicar tarifas de 50% aos produtos brasileiros.

Lei de Reciprocidade supre "falta" da entidade

Falar em OMC faz parte da memória afetiva de Lula porque foi em seu segundo governo que o Brasil colheu grande vitória contra os EUA na histórica disputa sobre o algodão. Em 2009, a OMC acolheu a queixa de que subsídios americanos ao algodão prejudicavam produtores brasileiros e autorizou o país a retaliar.

Não por acaso, foi quando os americanos começaram a minar a capacidade de intervenção da entidade, além da entrada da China na OMC. Há anos, os EUA não indicam integrantes para a instância máxima da entidade, o órgão de apelação. Qualquer consulta à OMC, como descreveu à coluna o embaixador José Alfredo Graça Lima, pode ser alvo de um panel (espécie de julgamento), ter decisão, mas sem o "martelo" do órgão de apelação, não há como impor determinações.

Esse foi o motivo da mudança na Lei de Reciprocidade Comercial, que passou a permitir represálias sem autorização da OMC. Embora a lei esteja em vigor, para ser aplicada exige regulamentação que deve ser definida por decreto. _

A admissão de Donald Trump de uma conversa com Luiz Inácio Lula da Silva "em algum momento" suavizou, na sexta-feira, a alta do dólar (0,1%) e a queda na bolsa (0,4%). Mas a semana encerra com subida de 2,29% no câmbio.

Tarifaço é ruim, mas não é "bomba atômica"

Os diagnósticos ainda são iniciais, mas especialistas apontam que o impacto do tarifaço de 50% sobre produtos brasileiros deve se concentrar em alguns setores, com efeitos limitados sobre a atividade econômica. Ou seja, não seria a "bomba atômica" que patriotas que torcem contra o interesse nacional tentam pintar.

Os EUA são o segundo maior parceiro comercial do Brasil e recebem cerca de 12% das exportações brasileiras, o que equivale a cerca de 2% do PIB nacional.

O gigante financeiro JP Morgan calcula que o indicador que mede a riqueza produzida no país pode ser reduzido entre 0,8% a 1,2%, mas afirma que, caso as taxas setoriais já aplicadas em aço e alumínio não se somem ao novo tarifaço, o efeito será 20% menor.

A consultoria Oxford Economics avalia que haverá "impactos limitados na economia brasileira". Mesmo se o Brasil retaliar com taxa de 50% sobre produtos americanos - o que não é provável -, o PIB brasileiro ficaria apenas 0,1% abaixo do projetado para 2026. E explica: "Reflete o fato de que o Brasil é uma economia relativamente fechada e, ainda assim, bem diversificada no comércio internacional".

O maior efeito na economia real, projeta a Oxford Economics, virá da "deterioração da confiança empresarial e da crescente incerteza econômica em relação ao investimento fixo". A simulação também aponta para desvalorização do real, o que ajuda a compensar o impacto negativo nas exportações.

Mas não se deve subestimar os efeitos danosos da alíquota de 50%. Um relatório da XP chama atenção para efeitos em setores e empresas específicos, como a Embraer. Quanto maior a dependência dos EUA, maior será o estrago. _

Estimativas de bancos nacionais e internacionais veem redução no PIB de 2026 por taxa de 50% de

1,2% até 0,1%

Além da garrafa

Indústria da Capital conhecida por fazer garrafas, a Termolar vai avançar em outros segmentos do mercado de soluções térmicas, com novo produto para guardar alimentos.

Com conservação de até três horas para comidas quentes e quatro horas para frias, a Marmita Smart tem recipiente interno removível, que pode ir ao micro-ondas.

A novidade integra a coleção 2025/2026 da Termolar. No site da marca, é possível encontrar o novo produto a partir de R$ 350. 

GPS DA ECONOMIA

12 de Julho de 2025
POLÍTICA E PODER - Rosane de Oliveira

Família Bolsonaro dá sinais de desespero

Alertados para o risco das consequências nefastas da taxação das exportações brasileiras recaírem sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus satélites, pai e filhos exibem sinais de desespero em suas manifestações. Em tom de catástrofe, os Bolsonaro dobraram a aposta na terra arrasada, empurrando a culpa para o presidente Lula e citando motivos que nem estão na carta aberta de Donald Trump.

Seria cômica se não fosse trágica a declaração do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que comparou a pressão de Trump via tarifaço com um dos episódios mais infames da história, as bombas atômicas que destruíram Hiroshima e Nagasaki:

- Qual foi a reação do Japão naquela época? Falou: "Olha, nós aqui somos patriotas; isso é uma interferência dos Estados Unidos aqui no nosso país; nós aqui vamos resistir; fora, ianques". Qual foi a consequência três dias depois? Uma segunda bomba.

Traduzindo, o patriota Zero Um quer que o Brasil se renda a Trump e que o Congresso aprove uma anistia ampla, geral e irrestrita. Se isso não for feito, que se quebre o Brasil, porque a culpa será de Lula.

O pai, Jair, não chegou a falar em bomba atômica, mas na nota publicada na quinta-feira trata o Brasil como se estivéssemos vivendo nas trevas de uma ditadura como a de 1964, que ele apoiou e segue apoiando.

Diz um dos trechos mais risíveis: "O Brasil caminha rapidamente para o isolamento e a vergonha internacional. A escalada de abusos, censura e perseguição política precisa parar".

Eduardo, o deputado que se licenciou para conspirar nos EUA contra o STF e o Brasil, chamou, em vídeo publicado no YouTube, de "tentadora" a proposta que Trump faz para facilitar a transferência de empresas brasileiras para território norte-americano:

Se você empresário brasileiro quiser investir nos EUA, não vai ter preconceito, em semanas a gente coloca seu processo adiante.

Os posts de Carlos, o vereador do Rio de Janeiro, que são na maioria reproduções de opiniões alheias, podem ser resumidos em uma frase publicada na quinta-feira, em letras maiúsculas: "A culpa é só do Lula". 

Como antecipado pela coluna, Eduardo Leite enviou o pacote de projetos de lei para a Assembleia Legislativa. Dentre as 11 propostas, está a criação da Secretaria da Mulher, que vai absorver cargos da Justiça e Direitos Humanos.

"O Estado brasileiro falhou", diz ministro sobre fraude no INSS

O ministro da Previdência, Wolney Queiroz, resumiu a explicação sobre a fraude no INSS com uma frase curta:

- O Estado brasileiro falhou.

E completou:

- O ladrão entrou na casa entre 2019 e 2022. E continuou em 2023 e 2024 porque os alarmes foram desligados propositalmente.

Ele não quis dar nomes, alegando que essa resposta estará no inquérito em andamento. Mas afirmou que quer entrar para a história como quem "fechou as portas para as fraudes". _

Na CPMI, discurso será de que o governo Lula deu fim ao esquema

Será esta a linha de defesa do governo na CPMI do INSS, que deve começar nos próximos dias: que as fraudes começaram a ser denunciadas em 2019 e que foi no governo Bolsonaro que associações foram credenciadas para ter o desconto associativo em folha, sem preocupação com a checagem da autenticidade das autorizações de segurados.

Confrontado com o crescimento exponencial dos descontos irregulares em 2023 e 2024, Wolney Queiroz voltou a mencionar o "desligamento dos alarmes" e reforçou o discurso do governo:

- Não foi no governo Lula que a fraude começou, mas foi o governo Lula que terminou com elas e que devolveu o dinheiro aos aposentados. _

Ministra cobra agilidade para instalar Casa da Mulher no RS

Em Porto Alegre para uma série de reuniões ligadas ao público feminino, a ministra das Mulheres, Márcia Lopes, cobrou agilidade do governo do Estado em encontrar uma área em Porto Alegre para receber a Casa da Mulher Brasileira - estrutura destinada ao atendimento de vítimas de violência doméstica. Márcia foi recebida pelo governador Eduardo Leite, secretários, deputadas gaúchas e representantes de movimentos sociais no Palácio Piratini.

Desde maio, quando assumiu a pasta, Márcia Lopes definiu como meta da sua gestão instalar, em todo o Brasil, 40 casas para atendimento das mulheres.

No Rio Grande do Sul, serão duas unidades: em Porto Alegre e em Caxias do Sul. Na Serra, já existe um terreno escolhido no bairro Sanvitto para abrigar o espaço. Já na Capital, o governo e a prefeitura ainda não encontraram uma área adequada e que atenda aos critérios do governo federal.

- A implantação dessas novas casas no Rio Grande do Sul fortalece a política do governo federal de tirar o Brasil do mapa da violência contra as mulheres. Com políticas intersetoriais, estamos unindo forças para salvar vidas e garantir dignidade, autonomia e justiça para todas as brasileiras. Nossa meta é feminicídio zero no país - reforçou a ministra. _

Nova eleição

A Justiça determinou a realização de nova eleição para a Mesa Diretora da Câmara de Vereadores de Boqueirão do Leão, no Vale do Rio Pardo.

Na votação de 1o de janeiro, os votos da oposição, que tem maioria, foram anulados pela vereadora Dalvina Reginatto (MDB), aliada do governo que presidia a sessão, sob alegação de que as cédulas de papel não haviam sido rubricadas por ela. _

mirante

Na segunda-feira, o MDB reinaugura o auditório da sede estadual e fará uma homenagem póstuma ao deputado Ibsen Pinheiro, que dará nome ao espaço.

O deputado federal Lindbergh Farias, líder do PT na Câmara, estará em Porto Alegre na próxima quinta-feira. O parlamentar discursará em plenária sobre a taxação dos super-ricos, isenção do IR até R$ 5 mil e o tarifaço de Trump.

POLÍTICA E PODER


12 de Julho de 2025
INFORME ESPECIAL- Rodrigo Lopes

Tensões entre EUA e Brasil são comuns

Um dos pilares da política externa brasileira no início do século 20 era contar que a aproximação com os Estados Unidos renderia concessões de Washington que seriam benéficas para o Brasil. Mas, como lembrou à coluna o embaixador Rubens Barbosa, essa relação de 200 anos é marcada por episódios frequentes de tensão. 

Se a retórica costuma exaltar a amizade estratégica e os interesses comuns, a realidade mostra que, por trás dos sorrisos protocolares, há contenciosos econômicos e políticos que revelam os limites da relação bilateral - especialmente quando interesses de Estado colidem com personalismos ou com narrativas ideológicas de ocasião.

Há rusgas históricas, desde o Império, mas para não nos alongarmos muito no tempo, vale lembrar que poucos embates foram tão emblemáticos quanto o contencioso do algodão, iniciado em 2002, quando o Brasil denunciou os subsídios americanos à produção de algodão, que distorciam o mercado internacional. 

O caso foi parar na Organização Mundial do Comércio (OMC) e resultou, anos depois, em uma vitória histórica do Brasil, com direito à autorização para retaliação comercial e, posteriormente, a um acordo bilionário com os EUA. Outro exemplo recorrente de atrito envolve o aço e o alumínio: em diferentes momentos, os EUA impuseram tarifas sob pretextos protecionistas, como fez Donald Trump em 2018 e 2019. O Brasil, ainda que se apresentasse como aliado fiel de Washington no governo Jair Bolsonaro, não escapou das sanções.

Casos recentes

A tensão também se estendeu ao etanol e aos biocombustíveis, com medidas de reciprocidade e disputa por mercado entre o etanol de cana brasileiro e o etanol de milho americano. Já no campo da propriedade intelectual, o embate foi mais sutil, mas não menos simbólico: os EUA pressionaram contra a quebra de patentes de medicamentos, especialmente durante a crise do HIV, enquanto o Brasil defendia o acesso universal à saúde, em consonância com tratados internacionais.

Mas foram os contenciosos políticos e diplomáticos que mais abalaram a confiança mútua nos últimos anos. O caso recente mais grave foi o episódio da espionagem da NSA, em 2013, quando a então presidente Dilma Rousseff teve seus dados monitorados ilegalmente pela inteligência americana. Dilma cancelou uma visita de Estado aos EUA e denunciou o abuso na ONU. A crise marcou um ponto de inflexão nas relações.

Sob o governo Biden, novas tensões emergiram. Os incêndios na Amazônia e a condução da política ambiental na época de Bolsonaro no Planalto provocaram reações duras do Congresso e da diplomacia dos EUA, que passaram a condicionar investimentos e cooperação ao combate ao desmatamento. A resposta do Brasil oscilou entre a negação e o discurso de soberania, com impacto direto na imagem internacional do país.

Apesar da retórica de proximidade, os interesses dos Estados Unidos raramente se curvam a afinidades ideológicas ou afetivas. O Brasil, por sua vez, oscila entre o pragmatismo e a tentativa de construir relações baseadas em lealdades pessoais, o que, invariavelmente, se revela frágil. _

Lula diz que tarifaços desorganizam a economia

O presidente Lula publicou, na quinta-feira, um artigo de opinião em nove jornais de relevância internacional. Intitulado Não há alternativa ao multilateralismo, o texto tece críticas às tarifas unilaterais e afirma que 2025 pode entrar para a história como o ano em que a ordem internacional poderia desmoronar.

Embora não cite diretamente a tarifa de 50% imposta pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre produtos brasileiros, o artigo ressalta que "tarifas abusivas desorganizam cadeias de valor e lançam a economia mundial em uma espiral de preços altos e estagnação".

Destacando que o Brasil sempre buscou e continuará buscando a colaboração entre as nações, Lula afirmou em seu artigo que "a solução para a crise do multilateralismo não é abandoná-lo, mas reconstruí-lo sobre bases mais justas e inclusivas".

O artigo foi publicado nos jornais Le Monde (França), El País (Espanha), The Guardian (Reino Unido), Der Spiegel (Alemanha), Corriere della Sera (Itália), Yomiuri Shimbun (Japão), China Daily (China), Clarín (Argentina) e La Jornada (México). _

Superman Trump

O perfil oficial da Casa Branca divulgou, no final da noite de quinta-feira, uma imagem do presidente americano, Donald Trump, vestido de Super-Homem. A ilustração era acompanhada da legenda: "O símbolo da esperança. Da verdade. Da justiça. Do estilo americano. O Super-Homem Trump."

A postagem foi feita um dia antes da estreia norte-americana do novo filme do super-herói da DC Comics, marcada para sexta-feira - enquanto no Brasil o lançamento ocorreu um dia antes, na quinta-feira. Curiosamente, na nova adaptação cinematográfica, o personagem é retratado como um imigrante. 

Como ficou o novo Parque da Cidade, o palco da COP30

Sede da COP30, que ocorrerá em novembro, o Parque da Cidade tem sido ponto de recreação da população de Belém (PA) desde o final de junho.

Com 500 mil metros quadrados, conta com os prédios dos centros de economia criativa e de gastronomia, lago, quadras esportivas, ginásio coberto, playground, skatepark, anfiteatro, ciclovias, ecotrilhas, área verde preservada e mais de 2,5 mil árvores plantadas e transplantadas.

Em agosto, o espaço será entregue ao governo federal e à ONU, que passarão a montar as estruturas modulares provisórias dos pavilhões de negociações e plenárias da COP30 - as chamadas áreas Blue e Green.

O Parque da Cidade foi construído na área do antigo Aeroporto Brigadeiro Protásio. _

INFORME ESPECIAL

sábado, 5 de julho de 2025



04/07/2025 - 13h51min
Martha Medeiros

Viajar é um vício, um prazer, um tratamento de saúde mental

Não é porque se está fora de casa que se pode agir feito um ogro, desrespeitando o silêncio alheio e a cultura de cada povo

Com adesão voluntária é melhor não contar: ninguém vai deixar de renovar o passaporte.

Gilmar Fraga / Agencia RBS

A pandemia trancou 7 bilhões de pessoas em casa. Quando acabou, éramos 7 bilhões de estressados, com abstinência de liberdade e craques em trabalhar online. Debandamos, claro. As vielas de Veneza hoje parecem formigueiros humanos, comprometendo o patrimônio histórico e elevando o custo de vida de quem lá nasceu, mas quem se importa, além dos moradores? Veneza é só um exemplo da invasão em massa. 

Protestos têm sido feitos nos mais cobiçados destinos turísticos, mas levantar cartazes têm pouco efeito prático. Alguns nativos reagem infantilmente, como os barceloneses que apontam pistolas d’água para os turistas. Com os termômetros batendo os quarenta graus, fazem até um favor a quem se arrasta pelas Ramblas com uma mochila pesada nas costas.

Alguns londrinos adotaram uma forma mais radical de expulsar os chatos. Desde quando foi lançado o filme Um Lugar Chamado Notting Hill, o bairro passou a concentrar alto índice de visitantes que fazem questão de conhecer a livraria “do Hugh Grant” e o conjunto de casas coloridas que dá um ar brejeiro à região. Pois alguns moradores, exaustos de verem seus jardins invadidos por turistas em busca do melhor ângulo para fotografar as fachadas, resolveram pintar suas casas de preto. Adeus, amarelinho, rosinha, azulzinho. Casas pretas. Notting Hill versão Família Addams.

Em Paris, há duas semanas, funcionários do Louvre organizaram uma greve relâmpago e fecharam as portas, deixando os turistas do lado de fora, com ingresso na mão, sem entender nada. Reivindicavam um limite de visitação, antes que o caos se instale no famoso museu. E nos aeroportos, na entrada das salas vip, as filas também andam gigantes. O que era para ser uma área destinada a poucos, se tornou acessível a todos, devido a ampliação das vantagens oferecidas pelos cartões de crédito. O benefício é vendido como “premium”, mas o que se vê é uma horda disputando o pão de queijo grátis.

Seria pedir demais que voltássemos a ter uma vida amena, ponderada, sem tanta ansiedade? 

Difícil reverter a situação, uma vez que o turismo impulsiona a economia mundial. Estudam-se paliativos, como exigir taxas de entrada nas cidades, impedir a construção de novos hotéis em zonas centrais e estimular a visita a lugares ainda não explorados, os tais paraísos secretos. 

Com adesão voluntária é melhor não contar: ninguém vai deixar de renovar o passaporte. Viajar é um vício, um prazer, um tratamento de saúde mental. Eu adoraria que Porto Alegre recebesse mais turistas – até que alguém invada meu jardim e perturbe a minha paz, logo, educação turística vai ter que entrar na pauta. Não é porque se está fora de casa que se pode agir feito um ogro, desrespeitando o silêncio alheio e a cultura de cada povo. Mas enquanto não se organiza essa barafunda, pistola d’água em nós. 


Casamento entre CLT e PJ

Foi-se o tempo em que os pais tinham emprego fixo e saíam de férias nos meses certos - no recesso escolar, seja no verão ou no inverno.

O dilema era contar com condições de viajar. Mas não havia dúvida de que existiria um período definitivo para descansar. Não se disputava folga com colegas, nem se negociavam acordos profissionais. O recesso beneficiava a todos.

Hoje, o cenário mudou: é comum um casal ser formado por CLT e PJ. Um com carteira assinada. O outro, pessoa jurídica. É assim no meu casamento.

Beatriz é advogada de banco. Precisa planejar seus 30 dias corridos de férias com antecedência. Já eu sou por minha conta e juízo. Não desfruto de férias, décimo terceiro, rescisão. Meu vínculo é pela minha empresa. Se eu adoecer, não há sentido em apresentar atestado. Vou entregá-lo para mim?

Minha esposa tem emprego. Eu tenho trabalho. São dimensões distintas na organização do calendário.

Tornei-me um workaholic sem escolha. Relaxo em semanas entre palestras, de modo repentino, ou aproveito algum pedaço de janeiro, algum naco de julho. Por sua vez, ela é condicionada por lei a usar o descanso antes que vença.

Não dá para fazer tudo junto. Senão, vamos enlouquecer em crises de ciúme e inveja. Remakes de lua de mel são inviáveis. Eu a deixo ir. E mais do que isso: incentivo. Saber que ela está feliz me traz alívio para me concentrar nas tarefas.

Que viaje com suas amizades e com sua família. Que viva dias leves enquanto eu sigo focado na lida. Ofereço apoio. Porque ela merece - trabalha tanto quanto eu. E porque prender a parceira não é justo - é avareza emocional.

Já não é mais possível uniformizar horários, ritmos e necessidades. Um acorda cedo, o outro vira a madrugada. Um tem fim de semana, o outro, plantão. O casamento é obrigado a se reinventar com as agendas desencontradas.

É perder o lazer para não pôr a perder os sonhos. É confiar nos projetos compartilhados, mesmo diante das situações adversas. Acredite no amor mais do que nas circunstâncias. A verdadeira afeição não compete por descanso. Você torce pela pessoa, ainda que esteja sobrecarregado.

É ajeitar dentro de si aquele desconforto contraditório: por que ela está na praia e eu preso numa planilha? É não se enganar pelas aparências. É relevar as restrições de cada um. É sentir o orgulho silencioso de manter a casa funcionando enquanto o par viaja. Realizar o invisível com alegria. Demonstrar a elegância do discernimento.

Pois a retaguarda também é cuidado. Não se deve sucumbir ao mito da simetria e da dependência. Nas diferenças, perdura a reciprocidade de intenções. Que minha esposa descanse sem carregar culpa na bagagem.

Tem gente que viaja e manda lembrança. Tem gente que fica, e é lembrança, e é saudade.

Que aceitemos o novo mundo do trabalho. É um privilégio vadiar a dois, mas é um dever permitir que quem amamos usufrua de seus direitos. CLT e PJ: os opostos se atraem - e se respeitam. 

CARPINEJAR

05 de Julho de 2025
COM A PALAVRA - Thomas Traumann

Analista político e autor do livro "O Pior Emprego do Mundo", no qual disseca as vicissitudes enfrentadas por 14 ex-ministros da Fazenda. "Lula tem problema de popularidade e reage atacando"

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vive o período mais delicado de seu 3o governo. Para o analista político Thomas Traumann, que foi ministro-chefe da Comunicação Social no governo Dilma Rousseff, isso ocorre por erros de gestão e falta de articulação política. Veja a entrevista.

Fábio Schaffner - Lula conseguirá reconstruir sua base no Congresso?

Esquece. Acabou. O presidente da Câmara, Hugo Motta, é hoje o líder da oposição. A origem disso foi a decisão, única e pessoal do presidente Lula, de antecipar o período eleitoral quando ele anunciou a reforma da renda junto com o ajuste de gastos. A partir dali, ele deixou claro que 2025 não existia, já era 2026. Todo mundo passou a olhar o que o outro estava fazendo em função da eleição. Perdeu-se o terceiro ano de governo.

O quanto o decreto do IOF agravou a crise?

A questão do IOF começa ruim da forma como a Fazenda fez, sem discutir com os outros ministérios e com o Congresso. Nem o Banco Central sabia. Depois, o Congresso dá sinais de que vai ter espaço de negociação mas, surpreendentemente, sem avisar o governo nem tentar alternativa, decide derrubar o decreto. Os dois lados estão muito radicalizados.

Que peso tem nessa crise a ausência de Lula na articulação política?

A primeira responsabilidade do presidente foi antecipar o processo eleitoral. A segunda foi não fazer uma reforma ministerial. A derrota que a esquerda teve na eleição municipal indicava a necessidade de composição. Ele só fez mudanças no PT, não fez na base. Tem uma questão de postura também.

O Congresso aprendeu com a eleição municipal que emendas elegem prefeito. Se elegem prefeito, elegem deputado. Então, não dá para imaginar que vai dar certo chegar até junho com R$ 200 milhões em emendas liberadas quando, no mesmo período do ano passado, já tinham soltado R$ 6,5 bilhões. Em uma semana agora liberaram R$ 4 bilhões. Ou seja, dava para ter feito mais. Então, há um problema de gestão também.

É possível reverter esse empoderamento do Congresso?

Só se isso for um tema do próximo presidente. Se na campanha ele disser: "Se for eleito, vou mudar isso". Assim se ganha legitimidade da urna. Voluntariamente, o Congresso não vai devolver esse poder.

O PT divulgou um vídeo em que diz defender os pobres enquanto o Congresso defende os ricos. Isso não acirra ainda mais os ânimos?

É natural. O governo está acuado, tem minoria no Congresso e nenhum relacionamento com a elite financeira e econômica do país. Nenhum empresário conversa com Lula. Ele tem problema de popularidade e reage atacando. Tem que engajar sua torcida, né? Como os discursos do Bolsonaro para o cercadinho. Nós contra eles. Deu certo em 2006, logo depois do mensalão, deu certo em 2010 e deu certo em 2014, quando Dilma se reelegeu numa crise de popularidade enorme. É aquela tática de colocar três centroavantes e jogar a bola na área. É bonito? Não. Mas, às vezes, dá certo.

Mas, em 2015, Dilma praticamente não governou e teve o impeachment em 2016. Isso não pode se repetir?

É um grande risco, porque o risco fiscal para 2027 é muito maior. Em 2015, o Brasil era um país rico comparado com hoje. Não lembro aqui, mas a relação dívida x PIB em 2015 era em torno de 60%, hoje tá indo quase a 80%. Quem quer que seja o presidente em 2027 terá de fazer um forte ajuste.

Como serão os 18 meses que restam para o governo?

Nada vai ser feito. Daqui até lá é só tiro, porrada e bomba. Alguma ou outra pauta vai ser resolvida, mas será exceção.

A queda na aprovação do governo e na popularidade de Lula é por falhas na comunicação ou por erros de gestão?

Pode-se melhorar a comunicação, mas o governo não entendeu que não foi Lula que venceu a eleição, Bolsonaro que perdeu. Ao não entender, Lula montou um governo cuja base era repetir os melhores momentos do governo Lula 1. Não se podia ter ideias novas, projeto novo. É um governo que começou desatualizado, com agenda que não excitava mais ninguém. Programas como Minha Casa, Minha Vida, Farmácia Popular, Mais Médicos, que tiveram enorme impacto quando lançados originalmente, agora não surtem tanto efeito.

Por quê?

As necessidades são diferentes hoje. O mercado de trabalho é digital. O rapper Mano Brown falou um negócio ao entrevistar o Lula semanas atrás que devia estar escrito no Palácio do Planalto: "Antes a luta era contra a fome. Agora é pelo iPhone". Se o governo não entender essa frase, não consegue entender o que está acontecendo. Porque a luta pelo iPhone significa que o sujeito se comunica, vende, compra, ganha o seu dinheiro, tudo no celular. Vive no celular. E o celular não pode ser roubado. É um modo de vida. Faltou ao governo entender isso. Não basta colocar mais propaganda. O governo é lento, a gestão é mais fechada.

? Isso explica porque esse motim é liderado por aliados e não pela oposição?

Exatamente. Porque eles se sentiram alijados do poder. É surpreendente que um governo com a caneta na mão não vai conseguir colocar um partido a mais na sua aliança para a reeleição do que tinha em 2022.

Por que há essa discrepância entre os números da economia, que não são tão ruins, com a percepção da sociedade sobre o cenário econômico?

O governo não notou o que estava acontecendo com o governo Joe Biden nos EUA. Biden conseguiu sair da pandemia de forma brilhante. O desemprego caiu para nível baixíssimo, começou a baixar a inflação, mas a sensação de insatisfação continuou e foi o que o derrotou. Lula não conseguiu ver que aquilo podia se repetir no Brasil. Se você pegar o último ano do governo Bolsonaro, os dois primeiros anos do Lula e este ano agora, o Brasil é um dos países que mais cresceu no mundo. Temos um dos mais baixos índices de desemprego da história e a massa salarial cresceu.

E por que há insatisfação?

Porque as pessoas não comem PIB. O PIB cresceu, mas como isso chega nas pessoas? Alguns grupos ganharam muito, algumas regiões ganharam mais que outras. Mas como o governo mostrou que ele estava do lado das pessoas? Como ajudou quem estava abrindo um negócio, como influenciou na segurança pública? Como o governo fez coisas de verdade? Faltou gestão.

Bolsonaro não vai apoiar o governador de SP, Tarcísio de Freitas?

Os sinais que a família Bolsonaro dá é que eles não confiam em outra pessoa que não seja na família Bolsonaro. Só teremos essa decisão no final do ano, depois da condenação e antes do cumprimento da pena.

O senhor enxerga Bolsonaro preso até o final do ano?

Ele provavelmente vai ser condenado e vai para prisão domiciliar. A decisão do Supremo em relação ao ex-presidente Collor é um indicativo, acho que se repetirá com Bolsonaro.

? Há espaço para uma terceira via, como sonha Eduardo Leite?

Zero, zero, zero. Nenhum. Em 2026, zero.

? E até quando vai essa polarização no país?

Enquanto tiver Lula e Bolsonaro. Pode ser que dê uma esfriada em 2030. _


05 de Julho de 2025
OPINIÃO RBS

Precaução a entraves previsíveis

Dois imbróglios que vieram à tona nos últimos dias, relacionados a obras de proteção contra cheias, reforçam a relevância de melhorar a interlocução entre os diferentes órgãos responsáveis por esses projetos e as instituições que de alguma forma são chamadas a se posicionar para dirimir conflitos. Amplo diálogo, antecipação a entraves previsíveis e precaução são ainda mais necessários nas intervenções voltadas a salvaguardar áreas densamente povoadas contra grandes enchentes. Como a natureza mostrou outra vez, novos eventos de chuva extrema voltarão a ocorrer. Só o quando é incerto.

Retomados no dia 27 de junho, os trabalhos de reforço do dique do bairro Sarandi, na zona norte da Capital, estavam parados desde março devido a uma decisão judicial que impedia o avanço do serviço executado pela prefeitura de Porto Alegre antes da remoção de todas as famílias da área e pela inexistência de estudo técnico que apontasse risco imediato à estrutura. 

Há duas semanas, enquanto as águas voltavam a subir e a ameaçar a região, ainda em meio a uma infiltração no dique, outra decisão dos tribunais manteve o impedimento a ações emergenciais no local, também pela falta de um laudo sobre o impacto da cheia na barragem e pela ausência de um plano de alocação das famílias que ainda ocupavam a área. Com a apresentação dos laudos, a reintegração de posse para o Executivo foi decidida pela Justiça e as obras foram reiniciadas.

Em outro episódio, o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Estilac Xavier suspendeu a concorrência para a elaboração do anteprojeto do futuro dique de Eldorado do Sul, enquanto novamente o Rio Jacuí invadia parte da cidade e deixava milhares de pessoas fora de casa. O certame estava em fase de homologação. Segundo o TCE, a licitação foi feita pela modalidade de menor preço, mas o entendimento - a partir da denúncia de supostas irregularidades feita por um sindicato - foi de que a modalidade correta da licitação seria a que leva em conta também a qualificação técnica da proposta.

É possível inferir, em ambos os casos, que um pouco mais de cuidado e de presteza poderia ter evitado os impasses. Seria possível providenciar antes laudos sobre o dique do Sarandi, assim como elaborar uma estratégia de alocação emergencial das famílias que resistiam em abandonar as residências irregulares onde viviam há bons anos - também por omissão histórica do poder público. No caso de Eldorado do Sul, não seria excesso de zelo uma consulta prévia sobre a modalidade de concorrência mais indicada.

Licitações são sempre passíveis de recursos administrativos e judiciais. Obras com remoção de famílias, da mesma forma, são sinônimo de solução intrincada. Não há surpresa também em tribunais serem provocados nessas situações. Esses episódios ao menos servem de lição para futuras concorrências e intervenções. Espera-se que o mesmo empecilho não se repita nos demais projetos de diques metropolitanos. 

Como não é possível saber quando será a próxima grande enchente e se se está diante de uma recorrência alarmante, cada dia importa para diminuir as vulnerabilidades a que milhares de pessoas estão expostas. Ganhar agilidade também depende de se precaver ao máximo das intercorrências comuns em obras públicas. 


05 de Julho de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

Um 0x0 para forçar negociação necessária

A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes sobre o impasse entre governo e Congresso sobre o aumento de IOF estipulou um 0x0: suspendeu tanto o decreto do Executivo quanto o do Legislativo que já havia derrubado a medida. E ainda forçou uma negociação já timidamente ensaiada ao convocar audiência de conciliação para o dia 15.

São 11 dias de prazo para encontrar uma saída para o impasse que, há vários dias, não é mais sobre o IOF, mas sobre o balanço de poder no Brasil e a necessidade de buscar uma solução mais robusta para o rombo do orçamento, não só deste ano, mas dos próximos.

Embora Moraes não tenha avaliado o mérito do decreto do governo, citou o uso arrecadatório do imposto regulatório para criar a dúvida que escancara a porta para a negociação. Uma janela já havia sido aberta com a aprovação, na Câmara dos Deputados, da urgência para votar um projeto que propõe cortes nos benefícios fiscais - uma proposta do governo.

Corte de gasto tributário é oportunidade

A combinação das duas medidas, a do STF e a da Câmara, dá oportunidade para o governo Lula desescalar o confronto com o Congresso - sob pena de tomar café frio mais de um ano antes da eleição - e para o Legislativo mostrar, de fato, que tem compromisso com o ajuste fiscal.

Na véspera, ocorreram conversas, como entre o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, seguidas de declarações pacificadoras de Lira, que propôs "um passo atrás". Uma das interpretações dessa sugestão foi a de que o governo retirasse o decreto do IOF. A decisão de Moraes poupa esse trabalho ao Planalto.

A urgência vale para projeto do senador Espiridião Amin (PP-SC) que propõe só revisar critérios de concessão de benefícios, com mais monitoramento e transparência. Mas há possibilidade de agregar outro, do deputado Mauro Benevides (PDT-CE), que prevê cortes graduais, de 5% neste ano e 5% em 2026. A estimativa de alívio no rombo é de R$ 70 bilhões. _

Depois de tocar no menor patamar em um ano na véspera, o dólar subiu 0,36%, para R$ 5,424, na sexta-feira. Mas a bolsa renovou recorde histórico em pontos: subiu 0,24%, para 141.264. A decisão salomônica do STF ajudou.

Inside job, o fator humano do risco

Com a prisão de João Nazareno Roque, funcionário da empresa de tecnologia C&M Software, ganhou força a suspeita de que o desvio de recursos do Pix tenha sido um "inside job" (trabalho interno, crime praticado com cumplicidade de alguém de dentro).

Nesse caso, o diagnóstico de especialistas é de que o roubo seja mais baseado em engenharia social e menos em hackers. A diferença está no acesso: Roque confessou que entregou uma senha, que deu entrada aos criminosos. Disse ter recebido R$ 15 mil para permitir o golpe estimado entre R$ 800 milhões e R$ 1 bilhão.

Qualquer que seja o nome, um dos lemas da segurança da informação é de que os sistemas são tão fortes quanto seus elos mais fracos, eletrônicos ou humanos. Como sinal de que o sistema do Pix segue seguro, o Banco Central relaxou a suspensão da C&M de cautelar para parcial. _

Mais prazo para hidrogênio verde

Os prazos do edital do governo do Estado para atrair a indústria de hidrogênio verde ficaram um pouco menos desafiadores. As inscrições foram prorrogadas por 10 dias. Interessados têm agora até o dia 26 para submeter propostas à chamada pública.

O cronograma final, no entanto, não sofrerá alterações, garante o governo estadual. O prazo apertado era uma reclamação de interessados em participar do edital. As propostas terão prazo de até 24 meses para execução após a assinatura do contrato. _

Acordo vai baratear chocolate suíço?

O acordo de livre-comércio entre Mercosul e Associação Europeia de Livre-Comércio (Efta, formada por Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein), anunciado quarta-feira, prevê cotas para chocolates suíços - parte das importações a ser definida será livre de tarifas quando o acordo Mercosul-Efta entrar em vigor.

Hoje, os chocolates importados pelos sul-americanos pagam imposto de 20%. Adilson Reis, analista da consultoria Mercado do Cacau, diz que a alta do cacau (300% em um ano e meio) e a posição de mercado de marcas suíças, como Lindt, Milka e Toblerone - produtos mais caros para um público específico - podem impedir queda de preços ao consumidor.

Devido à forte alta do cacau, prevemos aumentar os preços - afirmou um porta-voz da Lindt, umas das três empresas consultadas pela coluna (as outras duas não responderam). 

GPS DA ECONOMIA