sábado, 12 de julho de 2025


12 de Julho de 2025
CARPINAJER

Quando?

Meus pais andam concordando com tudo o que eu digo. Passei a estranhar. Não é que eles têm sido mais ecumênicos, generosos, compreensivos, tolerantes com as minhas excentricidades.

Há algo obscuro no ar. - Vou vender meu carro. Eles concordam. - Vou colocar implante de cabelo. Eles concordam. - Vou para a Ucrânia. Eles concordam. - Vou pôr piercing no nariz.

Eles concordam. Ainda que sejam altamente informados, nenhum comentário suscita críticas, apreensões, reclamações ou conselhos. Não se alvoroçam com minha saúde, finanças ou aparência. Comecei a desconfiar da televisão exagerada durante os nossos telefonemas. Pois meus pais interagem comigo com o aparelho no volume máximo.

O fundo da conversa é o noticiário. Tradicional sonoplastia caseira. Se prevalece a quietude, é engano. Não são eles. Os apresentadores dos canais de notícias (Globonews/CNN) formam seu coro grego.

Minha primeira impressão foi que abusam da tecla + do controle remoto porque não estão escutando direito. Pela idade (86 anos), deduzi que falham na recepção. Não pedem para repetir porque invariavelmente me mostro apressado e cheio de compromissos. Não insistem por educação - e acabam não se dando conta de que se afogam nos diálogos por causa da poluição sonora.

Creditei o problema à presbiacusia inevitável, perda auditiva comum em idosos, provocada pelo envelhecimento natural do ouvido. Ocorrem alterações no ouvido interno e no nervo auditivo, situação que pode ser agravada pela diabetes e hipertensão.

Mas existe um dado emocional por trás do costume, que deve ser considerado nas famílias. Na velhice, você se sente vivo com a casa habitada de sons e imagens. É o rádio. É a tela grande. É a tela pequena do celular. É um cruzamento infinito de vozes e trilhas. Os pais preferem ligar o arsenal completo do entretenimento ao mesmo tempo. Não conseguem se ausentar. Não escolhem um ou outro equipamento. Por onde vão, acendem as luzes e os barulhos.

Trata-se, na verdade, do efeito do ninho vazio. Os filhos cresceram, são adultos, não estão mais por perto - e os pais tentam ocupar os cômodos desesperadamente com os meios de comunicação.

Buscam reproduzir a nossa algazarra da infância. Combatem a solidão humana com a algaravia eletrônica. Precisam que o lar grite no nosso lugar.

Pois o silêncio arde no aluvião da falta, da carência, do desapego. Nada dói mais do que o desamparo do espaço: percorrer os aposentos parados e arrumados, que antes viviam em desordem e transbordavam com a nossa agitação.

Tanto que, quando falo para eles "estou indo aí para fazer uma visita", eles sempre escutam. Escutam muito bem. E logo emendam: - Quando? Hoje? Que horas? É uma audiometria infalível. A audição amorosa permanece absolutamente íntegra. Demonstram atenção perfeita para as frequências do coração.

Para a saudade, qualquer pai ou mãe é todo ouvidos. 

CARPINAJER

Nenhum comentário: