sábado, 14 de junho de 2025



12/06/2025 - 04h00min
Lou Cardoso

"Namorar é aprendizado": veja o que dizem casais de diferentes gerações sobre relacionamento

Três casais de diferentes gerações compartilham os aprendizados de seus relacionamentos e mostram como uma relação pode ser um espaço de construção conjunta

Cultura, Comportamento e Donna

O que significa namorar? O conceito pode ter variações, mas, de forma geral, a maioria dos casais entende que é um processo contínuo de conhecer o outro, e a si mesmo, enquanto se constrói algo a dois. Quando se é jovem, o primeiro amor parece intenso, novo e empolgante. Já na vida adulta, os sentimentos costumam estar mais maduros, e cada pessoa sabe o que busca em uma relação.

Pensando nisso, a reportagem de Zero Hora convidou três casais, de diferentes gerações, para compartilhar as suas reflexões sobre o que é essencial em um namoro, além de seus aprendizados ao longo das relações.

Como o amor começa? 

Era março de 1988 quando a consultora de turismo Juçara Figueiró da Fontoura, hoje com 73 anos, e Carlos Alberto Brondani, garçom de 60 anos, se conheceram em uma casa de umbanda em Porto Alegre. Após algumas trocas de olhares e conversas despretensiosas, veio um convite que definiria o rumo do casal, marcado por afeto, amizade e muitos desafios. 

— Tomei coragem e me convidei para levá-la para casa. Levei uma, duas, três vezes, e ela nunca me convidava nem para um cafezinho, né, minha senhora? — diz Carlos Alberto, olhando para Juçara. — Até que, no dia em que ela me convidou para um café, começou a nossa história — recorda. 

Também foi na convivência que a supervisora comercial Patrícia Langer, 51 anos, e o corretor de imóveis César Silva, 50, deram início a uma relação marcada por espontaneidade, paciência e parceria constante. 

Os dois se conheceram em 2002, em uma empresa automotiva. Colegas na mesma função, revezando escalas de folga e cobrindo férias um do outro. O namoro começou naquele mesmo ano e ganhou seriedade desde o princípio.

— A gente trabalhava muito próximo. Era o tempo todo junto, mas nunca teve estresse. A gente sabia que era algo para valer. Mesmo trabalhando juntos, tínhamos nossos momentos nos finais de semana. Logo começamos a pensar em comprar um apartamento — conta Patrícia.

Patrícia e César se conheceram no trabalho e estão juntos há 23 anos.

Patricia Langer / Arquivo Pessoal

Entre os frutos do casal está o filho, João Pedro Langer, de 15 anos.

Patricia Langer e César Silva / Arquivo Pessoal

César e Patrícia eram colegas de trabalho quando começaram a namorar.

Patricia Langer / Arquivo pessoal / 3

Foi entre as aulas e atividades esportivas da faculdade que Maria Vitória da Silva Mayer, 21 anos, estudante de Publicidade e Propaganda, e Marcelo Marques Stodolni, 22, aluno de Jornalismo, se interessaram um pelo outro. Apesar da rotina corrida, o primeiro beijo do casal foi digno de uma cena de filme.

— No Carnaval de 2024, eu estava em Jurerê e ela, na Praia do Rosa. Aí fiz a loucura de pegar um aplicativo de transporte e viajei duas horas para ver ela — lembra Marcelo. Para ela, esse gesto mudou tudo:

— Eu achava que ele não ia vir. Quando ele apareceu, pensei: "Meu Deus, é ele". 

Namorar é um teste? 

Segundo o pesquisador Dardo Lorenzo Bornia Junior, professor de Ciências Sociais do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS), o conceito de namoro surgiu como um intermediário entre o ato de conhecer alguém e o casamento — especialmente em contextos religiosos no passado.

As relações afetivas eram, em sua maioria, arranjos sociais, políticos e econômicos. Hoje, o namoro já não carrega mais a obrigação de levar ao altar. Para muitos, a relação se justifica pelo prazer de estar com alguém, sem necessariamente firmar um futuro conjugal.

— Sabemos que, especialmente a partir dos anos 1970, com as mudanças nas leis do divórcio e nas gerações mais urbanas, o namoro não necessariamente indica uma promessa de casamento, mas é visto como o próprio objetivo da relação, podendo evoluir para algo mais sério ou não — explica o pesquisador.

Maria Vitória e Marcelo compartilham a rotina na faculdade e nas atividades físicas.

Maria Vitória da Silva Mayer / Arquivo pessoal

Casal está junto há um ano e deseja dividir o futuro juntos.

Maria Vitória da Silva Mayer / Arquivo pessoal

Primeiro beijo do casal foi durante o Carnaval de 2024.

Arquivo Pessoal / Maria Vitória da Silva Mayer

Juçara e Carlos Alberto, por exemplo, estão juntos há quase 40 anos e têm dois filhos adultos – Acauã e Marina Brondani, de 35 e 32 anos, respectivamente. Mesmo com uma família já formada, o casal ainda não oficializou a união – algo que, segundo eles, deve mudar em breve.

— Já pedi ela em casamento umas três ou quatro vezes — brinca Carlos Alberto.

— A gente já tem tudo. Vivemos em união estável e agora vamos passar para o papel por questões jurídicas. Mas o que realmente importa, a gente já tem — reforça Juçara.

Para chegar até aqui, o relacionamento enfrentou obstáculos – entre eles, o racismo e a diferença de idade de 13 anos, que gerava olhares atravessados na época em que começaram o namoro. Com o tempo, as críticas perderam força, mas o amor entre eles só se fortaleceu, guiado por um ingrediente fundamental: o diálogo.

— O que nos manteve juntos foi isso: compreensão e a certeza de que toda crise passa. Para manter esse núcleo forte, fizemos terapia familiar, o que eu recomendo muito. Às vezes, a gente tenta consertar tudo sozinho, mas não tem resposta para tudo. Um terceiro pode ajudar a reorganizar as coisas — afirma Carlos Alberto.

Eles também fizeram questão de construir um lar diferente do que tiveram.

— A gente traz muitas coisas da infância. Mas tentamos fazer diferente, formar uma família com mais diálogo, mais companheirismo — acrescenta Juçara.

Patrícia e César também passaram por momentos difíceis. Mesmo com a alegria da chegada do filho João Pedro, hoje com 15 anos, a relação exigiu paciência diante das adversidades da vida adulta.

— A gente divide tudo. A adolescência do filho, a velhice dos pais, as tarefas de casa... Tem fim de semana que cuidamos da minha mãe, no outro da mãe dele. E mesmo no meio de tudo isso, seguimos querendo estar juntos — conta Patrícia.

Já para Maria Vitória e Marcelo, o namoro na juventude é um constante aprendizado e nem sempre fácil. Para a estudante, um dos maiores desafios é a correria do dia a dia:

— Hoje em dia, tudo tem que ser rápido, do nosso jeito. Mas relacionamento exige paciência, escuta, maturidade pra entender que fases difíceis passam — relata a jovem, que completa: — Às vezes, o amor está num "bom dia", num copo d’água que ele me traz. A gente aprende que amor é mais do que paixão.

Afinal, o que significa namorar?

O termo namoro, que vem do latim e significa se apaixonar, passou a ser associado à difusão do amor romântico como justificativa para relacionamentos e casamentos. Segundo destaca Bornia, esse entendimento se popularizou nos últimos cem anos com a chamada "indústria cultural do amor", muito presente na literatura, na música e, especialmente, nas novelas.

Hoje, como mostram os casais entrevistados pela reportagem, namorar significa, essencialmente, estar junto — o que contribui para o conceito de “se apaixonar” diariamente.

Foi assim com Juçara e Carlos Alberto. Com os filhos seguindo seus próprios caminhos, o casal vive uma nova fase:

— Nosso namoro hoje é tomar uma taça de vinho em casa, conversar, rir, dormir juntos. Uma fase mais devagar, mas muito gostosa. Nosso relacionamento começou com fogo e paixão, depois virou companheirismo, e agora é cuidado um com o outro — diz Carlos Alberto, que sonha com o futuro de mãos dadas com a futura esposa: — Quero ficar velhinho com ela, de bengala. Quanto mais eu puder estar ao lado dela, eu vou querer estar.

Juçara concorda, com o olhar de quem já atravessou o tempo ao lado do seu grande amor:

— Vamos seguir juntos, grudados, tentando aproveitar a vida de verdade. Até o fim.

Acauã Brondani / Arquivo pessoal

Juçara e Carlos Alberto com os filhos Acauã e Marina.

Acauã Brondani / Arquivo pessoal

Vinte e três anos depois, Patrícia e César seguem namorando — sempre com novos planos, viagens, shows e barzinhos. Para eles, o segredo de uma relação duradoura está em continuar se escolhendo.

— O início do namoro é cheio de fantasia. Depois, vem uma fase mais verdadeira. É preciso regar. Às vezes é um "eu te amo" no meio da tarde, um "obrigado por estar comigo". Coisas simples que mantêm tudo vivo — cita Patrícia.

César completa:

— É saber respeitar as diferenças, conversar, trocar ideias, reconhecer as qualidades e aceitar os defeitos. É assim que a gente vai junto.

Apesar de recente, Maria Vitória e Marcelo também entendem que um namoro vai muito além do romance idealizado pela ficção:

— Namorar é aprendizado. A gente deixa de viver só por nós mesmos e passa a compartilhar a vida com alguém. Com o tempo, vamos entendendo a visão do outro. E isso ensina demais — reflete Maria.

— Esse é meu primeiro namoro, então muita coisa foi nova. Mas eu sinto que evoluí muito como pessoa. Namorar é isso: evolução — completa Marcelo.

E o futuro do amor?

Os relacionamentos seguem em transformação, refletindo as mudanças da sociedade. Com isso, o namoro ganhou novos rituais e novos modelos de relação – do cortejo por cartas aos aplicativos, de casais LGBT+ a uniões não-monogâmicas. E mesmo que as relações mudem, a busca por afeto, intimidade e conexão continua essencial.

— Nunca encontraremos alguém que seja exatamente como queremos, porque cada pessoa é única. É difícil encontrar esse equilíbrio, especialmente quando somos bombardeados diariamente com ideais de consumo nas redes sociais. As relações humanas não são produtos a serem consumidos. Encontrar o meio termo é o verdadeiro desafio — conclui Bornia.

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