
21 de Junho de 2025
OPINIÃO RBS
Pesadelo repetido
Ainda que não atinja a dimensão catastrófica da enchente de maio de 2024, a atual inundação em várias regiões do Estado já provoca os mesmos sofrimentos para as populações atingidas: vidas interrompidas, famílias desabrigadas, casas danificadas, móveis e eletrodomésticos inutilizados, estradas e pontes obstruídas e um trauma coletivo que se renova a cada chuva mais consistente.
O mais doloroso e decepcionante neste momento é a constatação de que, passado um ano da maior tragédia climática que se abateu sobre o Estado, muitos municípios gaúchos continuam vulneráveis às precipitações volumosas e à elevação dos níveis dos rios, inclusive em áreas que podiam - e deviam - estar mais protegidas. Nesse aspecto, cabe, sim, responsabilizar gestores públicos, legisladores e a burocracia estatal pela demora na implementação das obras estruturantes prometidas - evidentemente, sem desconsiderar também o descaso de parcela da população com a educação ambiental, incluído aí o descarte inadequado do lixo que entope bueiros e dificulta o escoamento das águas.
Há uma evidente dessintonia entre os discursos oficiais e o clamor dos moradores de áreas vulneráveis. Enquanto os governantes apontam soluções distantes e dependentes de projetos visíveis apenas no papel, os cidadãos lamentam perdas e reclamam que nada ou pouco foi feito pelo poder público para evitar a repetição do pesadelo do ano passado. Ressalve-se nesse contexto alguns municípios em que a Defesa Civil vem procurando remover os moradores ribeirinhos de forma preventiva. Na maioria dos casos, porém, são os próprios habitantes dessas áreas de risco que procuraram socorro antes de a situação se tornar incontornável.
Toda vida perdida deve ser lamentada, isso é inquestionável. Mas a significativa redução no número de vítimas fatais na enchente atual é também um registro que merece ser considerado, até mesmo em reconhecimento à conscientização dos próprios cidadãos que já não esperam para serem salvos no último momento. A autopreservação é um aprendizado valioso, principalmente quando se sabe, por previsões e estudos científicos, que os desarranjos climáticos tendem a se repetir com maior frequência no futuro.
Evidentemente, tais constatações não servem de consolo nem devem servir de estímulo para o conformismo. Pelo contrário, cada calamidade climática como a atual, ainda que resultante de precipitações acima da normalidade como alegam os governantes, tem que continuar provocando indignação pelo que ainda não foi feito para proteger as populações de riscos previsíveis e sanáveis.
Se não podemos impedir a chuva excessiva, certamente podemos evitar que mais habitações se localizem em terrenos alagáveis e que os serviços públicos continuem funcionando, cabendo aos representantes políticos adotar as devidas providências para que o escoamento funcione, as pontes resistam e as estradas continuem transitáveis. Cada cidadão pode contribuir com a parte que lhe cabe, mas a responsabilidade maior - como é legítimo numa democracia representativa - compete aos gestores públicos e aos políticos eleitos para trabalhar pela população.
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