21
de março de 2012 | N° 17015
MARTHA
MEDEIROS
Burrocracia
Recebi convite para participar de um evento
literário em João Pessoa. Já quase não viajo a trabalho, preciso ficar mais
tempo no meu escritório, mas respondi que, dependendo da data, talvez
conseguisse ir. Foi então que me chegou uma lista de documentos que eu deveria
providenciar para viabilizar minha participação.
Não
acreditei. Nem para um ex-presidiário acusado de desfalque do Banco Central
exigiriam tamanha quantidade de certificados de idoneidade moral e financeira. Eu
teria que passar uma semana percorrendo cartórios e contratar um ou dois
advogados. Muito grata, mas fica pra próxima.
Nunca vi um país se entravar tanto. Nada
avança em ritmo razoável. As incensadas obras prometidas para a Copa do Mundo são
apenas um exemplo. Afora maledicências, pilantragens e disputas de poder, ainda
temos a questão da papelada: é 1 milhão de pareceres, assinaturas, carimbos e
rubricas que impedem o andar da carruagem. Pois é, ainda estamos nos tempos da
carruagem, trotando.
Durante a enxurrada que desabou sobre Porto
Alegre, semana passada, tivemos mais do mesmo: ruas alagadas nos pontos de
sempre. Ok, o asfalto não absorve a água, o lixo é jogado em locais impróprios
e choveu o esperado para o mês inteiro. Mas não há pessoas dentro das
secretarias de governo sendo pagas para resolver os problemas da cidade?
Vai
chover de novo, e forte. E os carros ficarão boiando, poucos conseguirão chegar
ao trabalho, o comércio terá que fechar, moradores perderão seus móveis, grávidas
terão que ser retiradas de barco de dentro de suas casas. É um déjà vu
recorrente.
Como não imagino que haja almas satânicas
por trás da nossa administração, só posso pensar que a burocracia tem algo a
ver com isso. Quantos estudos, laudos, aprovações, orçamentos, prazos
remarcados, projetos refeitos serão necessários para resolver nossas pendências?
É o país da novela, de fato.
Fizemos progresso na emissão de documentos
pessoais – hoje se pode tirar uma certidão de nascimento ou uma carteira de
identidade sem trâmites e demoras, mas ainda falta, como falta, para a gente
ser uma nação que flui. A expressão “é pra ontem”, que configura a pressa,
passou a ser literal. Não conseguimos sair do ontem e entrar no amanhã.
Os reféns da burocracia se defendem dizendo
que não é culpa deles, exige-se o cumprimento da lei, e estão certos, senão
vira bagunça. Mas alguém lá em cima, com a caneta na mão, tem o dever de
promover mais agilidade nesse Brasil que só é rápido na informalidade. Há que
se encontrar um meio de trabalhar de forma legal e ao mesmo tempo atender as
demandas em prazo de país desenvolvido, que é o que almejamos ser.
O que é preciso para promover a
desburocratização? Claro, uns 3.479 estudos de viabilidade. Pocotó, pocotó.
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