18
de março de 2012
Martha
Medeiros
Inimigos de Classe
Quando
vai chegando a data do aniversário de Porto Alegre (26 de março próximo), começam
as enquetes: o que há de bom na nossa cidade, o que temos que as outras não têm?
Respondo: Luciano Alabarse.
Afora
seu mérito como organizador de um dos maiores festivais de teatro do país, o Em
Cena, que traz anualmente grandes nomes internacionais para os palcos gaúchos,
além de uma seleção caprichada do que de melhor se faz na dramaturgia nacional
e local, Luciano é, em essência, um senhor diretor.
E
mais uma vez prova isso com seu recente espetáculo, Inimigos de Classe, que
esteve em cartaz no Theatro São Pedro e que merece longa temporada. A peça,
escrita pelo dramaturgo inglês William Nigel, e que estreou em 1978, traz uma
temática que, aparentemente, é rançosa (a delinquência nas escolas), mas que
segue atual, basta lermos os jornais.
No
caso da peça, Inimigos de classe seis alunos da periferia de uma grande cidade
acabaram de expulsar uma professora da sala e aguardam um substituto que tenha
peito para enfrentá-los. Enquanto esse professor não chega, resolvem eles próprios
dar aula uns para os outros.
É nesses
momentos performáticos, quando se transmutam em “mestres”, que revelam sua violência
e fragilidade simultâneas, além de dar as pistas para que entendamos que eles não
tiveram muitas opções, a não ser se refugiar na marginalidade. O que diferencia
essa peça de filmes clássicos como Ao Mestre com Carinho e menos clássicos como
Mentes Perigosas é que não há figura do herói, o professor que resgatará a
garotada e os conduzirá a um final feliz.
Os
seis alunos não possuem essa boia salva-vidas. Eles precisam buscar em si
mesmos os recursos para escapar da desesperança. Ninguém vai me conhecer, mínguem
vai me conhecer!”, grita em surto, o personagem principal, Ferro, o mais
destemido de todos, dando bandeira da dor e do medo que sente em sua solidão
existencial. Ele e os demais colegas são frutos de lares desestruturados e
problemáticos.
Só atingem
um simulacro de segurança quando exacerbam uma virilidade patética e ao mesmo
tempo brutal. Claro, ninguém pode conhecer seus gostos, suas carências, seu desespero
íntimo: seria a revelação de uma fraqueza e de uma humanidade que eles na
permitem eu venha à tona.
Mas
que cedo ou tarde virá. Luciano Alabarse é o maestro dessa orquestra. Em quase
duas horas de encenação, rege uma coreografia fascinante no palco, que é valorizada
pelo cenário, pelo figurino, pela luz e pela espetacular trilha sonora que
resgata TomWaits em seu auge. E os seis atores em cena não devem nada a medalhões
– entregam o prometido:almas inquietas vivendo nas frestas.
Peças
de entretenimento possuem seu espaço e são bem-vindas, mas dramaturgia é outra
coisa. É sangue, suor, estupor, desconforto. Dessa matéria, Inimigos de Classe
entende tudo.
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